Resumo
Objetivo: Avaliar a eficiência das ações de controle da hipertensão na Atenção Básica dos municípios da Região Norte do Brasil. Métodos: Estudo avaliativo, descritivo, transversal e quantitativo utilizando Análise Envoltória de Dados. Os insumos foram: recurso financeiro, jornada de trabalho da equipe e utilização de consultórios, e os produtos: ações de controle da HAS (hipertensos cadastrados, consulta individual e visita domiciliar). A coleta de dados foi realizada através dos bancos de dados secundários, com dados referentes ao ano de 2013. Resultados: Foram avaliados 142 municípios estratificados em dois portes populacionais: até 10 mil habitantes (porte 1) e 10.001-20.000 habitantes (porte 2). Os resultados indicaram baixo percentual de municípios eficientes (22,5% no porte 1 e 34,7% no porte 2), com a menor média de eficiência (0,7634) em municípios do porte 1. Os maiores déficits encontrados foram na consulta individual aos hipertensos em ambos os portes (48,6% e 46,6%, respectivamente). Conclusão: Esses municípios apresentaram escores de eficiência abaixo de suas capacidades instaladas e poderiam aumentar suas ações em mais de 40% em média. Tais achados indicam que os gestores poderiam planejar melhor suas ações, otimizando os recursos disponíveis para aumentar a oferta de serviços.
Palavras-chave:
Atenção Primária à Saúde; Hipertensão; Eficiência; Avaliação de serviços de saúde.
ABSTRACT
Objective To evaluate the efficiency of control actions of Hypertension in Primary Health Care in the municipalities in Northern Brazil. Methods: Evaluative, descriptive, cross-sectional and quantitative study using Data Envelopment Analysis. The inputs were: financial resources, team work hours and use of consulting rooms; and the outputs: hypertension control actions (registered hypertensive patients, individual appointment and home visits to hypertensive patients). Data collection was performed through secondary databases, with data for the year 2013. Results: 142 municipalities were stratified into two population sizes were used for the study: up to 10,000 inhabitants (size 1) and 10,001 to 20,000 inhabitants (size 2). The results indicated a low percentage of efficient municipalities (22.5% in size 1 and 34.7% in size 2), with the lowest average efficiency (0.7634) in cities of size 1. The biggest deficits found were in the individual appointment with hypertensive patients in both sizes (48.6% and 46.6% respectively). Conclusions: These municipalities had efficiency scores below their installed capacities and could increase their health actions by more than 40% on average. The results indicate that managers could better plan hypertension actions, optimizing the available resources to increase the offer of services provided to hypertensive patients.
Keywords:
Primary Health Care; Hypertension; Efficiency; Health services evaluation.
Introdução
Os recursos para o financiamento da saúde são escassos e limitados, e diante desse cenário há a necessidade de que os sistemas de saúde e os serviços sejam eficientes e otimizem os recursos disponíveis para produzir ao máximo os serviços para atender à demanda da população (VIDAL; GUSMÃO-FILHO; SAMICO, 2010VIDAL, A. S.; GUSMÃO-FILHO, F. A. R.; SAMICO, I. Avaliação econômica em saúde. In: SAMICO, I. et al. organizadores. Avaliação em saúde: bases conceituais e operacionais. Rio de Janeiro: MedBook, 2010. 196p.; MICLOS; CALVO; COLUSSI, 2017MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho das ações e resultados em saúde da atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 51, p. 86, 2017. ). Sendo assim, é de fundamental importância que as práticas de avaliação da eficiência sejam introduzidas no âmbito da Atenção Básica (AB), em busca de otimização dos recursos públicos e, consequentemente, melhorias nas condições de saúde da população (VIDAL; GUSMÃO-FILHO; SAMICO, 2010).
Contandriopoulos et al. (1997CONTANDRIOPOULOS, A. et al. A avaliação na área da saúde: conceitos e métodos. In: HARTZ, Z. M. A. (Org.). Avaliação em saúde: dos modelos conceituais à prática na análise da implantação de programas. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1997. 131p.) afirmam que a eficiência é considerada um dos tipos de análise da pesquisa avaliativa e a define como sendo uma combinação de duas análises: 1 - análise da produtividade econômica, que mede a relação entre os recursos empregados e os serviços produzidos; e 2 - análise do rendimento, que relaciona a análise dos recursos utilizados com os efeitos obtidos. Segundo os autores, a partir dessas análises é possível levantar alguns questionamentos para reflexão, como: seria possível a produção de mais serviços utilizando os mesmos recursos? Ou utilizar menos recursos empregados para produzir a mesma quantidade de serviços?
A base da teoria econômica da análise de eficiência foi introduzida através dos trabalhos de Debreu e Koopmans, em 1951, sobre análise de produtividade. Debreu estabeleceu o primeiro indicador de eficiência produtiva, orientado para a minimização do consumo de recursos. Em 1957, Farrell aprofundou este trabalho, desenvolvendo um procedimento com o objetivo de definir uma medida simples de eficiência que poderia englobar múltiplos inputs (CASADO, 2007CASADO, F. L. Análise envoltória de dados: conceitos, metodologia e estudo da arte na educação superior. Sociais e humanas, v. 20, n. 1, p. 59-71, 2007. ).
Já na década de 70, os trabalhos de Koopmans, Debreu e Farrel foram aperfeiçoados por Charnes, Cooper e Rhodes, dando origem a uma técnica em que se constrói uma fronteira de produção, denominada Análise Envoltória de Dados, conhecida como DEA (sigla em inglês para Data Envelopment Analysis) (VARELA; MARTINS; FÁVERO, 2012VARELA, P. S.; MARTINS, G. A.; FÁVERO, L. P. L. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Revista de Administração, v. 47, n. 4, p. 624-637, 2012. ). No Brasil, a discussão sobre eficiência começou a partir dos anos 1980, mais fortemente após a implantação do SUS, pela necessidade de maior eficiência na gestão para atender aos princípios e diretrizes propostos (VIDAL; GUSMÃO-FILHO; SAMICO, 2010VIDAL, A. S.; GUSMÃO-FILHO, F. A. R.; SAMICO, I. Avaliação econômica em saúde. In: SAMICO, I. et al. organizadores. Avaliação em saúde: bases conceituais e operacionais. Rio de Janeiro: MedBook, 2010. 196p.).
No Brasil, a partir de 2010, houve um aumento de estudos de eficiência da AB (MICLOS; CALVO; COLUSSI, 2015MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho da atenção primária em saúde através da Análise Envoltória de Dados. Revista Eletrônica Gestão e Saúde, v. 6, n. 2, p. 1749-63, 2015.), até então concentrados em análises de eficiência no cenário hospitalar. No entanto, no que se refere à avaliação de eficiência voltado às ações de algum agravo específico, como a hipertensão arterial sistêmica (HAS), ainda é escasso. Apenas um estudo foi encontrado na literatura, relacionando a eficiência com as ações de controle da HAS (RABETTI; FREITAS, 2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ) e demonstrando que ainda há necessidade de mais estudos que envolvam essa temática, em razão da sua relevância nos sistemas públicos de saúde.
A HAS é um problema de saúde pública de alta prevalência e sua condição crônica leva ao aumento da morbimortalidade. Por consequência, cresce a demanda por serviços de saúde, gerando altos custos e significativos impactos financeiros para os sistemas de saúde. Sabe-se que a porta de entrada dos usuários hipertensos deve ser, preferencialmente, a AB (BRASIL, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial sistêmica. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 128p. ). Assim, é de grande importância entender como as unidades de saúde da rede básica funcionam e conhecer os seus níveis de produção e de eficiência. Para Viacava (2011VIACAVA, F. PROADESS. Laboratório de Informações em Saúde (LIS). Instituto de Comunicação e Informação em Ciência e tecnologia (ICICT). Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Avaliação de Desempenho do Sistema de Saúde Brasileiro: indicadores para monitoramento. Relatório final. Rio de Janeiro, 2011. 258p.), muitos dos recursos disponibilizados não são utilizados apropriadamente por seus gestores, acarretando ineficiências e um impacto negativo no acesso aos cuidados e serviços de saúde, sendo fundamental a melhoria na eficiência desses serviços.
Rocha e Silva (2019ROCHA, T. A. H.; SILVA, N. C. Oferta de cuidado primário para doenças crônicas: uma análise da eficiência técnicas das equipes de saúde brasileiras. APS em Revista, v. 1, n. 1, p. 1-10, 2019. ) citam o relatório do ano de 2005 da Organização Mundial da Saúde, no qual se estima que a perda de renda nacional devido às doenças cardiovasculares e diabetes atingirão, nos próximos dez anos, 49,2 bilhões de dólares no Brasil, tendo em vista que aproximadamente 60% de todas as mortes são devido às condições crônicas, em especial as doenças cardiovasculares, câncer e diabetes. Para os autores, esses dados enfatizam a importância indiscutível que a abordagem do cuidado de doenças crônicas representa para a saúde no país.
Diante de tais considerações, o presente estudo1 1 Trabalho baseado na dissertação de mestrado apresentada ao Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD)/Fiocruz Amazônia, em 2020. Os autores declaram não haver conflitos de interesse. teve como objetivo avaliar a eficiência da AB em relação às ações de controle da HAS dos municípios da Região Norte, buscando responder às questões: a AB desses municípios tem produzido serviços de forma eficiente para o controle da HAS? Existe diferença entre os municípios quanto à eficiência das ações de controle da HAS?
Análise Envoltória de Dados (DEA)
A DEA busca a otimização baseada na programação linear, com o objetivo de medir e comparar a eficiência relativa de unidades produtivas (Decision Making Units - DMUs), por meio da aplicação de recursos/insumos (inputs) e resultados/produtos (outputs). A ferramenta identifica as unidades com melhor desempenho através da “fronteira de eficiência” que é construída pelas DMUs eficientes. Uma unidade com coeficiente de 1 (ou 100%) é classificada como eficiente, logo essa unidade ficará sobre a fronteira. Ainda, uma DMU com coeficiente menor que 1 é classificada como ineficiente e estará abaixo da fronteira (PEÑA, 2008PEÑA, C. R. Um Modelo de Avaliação da Eficiência da Administração Pública através do Método Análise Envoltória de Dados (DEA). Revista de Administração Contemporânea, v. 12, n. 1, p. 83-106, 2008.).
De acordo com Marinho, Cardoso e Almeida (2012MARINHO, A.; CARDOSO, S. S.; ALMEIDA, V. V. Avaliação de eficiência em sistemas de saúde: Brasil, América Latina, Caribe e OCDE. Brasília: Ipea; 2012. 98p.), ao se identificar as unidades eficientes, deve-se levar em consideração a frequência com que essas unidades se tornam referência para outras ineficientes. Lopes, Lorenzett e Pereira (2011LOPES, A. L. M; LORENZETT, J. R; PEREIRA, M. F. Data Envelopment Analysis (DEA) como ferramenta para avaliação do desempenho da gestão estratégica. Revista Universo Contábil, v. 7, n. 3, p. 77-94, 2011. ) denominam essas unidades como “benchmarks”, e seu valor representa o número de municípios que poderiam adotá-lo como referência. De modo geral, um município com maior valor de benchmarks indica que ele pode servir de referência para melhorar as práticas de gestão de muitos municípios ineficientes.
Segundo Peña (2008PEÑA, C. R. Um Modelo de Avaliação da Eficiência da Administração Pública através do Método Análise Envoltória de Dados (DEA). Revista de Administração Contemporânea, v. 12, n. 1, p. 83-106, 2008.), os estudos utilizando o modelo DEA possuem alguns procedimentos em comum. São eles: 1. Seleção das DMUs; 2. Escolha das variáveis input e output; 3. Orientação do modelo a ser usado; e 4. Tipo do modelo DEA. Ao selecionar as DMUs, o conjunto adotado deve ser homogêneo, ou seja, semelhantes em um sistema de produção. As variáveis input/output devem representar o processo de produção que se deseja avaliar. Em relação à orientação do modelo, este pode ser orientado ao insumo (minimizar os insumos mantendo os produtos) ou orientado ao produto (maximizar os produtos mantendo os insumos). Em relação ao tipo de modelo DEA, esta fará as projeções de eficiência, ou seja, o caminho das DMUs ineficientes até a fronteira de eficiência que são: modelo CRS (Constant Returns to Scale) que pressupõe retornos constantes de escala e o modelo VRS (Variable Returns to Scale) que pressupõe retornos variáveis de escala.
Ainda quanto ao número de DMUs que deve conter uma amostra, Dyson et al. (2001DYSON, R. G. et al. Pitfalls and protocols in DEA. European Journal of Operational Research, v. 132, n. 2, p. 245-259, 2001. ) consideram que, na análise de eficiência utilizando DEA, é recomendado que a quantidade de unidades deve ser no mínimo igual ou maior que 2x (nº inputs x nº outputs), alertando que um número muito grande de variáveis em comparação às unidades analisadas conduzirá a resultados distorcidos.
Diversos autores relatam que a DEA apresenta muitas vantagens, dentre as quais se destacam a possibilidade de se trabalhar com múltiplos inputs e outputs, identificação de metas de eficiência para as unidades de desempenho ineficientes e a possibilidade de identificar os benchmarks. No entanto, apresenta limitações por ser sensível à presença de outliers, ou seja, observações atípicas de erro na entrada de dados ou dados discrepantes. Além disso, o cálculo da fronteira de eficiência é dependente da qualidade dos dados obtidos na análise (CESCONETTO; LAPA; CALVO, 2008CESCONETTO, A.; LAPA, J. S; CALVO, M. C. M. Avaliação da eficiência produtiva de hospitais do SUS de Santa Catarina, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 24, n. 10, p. 2407-2417, 2008. ; LOPES; LORENZETT; PEREIRA, 2011LOPES, A. L. M; LORENZETT, J. R; PEREIRA, M. F. Data Envelopment Analysis (DEA) como ferramenta para avaliação do desempenho da gestão estratégica. Revista Universo Contábil, v. 7, n. 3, p. 77-94, 2011. ; VARELA; MARTINS; FÁVERO, 2012VARELA, P. S.; MARTINS, G. A.; FÁVERO, L. P. L. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Revista de Administração, v. 47, n. 4, p. 624-637, 2012. ; MICLOS; CALVO; COLUSSI, 2015MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho da atenção primária em saúde através da Análise Envoltória de Dados. Revista Eletrônica Gestão e Saúde, v. 6, n. 2, p. 1749-63, 2015., 2017MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho das ações e resultados em saúde da atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 51, p. 86, 2017. ).
Métodos
Trata-se de uma pesquisa avaliativa, descritiva, transversal, com abordagem quantitativa que visa avaliar a eficiência da AB nas ações de controle da HAS dos municípios da região Norte, utilizando a ferramenta DEA.
A unidade de análise a ser considerada nesse estudo foi o município, por ser este o responsável pelas demandas na AB. Portanto, a amostra de DMUs foi composta pelos 450 municípios pertencentes aos sete estados da Região Norte: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Roraima, Rondônia e Tocantins. O ano de referência dos dados foi 2013, pois este é o ano em que se observou a maior completude dos dados para esses municípios.
Para o desenvolvimento da metodologia, o estudo apresentou as seguintes etapas:
Etapa 1 - Escolha das variáveis de análise
Passo 1: Para a escolha das variáveis utilizadas como insumo (input) e produto (output) levou-se em consideração, inicialmente, que o setor da saúde para avaliação da eficiência era a AB.
Passo 2: A partir daí, poderia-se utilizar:
-
I)
As encontradas na literatura sobre a AB;
-
II)
As escolhidas por consenso de especialistas; ou
-
III)
Através de técnicas estatísticas multivariadas
Sendo as descritas nos itens I e II acima, as mais comumente utilizadas na área da saúde.
Na presente pesquisa, a escolha das variáveis considerou o levantamento bibliográfico feito por estudos que avaliaram a eficiência de sistemas de saúde, bem como sua disponibilidade nos bancos de dados. O quadro 1 apresenta as variáveis e a fonte dos dados.
Etapa 2 - Critérios de inclusão e exclusão
Inclusão: Municípios com 100% de cobertura estimada da AB. Nesta etapa, a amostra ficou constituída por 228 municípios.
Exclusão: i) municípios sem as informações nos bancos de dados secundários (51 municípios); e ii) municípios com dados discrepantes: valores de input e output acima do percentil de 95% e abaixo de 5% (12 municípios). Restaram nesta segunda etapa 165 municípios.
Etapa 3 - Homogeneização da amostra
Homogeneização proposta por Miclos, Calvo e Colussi (2017MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho das ações e resultados em saúde da atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 51, p. 86, 2017. ), que estratificaram os municípios segundo seu porte populacional. Desta forma, os 165 municípios foram agrupados nos seguintes portes populacionais:
-
Porte 1 (até 5.000 habitantes) - 43 municípios;
-
Porte 2 (de 5.001 a 10.000) - 50;
-
Porte 3 (de 10.001 a 20.000) - 49;
-
Porte 4 (de 20.001 a 50.000) - 17;
-
Porte 5 (de 50.001 a 100.000) - 5 municípios; e,
-
Porte 6 (mais de 100.000) - apenas 1 município.
Etapa 4 - Adequação do número de DMU’s para a DEA
Número de DMU’S > (2 * nº inputs * nº outputs) = 18
Considerando que os portes 4, 5 e 6 ficaram com amostras menores que 18 DMUs, conforme o preconizado por Dyson et al. (2001DYSON, R. G. et al. Pitfalls and protocols in DEA. European Journal of Operational Research, v. 132, n. 2, p. 245-259, 2001. ), estes portes foram descartados, restando para análise os municípios dos portes 1, 2 e 3.
Etapa 5 - Verificação se, de fato, os dados precisam ser estratificados
Fez-se a comparação de medianas dentro de cada estrato, com nível de significância de 10%, utilizando as variáveis ambiental, social e econômica dos municípios como: % de residências com abastecimento de água, esgoto sanitário, coleta de lixo e energia elétrica, e ainda o IDHM e o PIB do município, caracterizadas como variáveis exógenas.
Os resultados indicaram que uma estratificação mais apropriada para o conjunto de dados foi a manutenção do porte 3 (49 municípios) e o agrupamento dos munícipios do porte 1 e 2 (93 municípios), conforme a tabela 1.
Etapa 6 - Preparação do banco para calcular DEA
Todos os dados foram organizados em um banco de dados na planilha eletrônica do Microsoft Excel 2013. As DMUs foram codificadas por siglas de acordo com o estado de federação e enumeradas em ordem crescente para preservação da identidade dos municípios.
Etapa 7 - Realização da análise da eficiência
Foi utilizado o programa R com os pacotes FEAR (Frontier Efficiency Analysis with R) e Benchmarking, no modelo VRS (Variable Return Scale), com orientação para o produto, pois este visa a otimização da produção de serviços a partir dos recursos disponíveis.
Para analisar os dados sob o critério da eficiência, a escolha baseou-se em Miclos, Calvo e Colussi (2015MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho da atenção primária em saúde através da Análise Envoltória de Dados. Revista Eletrônica Gestão e Saúde, v. 6, n. 2, p. 1749-63, 2015.), que consideraram o modelo DEA-BCC com orientação para produto, levando em conta a hipótese de que os recursos para a AB são escassos e que o gestor municipal deve fazer escolhas considerando que, com os recursos disponíveis, deve ofertar o máximo de ações de saúde à população. Importante observar que a DEA utiliza técnica de programação linear para cálculo da eficiência de um conjunto de unidades produtivas que possuem função comum e operem de forma similar, mas cuja eficiência varia em função de aspectos internos. E ainda que, neste modelo, a eficiência não está nos resultados alcançados, mas na relação entre resultados e recursos utilizados.
Etapa 8 - Ajuste de Regressão Tobit
Usando a pontuação de ineficiência estimada para cada município, um Modelo de Regressão Tobit foi utilizado para verificar o efeito dos fatores exógenos na eficiência. Esses fatores foram: percentual da população adulta (de 20 anos ou mais), percentual da população sem instrução e até o 1º ciclo incompleto; percentual da população com renda menor que meio salário-mínimo, percentual de população residente na área urbana e densidade demográfica dos municípios que fizeram parte do estudo.
A escolha do modelo de regressão Tobit justifica-se pelo fato de a variável dependente ser, do ponto de vista da estatística, uma variável censurada. Ou seja, há alguma limitação imposta a sua mensuração, impedindo que se observem valores inferiores (censura à esquerda) ou superiores (censura à direita) da variável dependente. Resumidamente, este modelo de regressão trata as observações com valores censurados diferente das demais (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, M. M. Modelos de Regressão com Variável Dependente Truncada ou Censurada, 2004. Disponível em: <Disponível em: https://www.fep.up.pt/disciplinas/2E103/ec_cens.pdf >. Acesso em: 29 jan. 2020.
https://www.fep.up.pt/disciplinas/2E103/...
).
Resultados
O estudo analisou 142 municípios agrupados em dois portes populacionais e através da DEA, estimou-se uma fronteira de eficiência técnica para cada um. Os municípios situados na fronteira foram considerados eficientes (escore=1) e aqueles abaixo da fronteira, ineficientes (escore < 1). A tabela 2 ilustra o percentual de municípios eficientes e ineficientes, por porte populacional. Verificou-se nesta análise que, nos dois portes, o percentual de municípios eficientes não chega a 40%, sendo que o percentual de municípios eficientes é maior no grupo com municípios com número de habitantes entre 10.001 e 20.000. Ainda, no porte 2 a média de eficiência foi maior.
Uma das características da DEA é que ela permite que cada município ineficiente, identifique um ou vários municípios eficientes que podem ser referência para se tornar eficiente, ou seja, suas características de organização de recursos e produtos podem ser consideradas comuns e de possível realização para muitos de seus pares (RABETTI; FREITAS, 2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ).
No porte 1, o município TO-18 obteve maior valor de benchmarks, indicando que 45 municípios ineficientes poderiam tomá-lo como referência em suas ações de saúde. Esses 45 ineficientes, em média, tinham inputs maiores que o TO-18 e quanto ao que produziam, em média, eles deixaram de cadastrar 1.263 pacientes com HAS, de fazer 2.637 consultas e 3.650 visitas domiciliares. No porte 2, os resultados evidenciaram que o município TO-83 obteve maior valor de benchmarks, indicando que 17 municípios ineficientes, em média, recebiam mais recursos que TO-83, mas, em média, eles deixaram de cadastrar 1.030 pacientes com HAS e de fazer 896 consultas. Quanto às visitas domiciliares, em média, eles fizeram 6.158, além do esperado. A tabela 3 demonstra as medidas descritivas dos municípios eficientes.
Medidas descritivas para inputs e outputs e valor de Benchmarks de municípios eficientes segundo o porte populacional
Dentre as ações de saúde produzidas pelos municípios ineficientes, a média de déficit foi maior nas ações de consultas para hipertensos tanto no porte 1 (48,6%) quanto no porte 2 (46,6%). Somente nas visitas domiciliares os do porte 1 tiveram déficit menor (34,3%) que os do porte 2 (44,2%). Mas no porte 2, em média, a eficiência foi maior (0,7030) que o porte 1 (0,6904), em ambos os portes, é possível identificar pelo menos um município com eficiência muito próxima de 1,0 indicando que pequenos ajustes poderiam resultar em município eficiente (tabela 4).
Medidas descritivas para outputs e respectivos déficits para municípios ineficientes segundo o porte populacional
Uma vez conhecido o grau de (in)eficiência, torna-se necessário investigar por que isso acontece e identificar se essas pontuações se devem exclusivamente às práticas de gestão dos municípios ou a alguns fatores externos.
Assim, para cada porte populacional estudado, foi ajustado ao modelo de regressão Tobit e apenas para o porte populacional de até 10 mil habitantes foram encontradas significâncias estatísticas no ajuste. Esses resultados do ajuste indicaram que apenas as variáveis “percentual de pessoas adultas (20 anos ou mais) na população” e “percentual de residentes na área urbana” foram significativas, conforme mostra a tabela 5.
Discussão
O estudo foi desenvolvido seguindo o modelo de Rabetti e Freitas (2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ). Os autores avaliaram as ações de saúde voltadas para HAS de municípios catarinenses com população de até 10 mil habitantes. Encontraram 37,8% de municípios eficientes, valor maior que os do presente estudo nos dois portes (22,5% e 34,7%).
No presente estudo, ficou evidenciado que os municípios de maior porte são, em média, mais eficientes (0,8061) que os de menor (0,7636). Araújo e Pontes (2017ARAÚJO, E. C.; PONTES, E. Análise da Eficiência do Gasto Público com Saúde. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2017/maio/26/1.a-Banco-Mundial-Eficiencia-do-Gasto-. com-Saude-CIT.pdf >. Acesso em: 22 jan. 2020.
http://portalarquivos2.saude.gov.br/imag...
), no Estudo do Banco Mundial sobre Eficiência do Gasto com Saúde de 2013, mostraram que, na atenção primária, a eficiência média do SUS é estimada em 0,6300, com grande variação entre os municípios, dependendo da localização geográfica e tamanho dos municípios (população). Os autores afirmam ainda que, na atenção primária, a eficiência está diretamente associada ao tamanho do município (escala) e inversamente ao gasto per capita.
Miclos, Calvo e Colussi (2017MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho das ações e resultados em saúde da atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 51, p. 86, 2017. ) avaliaram a eficiência da AB no Brasil e o alto percentual de ineficiência dos municípios de pequeno porte se destacou dentre os demais portes populacionais. Varela, Martins e Fávero (2012VARELA, P. S.; MARTINS, G. A.; FÁVERO, L. P. L. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Revista de Administração, v. 47, n. 4, p. 624-637, 2012. ) mensuraram as variações na eficiência relativa da aplicação de recursos na AB em municípios do estado de São Paulo e concluíram que o grupo dos mais ineficientes era formado, predominantemente, por municípios de menor porte. Em ambos os estudos, identificou-se que a eficiência média era proporcional ao aumento dos portes populacionais. Resultados semelhantes foram encontrados neste estudo.
Estudo realizado no Brasil concluiu que 75% dos municípios considerados de pequeno porte e que tiveram desempenho de gestão em saúde desfavorável localizavam-se nas regiões Norte e Nordeste (CALVO et al., 2016CALVO, M. C. M. et al. Estratificação de municípios brasileiros para avaliação de desempenho em saúde. Epidemiologia e Serviços de Saúde, v. 25, n. 4, p. 767-776, 2016. ). Em outro estudo realizado por Garnelo et al. (2018GARNELO, L. et al. Access and coverage of Primary Health Care for rural and urban populations in the northern region of Brazil. Saúde Debate, v. 42, n. 1, p. 81-99, 2018. ), observou-se que 33,3% dos municípios da Região Norte possuíam maior concentração de população rural em comparação à urbana. Os achados demonstram que a Região Norte possui uma realidade distinta em relação a outras regiões do país, uma vez que há maior concentração de municípios em áreas rurais e comunidades ribeirinhas (MAIA; QUADROS, 2009MAIA, A. G; QUADROS, W. J. Tipologia municipal de classes socio ocupacionais: uma nova dimensão para análise das desigualdades territoriais no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 47, n. 2, p. 389-418, 2009. ).
Neste estudo, uma possível explicação para a maior ineficiência dos municípios de pequeno porte pode ser o fato de não terem acesso rápido ou integral aos atendimentos de saúde necessários para a população (MEDICI, 2011MEDICI, A. Propostas para melhorar a cobertura, a eficiência e a qualidade no setor saúde. In: BACHA, E. L.; SCHWARTZMAN, S. (Org.). Brasil: a nova agenda social. Rio de Janeiro: LTC, p. 23-93, 2011.), uma vez que a distância até o centro de saúde é um fator importante que pode influenciar a eficiência de uma instituição de saúde e podem dificultar o acesso aos serviços de saúde e o desempenho desses municípios (MARSCHALL; FLESSA, 2011MARSCHALL, P.; FLESSA, S. Efficiency of primary care in rural Burkina Faso: A two-stage DEA analysis. Health Economics Review, v. 1, n. 5, 2011. ; FERREIRA; MARQUES; NICOLA, 2013FERREIRA, C.; MARQUES, R. C.; NICOLA, P. On evaluating health centers groups in Lisbon and Tagus Valley: efficiency, equity and quality. BMC Health Services Research, v. 13, n. 2, p. 529, 2013. ).
Segundo Kontodimopoulos et al. (2007KONTODIMOPOULOS, N. et al. The effect of environmental factors on technical and scale efficiency of primary health care providers in Greece. Cost Effectiveness and Resource Allocation, v. 5, n. 1, p. 14, 2007. ), a localização dos centros de atenção primária (urbano ou rural) e o seu tamanho (pequeno, médio ou grande porte) foram os preditores significativos de eficiência técnica. Esta ótica encontra afinidade com os achados de Ramírez-Valdivia et al. (2015)RAMÍREZ-VALDIVIA, M. T. et al. Measuring the Efficiency of Chilean Primary Healthcare Centres. International Journal of Engineering Business Management, v. 7, p. 15, 2015. , que analisaram 259 municípios chilenos e observaram que os municípios urbanos são, em média, mais eficientes (68,4%) do que os rurais (54,5%). Oikonomou et al. (2016OIKONOMOU, N. A. et al. Measuring the efficiency of the Greek rural primary health care using a restricted DEA model; the case of southern and western Greece. Health Care Management Science, v. 19, n. 4, p. 313-325, 2016.) avaliaram 42 centros de saúde da Grécia e verificaram que as unidades mais ineficientes estavam localizadas em áreas com menor porte populacional e que se situavam em áreas mais distantes. De um modo geral, os estudos explicam que a menor eficiência em municípios de pequeno porte decorre da dificuldade do acesso aos serviços de saúde, considerando que esses municípios têm características distintas daqueles com maior porte e normalmente se situam em áreas rurais, com baixa densidade demográfica (KONTODIMOPOULOS et al., 2007KONTODIMOPOULOS, N. et al. The effect of environmental factors on technical and scale efficiency of primary health care providers in Greece. Cost Effectiveness and Resource Allocation, v. 5, n. 1, p. 14, 2007. ; KLUTHCOVSKY; KLUTHCOVSKY, 2007KLUTHCOVSKY, F. A.; KLUTHCOVSKY, A. C. G. C. Análise da avaliação do PSF em municípios de pequeno porte. Revista Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, v. 3, n. 10, p. 116-124, 2007. ; CASTANHEIRA et al., 2014CASTANHEIRA, E. R. L. et al. Avaliação de serviços de Atenção Básica em municípios de pequeno e médio porte no estado de São Paulo: resultados da primeira aplicação do instrumento QualiAB. Saúde Debate, v. 38, n. 103, p. 679-691, 2014.; CALVO et al., 2016CALVO, M. C. M. et al. Estratificação de municípios brasileiros para avaliação de desempenho em saúde. Epidemiologia e Serviços de Saúde, v. 25, n. 4, p. 767-776, 2016. ).
Um único trabalho encontrado na literatura propôs analisar a eficiência da AB nas ações de controle da HAS. Rabetti e Freitas (2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ) avaliaram a eficiência de municípios catarinenses de até 10 mil habitantes e encontraram altos percentuais de municípios ineficientes na produção de serviços (62,2%). O maior déficit foi no serviço de vinculação de usuários medida pelo cadastro de hipertensos no Sishiperdia (47,3%). No presente estudo, observou-se maior ineficiência nas ações de consultas individuais para hipertensos, com média de déficit de 48,9% no porte 1 e 46,6% no porte 2.
As ações de saúde aqui estudadas são fundamentais para atenção ao hipertenso na rede básica de saúde, e quando são realizadas de forma satisfatória, evitam maiores custos ao sistema e reduzem internações por complicações da HAS. Devem ser, portanto, prioritárias na assistência a esses usuários na AB (BRASIL, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial sistêmica. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. 128p. ). Os achados encontrados no estudo demonstram que os municípios poderiam aumentar a oferta de ações de saúde em mais de 40% em média para que se tornassem eficientes. Resultado similar ao observado por Rabetti e Freitas (2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ), cujo valor foi 42,4%.
Peña (2008PEÑA, C. R. Um Modelo de Avaliação da Eficiência da Administração Pública através do Método Análise Envoltória de Dados (DEA). Revista de Administração Contemporânea, v. 12, n. 1, p. 83-106, 2008.) considera a eficiência como a capacidade de conseguir obter máximos outputs possível a partir de um mesmo conjunto de inputs, e que há ineficiência quando a quantidade produzida por uma unidade se encontra abaixo do máximo possível que pode ser atingido com a combinação que possui. Por sua vez, para Ramírez-Valdivia, Maturana e Garrido (2011)RAMÍREZ-VALDIVIA, M. T.; MATURANA, S.; SALVO-GARRIDO, S. A Multiple Stage Approach for Performance Improvement of Primary Healthcare Practice. Journal of Medical Systems, v. 35, n. 5 p. 1015-1028, 2011. , o modelo DEA fornece apenas as estimativas dos índices de eficiência, que por si só não são suficientes para explicar o que determina esta ineficiência. Se o interesse é determinar as fontes de sua ineficiência, precisamos identificar os fatores específicos que a afetam. Eles afirmam que se as fontes de ineficiência forem reduzidas, melhores resultados dos serviços fornecidos devem ser esperados. Portanto, identificar fatores que influenciam o desempenho relativo dos municípios poderia ajudar a desenvolver um plano e uma estratégia para melhor provisão de serviços.
Nesse sentido, alguns estudos buscam realizar uma abordagem de análise em múltiplos estágios que permite identificar os fatores externos que podem influenciar nos índices de eficiência. Marschall e Flessa (2011MARSCHALL, P.; FLESSA, S. Efficiency of primary care in rural Burkina Faso: A two-stage DEA analysis. Health Economics Review, v. 1, n. 5, 2011. ) mostraram que a distância até o centro de saúde é um fator importante que influencia a eficiência de uma instituição de saúde. Outros fatores como maior proporção de habitantes com mais de 65 anos de idade em um município torna o sistema de saúde mais ineficiente (RAMÍREZ-VALDIVIA; MATURANA; GARRIDO, 2011RAMÍREZ-VALDIVIA, M. T.; MATURANA, S.; SALVO-GARRIDO, S. A Multiple Stage Approach for Performance Improvement of Primary Healthcare Practice. Journal of Medical Systems, v. 35, n. 5 p. 1015-1028, 2011. ; VARELA; MARTINS; FÁVERO, 2012VARELA, P. S.; MARTINS, G. A.; FÁVERO, L. P. L. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Revista de Administração, v. 47, n. 4, p. 624-637, 2012. ; FERRERA; CEBADA; ZAMORANO, 2014FERRERA, J. M. C.; CEBADA, E. C.; ZAMORANO, L. R. M. The effect of quality and socio-demographic variables on efficiency measures in primary health care. European Journal of Health Economics, v. 15, n. 3, p. 289‐302, 2014. ) e o aumento da escolaridade e do PIB per capita reduz a ineficiência, assim como maiores densidade populacional, grau de urbanização e escala dos estabelecimentos de saúde favorecem o gasto público com mais eficiência (AFONSO; AUBYN, 2011; VARELA; MARTINS; FÁVERO, 2012VARELA, P. S.; MARTINS, G. A.; FÁVERO, L. P. L. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Revista de Administração, v. 47, n. 4, p. 624-637, 2012. ; FERRERA; CEBADA; ZAMORANO, 2014FERRERA, J. M. C.; CEBADA, E. C.; ZAMORANO, L. R. M. The effect of quality and socio-demographic variables on efficiency measures in primary health care. European Journal of Health Economics, v. 15, n. 3, p. 289‐302, 2014. ).
No presente estudo, os resultados do ajuste de Regressão Tobit indicaram que dentre as variáveis estudadas, apenas as variáveis percentuais de pessoas adultas (20 anos ou mais) na população e de residentes na área urbana foram significativas e impactaram nos escores de eficiência dos municípios de até 10 mil habitantes. Já as variáveis de percentual da população sem instrução e até o 1º ciclo incompleto; percentual da população com renda menor que meio salário-mínimo e densidade demográfica não apresentaram resultados significativos na regressão em nenhum dos portes populacionais. De um modo geral, os autores concluem que algumas características externas de um município quando apresentadas, individual ou conjuntamente, podem colocá-lo em condição desfavorável em relação aos demais e que, apesar de não estarem sob o controle dos gestores, não se pode ignorá-las do contexto, sendo importante incluir essas características nas análises de eficiência (FERRERA; CEBADA; ZAMORANO, 2014FERRERA, J. M. C.; CEBADA, E. C.; ZAMORANO, L. R. M. The effect of quality and socio-demographic variables on efficiency measures in primary health care. European Journal of Health Economics, v. 15, n. 3, p. 289‐302, 2014. ).
Um ponto a se ressaltar neste estudo é o fato de que os resultados encontrados se limitam à análise de eficiência para produção de serviços no controle da HAS, considerando os inputs e outputs escolhidos, e não se relacionam aos desfechos em saúde na população. Os estudos que avaliaram a eficiência da AB na produção de serviços e de resultados na saúde da população demonstraram ineficiências maiores na produção de resultados do que na produção de serviços, indicando que ser eficiente na execução de ações/serviços não garante a eficiência para alcance de resultados na saúde da população, como as internações por condições sensíveis à AB (RABETTI; FREITAS, 2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ; MICLOS; CALVO; COLUSSI, 2017MICLOS, P. V.; CALVO, M. C. M.; COLUSSI, C. F. Avaliação do desempenho das ações e resultados em saúde da atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 51, p. 86, 2017. ).
Nesse sentido, Allin et al. (2015ALLIN, S. et al. How Can Health System Efficiency Be Improved in Canada? Health Policy, v.11, n.1, p. 33‐45, 2015.) propõem que uma das medidas que podem ser eficazes na melhoria da eficiência do sistema de saúde são os esforços nos investimentos na atenção primária e no acesso aos serviços de saúde para indivíduos de baixa renda. Contudo, Mazon, Mascarenhas e Dalabrida (2015MAZON, L. M.; MASCARENHAS, L. P.G.; DALLABRIDA, V. R. Eficiência dos gastos públicos em saúde: desafio para municípios de Santa Catarina, Brasil. Saúde e Sociedade, v. 24, n. 1, p. 23-33, 2015.) apontam que o aumento do gasto em saúde não significa, necessariamente, o alcance de maior eficiência na gestão dos seus recursos para melhorar os níveis de saúde da população. Os autores observaram que municípios de Santa Catarina que tiveram maior alocação de recursos e investiram percentuais de sua receita em saúde superiores às médias do estado, não apresentaram melhor desempenho em relação aos indicadores de mortalidade geral.
Esses resultados demonstram que a análise da eficiência como ferramenta de controle pode ser uma das ações iniciais de gestão, ao possibilitar a compreensão do cenário da saúde pública na região. No entanto, deve estar atrelado à capacidade de tomada de decisão pelos gestores para desencadear as alterações necessárias e, com isso, garantir que as instituições de saúde utilizem seus recursos eficientemente para atingir seus objetivos (SANTOS; FRANCISCO; GONCALVES, 2016SANTOS, L. M. D.; FRANCISCO, J. R. S.; GONÇALVES, M. A. Controle na alocação de recursos na saúde pública: uma análise nas microrregiões do sudeste brasileiro. Administração Pública e Gestão Social, v. 8, n. 2, p. 119-130, 2016.).
Limitações do estudo
Neste estudo, não foi possível avaliar a eficiência de 51 (22,3%) municípios, devido à falta de registro nos bancos secundários, limitando-se ao ano de 2013, pois foi o ano mais recente com a maior disponibilidade de dados. Aliado a isso, a transição dos Sistemas de Informações em Saúde (SIS), com a mudança do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) para o E-SUS, o que dificultou na busca dos dados e uso de dados mais recentes.
Estudos que utilizam dados secundários dos SIS nacionais apresentam algumas limitações como a baixa qualidade dos dados e subnotificação (RABETTI; FREITAS, 2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ). Rabetti e Freitas (2011RABETTI, A. C.; FREITA, S. F. T. Avaliação das ações em hipertensão arterial sistêmica na atenção básica. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p. 258-68, 2011. ) também encontraram restrições na obtenção dos dados referentes às ações de HAS dos municípios catarinenses nos bancos de dados do SIAB e SisHiperdia, ao serem excluídos 35,9% da amostra por falta de registro.
Em outro estudo que avaliou os municípios paulistas, no qual foram analisadas variáveis como procedimentos gerais de médicos e enfermeiros e usuários cadastrados, verificou-se a exclusão de apenas 6,51% da amostra, por falta de dados e informações inconsistentes nos dados de produção ambulatorial (VARELA; MARTINS; FÁVERO, 2012VARELA, P. S.; MARTINS, G. A.; FÁVERO, L. P. L. Desempenho dos municípios paulistas: uma avaliação de eficiência da atenção básica à saúde. Revista de Administração, v. 47, n. 4, p. 624-637, 2012. ). Tal situação demonstra que a alimentação de dados sobre informações de saúde relacionados à HAS nos sistemas de informação apresenta maiores deficiências, não só na Região Sul como na Norte.
O cálculo da fronteira de eficiência pela ferramenta DEA depende da qualidade dos dados obtidos e, diante disso, deve-se ter certa cautela na obtenção dos dados. Tanaka e Tamaki (2012TANAKA, O. Y.; TAMAKI, E. M. O papel da avaliação para a tomada de decisão na gestão de serviços de saúde. Ciências e Saúde Coletiva, v. 17, n. 4, p. 821-828, 2012. ) recomendam o uso de dados secundários em estudos avaliativos pela disponibilidade de informações, baixo custo e pela obtenção de dados e resultados em tempo hábil para as pesquisas. Nesse sentido, é de suma importância a melhoria na notificação e qualidade dos registros para aprimoramento dos estudos e utilização de informação com qualidade.
A falta de dados nas bases consultadas também se configura como uma limitação desse estudo. Por conseguinte, suas conclusões não podem ser utilizadas de maneira generalizada. Também a utilização dos recursos da AB, como proxy dos recursos destinados exclusivamente para HAS, pode ser caracterizada como uma limitação. Por consequência, as conclusões não podem ser estendidas aos municípios que não fizeram parte do estudo. Se essas questões puderem ser resolvidas, uma caracterização mais parcimoniosa da AB na Região Norte poderá ser obtida para representar suas atividades produtivas.
Conclusão
Os resultados indicaram altos percentuais de municípios ineficientes e, em média, poderiam aumentar a oferta de suas ações em mais de 40% utilizando os mesmos recursos. Com os inputs e outputs adotados no estudo, os gestores poderiam otimizar os recursos públicos disponíveis para melhorar a oferta de suas ações de saúde, abrangendo, assim, maior número de usuários hipertensos. O aumento da eficiência está condicionado ao aumento de pacientes cadastrados e de consultas individuais e readequação do número de visitas domiciliares, e que isto resulte, de fato, em bons desfechos em saúde para o controle da HAS na população.
A utilização da análise da eficiência pode servir como ferramenta para tomada de decisão do gestor que tem como prática acompanhar o desempenho das ações de saúde desenvolvidas no município. Para além de ajudar a gestão da oferta de ações de saúde necessárias para o controle e redução de pacientes com HAS, esta análise ajuda a identificar as fortalezas e fragilidades do serviço. Entretanto, o alcance dos objetivos propostos pela gestão no controle da HAS deve estar atrelado à sua capacidade de tomada de decisão para desencadear as alterações necessárias.
A carência de estudos que avaliem a eficiência da AB em relação à atenção à HAS e a ausência de estudos de eficiência que englobem os estados da Região Norte nos mostram a existência de lacunas na literatura. Portanto, se faz necessário mais estudos nessa temática para entender melhor como a AB opera nessa região e que contribuam na produção de novos conhecimentos, possibilitando melhorias que impactem na saúde dessa população.2 2 G. Arie: planejamento da pesquisa, coleta e análise de dados, redação do artigo. R. C. P. Parente: orientação do estudo e da coleta de dados, análise estatística dos dados, colaboração na redação do artigo.
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1
Trabalho baseado na dissertação de mestrado apresentada ao Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD)/Fiocruz Amazônia, em 2020. Os autores declaram não haver conflitos de interesse.
-
2
G. Arie: planejamento da pesquisa, coleta e análise de dados, redação do artigo. R. C. P. Parente: orientação do estudo e da coleta de dados, análise estatística dos dados, colaboração na redação do artigo.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Jul 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
-
Recebido
15 Jul 2020 -
Revisado
10 Abr 2021 -
Aceito
09 Jul 2021