RESUMO
Objetivo: compreender os significados que permeiam as conexões entre a produção/resultados de pesquisa e o processo de trabalho da enfermagem no âmbito assistencial.
Método: pesquisa do tipo explicativa, de abordagem qualitativa, que teve como referenciais teórico e metodológico, respectivamente, a Teoria da Complexidade e a Teoria Fundamentada nos Dados. Os dados foram coletados com 25 sujeitos, distribuídos em três grupos amostrais: dez enfermeiros assistenciais, vinculados a um hospital universitário; seis enfermeiros pesquisadores e nove estudantes de graduação em enfermagem. A entrevista semiestruturada foi utilizada como técnica de coleta de dados. A pesquisa foi validada por dez juízes de diferentes regiões do Brasil.
Resultados: apresenta-se a categoria: Enfrentando desafios emergentes da enfermagem na era da ciência, inovação e tecnologia, alicerçada pelas subcategorias: Pontos de partida para uma enfermagem contextualizada: da produção científica ao consumo de resultados de pesquisa; e Conexões fragilizadas entre produção científica e prática assistencial da enfermagem.
Conclusão: os sistemas de significados que influenciam as conexões entre pesquisa científica e prática assistencial da enfermagem são estruturados e fortalecidos por fenômenos plurais, dentre os quais estão as inflexões negativas do processo de comunicação, presença e pertencimento dos pares, entre quem produz pesquisa e quem poderá consumi-la.
DESCRITORES: Enfermagem; Ciência; Gestão do conhecimento; Tecnologia; Inovação
RESUMEN
Objetivo: comprender los significados que permean las conexiones entre la producción/resultados de investigación y el proceso de trabajo de la enfermería en el ámbito asistencial.
Método: investigación del tipo explicativa, de abordaje cualitativo que tuvo como referenciales teórico y metodológico, respectivamente, la Teoría de la Complejidad y la Teoría Fundamentada en los Datos. Los datos fueron recolectados con 25 sujetos, distribuidos en tres grupos muestrales: diez enfermeros asistenciales, vinculados a un hospital universitario; seis enfermeros investigadores y nueve estudiantes de grado en enfermería. La entrevista semiestructurada fue utilizada como técnica de recolección de datos. La investigación fue validada por diez jueces de diferentes regiones de Brasil. La investigación fue validada por diez jueces de diferentes regiones de Brasil.
Resultados: se presenta la categoría: Enfrentando desafíos emergentes de la enfermería en la era de la Ciencia, la Innovación y la Tecnología, basada en las subcategorías: Puntos de partida para una enfermería contextualizada: de la producción científica al consumo de resultados de investigación; Conexiones fragilizadas entre producción científica y práctica asistencial de la enfermería.
Conclusión: los sistemas de significados que influencian las conexiones entre investigación científica y práctica asistencial de la enfermería son estructurados y fortalecidos por fenómenos plurales, entre los cuales están las inflexiones negativas del proceso de comunicación, presencia y pertenencia de los pares, entre quien produce investigación y quién puede consumirla.
DESCRIPTORES: Enfermería; Ciencia; Gestión del conocimiento; Tecnología; Innovación
ABSTRACT
Objective: to understand the meanings that permeate the connections between the production / research results and the nursing work process in the care context.
Method: explanatory style research using a qualitative approach, with theoretical and methodological references: Theory of Complexity and grounded theory, respectively. The data were collected from 25 subjects, distributed in three sample groups: ten clinical nurses linked to a university hospital; six nurse researchers and nine undergraduate nursing students. The semi-structured interview was used as a data collection technique. The research was validated by ten reviewers from different regions of Brazil.
Results: The following category is presented: Facing Emerging Nursing Challenges in the Age of Science, Innovation and Technology, based on the subcategories: Starting points for contextualized nursing: from scientific production to the utilization of research results; And Fragile connections between scientific production and nursing care practice.
Conclusion: the systems of meanings that influence the connections between scientific research and nursing care practice are structured and strengthened by plural phenomena, among which are the negative inflections of the communication process, presence and recognition between who produces research and who can use it.
DESCRIPTORS: Nursing; Science; Knowledge management; Technology; Innovation
INTRODUÇÃO
Os progressos científicos e sociais da enfermagem permitiram, ao longo dos anos, sua conformação como profissão, disciplina acadêmica e ciência em construção, que tem avançado no campo epistemológico ao demandar esforços para alcançar um escopo de conhecimentos identificável, buscando o que lhe é peculiar, com vistas a subsidiar suas práticas para a promoção, a manutenção e o restabelecimento da saúde do indivíduo e da coletividade.1
Dentre os desafios a serem superados pela enfermagem está a necessidade de domínio de competências para desempenhar, com êxito, o seu trabalho na era da ciência, inovação e tecnologia, que, em conjunto, sustentam a economia do conhecimento para o progresso das sociedades. Nessa conjuntura, sendo a enfermagem uma prática social,2-4 faz-se pertinente identificar pontos de partida para a sua consolidação diante das demandas sociais emergentes, sobretudo no que diz respeito à construção e utilização do conhecimento. A esse respeito, destaca-se a crescente expansão de produções científicas da enfermagem brasileira nos últimos anos.5
Esse fenômeno pode ser explicitado a partir da comparação da produção do triênio 2004-2006, em que foram publicados 3.563 artigos, em 373 periódicos; enquanto que, no triênio 2007-2009, obteve-se o total de 5.194 artigos, publicados em 595 periódicos, ou seja, um avanço de, aproximadamente, 30% de publicações no intervalo de três anos.6 No triênio 2010-2012, a quantidade de produção científica da área foi ainda mais expressiva. Nesse período, foram registrados 9.206 artigos, correspondentes a 77,2% de acréscimo.5
Todavia, é necessário considerar a importância de que o avanço científico alcance possibilidades que perpassem o campo do progresso quantitativo dessas produções, de modo a considerar os reais impactos que a ciência produzida exerce sobre a assistência, pois, a partir dos resultados desses impactos, poder-se-á alcançar reconhecimento acadêmico e visibilidade social desejável ao ajustamento de uma ciência com consciência,7 bem como capacidade para retroalimentar possibilidades emergentes de pesquisa e mecanismos de intervenção.8
Nessas circunstâncias, sustenta-se o pressuposto de que a gestão do conhecimento em enfermagem deve contemplar possibilidades de avaliar a convergência entre resultados de pesquisa e realidade contextual, justificando, assim, a importância do consumo de pesquisa por enfermeiros assistenciais. Entretanto, apesar de os enfermeiros pesquisadores demandarem esforços em realizar estudos que provoquem mudanças nas práticas de cuidado, urge a necessidade de melhores integrações entre a produção científica da enfermagem e o seu processo de trabalho na assistência.9
É preciso, portanto, reconhecer a prática de pesquisa como alicerce para o cuidado de enfermagem, o que sugere intenso envolvimento de enfermeiros assistenciais com as práticas e resultados de pesquisa que se destinam ao campo de seu trabalho, ao passo que poderão colaborar para o desenvolvimento e aperfeiçoamento das bases científicas fundamentais ao exercício e desenvolvimento da enfermagem.8,10 Desse modo, não há como dissociar movimentos de construção científica das práticas assistenciais.8 Deve-se, porém, buscar estratégias que fortaleçam as conexões entre essas dimensões, nos diferentes contextos e de forma transversal, ou seja, desde o processo de formação do enfermeiro às ações de saúde e práticas de cuidado.
Diante do exposto, questiona-se: quais fenômenos ou sistemas de significados influenciam as conexões entre a produção científica da enfermagem e a prática assistencial do enfermeiro? Para responder essa questão, estabeleceu-se como objetivo: compreender os significados que permeiam as conexões entre a produção/resultados de pesquisa e o processo de trabalho da enfermagem no âmbito assistencial.
MÉTODO
Estudo do tipo explicativo, de abordagem qualitativa, tendo como referencial teórico a Teoria da Complexidade,7 e como referencial metodológico, a Teoria Fundamentada nos Dados (TFD), que é um método desenvolvido a partir de um conjunto de recursos analíticos que, sistematicamente conduzidos, poderão gerar uma matriz teórica explicativa do fenômeno investigado.11
Os participantes da pesquisa constituíram três grupos amostrais, sendo: enfermeiros assistenciais, enfermeiros pesquisadores e estudantes de graduação em enfermagem. Contudo, cabe pontuar que, inicialmente, foram delimitados apenas os dois primeiros grupos amostrais, pois uma das características da TFD é a possibilidade de a condução analítica dos dados direcionar para um novo grupo amostral. Isso se deve ao fato de que os dados são coletados e analisados paralelamente. A utilização de memorandos favorece a formulação de hipóteses ao longo da pesquisa, tendo em vista alcançar profundidade nos fenômenos que emergem dos dados.11
Nesse sentido, durante a pesquisa, surgiu a seguinte hipótese: a formação profissional do enfermeiro se configura como valoroso mecanismo interveniente ao consumo de pesquisa desse profissional. Desse modo, a hipótese em questão direcionou a conformação do grupo amostral formado por estudantes de graduação em enfermagem, tendo como indicativo basilar que esse poderia ser o contexto inicial para as conexões entre a pesquisa científica e a prática assistencial do enfermeiro, de modo a poder revelar fatores intervenientes para essas conexões a partir do aprender pela pesquisa no decurso da graduação de enfermagem.
Sobre os cenários e, por conseguinte, participantes da pesquisa, cumpre destacar que a gestão do conhecimento se configura como fenômeno complexo e, portanto, enraizado em múltiplas facetas, incluindo contextos e especificidades de áreas de conhecimento. No campo da enfermagem, como ciência e prática social, faz-se necessário considerar seus distintos espaços de atuação, em que para cada um deles poderá apresentar peculiaridades para a convergência entre pesquisa e assistência. Nesse ínterim, dentre os campos de conhecimento e contextos de intervenção, destaca-se um grupo específico no conjunto dos grupos humanos, a saber: a adolescência, que em relação às demais etapas do ciclo vital, se torna bastante peculiar no campo do conhecimento, haja vista a necessidade de construtos científicos pertinentes a essa fase da vida, posto que a concepção da existência de um período intermediário entre criança e o adulto é recente.12 Logo, abordar a gestão do conhecimento para melhor intervir nessa área parece se configurar como importante demanda social.
Partindo desse entendimento, foram cenários da pesquisa: para o grupo composto por enfermeiros assistenciais, um núcleo de estudos de um hospital universitário voltado para a saúde e desenvolvimento do adolescente, localizado na capital do Rio de Janeiro. As atividades desenvolvidas nesse núcleo abrangem a assistência à saúde nos níveis de atenção primária, secundária e terciária, preconizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Para os enfermeiros pesquisadores, delimitou-se como cenário grupos de pesquisa cadastrados no Diretório dos Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), vinculados às universidades do Rio de Janeiro. O terceiro cenário, correspondente ao grupo de estudantes de graduação, foi o curso de enfermagem de uma universidade pública federal do Rio de Janeiro.
Para selecionar o grupo de enfermeiros assistenciais, estabeleceu-se como critérios de inclusão: possuir tempo de experiência profissional como enfermeiro, no cenário atual, igual ou superior a um ano, e como critérios de exclusão: enfermeiro que estivesse cursando pós-graduação na modalidade stricto-sensu. Para o grupo de enfermeiros pesquisadores, os critérios de inclusão foram: possuir título de doutor, e estar vinculado a um grupo de pesquisa cadastrado no CNPq, em que uma de suas linhas de pesquisa apresentasse relação temática com o cenário de trabalho dos enfermeiros do primeiro grupo amostral, ou seja, a saúde do adolescente. Foram excluídos os pesquisadores cuja experiência no gerenciamento de pesquisa, na condição de doutor, estabelecesse tempo inferior a dois anos. Para o terceiro grupo amostral, o critério de inclusão foi: estar cursando o último ano de graduação em enfermagem; e o de exclusão: estudante que estivesse inserido em grupo de pesquisa de outra categoria profissional.
Após os critérios adotados, obteve-se a seguinte composição amostral: 25 participantes da pesquisa, sendo dez enfermeiros assistenciais, seis enfermeiros pesquisadores e nove estudantes de graduação em enfermagem.
A seleção dos participantes ocorreu de forma intencional e foi orientada pela amostragem teórica da TFD, que consiste em maximizar oportunidades comparativas de fatos, incidentes ou acontecimentos para determinar como uma categoria varia em termos de suas propriedades e dimensões.11 A coleta de dados foi finalizada ao atingir a saturação teórica, isto é, quando as categorias apresentaram densidade explicativa capaz de responder ao problema de pesquisa.
O recrutamento dos enfermeiros assistenciais e dos estudantes de graduação foi intencional, mediante técnica de bola de neve, isto é, o sujeito que participava da pesquisa indicava o participante subsequente. Para captar os enfermeiros pesquisadores, realizou-se busca parametrizada na Plataforma Lattes, no Campo do Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq, utilizando-se as estratégias apresentadas no quadro 1:
Após selecionar os grupos de pesquisa, cada pesquisador foi convidado a participar desta mediante correspondência eletrônica pelo e-mail cadastrado no Currículo Lattes.
A entrevista semiestruturada foi empregada como técnica para coleta de dados em todos os grupos, realizada no período de outubro de 2014 a março de 2015, e gravada em meio digital. Em média, cada entrevista durou cerca de 55 minutos. Para os enfermeiros assistenciais, a principal pergunta de pesquisa foi: fale-me como você compreende a relação entre pesquisa científica e o seu processo de trabalho. Para o grupo de enfermeiros pesquisadores, as principais perguntas foram: fale-me sobre a sua compreensão acerca da participação do enfermeiro assistencial no desenvolvimento de pesquisas em enfermagem; e quais estratégias você utiliza para possibilitar que seus resultados de pesquisa sejam consumidos por enfermeiros assistenciais? Para o grupo de estudantes de enfermagem, as principais perguntas foram: como você compreende a relação da pesquisa científica com o seu processo de formação? De que forma você percebe, a partir do que já vivenciou na graduação, a relação entre a pesquisa e o trabalho do enfermeiro assistencial? A partir destas, foram realizadas perguntas circulares para que os depoimentos atendessem às exigências de aprofundamento do fenômeno investigado.
Os locais das entrevistas foram os cenários descritos acima, em ambiente reservado. Para o grupo de enfermeiros pesquisadores, o local de coleta foi a própria instituição de ensino a qual estava vinculado.
A análise dos dados se deu a partir do processo de codificação que, na TFD, consiste em um processo de análise comparativa, em três níveis - aberta, axial e seletiva.11 Na codificação aberta, os conceitos foram identificados mediante comparações entre propriedades e dimensões dos dados. Nessa etapa surgiram os códigos preliminares a partir dos títulos atribuídos para cada incidente, ideia ou evento. De posse desses, iniciou-se o movimento de comparação entre eles para agrupá-los em códigos conceituais.11
Na codificação axial, ocorreu o agrupamento dos códigos conceituais para formar as categorias e subcategorias.11 Objetivou-se, nessa etapa analítica, iniciar o processo de reagrupamento dos dados que foram separados na codificação aberta, visando uma explicação densa do fenômeno.
A codificação seletiva consistiu na comparação e análise das categorias e subcategorias, processo este realizado de forma contínua que objetiva desenvolver as categorias, integrar e refinar a matriz teórica fazendo emergir o fenômeno central.11
As categorias foram ordenadas segundo o modelo paradigmático,11 esquema este que possibilita coerência explicativa entre as dimensões que sustentam o fenômeno investigado. Sua estrutura se dá a partir dos seguintes componentes: fenômeno, condições causais, condições intervenientes, contexto, estratégias de ação/interação e consequências.
Seguindo a conformação de uma teoria fundamentada nos dados, os resultados da pesquisa sofreram processo de validação por dez juízes, a saber: enfermeiros pesquisadores vinculados a grupos de pesquisa cadastrados no CNPq, em sua maioria líderes desses grupos, de diferentes regiões do país, com expertise na área da saúde do adolescente e renomada experiência no gerenciamento de pesquisa. Para tanto, utilizou-se a mesma estratégia descrita no quadro 1; contudo, ampliando-se o refinamento para todas as regiões do Brasil.
Buscou-se selecionar pesquisadores de grupos de pesquisa de cada macrorregião brasileira, isto é: Sul, Sudeste, Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Esta última região não foi contemplada por não ter havido retorno do grupo selecionado. A distribuição de juízes por região resultou na seguinte composição: três do Norte, três do Nordeste, um do Sudeste e três do Sul.
Para selecionar os grupos de onde emergiram os juízes, estabeleceu-se como critérios: análise dos recursos humanos dos grupos, a partir dos dados contidos no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq, atentando-se para a heterogeneidade dos membros (pesquisadores, estudantes de graduação, especialização, enfermeiros assistenciais), bem como para a produção acadêmica dos juízes selecionados, sobretudo, na condução de projetos de pesquisa. Inicialmente, o convite foi efetivado aos líderes dos grupos, mas estes poderiam designar outro(s) membro(s) para a validação.
O material para validação foi constituído de uma apostila compactada em dois componentes: o resumo dos resultados da pesquisa e o instrumento de validação. Neste último, utilizou-se como parâmetros de análise os critérios de ajuste (capacidade de uma teoria/ modelo conceitual se ajustar à realidade investigada) compreensão (facilidade para a compreensão dos significados que os conceitos sinalizam) e generalização teórica (capacidade de tornar uma teoria/ modelo conceitual aplicável em contextos similares de onde emerge o fenômeno investigado).11 Cada juiz poderia descrever sua avaliação tomando como possibilidade três opções para cada critério, a saber: corresponde totalmente, corresponde parcialmente e não corresponde. Para quaisquer opções, era necessário justificar a resposta.
Para facilitar a validação, disponibilizou-se, como eixo de conexão entre juízes e pesquisador, um espaço (sala) no 18º Seminário Nacional de Pesquisa em Enfermagem (SENPE), que ocorreu em Fortaleza-CE em junho de 2015. Para tanto, obteve-se autorização formal da Diretora de Pesquisa de Enfermagem da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn).
A escolha desse espaço deveu-se ao contexto do evento científico estabelecer aproximação com o objeto do estudo, pois o tema central do Seminário delineou-se em “Pesquisa em enfermagem: aplicabilidade, implicações e visibilidade”. Os juízes, que não puderam comparecer ao seminário, encaminharam o material analisado, via correspondência, para o pesquisador.
Os resultados que estruturam a matriz teórica foram, portanto, validados. Em todos os critérios, os juízes referiram aderência ao contexto de suas realidades. Entretanto, consideraram importante ajuste nos títulos de algumas categorias, posto que os termos utilizados direcionavam para especificidades da Teoria da Complexidade, de modo que a compreensão de quem domina tal referencial poderia ser dificultada. Com base nesse indicativo, alguns títulos foram modificados. Cumpre destacar que, para o critério de generalização, os juízes pontuaram que as lacunas entre a pesquisa e a assistência, apesar de apresentarem especificidades em relação ao campo de conhecimento da adolescência, possuíam transversalidade com os demais campos de conhecimento e intervenção, corroborando com os resultados da pesquisa em pauta.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Escola de Enfermagem Anna Nery - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sob o protocolo de n. 6665.516/ CAAE: 30438114000005238, e pelo CEP do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), sob o protocolo de n. 686.612. Os pesquisadores atenderam nº a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. A participação dos sujeitos se deu de forma voluntária, após esclarecimento e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para manter o anonimato dos participantes da pesquisa, eles foram designados alfanumericamente, de acordo com o grupo amostral de origem e a sequência da entrevista. Desse modo, para o 1º grupo (EAnº - Enfermeiro Assistencial) para o 2º grupo (EPnº - Enfermeiro Pesquisador) e para o 3º grupo (EGnº - Estudante de Graduação).
RESULTADOS
Após o processo de validação, o fenômeno central da matriz teórica, estruturada a partir do conjunto das categorias, delineou-se em: Conexões para uma ciência viva da enfermagem. Contudo, será abordada neste artigo a categoria que, no emprego do modelo paradigmático, se configura como condição causal do fenômeno investigado, isto porque, em seu conjunto, sustenta a importância das conexões entre pesquisa e assistência de enfermagem.
Nessa perspectiva, apresenta-se a categoria Enfrentando desafios emergentes da enfermagem na era da ciência, inovação e tecnologia. Ela está alicerçada pelas subcategorias: Pontos de partida para uma enfermagem contextualizada: da produção científica ao consumo de resultados de pesquisa; e Conexões fragilizadas entre produção científica e prática assistencial da enfermagem.
Pontos de partida para uma enfermagem contextualizada: da produção científica ao consumo dos resultados de pesquisa revelam demandas da sistemática de mercado, no que tange aos atuais desdobramentos científicos e tecnológicos, que têm exigido competências do enfermeiro diante das configurações emergentes dos sistemas de saúde e de cuidados.
Esse processo reflete na necessidade de conhecimentos científicos e de competências para melhor exercer a profissão, o que poderá resultar em impactos sobre a prática de consumo de pesquisa por enfermeiros, conforme retratado nos trechos a seguir:
eu acho que a motivação para pesquisar está no trabalho que mudou, o perfil do paciente mudou, o perfil dos aparelhos, a tecnologia hospitalar [...]. O paciente tem mais acesso à informação [...]. A família do doente está mais informada, isso tudo influencia (EA6).
[...] o nível de exigência do consumidor de cuidados, o usuário do sistema de saúde, também tem impulsionado muito o enfermeiro a buscar mais conhecimentos (EP4).
Com base no exposto, depreende-se que o consumo de pesquisa pelo enfermeiro assistencial está conectado ao seu interesse e necessidade de aplicabilidade do conhecimento na prática de cuidados, perpassando, assim, o potencial campo contemplativo das pesquisas, ao passo que busca a práxis em seu contexto de inovação e tecnologia, conforme demonstrado a seguir:
o enfermeiro da assistência consome pesquisa, mas que tenha a ver sobre tecnologia, inovação. Tem que trazer algum resultado para a prática (EP1).
[...] deveríamos perceber a necessidade das inovações científicas refletirem em nossa prática e eu não vejo isso acontecer (EA5).
No tocante ao gerenciamento do cuidado de enfermagem, o consumo de pesquisa está intimamente relacionado ao processo de tomada de decisão, em que pese a sustentação científica e a segurança para fundamentar suas escolhas e assegurar uma prática calcada nas melhores evidências científicas. Porém, os resultados revelaram desafios para essa realidade.
Muitas vezes, a gente não encontra subsídios para tomada de decisão, ou para dar continuidade a certas coisas que ainda não possuem fundamento, e você, por conta disso, fica meio que na corda bamba, sem saber o que fazer (EA1).
Eu acho que se nós tivéssemos mais pesquisas, tenho certeza de que as pessoas procurariam mais e, então, a gente teria mais esse embasamento para decidir (EA3).
A dificuldade do enfermeiro no acesso aos resultados de pesquisa, com vistas à fundamentação de suas ações para a tomada de decisão, implica na busca e utilização de outras bases de conhecimento, dentre as quais o empirismo e o subjetivismo.
[...] as pessoas fazem uma determinada ação pelo costume de realizar aquela ação e não pela finalidade de uma comprovação científica que justifica a ação (EA5).
[...] tudo começa a ficar muito empírico, acho que você vai se perdendo no meio do caminho (EA1).
Dentre as consequências negativas para o defict de consumo de pesquisa do enfermeiro assistencial, evidenciou-se a fragilidade para o posicionamento e autonomia desse profissional diante equipe multiprofissional de saúde, gerando incertezas, insegurança e desmotivação.
[...] aí chega o médico e, só porque é o médico, o que ele fala fica entendido que é assim e pronto, ninguém tem mais dúvida. A enfermagem precisa se posicionar mais (EA8).
O enfermeiro que está desatualizado, que fica esvaziado de argumentos, vai diminuindo sua autoestima, fica com baixa estima porque não sabe o que falar com seus pares, com seus subordinados [...] nem com os demais membros da equipe interprofissional (EP2).
Por outro lado, cumpre pontuar que, diante dessas situações, o enfermeiro assistencial reconhece a necessidade de consumir pesquisa.
Seria maravilhoso se, nas reuniões da equipe multiprofissional de saúde, eu pudesse levar contribuições a partir dos estudos produzidos pela enfermagem (EA7).
A partir do momento em que, não só o enfermeiro, mas a equipe de enfermagem se mostra disposta a adquirir conhecimentos científicos, a tornar o conhecimento científico algo palpável, acessível, familiar, dominar esse conhecimento - a posição da equipe de enfermagem, diante da equipe multidisciplinar e, principalmente, da medicina, vai ser algo mais participativo (EA9).
A multidimensionalidade envolvida na dificuldade para o consumo de pesquisa por enfermeiros assistenciais, além de outros fatores, consiste em Conexões fragilizadas entre produção científica e prática assistencial da enfermagem. Nesse ínterim, por se tratar de um fenômeno multifacetado, o campo das conexões entre pesquisa e prática assistencial abrange aspectos que convergem para que os enfermeiros assistenciais percebam a produção científica em enfermagem como uma realidade distante das suas e, que, em uma relação de causa ou efeito, pouco interferem no seu processo de trabalho.
[...] eu acho que dentro da enfermagem se produz muito pouco coisas relevantes para o trabalho em si (EA2).
Nós comentamos na rotina de trabalho que as pesquisas de enfermagem passam a ideia de que elas são desprezíveis, porque a partir do momento em que elas não refletem mudanças no quotidiano, pra quê pesquisar na enfermagem? (EA9)
[...] parece-nos que as pesquisas são apenas para publicação com interesses em publicações, porque você tem que produzir! Às vezes, temas e discussões fora da realidade (EA6).
Dentre as possibilidades para fortalecer as conexões entre pesquisa e assistência, conforme mencionado, está o processo de formação ainda no decurso da graduação, quando, principalmente, o estudante tem a possibilidade de relacionar a importância da pesquisa com o seu futuro processo de trabalho, no campo assistencial, conforme pode ser evidenciado nos trechos a seguir:
[...] quando a gente vê que a pesquisa tem uma finalidade para a prática do enfermeiro, fica mais fácil e prazeroso de entender os assuntos de pesquisa que aprendemos no curso (EG9).
[...] ajuda muito o grupo de pesquisa porque lá também temos enfermeiros da assistência que falam da importância da pesquisa (EG3).
Apesar da especificidade no campo de conhecimento e intervenção em que os enfermeiros assistenciais dessa pesquisa estão inseridos, o distanciamento entre produção científica e assistência de enfermagem parece não se limitar ao cenário de cuidados ao adolescente, conforme destacaram:
[...] essa realidade é geral, não só ao adolescente (EA4).
a dificuldade de encontrar pesquisa não é apenas em relação ao adolescente, está na enfermagem toda, é o que eu vejo (EA10).
As fragilidades dessas conexões vão ao encontro do que também os enfermeiros pesquisadores e os graduandos de enfermagem percebem:
[...] vejo que a pesquisa não traz o retorno que deveria para a prática. Esse retorno vai para a graduação, ou para quem está fazendo o mestrado ou doutorado (EP5).
[...] o abismo está nisso: na linha de objetivos, na proximidade entre as pessoas e na interação para mudar junto (EP6).
eu acho que na enfermagem isso é muito fragmentado, existem as pessoas que pesquisam, que entendem sobre o assunto, que dizem, por exemplo: você faz da forma “x”, mas a forma “y” me parece muito mais evidente, mas não são as pessoas que estão na ponta (EG1).
até hoje eu não vi muito essa relação da pesquisa com a assistência (EG5).
A comunicação entre quem produz pesquisa e os potenciais consumidores dos resultados científicos surge como importante elemento interveniente para a conexão entre essas dimensões, já que possibilita condições para o feedback necessário ao campo da percepção, valorização e aderência pelos enfermeiros assistenciais aos resultados de pesquisa em suas práticas laborais.
Não existe uma comunicação, não tem feedback [...]. Eu acho que a gente criou um abismo tão grande que a comunicação se perdeu (EA2).
[...] existe uma falha de comunicação nessas duas vertentes (EG8).
A distância entre o pesquisador e o campo assistencial da enfermagem, na percepção dos enfermeiros assistenciais, parece afetar a retroalimentação necessária à consolidação da pesquisa enquanto imagem, na relação sujeito/objeto. Por conseguinte, acreditam que esse fenômeno reflete na distorção da realidade, conforme demonstrado a seguir:
o pesquisador deveria estar mais em campo, porque cada vez mais que ele se distancia, isso deixa de ser a sua realidade e daí não consegue identificar os problemas (EA1).
não que o doutor em enfermagem precise ficar à beira-leito, mas é interessante ele estar no cenário [...] ser uma pessoa mais acessível (EA5).
facilitaria se o enfermeiro pesquisador levantasse junto da equipe o que realmente aquele grupo necessita (EA6).
Desse modo, as conexões entre as dimensões da pesquisa científica e a prática assistencial parecem ser prejudicadas pelas inflexões negativas do processo de comunicação, presença e pertencimento dos pares - entre quem produz pesquisa e quem poderá consumi-la.
DISCUSSÃO
Ciência, inovação e tecnologia configuram-se como dimensões interdependentes e complementares de um processo que visa o desenvolvimento social, político e econômico das nações13 e, consequentemente, dos mecanismos imbricados nesse contexto, dos quais resultam as profissões como elementos estruturantes da sociedade.
Nesse sentido, os desafios emergentes da enfermagem, a partir dos resultados expostos, apontam para o chamado social perante as demandas de indivíduos e coletividades que vivenciam, dentre outros fatores, possibilidades de acesso às informações, bem como aos artefatos e aos processos tecnológicos e de inovação.13 Por conseguinte, em uma perspectiva dinâmica, direcionam mecanismos de intervenção ao campo da enfermagem e da sociedade à medida que reclamam soluções diante das necessidades emergentes de saúde e de cuidados.14-15
Para discutir esse fenômeno, faz-se necessário globalizá-lo, haja vista os problemas essenciais da humanidade nunca serem parcelares, mas multidimensionais e inseridos em um contexto, sem o qual não seria possível tecer aproximação de sua realidade.7 Desse modo, evidencia-se que, para além dos progressos científicos, como, por exemplo, o desenvolvimento da robótica e da engenharia genética, a evolução das ciências e das tecnologias têm impulsionado, nos últimos anos, o desenvolvimento e acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC),16 em diferentes vertentes, com destaque para a Internet e para a rede de mídias virtuais, que influenciam, inclusive, os sistemas de saúde e de cuidados de enfermagem.17-18
Resulta desse processo, além as questões supracitadas, relativas à inclusão digital, um novo perfil de consumidor dos serviços de saúde que, no acesso à informação, poderá encontrar possibilidades para exercer seus direitos de cidadania em meio às desordens programáticas dos sistemas de saúde que tangenciam vulnerabilidades sociais, especialmente pelo acesso e acessibilidade ineficientes aos serviços de saúde, agravados, por vezes, pela indisponibilidade/inconformidades de informações aos consumidores desse sistema.19
Diante do novo panorama de consumidores dos serviços de saúde é que se busca entendimento para as sinalizações pontuadas pelos enfermeiros participantes do estudo acerca dos motivos que o impulsionam a consumir pesquisa - aliado, consequentemente, à necessidade de conhecimento científico. Porém, a motivação para esse consumo está assentada no caráter processual e de produto das tecnologias14 vislumbradas nas pesquisas científicas como elementos que despertam interesse do enfermeiro assistencial em consumi-las. Todavia, há que se pensar e possibilitar o desenvolvimento de competências para que o enfermeiro possa melhor utilizar as TICs em benefício de seu processo de trabalho, o que inclui o consumo de pesquisa. Para tanto, é necessário que essas questões sejam contempladas no conjunto das ações e estratégias imbuídas na educação permanente da instituição em que esse profissional exerce seu trabalho.
Os desafios emergentes da enfermagem estão, também, na necessidade de garantir a legitimidade da sua autonomia.20 Acerca disso, os resultados sinalizam para a importância do empoderamento do enfermeiro pelo conhecimento científico. Chama a atenção o realce que os enfermeiros assistenciais atribuem à comparação com a medicina, ao tratarem da valorização do conhecimento para a atuação profissional. Permeia, nessa realidade, a desvalorização profissional e desgastes nas relações de trabalho, além de impactos negativos na assistência à saúde.21
Por outro lado, essas relações podem ser horizontalizadas pela autoridade do argumento22 que, nesse contexto, corresponde a capacidade argumentativa fundamentada e manifesta no conhecimento científico sem, com isso, interferir na expressão do exercício legal de cada profissão. Nessa conjuntura, de acordo com os resultados, o ensino da ciência, no contexto da graduação, exerce importante influência no desenvolvimento da visão do enfermeiro acerca da pesquisa como alicerce para a sua prática profissional, fato que sustenta a importância do ensino da ciência nessa etapa de formação profissional. Contudo, esse fenômeno não pode ser compreendido por uma perspectiva unilateral, justificada apenas pelo empoderamento científico, pois também é resultante do contexto histórico e político de onde emergem e se sustentam as profissões da saúde.9,20-21
Ainda como elemento que conclama a autoridade do argumento22 está a tomada de decisão, competência requerida no processo de trabalho do enfermeiro. Essa dimensão do gerenciamento em enfermagem pode ser prejudicada quando a fundamentação para o posicionamento do enfermeiro está fragilizada no campo do conhecimento científico.23 Tal problemática se agrava em meio às demandas do mercado, que exigem decisões acertadas em intervalos de tempo cada vez mais curtos,24 em que o acesso às informações, capacidade de decodificá-las são condições para assegurar o enfermeiro em seu processo de tomada de decisão. Entretanto, nem sempre o conhecimento científico é o elemento estruturante desse processo,25-26 haja vista o subjetivismo e o empirismo se configuram como eixos que norteiam as decisões.23
A compreensão para esses mecanismos, sob a ótica da complexidade, não pode ser considerada isoladamente, uma vez que a relação entre a produção de subjetividade e o processo de tomada de decisão do enfermeiro é mediada pela macro e microcultura contextual, poder e capitalismo que manifestam no indivíduo reflexos da coletividade.27 Além disso, estudos23,25 identificaram relação inversamente proporcional entre experiência prática/tempo de formação com a valorização da fundamentação teórica, mediante consumo de pesquisa para o processo de tomada de decisão do enfermeiro, o que revela, destarte, lacunas entre a prática científica e o empirismo na condução do processo de trabalho da enfermagem, agravada pelas dificuldades de adaptação às novas tecnologias para o conhecimento e desenvolvimento profissional. Essa realidade emerge, também, como desafio para a gerência institucional, posto que o capital humano de excelência de uma instituição deverá se adequar às demandas do público cujos serviços são destinados.
Tomando o conhecimento como fenômeno plural, a Teoria da Complexidade7 estabelece conexões com a própria Teoria do Conhecimento,28 ao considerar que a origem e possibilidade do conhecimento é tangenciada pela experiência e pensamento do sujeito, ao passo que evidencia a questão: onde a consciência cognoscente alicerça seus esforços para chegar ao conhecimento? É na experiência ou no pensamento?28 Com efeito, retoma-se a discussão sobre o racionalismo e o empirismo, de onde se parte da divergência em busca de uma dialógica, haja vista que o próprio conhecimento se constitui a partir de conexões, pois é em si, e para si, multidimensional.7
Portanto, diante das várias possibilidades para se chegar à imagem ou à essência do conhecimento, faz-se necessário reconhecer a complexidade existente no próprio conhecimento, não em sentido de completude,7 mas na valorização das múltiplas vertentes que podem se complementar, chegando-se ao conhecimento do conhecimento. Assim, poder-se-á avançar da dóxa (opinião) para a episteme (saber)1,28 e, quiçá, numa relação mais objetiva do processo de trabalho, conectar os resultados de pesquisa ao conhecimento tácito do enfermeiro. Para que isso seja viável, é fundamental que as conexões entre pesquisa e prática assistencial, bem como entre enfermeiros pesquisadores e enfermeiros assistenciais, sejam estreitadas.8
Esse movimento, por suposto, envolve o engajamento das dimensões assistenciais e acadêmicas. Desse modo, a ciência da enfermagem deve ser produzida na perspectiva relacional entre os diferentes atores sociais que constituem essa profissão, bem como os distintos contextos, de modo a romper com a polarização da pesquisa no campo universitário.29
Todavia, é fundamental o desenvolvimento e/ou aperfeiçoamento de estratégias que possibilitem transformar resultados de pesquisa em políticas de cuidados. Logo, faz-se mister que enfermeiros pesquisadores/cientistas, em conjunto dos enfermeiros assistenciais, assumam o desafio da ciência com consciência7 ao estabelecerem relação orgânica com a sociedade30 e, nesse vislumbre, alcançar o sentido de inerência entre as pesquisas produzidas e as demandas prioritárias do processo de trabalho do enfermeiro diante dos desafios contemporâneos da ciência, inovação e tecnologia.
CONCLUSÃO
A pesquisa revela sistemas de significados e fenômenos que influenciam as conexões entre pesquisa científica da enfermagem e o consumo desses resultados pelo enfermeiro no âmbito da assistência. Nessa conjuntura, considera que o consumo de pesquisa de enfermagem, por enfermeiros assistenciais, é uma necessidade que vai ao encontro das demandas emergentes de saúde e de cuidados, sobretudo no que se refere à ciência, inovação, tecnologia para o desenvolvimento da sociedade, bem como das profissões inseridas nela.
O consumo de pesquisa pelo enfermeiro assistencial está relacionado aos significados que este atribui à produção científica da enfermagem, assim como ao próprio processo de pesquisa. Por sua vez, tais significados podem ser influenciados de forma positiva quando há retorno das pesquisas produzidas pela enfermagem ao campo assistencial, seja no formato de processo, seja na forma de produto. Com efeito, o distanciamento e/ou aproximação entre o que é produzido, em termos de ciência, e o que é consumido pela enfermagem direciona para a importância de se pensar estratégias que viabilizem melhores conexões entre pesquisa e processo de trabalho da enfermagem. A despeito dessa realidade, o processo de formação, no âmbito da graduação, foi apontado como importante contexto em que são tecidas e fortalecidas as conexões iniciais entre o desenvolvimento de pesquisa e a dimensão assistencial.
Os resultados direcionam e fortalecem a perspectiva de que o desenvolvimento da enfermagem, enquanto ciência em construção, requer uma compreensão sistêmica acerca dos reais impactos da pesquisa produzida pela enfermagem para o campo assistencial. Com efeito, de posse dessa compreensão, enfermeiros assistenciais e enfermeiros pesquisadores fortalecerão estratégias que garantam inerência entre o que se produz como ciência, o que se consome de pesquisa, bem como o que, desse processo, é aplicado na prática.
Vale destacar que, muito embora essa pesquisa tenha, ao longo do seu processo analítico, sustentado a hipótese de que o contexto da adolescência apresente especificidades para os desafios na conexão entre pesquisa e assistência de enfermagem, os resultados e o processo de validação foram contundentes ao demonstrarem que esses desafios, de modo geral, se dão de forma transversal na enfermagem. Contudo, a replicação dessa pesquisa em cenários de intervenção distintos poderá fortalecer ou refutar os dados de que a realidade apresentada é transversal ao contexto da adolescência.
Dentre as potenciais limitações da pesquisa, sublinha-se o entendimento de que estudos similares em instituições privadas, tanto no que se refere ao contexto assistencial, como de ensino, podem apresentar resultados divergentes do que, aqui, foram sinalizados, motivo pelo qual estimula-se pesquisas dessa magnitude nesses demais contextos.
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Artigo extraído da tese - Gestão do conhecimento científico: conexões entre a pesquisa e o gerenciamento do cuidado de enfermagem no contexto da adolescência, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 2015.
Agradecimentos
Dedicamos agradecimento especial à Dra. Leila Milman Alcantara (in memoriam), pelo encorajamento ao desenvolvimento dessa pesquisa.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
2017
Histórico
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Recebido
11 Jul 2016 -
Aceito
20 Mar 2017