Open-access Análise da percepção de gestores sobre a gestão da política de saúde penitenciária em Mato Grosso, Brasil1

Resumos

A saúde da população privada de liberdade diferenciou-se em 2003 pela divulgação do Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário o qual, em 2014, foi instituído como Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional. O estado de Mato Grosso habilitou-se ao Plano em 2004 e conta com equipes de saúde em seis unidades prisionais de regime fechado, com gestão compartilhada pelas secretarias estaduais de Saúde e de Justiça e Direitos Humanos. Este artigo analisa a percepção de gestores sobre a gestão da política de saúde no Sistema Prisional de Mato Grosso, enfocando suas características, os entraves e pontos positivos. Valoriza-se a subjetividade na tomada de decisão em que o gestor se vale de referências técnicas, políticas, institucionais, sociais, culturais e a percepção (perpassada pela experiência) que tem do tema e das intervenções. Trata-se de pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória que faz uso de entrevistas semiestruturadas com gestores das duas secretarias e consulta a documentos oficiais de livre acesso, tratados pela análise temática. A gestão das ações de saúde penitenciária encontra entraves, mas, também, avanços. Ressaltam-se as incongruências nos valores que regem o setor da justiça e o da saúde, em que questões jurídicas, de segurança e disciplina tensionam o direito à saúde e a superlotação não pode ser ignorada. O contexto prisional imprime peculiaridades à assistência que se refletem na gestão, pois ora empreendem-se adequações frente ao diferente mobilizando o princípio da equidade, ora o compromete colocando os gestores diante de dilemas entre o cuidado necessário e o possível.

Saúde Penitenciária; Gestão em Saúde; Planejamento em Saúde; Políticas de Saúde; Sistema Prisional


The health of prison population was differentiated in 2003 with the publication of the National Health Plan in the Prison System which, in 2014, was established as a National Policy on Comprehensive Healthcare for People Deprived of Liberty in the Prison System. Mato Grosso integrated the Plan in 2004 and currently has health teams in six closed regime prison units, with management shared by the State Justice and Human Rights and the State Health Secretariats. The present article analyzes the perception of managers on the management of health policy in the Prison System of Mato Grosso focusing on its characteristics, barriers, and strengths. Subjectivity in decision-making-in which the manager relies on technical, political, institutional, social, cultural references and the perception (permeated by experience) of the theme and interventions-is valued. It is a qualitative, descriptive and exploratory research using semi-structured interviews with managers of both secretariats and consultation of official documents of free access, treated by thematic analysis. The management of prison health actions encounters obstacles but also advancements. Inconsistencies are highlighted in the values that govern the justice and health sectors where legal security and discipline issues put a strain on the right to health and overcrowding cannot be ignored. The prison context provides peculiarities to the assistance, which are reflected in management, because sometimes adjustments are made when facing differences, mobilizing the principle of equality, and sometimes they are compromised and managers are left with the dilemma between necessary and possible care.

Prison Health; Health Management; Health Planning; Health Policies; Prison System


Introdução

A Constituição Federal de 1988 assumiu a saúde como dever do Estado e direito de todo cidadão, incluindo-se aquele em privação de liberdade. Antes desse aparato legal, a atenção à saúde, do segmento em questão, consistia de ações pontuais e contou com um diferencial a partir da Lei de Execução Penal n. 7.210, de 1984. Após quase vinte anos, novo impulso adveio das publicações da Portaria Interministerial n. 1.777/2003, que instituiu o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (PNSSP) (Brasil, 2005) e, recentemente, da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), em 2014 (Brasil, 2014).

O PNSSP prevê a implantação de equipes de saúde (médico, enfermeiro, odontólogo, psicólogo, assistente social, técnicos de enfermagem e de higiene dental) nas unidades prisionais com mais de cem presos, na proporção de uma equipe para cada quinhentos presos. Tais serviços devem atender "às necessidades de atenção no nível básico, mínimo da assistência no nível da média complexidade [...] e componentes das urgências e emergências em saúde, em consonância com as especificidades do Sistema Penitenciário Nacional" (Brasil, 2005, p. 24).

Em 2004, o estado de Mato Grosso habilitou-se ao PNSSP cuja gestão é compartilhada entre a Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh/MT) e a Secretaria de Estado da Saúde (SES/MT) (Mato Grosso, 2010a). Pressupõe, assim, uma parceria institucional não isenta de tensões por se tratar de instituições com histórias, valores e missões distintas e que passam a se envolver, em algum grau, com o compromisso comum de "prover a atenção integral à saúde da população prisional confinada [...]" (Brasil, 2005, p. 1).

O PNSSP pautou-se pelos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) para a implantação das unidades de saúde, que passaram a integrar a rede pública, contudo, as peculiaridades do contexto prisional imprimem particularidades, às vezes, geradoras de ambiguidades e entraves que se refletem tanto na execução, quanto na gestão da assistência. Os obstáculos, no entanto, não inviabilizam a implementação de uma política, antes, podem promover aprendizagem para aprimoramentos na tomada de decisão, desde que monitorados ao longo do processo e compreendidos como parte da gestão mais ampla (Silva; Melo, 2000), sendo uma experiência que comporta elementos positivos à prática gestora.

No campo da Saúde Coletiva situamos este artigo na área de Política, Planejamento e Gestão em Saúde, que "[...] trata dos processos de produção de políticas (formulação), dos modos de organização das práticas (programação) e das formas de gestão (operacionalização) de planos, programas e projetos de ação" (Teixeira et al., 2014, p. 589). Todavia, enfoca a gestão em saúde que, em sentido amplo, refere-se às ações de formulação e execução das políticas de saúde, na perspectiva de a implementação dessas ações ser mediada por atividades gestoras de condução dos sistemas e serviços de saúde e, nas esferas locais, refere-se à coordenação dos processos de trabalho. A gestão em saúde pressupõe, ainda, arranjos de estrutura, articulação e mobilização de alianças e parcerias, além dos recursos políticos e estratégicos que propiciam condições para alcançar os objetivos das políticas, planos e programas (Guimarães et al., 2004). Dessa forma, a tomada de decisão é responsabilidade e competência formal do gestor que se vale de informações para tal, inclusive do conhecimento pessoal que possui (referências técnicas, políticas, institucionais, sociais, culturais dentre outras) e a percepção que tem do problema, para formar uma opinião e agir (Tanaka; Tamaki, 2012).

Assim, baseado e adaptado à ideia de (Uchimura e Bosi, 2002), destaca-se a relevância das percepções dos sujeitos no processo de gestão, as quais são condicionadas por suas experiências com dada política, programa, sistema, serviço; e pela inserção particular em determinado contexto cultural, econômico e social (Guatarri apudCastiel, 1994). Trata-se de valorizar a subjetividade (configurada na esfera individual e coletiva) na tomada de decisão em que o gestor se vale de referências técnicas, políticas, institucionais, sociais, culturais e a percepção (perpassada pela fluidez da experiência) que tem do tema e das intervenções.

Este artigo analisa a percepção de gestores sobre a gestão da política de saúde no Sistema Prisional de Mato Grosso, enfocando as atuais características, os entraves e os pontos positivos na sua operacionalização. Vale-se do método qualitativo, apropriado para abordar os significados, as motivações, as crenças, os valores, as percepções e permite apreender processos sociais pouco conhecidos e estudados, como é o caso do tema saúde penitenciária, cuja revisão de (Gois et al., 2012), apontou a escassez de publicações, caracterizando-se, também, por isso como uma pesquisa descritiva e exploratória (Gil, 2002).

Orientado por roteiro semiestruturado, foram entrevistados, em outubro de 2013, dois gestores da saúde no sistema prisional, sendo um da Sejudh/MT e outro da SES/MT, com formação em administração e em enfermagem, respectivamente, ambos com experiência em administração de saúde e um na assistência direta. Os dados foram complementados com documentos oficiais de livre acesso digital sobre gestão de saúde penitenciária e tratados pela análise temática (Bardin, 2011), quais sejam: política e planos de âmbito nacional e estadual (Brasil, 2005; 2014; Mato Grosso, 2010a; 2010b; 2011a), atas e relatórios de gestão (Mato Grosso, 2011b; 2012; 2013; 2014).

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário Júlio Müller (Parecer n. 344.952 de 31/7/13) e os entrevistados foram identificados por G (Gestor) seguido de numeração aleatória, resguardando sua identidade independentemente da inserção institucional.

A gestão da política de saúde no Sistema Prisional em Mato Grosso: entraves e avanços

A gestão das ações de saúde penitenciária em Mato Grosso concentra-se, predominantemente, na Sejudh/MT e, em pequena parte na SES/MT. Para tanto, a Sejudh/MT conta com uma Gerência de Saúde Prisional vinculada à Superintendência de Gestão Penitenciária e é composta por um gerente, três assistentes administrativos, um farmacêutico e dois profissionais agentes de desenvolvimento econômico e social (Mato Grosso, 2011a). Como foi relatado, quando o estado de Mato Grosso aderiu ao PNNSP em 2004,

[...] a constituição da equipe de saúde ficou sendo responsabilidade administrativa da Secretaria de Justiça - na época Secretaria de Segurança [...]; e toda a parte de capacitação e apoio era feita pela Secretaria Estadual de Saúde [...].

Assim, os recursos humanos da área de saúde nas unidades prisionais se inserem na Sejudh/MT o que parece trazer consequências à assistência e à gestão, como será discutido mais adiante.

No âmbito da SES/MT, à ocasião da habilitação desse estado ao plano em 2004, as ações de saúde no sistema prisional foram alocadas na área de Saúde Mental, passando em 2010, a constituir-se como área técnica com a Gerência de Ações Estratégicas. Em consulta aos dois últimos Planos Estaduais de Saúde, nota-se que no período de 2008 a 2011 a saúde no sistema prisional consta, sucinta e vagamente, como uma das diretrizes do eixo de atenção à saúde (Mato Grosso, 2010b) e no período de 2012 a 2015 constatam-se fragilidades na implantação das equipes de saúde diante das quais

[...] faz-se necessário uma gestão compartilhada das Secretarias de Saúde e de Justiça e Direitos Humanos para superação de desafios, priorizando a readequação da infraestrutura que considere as ações da equipe multidisciplinar, bem como a cobertura dessa equipe ao total da população presidiária (Mato Grosso, 2013, p. 83).

Na SES/MT a equipe gestora é composta, atualmente, por dois profissionais - o gestor e um técnico de nível superior que atuam no nível central e contam com técnicos de referência para assuntos de saúde penitenciária em três municípios no interior (sede de penitenciárias), vinculados aos respectivos Escritórios Regionais de Saúde (ERS) - instâncias regionalizadas da SES/MT. Chama atenção a inserção inicial das ações na área de Saúde Mental da SES/MT, o que não parece gratuito, haja vista que a vinculação dos crimes com a loucura fora apontada por (Foucault, 2001), ( Rebelo e Caponi, 2007), (Carrara, 1991; 1998) dentre outros. Notemos:

[...] na época que foi elaborado [a habilitação ao PNSSP] ainda não era uma área técnica: era uma ação dentro da Saúde Mental. Em todos os estados começou assim. Aí em 2009, mais ou menos, que se tornou uma área técnica dentro das secretarias estaduais de saúde. [...] Desde 2010 se transformou numa área técnica específica, dentro da Gerência de Ações Estratégicas (G1).

É oportuno lembrar que, diante de crimes enigmáticos, a partir do século XIX, a elucidação da relação crime/loucura decorreria de esforços para compreender e diferenciar as ações humanas quando movidas pelo livre-arbítrio, comportando, então, a responsabilidade moral e a culpa do criminoso ou, ao contrário, quando seriam expressões de alguma doença ou anormalidade mental que, atingindo o delinquente, determinaria seus atos, tornando-o irresponsável por eles (Carrara, 1991). Nesse sentido, (Foucault, 1978) distinguiria dois tipos de loucura: uma na qual as pessoas se reconheceriam nas ações movidas por opções morais (por exemplo, ciúme e ódio) sendo compreensíveis pela razão, mas outra que seria estranha ao mundo moral dando origem, sucessivamente, às noções de loucura moral, de degenerescência, do criminoso nato, da perversidade. Quem deveria ser punido, corrigido, protegido, curado, controlado? Todavia, se é conhecida a problemática do estabelecimento de fronteiras da "normalidade" e da "sanidade" (das loucuras, no caso), em que os limites são tênues e se confundem, sabe-se também que tais postulados influenciaram o destino dos loucos criminosos e, de certa forma, as diferentes escolas penais2.

O Sistema Prisional3 de Mato Grosso compõe-se por seis penitenciárias (cinco masculinas e uma feminina), quarenta e nove cadeias públicas, cinco Casas de Apoio (três Casas do Albergado, uma Colônia Agrícola, um Anexo à Penitenciária Central do Estado (PCE), dois Centros de Detenção Provisória, totalizando sessenta e duas unidades prisionais (Mato Grosso, 2011a), além da Unidade de Saúde Mental4.

Embora haja o critério da quantidade de presos, o PNSSP não contempla as unidades penais de regime aberto ou de presos provisórios (recolhidos em cadeias e distritos policiais). Em Mato Grosso havia em 2012 sete unidades (Mato Grosso, 2012) com equipe de saúde implantada, cuja localização, capacidade e quantitativo de presos são informados no Quadro 1 a seguir.

Quadro 1
Capacidade e distribuição de presos por unidade prisional de regime fechado de Mato Grosso que possui equipe de saúde implantada, 2012

O critério quantitativo para implantar uma equipe de saúde para cada quinhentos presos (Brasil, 2005) é questionado por um gestor pelo parâmetro da capacidade institucional e não pela população real. Em consequência da superlotação que é comum, há sobrecarrega da equipe e reflexos na provisão de insumos (destaque aos farmacêuticos), gerando tensões entre os níveis da gestão quanto à competência e à responsabilidade de cada ente.

A capacidade instalada era muito inferior ao que estava [se] configurando de presos naquela unidade - a superlotação. E aí, no caso, algumas unidades conseguiram se habilitar com duas equipes, mas a maioria delas só com uma equipe. O que isso significa? Significa prejuízo porque o Ministério estabeleceu um kit para 500 presos, né. Era por total de população na capacidade instalada. Então o ministério da Justiça, da Saúde, passa um kit de atendimento básico de medicamentos e de atenção básica para cada presídio considerando essa característica de capacidade. [...] E as secretarias municipais deveriam complementar, mas isso não tira a capacidade da própria... Sejudh, também de fazer essa complementação (G1).

Há, ainda, a situação das cadeias como, por exemplo, no município vizinho onde uma unidade com capacidade de cento e noventa e dois detentos (Mato Grosso, 2014) é assistida pela Gerência de Saúde da Sejudh/MT. Formalmente vinculam-se, administrativamente, à Superintendência de Gestão de Cadeias/Sejudh/MT (Mato Grosso, 2010), devendo a assistência àqueles presos ser provida pelo Sistema de Saúde municipal. No entanto, arranjos informais não institucionalizados são colocados em ação para prover o cuidado configurando-se como flexibilização de normas. Esses arranjos são importantes como agentes de mudanças, transformações, inovações que podem estimular e respaldar novas pactuações e a institucionalização de processos originais e diferenciados de gestão, sempre orientados para a consecução das finalidades planejadas.

Está dentro do Sistema Prisional [a cadeia]. Mas aí eles vêm com alguns "acertinhos" assim... [para atender]. Não está nada configurado, né. Não está nada institucionalizado e a gente tem trabalhado assim com as secretarias municipais. Bom: já que é considerada na população flutuante do seu município, a partir do momento que seu município é sede de cadeia, quer você queira, quer não, é competência de você fazer saúde. Não tem como você, secretário, falar: "Não, essa população não existe", porque você estará criando um problema sério com a sua própria população que não é presa, né. Porque o preso não está condenado, mas ele está restrito de liberdade... (G1).

A operacionalização do PNSSP/Mato Grosso depara-se com alguns entraves não isolados que dificultam o processo de gestão. No caso da Gerência de Saúde/Sejudh/MT, a ausência de corpo técnico soma-se à concentração de presos nas unidades prisionais da capital. Com a proximidade física a essas unidades e diante da escassez de recursos humanos, a gerência se vê sobrecarregada pelas demandas técnicas, acumulando-se e confundindo-se com a gestão propriamente dita. Uma das consequências é a dificuldade das visitas periódicas às equipes das unidades prisionais do interior, como expressa:

Não, não tem essa periodicidade. A gente se define por um tempo, por exemplo, vamos ter que ir em X [município sede de penitenciária], porque lá está dando problema. No ano passado as visitas foram feitas estruturadas. Esse ano foi feita apenas uma visita em uma unidade penitenciária do interior. [...] O que demanda muito esforço da própria gerência são as unidades da capital, constantemente temos que estar na Penitenciária Central (PCE), temos que estar no Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC) ou na Penitenciária Feminina. Então, Cuiabá nos suga de um tanto que a gente não tem tempo nem de dar atenção às unidades do interior. É como se a Gerência de Saúde... fosse o gerente da PCE, fosse a gerência do CRC e do Feminino, né. Constantemente é ligando... e muito operacional [...]: "porque não veio o medicamento" ou "porque fulano quebrou o carro [e] não veio, tem que fazer o revezamento com outra unidade..."; "Ah! É porque fulano tirou férias...". Eu atribuo a essa concentração das unidades [e], também, porque a concentração de problemas é aqui na capital e como a administração é aqui na capital a pressão é maior (G2).

Aliada à referida concentração das unidades estão as questões físicas estruturais do estado (que fogem ao poder da gestão de saúde, mas que nela interfere), inclusive quanto aos meios de comunicação, também dificultando o trabalho, porque, como relatou um gestor:

[...] em X [município] a gente não consegue falar, lá não pega telefone; em Y [cita outro município] é muito difícil você se comunicar e a nossa comunicação é praticamente através de documento e isso dificulta muito, né? (G2).

Problemas de comunicação, visibilidade e transparência das decisões também podem afetar a gestão na saúde no sistema prisional, por exemplo, na publicização do Plano Operativo Estadual (POE). O POE é um instrumento de gestão em que constam as metas, formas de gestão e gerência das ações e serviços de saúde (Brasil, 2005). Deve ser apresentado ao Conselho Estadual de Saúde (CES) e à Comissão Intergestores Bipartite (CIB) para apreciação, discussão e aprovação, sendo as proposições, posteriormente, pactuadas no âmbito de cada unidade federada, por meio da CIB e entre gestores estaduais de saúde, de justiça e gestores municipais de saúde (Brasil, 2005).

Lembramos que o POE confirma a adesão ao PNSSP e deve existir para que o incentivo financeiro previsto na Portaria n. 1.777/2003, para execução de serviços de saúde nas penitenciárias, seja garantido ao estado. Atesta sua existência em Mato Grosso a ata da 263ª reunião do CES de 09/11/2011, informando o andamento do PNSSP com a apresentação, discussão e homologação do Relatório de Gestão de 2010 do POE de Saúde do Sistema Penitenciário, destacando tratar-se de uma parceria da Sejudh/MT e SES/MT (Mato Grosso, 2011b). Embora sua aprovação esteja publicada, até o momento não conseguimos acesso ao documento eletronicamente - dificuldade compartilhada por um gestor:

Existe o Plano Operativo Municipal de W [cita município] e o Plano Operativo de Z [outro município], mas nós não temos o plano operativo nas demais unidades, o que dificulta a questão das referências, a questão dos fluxos, o protocolo e itinerário terapêutico e os profissionais se veem, muitas vezes, com muitos problemas de difícil resolução e ao mesmo tempo tendo que resolver quase que imediatamente. [...] Eu tenho [o POE] mas foi difícil achar. [...] Eu tentei colocar ele no nosso site porque a gente tem um relatório de gestão de 2012 que eu consegui colocar, mas eu estou colocando aos poucos algumas coisas no site e eu queria colocar a portaria e o POE, mas ele é muito pesado, então, não foi possível. Eu tenho ele em arquivo e tenho o extrato da publicação no Diário Oficial, então, ali eu vi que existe o POE [...], mas é que nem em conto, vai passando de pai para filho, todo mundo fala, mas cadê? [risos] (G2)

A dificuldade na execução financeira é apontada por um gestor como obstaculizador na implementação do POE, consistindo em aspecto que mereceria estudo mais aprofundado:

Não consegue fazer uma aquisição nesse processo todinho... Para você ter uma ideia, eu entrei em 2011 como área técnica da saúde no sistema prisional. Os processos tudinho de aquisição, o primeiro Plano [POE], para abastecer os insumos que as unidades precisam, o de 2011, foi comprar agora em 2013. [...] Quer dizer, o processo caducou, aí volta, você refaz como se fosse começando neste ano. [Em] 2011 começou, ele volta em 2012 para você refazer como se ele nascesse em 2013. Aí agora... mandaram refazer... Aí já compraram um pouquinho, uma parte. E uma hora tem orçamento, outra hora não tem financeiro, outra hora tem financeiro, outra hora não tem orçamento... (G1).

Diante disso, a desconcentração mostra-se vantajosa no caso da SES/MT que conta com um técnico de referência para assuntos de saúde penitenciária nos seus ERS em três municípios sede de penitenciária no interior, esses escritórios podem contemplar e agilizar a inserção dos profissionais de saúde penitenciária ali atuantes com os demais profissionais do SUS. Assim é relatado:

Uma coisa positiva é que a gente tem, -através dos Escritórios Regionais, conseguido movimentar a roda. É fazer com que essa equipe de saúde seja inclusa na CIES, na Comissão de Educação Permanente em Saúde. Então, a gente tem conseguido colocá-los, inseri-los nas capacitações, atualizações do SUS (G1).

As equipes de saúde das unidades prisionais do interior apresentam atuação positiva em alguns pontos (resolubilidade, proposições/iniciativas, relação com outras unidades de referência), como apontado por ambos os gestores. Atribuem o diferencial, enfaticamente, à menor quantidade de presos e aos contatos informais extramuros, facilitado por ser municípios de menor tamanho e pelos outros vínculos empregatícios do servidor, possibilitando agilidade, atalhos à assistência e iniciativas de articulação com a comunidade:

Sim, têm [diferenças]. [...] Eu acredito que a questão populacional influencia e o conhecimento de pessoas-chave facilita tanto o acesso do preso [ao serviço] como a resolução de alguns problemas de saúde. [...] A gente tem conhecimento que o profissional de saúde penitenciário trabalha no município e isso não sei se é um ganho, mas facilita (G2).

De estrutura algumas coisas sim, porque tem equipes que são mais propositivas [...] e depende da equipe... No interior algumas equipes são, tipo X [cita município], a gente viu que eles [...] trouxeram o Conselho de Comunidade que existe constituído, que seria o controle social junto deles, eles têm ativo [...] (G1).

A incompatibilidade na organização do serviço de saúde penitenciária com outros serviços de saúde específicos é um dificultador apontado pelos gestores, por exemplo, quanto à dependência química/uso abusivo de drogas pelos presos e, no caso, a relação com unidades de referência da rede pública de saúde que são os Centros de Apoio Psicossocial (CAPS). Tal situação desconsidera a posição social da pessoa/preso e as características do seu contexto para oferecer o cuidado, ferindo o princípio da equidade no acesso à saúde que levaria em conta a diversidade de pessoas, de necessidades e, portanto, distribuição diferenciada - no caso flexibilização na organização do serviço para permitir o acesso. Lembremos que "não basta um padrão universal se este não comportar o direito à diferença. Não se trata de um padrão homogêneo, mas equânime" (Sposati, 1999, p. 128). O relato de possibilidades de articulação mostra viabilidade, relativizando a incompatibilidade absoluta:

O que eu tenho conhecimento é que existe uma unidade [para tratamento de dependência química], mas não é para preso, é só para população livre. Muitas vezes já foi [encaminhada] determinação judicial para que [o preso] seja recebido e eles se recusam porque a política de lá de trabalho é diferente. Não tem como o preso ir lá, não tem como o preso ficar lá preso, mesmo que seja ambulatorial leve, mas [a organização do] trabalho lá impede o acesso do preso, por isso que tem essa separação. [...] muitas vezes os CAPS não aceitam [atender o preso] por conta dessa filosofia de trabalho, mas nós temos uma facilitação em outras unidades do interior... (G2).

As unidades de saúde penitenciárias, formalmente orientadas pelos princípios e diretrizes do SUS, ao ser implementadas, requerem adequações conformes às especificidades do contexto prisional. É que tais unidades se classificam como Unidades Básicas de Saúde (UBS) do Sistema Prisional e, de fato, oferecem consultas médicas e odontológicas, inalações, injeções, curativos, vacinas, coleta de exames laboratoriais, encaminhamentos para especialidades, medicação básica. Com algumas variações locais, funcionam também no final de semana (ações restritas) e sua rotina as aproxima de Pronto Atendimento (PA), com demanda espontânea e atenção não programática, exceto às doenças infecciosas (tuberculose, hanseníase, HIV/aids). Parece tratar-se de unidade básica distinta devido às peculiaridades da instituição e da população atendida - de confinamento e de presos, respectivamente.

Então, atuam de forma intermediária entre UBS e PA, resolvendo parte significativa das ocorrências, e evitando as complicadas saídas escoltadas dos presos. Contudo, distinguem-se do PA típico, porque seu expediente é diurno e não contam com plantões noturnos, sendo as urgências encaminhadas às unidades de referência local. Além disso, há de considerar que a população confinada é circulante (entre cadeias/penitenciária e entre penitenciárias), flutuante (entradas e saídas diárias), e demanda segurança, e as ações programadas requerem manejo dos presos e dependem da intermediação de outras categorias profissionais (agente prisional, polícia militar). Nesse caso, esbarra-se em questões de disponibilidade e disposição de profissionais atuantes em ambiente de trabalho pautado pelos princípios de disciplina e segurança5 em detrimento da saúde (Thompson, 1993; Diuana et al., 2008), podendo gerar tensões, dificultando a integralidade no sentido da oferta de ações curativas, preventivas e de promoção da saúde. As interações e as normas vigentes inter e intracelas também podem filtrar o acesso. Notemos:

Tanto a promoção, quanto a saúde, e [o preso] como pessoa social, [isso] não existe, né. Agora o curativo, aí depende. Depende do agente carcerário, depende dos parceiros que estão dentro desse raio [divisão física interna] porque, no caso, [depende de] que tipo de crime ele fez. Depende da visão subjetiva de cada um, do que seria cuidado em cima desse sujeito que está preso (G1).

Tais tensões irão se refletir (e reforçar) em pontos citados pelos gestores, como no caso da vinculação das equipes de saúde à Sejudh/MT e não à SES/MT, afetando tanto a atuação dos profissionais que se veem em situações embaraçosas entre as diretrizes e as práticas (às vezes contraditórias à sua formação), quanto à gestão da saúde naquele contexto. Ambos os gestores reconhecem a interferência das diferenças institucionais nas suas atuações:

Embora a saúde seja responsabilidade de quem faz saúde, eu acredito que, mesmo estando sob responsabilidade da Secretaria de Justiça, os problemas existem, e talvez podem existir mais [outros] com a administração da Secretaria e Administração Penitenciária... A prioridade do gestor está, às vezes, mais na custódia, voltada ao trabalho do preso e esquece essa responsabilidade acerca da saúde, por serem áreas distintas (G2).

Eu lembro que na época, eu estava chegando aqui [...], eu falei assim: [...] "é um absurdo a equipe de saúde ser da Justiça...". Por que a Secretaria de Saúde não coloca... [os próprios] funcionários? Porque aí vai ser mais fácil. Imagina a gente chegar num ambiente que é da Justiça [e] a gente querer fazer saúde? [...] Como é que a gente vai trabalhar [com saúde] com uma instituição em que a gente deveria estar trabalhando com maior proximidade possível, [mas] onde a questão de justiça é prioridade? (G1).

O último trecho leva-nos a refletir sobre a aparente incompatibilidade entre a justiça e o direito à saúde no contexto do sistema prisional, haja vista que a saúde se fundamenta no princípio da justiça social. Discutindo uma nova agenda social na América Latina, (Draibe, 2011) reporta-se à crescente valorização dos direitos sociais na base da proteção social, assegurados na legislação e pressupondo a garantia das demandas e resultados. Ancorados nos valores e princípios de justiça social, os conceitos de solidariedade e de coesão social colocam o direito à saúde como parte da justiça e não incongruente a esta como subentendido acima. Tem-se a impressão que a justiça, ao ser reduzida à segurança, se opõe à saúde. Outro ponto que difere na orientação da gestão das ações de saúde no Sistema Prisional de Mato Grosso diz respeito à descentralização proposta na implementação do SUS. É que o sistema prisional, situado no âmbito da segurança pública, é de responsabilidade do governo estadual (portanto, centralizado), sendo que na saúde o movimento foi de intensificação da municipalização e, assim, o fato de o serviço inserir-se diretamente em uma instância estadual/Sejudh cria ambiguidades à gestão:

Em 2004, o estado de MT aderiu ao Plano [PNSSP] e a constituição da equipe de saúde ficou sendo responsabilidade administrativa da Secretaria de Justiça - na época Secretaria de Segurança [...]. É diferente em alguns estados, por exemplo, onde a equipe... é do próprio município ou da própria Secretaria [da Saúde] do estado [...]. E isso, pelo alinhamento da política do SUS, ficou numa forma diferenciada porque o SUS prega a descentralização, a atenção básica de responsabilidade dos municípios [...], mas dentro de unidade penitenciária é executada por uma equipe que fica sob a responsabilidade administrativa de uma Secretaria Estadual e, ainda, de... administração penitenciária. [...] E a gente vê reflexos um pouco positivos e um tanto negativos, mas de qualquer forma, é diferente em nível nacional (G2).

[...] Porque o SUS estando num contexto de Justiça, é totalmente ao contrário. Nós trabalhamos no SUS [...] que tem avançado - apesar dos pesares -, a gente tem avançado na gestão da descentralização, enquanto a Sejudh está ainda no processo de centralização, cada vez mais. Então, a gente [SES e Sejudh]... não anda no mesmo compasso, né? [...] (G1).

As peculiaridades do contexto prisional, a instituição, a população atendida e as interações que ali transcorrem, influenciam a prática dos profissionais de saúde o que, por sua vez, se reflete na atuação dos gestores, como abordado a seguir.

O contexto prisional e as repercussões na assistência e na gestão

Em sua obra clássica Vigiar e Punir, acompanhando as mudanças nas práticas punitivas ao longo do século XVIII, (Foucault, 1987) relata como, no contexto de uma nova "economia política do corpo", os espetáculos públicos, em que se infligiam todo um rol de castigos, suplícios e torturas aos corpos dos condenados, com grande dispêndio de violência; acabam sendo substituídos pela pena de detenção com técnicas punitivas mais brandas aos criminosos. O encarceramento converte-se na pena por excelência adotada pelo sistema legal e promete cuidar da alma e do corpo do preso, disciplinando sua conduta, dominando sua força física e corrigindo seu espírito. Daí, a preferência do órgão penitenciário por dispositivos disciplinares, vigilância incessante, administração de castigos e medidas corretivas. Todavia, o autor adverte que o cárcere não se resume às funções negativas de privar o criminoso de sua liberdade, puni-lo, vigia-lo e dobrá-lo a um sistema de docilidade-utilidade, mas que o cumprimento da pena deve ter efeitos corretivos profundos, promovendo a transformação dos indivíduos, tornando-os aptos a seguir a ordem social vigente.

A conciliação desses propósitos, que parecem um tanto contraditórios, logo se revelou mesmo falaciosa já que desde cedo foi denunciado o visível fracasso do modelo penitenciário por não atender aos fins apregoados: as taxas de criminalidade não caíam, o índice de reincidência permanecia alto, a rotina de abuso de poder, a corrupção, a violência institucional longe de ensinarem o respeito às leis favorecia a perpetuação da delinquência. Contudo, se a prisão continua sendo acionada é porque seu funcionamento não visa a atender aos seus propósitos declarados, mas sua verdadeira função encontra-se encoberta, porque o seu real papel desempenhado não é no sentido de erradicar a criminalidade ou ilegalidades, mas sim, de administrá-las, organizá-las, diferenciá-las, ou seja, uma forma de gestão das transgressões, conclui (Foucault, 1987). Atuação seletiva e uma dinâmica não autônoma aos interesses e jogo de forças sociais do contexto mais amplo, podemos acrescentar.

Autores como (Thompson, 1993), (Silva, 2008), (Moraes, 2013), (Barcinski, Altenbernd e Campani, 2014) também apontaram contradições nos discursos e práticas das prisões, porque propõem reeducar, ressocializar, regenerar, cuidar e, ao mesmo tempo, historicamente, serve para punir, vigiar, castigar, controlar e disciplinar outros seres humanos. Diante disso, como operacionalizar uma política orientada pelos princípios de universalidade, equidade, integralidade, acolhimento e humanização como o SUS? Vejamos:

[...] Primeiro, a ótica da Justiça é: você está com dor, [e] aí se a dor chegar aqui, para falar aqui para mim que tem uma pessoa lá com dor e quiserem me levar até ela, aí eu faço o atendimento de saúde, aí existe a equipe de saúde para fazer esse atendimento, dessa dor de dente [por exemplo]. É uma ação pontual, fragmentada, assim, naquilo que a pessoa está sentindo. E o Plano [PNSSP] fala, escreve, coloca lá bem claro: ações de promoção, prevenção, tratamento, reabilitação. [...] E a humilhação com que ela passa..., até chegar a fazer uma visita, é muito constrangedor isso... Enquanto nós da saúde, estamos trabalhando na questão humanização. Humano! Tratar o humano como humano! E aí você vê o sistema prisional... (G1).

Destarte, há implicações nas atribuições dos profissionais de saúde diante das demandas, tendo em vista os conflitos e a hierarquização das ações internas, em que questões jurídicas, de disciplina e de segurança, parecem sobrepujar-se às de saúde, como citado anteriormente e expresso nos excertos seguintes, mas que interpretamos como típicos do contexto da prisão e, portanto, não restrito a uma categoria profissional ou ao contexto local:

A prioridade do gestor [da penitenciária] é, às vezes, mais na custódia, voltada ao trabalho do preso e esquece essa responsabilidade acerca da saúde por serem áreas distintas. Então, hoje embora não seja uma tendência em nível nacional, nós pensamos em nos apropriar desse conhecimento de saúde e mais do que isso, fazer um link com a administração penitenciária que é a questão da custódia, porque o que se percebe [é que] a visão de Agente Prisional de [sobre] saúde é diferente da visão de saúde e isso é realidade em nível de Brasil (G2).

A referida prioridade se reflete na atuação dos profissionais de saúde e, consequentemente, no cuidado dos presos de várias formas. Eles não são atendidos nas celas, mas na unidade de saúde, portanto, dependem de outros profissionais que os desloquem para lá, assim como acontece quando necessitam de procedimentos de outros níveis de atenção fora da penitenciária e que requer saída escoltada. Todavia, os mesmos profissionais e viaturas são requisitados para os deslocamentos dos presos para atendimento jurídico (fóruns), sendo assim, são postos diante de delicadas escolhas e pressionados mais por aquelas que interferem na situação legal do preso e que podem significar mudanças no seu destino (da pena, do regime, o alvará/liberdade), essas mudanças influenciam na dinâmica interna. Para compreender o possível critério que baliza a escolha, podemos exercitar nossa imaginação sociológica considerando as diferenças nos desdobramentos, para o preso e para a instituição, do não comparecimento a uma audiência ou a uma consulta médica ou outro atendimento de saúde...

Como consequência, ocorre o que designamos "resolutividade forçada" de grande parte das demandas de saúde na unidade local (Barsaglini; Arruda, 2014), que gera dilemas e desconfortos ao profissional que levam reclamações aos gestores locais ou do nível central, uma vez que a recusa é problemática naquele contexto. A pressão pode vir por meio dos presos (também privados da liberdade de escolha para atendimento e aquisição de medicamentos de venda livre nas farmácias externas), dos seus familiares (telefonemas, diretamente na enfermaria ou na direção) e de outros servidores na penitenciária, mas, também, formalmente por ofícios da administração local ou autoridades jurídicas externas e, ainda, das duas formas. Notemos nos excertos:

Eu posso ter meu ponto de vista como técnico, um enfermeiro e aí ser respeitado - eu não vou compartilhar do que me é imposto. Já lá [penitenciária], a gente não percebe isso, tem toda uma movimentação: "tem que ser feito", vai ser, "cumpra-se!". E até as colocações quando chegam para nossos profissionais colegas que estão compondo as equipes de saúde, são assim: "[G1], não tem como não fazer, porque já chega assim: 'você vai fazer, cumpra-se'". Falei: eu, hein! ... [risos]. Enquanto nós, saúde, não temos isso daí. Eu, como técnica, posso simplesmente [dizer]: "não vou fazer porque o meu respaldo técnico é esse, esse, esse e esse". [...] Porque tipo, não tem médico, aí o enfermeiro se vê obrigado, por toda uma situação, de fazer medicação: seja uma dipirona, mas é uma medicação, do qual ele não tem competência para fazer, não é competência dele (G1).

[...] Na penitenciária de X [município], porque lá nós não temos o profissional médico e a equipe está um pouco desconstituída e, também, porque se afastou o enfermeiro por problemas de saúde, e nós tivemos um embate de duas profissionais de saúde com a equipe de segurança, no sentido de que os técnicos de enfermagem tinham que resolver tudo, e a gente sabe que isso não deve ser feito... (G2).

Pode-se pensar em territórios de poder demarcados nas instituições, em que o acesso e atuação nos seus espaços podem ser embaraçosos, tolhidos como aponta um gestor sobre a dificuldade em entrar nas unidades prisionais, e uma das estratégias para contornar seria por meio de outras organizações ali atuantes como a Pastoral, uma vez que a penitenciária "é a casa da Sejudh...", como referiu.

Nesse sentido, o acesso às informações sobre o estado de saúde dos profissionais de saúde das equipes também é apontado como difícil, as informações são restritas à Secretaria de Segurança Pública. Estudos mostram que trabalhar em instituições fechadas vulnerabiliza os profissionais (Rumin et al., 2011; Greco, 2011), e se há um setor que se ocupa dessa questão, parece atuar de forma fechada, com pouca visibilidade e comunicação com os interessados. Vale lembrar que o adicional de insalubridade conquistado em 2013 decorreu de longa luta sindical e após uma greve dos servidores do sistema prisional (Sindespen-MT, 2013a). A existência de um setor específico, ao lado da aquisição do referido benefício, denota o reconhecimento das exposições e riscos à saúde do trabalhador naquele ambiente.

Porque o tipo de trabalho que eles fazem - porque acaba sendo um profissional de saúde confinado também - ele fica ali, ele entra ali, e está numa situação também de vulnerabilidade, principalmente psicológica. A gente tem observado isso nos profissionais... (G1).

[Este serviço] é feito pelo Núcleo de Segurança e dentro da política de recursos humanos que atende tanto a Secretaria de Justiça, quanto a de Segurança, chama-se Gerência de Qualidade de Vida. [...] Existe um trabalho de psicologia, de psicólogos [...], onde atendem pessoas tanto da saúde, quanto servidores, agentes prisionais, mas não temos um retorno acerca desses dados, se tem estatísticas ou um trabalho mais estratégico acerca disso. O [setor de] Recursos Humanos nos apontou que a Sejudh não fez nenhuma previsão orçamentária acerca dessa natureza e, por isso, não teriam condições de fazer trabalho algum e deixou claro que o trabalho que é feito ele acontece [...] dessa forma, com acompanhamento ao servidor quando o servidor vai buscar. Mas é uma preocupação enquanto servidor... desse adoecimento dos profissionais, só que a gente não consegue [...] achar uma alternativa para minimizar isso e eu acredito ainda que teria que ser um trabalho feito num grupo de trabalho, em um estudo de que forma teria como minimizar [riscos]. Quais seriam as alternativas, né? E o que a gente tem de concreto é que não tem nada voltado ao servidor penitenciário, inclusive os profissionais da saúde (G2).

Outro avanço considerado positivo refere-se às iniciativas de mudanças na capacitação dos profissionais de saúde para atuarem, acrescido da elaboração de protocolos de atendimento das respectivas especialidades. Se a competência técnica é a mesma requerida ao atendimento, não se ignora que a abordagem e o manejo do cuidado são diferenciados no contexto da penitenciária. Em seu estudo sobre o cotidiano dos profissionais de saúde, (Lopes, 2014) notou a oferta de capacitações técnicas isoladas ou em conjunto com outras categorias, as quais, dado seu trabalho bem distinto, os profissionais consideram, em parte, não adequadas para as especificidades da atuação em saúde penitenciária, o que faz com que eles aprendam, efetivamente, no exercício da sua prática. Não obstante, notamos esforços em direcioná-las e também adequá-las à realidade do serviço de saúde naquele contexto, como se observa no trecho:

Existe uma escola de saúde - a Escola Penitenciária - ela foi constituída há pouco tempo e tem no regimento interno da carreira de servidores penitenciários que eles têm que passar, se não me engano por mais ou menos 400 horas de curso. Isso foi um ganho para os servidores, mas nós temos algumas realidades. Recentemente nós demos posse para vários profissionais e esses profissionais não receberam esse curso. Mais devido à questão de estrutura também, por dependermos de profissionais e também... [é difícil] para os profissionais que estão entrando ao longo do tempo [...], mas o que tem sido feito é justamente períodos de capacitações [...]. Essa capacitação tem uma organização toda voltada à segurança e dedicada mais aos agentes prisionais, mais a quem faz a guarda dos reeducandos e nós estamos, aos poucos, abraçando também todos os outros profissionais sejam eles médicos, advogados ou enfermeiros. Mas é muito característico o profissional que entra e não é agente prisional, ele não quer passar por trabalhos, por oficinas voltadas mais aos agentes, [...] e isso é dispensado pela Secretaria. De certa forma não é um entendimento ainda definido se deve ou se não deve. Ele fica mais em aberto [...] e o profissional pensa: "eu não vou fazer porque não adianta eu aprender defesa pessoal, não me adianta aprender coisas assim mais ligadas ao Agente" (G2).

A cooperação entre as secretarias estaduais (Sejudh/MT e SES/MT) e municipal é relevante pela otimização dos recursos e integração dos profissionais na rede pública e nos processos de capacitação, e que, inclusive, está prevista no PNSSP como competência compartilhada pelos entes envolvidos (Brasil, 2005). Porém, ainda que operante, a esperada cooperação se mostra com nuances de improviso, pouco articulada ou fortalecida institucionalmente. Notemos:

[...] E quanto à capacitação voltada aos profissionais da saúde, a atualização terapêutica, nós não temos um protocolo de capacitação. O que nós temos são necessidades espontâneas, de acordo com os próprios relatos de profissionais que dizem que estão precisando de capacitação [...] e muitas vezes também a gente faz trabalhos com o município, com as áreas técnicas da Secretaria de Estado, como DST, aids, hanseníase, tuberculose, né? E, na maioria das vezes, a gente entra nas capacitações montadas diretamente para os profissionais dos municípios. Então..., não [é] uma capacitação direcionada, mas a gente aproveita a oportunidade dali para ser inserido. E nós queremos fazer esse trabalho de capacitação permanente, mas ainda a gente não tem esse esquema preparado. Recentemente nós solicitamos para todos os profissionais [dizerem] que capacitação seria importante, aquilo que ele queria fazer, mas nós não tivemos o retorno devido. Acredito que a lida diária faz com que eles não tenham tempo nem de pensar nisso, inclusive teve uma assistente social que disse: "não adianta, eu não vou fazer isso agora. Eu vou ser sincera com você: [...] eu não consigo, não tenho tempo para respirar". Então, em nível de gestão, nós não definimos nada, e, então, as capacitações que tem a gente acorda junto com a área técnica de saúde prisional do estado, fazemos um planejamento no início do ano e esse planejamento é cumprido (G2).

A iniciativa de protocolos específicos às categorias profissionais de saúde, se faz positiva e importante para resguardar a autonomia de atuação dentro dos limites legítimos e legais do exercício da profissão, a exemplo do Manual de Normas e Rotinas de Enfermagem (Mato Grosso, 2012). Ressaltamos que a participação sindical e dos conselhos profissionais seriam produtivos nesse processo, como também a compreensão da Educação Permanente em Saúde atrelada ao processo de mudança das práticas profissionais.

[...] estão montando uma ementa sobre atribuições, competências e os procedimentos de saúde de cada profissional. Então, vai ser ministrado para os servidores o trabalho do farmacêutico, o trabalho do enfermeiro, o trabalho do odontólogo até para que isso facilite a vida do profissional lá. Então, o projeto piloto vai ser Cuiabá [...] e feito isso a gente vai fazer uma avaliação e se atender as nossas expectativas nós vamos definir isso como modelo para todas as unidades penitenciárias e também acompanhar. Fora isso, a gente vai ter que [...] definir uma série de outras campanhas de educação e saúde, ou seja, um trabalho de educação permanente para os servidores penitenciários. Porque sem ele não tem como a saúde funcionar [...]. Então, foi montado qual que seria esse protocolo mínimo, no caso desde a hora que ele [o preso] chega, que ele entra no presídio, seria feito o exame admissional [...] considerando que ele teria que passar por isso, isso e aquilo..., quais seriam os encaminhamentos. A unidade prisional faria o que e o que isso demandaria para o município, para a rede municipal (G2).

Apesar dos percalços, e justamente pelas condições muitas vezes desfavoráveis, entende-se que as equipes de saúde conseguem atuar e fazer diferença na assistência aos presos - inclusive por ser um trabalho com pouca visibilidade externa. Ao que parece, conseguem atender de modo a controlar a situação dentro do que é sustentável em meio ao que caracterizamos, em outro estudo, como atuação que oscila "entre o cuidado necessário e o possível no contexto prisional" (Barsaglini et al., 2014). Em alguns momentos, por exemplo, diante do aumento dos casos de tuberculose6 em 2013 (Sindespen-MT, 2013b), a situação pode fugir do controle, expressando fragilidade do serviço de saúde, como cita um gestor. O fato é que, nesses casos, não só o setor saúde ganha visibilidade, pela ameaça representada tanto à população não encarcerada, quanto aos trabalhadores locais e outras pessoas que ali transitam (profissionais, visitas), além dos presos que diariamente recebem alvará e retornam à sociedade aberta; como também, a realidade da prisão que, oportunamente, vem à tona.

Os profissionais estão fazendo além da capacidade. Então, partindo do Plano Nacional, se você tem que ter uma equipe mínima até para quinhentos presos e você tem um lugar que tem uma equipe mínima para mil presos significa que essa equipe deveria atender e promover saúde para quinhentas pessoas, mas ela está tentando fazer esse trabalho para mil. A questão da promoção e prevenção deixa a desejar e na assistência trabalha mais o curativo que tende a ser priorizado. [...] Fora isso, eles trabalham em lugar muito estressante com muita pressão por parte de gestão prisional e conseguem atender os casos mais críticos, mais emergenciais, urgentes de saúde. [...] A equipe funciona? Funciona. Atende todas as expectativas e tudo o que está no Plano Nacional e o que é para desenvolver na atenção básica? Ainda não. Mas [...], faz com que uma doença não vire uma epidemia, dando um atendimento mais rápido ao preso, a equipe acaba fazendo o possível (G2).

Ah, eu acho que ela [a assistência] não chega ser nem um "açuquinha", sabe? Infelizmente, tipo assim, vem para impedir que realmente se aflore toda a necessidade de saúde que eles [presos] têm. Aí ele vem ali para tipo tapar o solzinho assim..., mas [com] uma fragilidade, muito incipiente, que não faz. Tanto é o caso aí da tuberculose, que vocês estão assistindo na televisão, né? (G1).

Por fim, e não menos importante, inquirimos os gestores sobre sua visão da instituição penitenciária e a população atendida/presa, pois estamos no plano da percepção, e entendemos que essa percepção alimenta e retroalimenta-se pela experiência e na prática, sendo, também, pautada pelos valores dominantes na nossa sociedade.

No caso em questão, a consideração sobre a população carcerária atendida pelo serviço de saúde, na visão dos gestores, traz a ambiguidade de os presos serem vistos como diferentes por desobedecer à lei, infringir a ordem social, mas, também, como iguais aos demais no que concerne ao direito à saúde a ser provido pelo Estado.

A percepção do preso como "cliente" sugere a utilização de determinado serviço oferecido e a quem se deve atender, no caso, mesmo não sendo qualquer pessoa (mas, que se deve "tratá-los como se fosse..."), o que embute sua anormalidade ou o deslize - legal (e moral), pelo qual já foi julgado pelo órgão competente (a Justiça), não cabendo ao setor saúde refazê-lo. Ressalta-se que a pena é privação da liberdade, sugerindo que ao adentrar a prisão o sujeito é submetido a outros tipos de punição, material ou simbólica (Silva, 2008), mas, também, que sua situação é provisória, pois retornará à sociedade, como citado abaixo.

A refração que a prisão provoca não parece ser somente nos princípios do SUS, como vimos, pois o preso pode passar de réu à vítima nos meandros da instituição. De fato, ele se submeterá tanto às normas oficiais quanto àquelas que regem as relações intra e intercelas impondo-lhe outro lugar (Silva, 2008; Coelho, 2005). Nota-se, também, a referência ao tratamento como "humano", o que insinua que se deve assim tratá-lo, levando a cogitarmos que esse, então, não seria o tratamento costumeiro7.

Como gestor de saúde eu vejo o preso como um cliente - não tem como a gente ter um olhar da sua situação jurídica: "Ah, porque você matou, porque você furtou", né? [...] Porque tem também a vitimização, porque o preso faz todo o trabalho externo ruim [...], ele é o mau fora, mas quando ele chega no presídio ele é vítima e a gente percebe essa característica de vitimização. Mas fora isso, nós temos que dar total acesso e fazer todo um trabalho com as equipes para justamente garantir esse acesso dos presos e tratá-los como se fosse tratar qualquer pessoa. [...] Mesmo sendo um criminoso, embora possa vir a se redimir ou não, você tem que fazer o seu trabalho com esse objetivo, de que ele possa sair de uma unidade penitenciária e seguir sua vida e se redimir, se recuperar, se ressocializar ou qualquer termo que seja, [...] isso é uma hipótese, mas que você trate humanamente mesmo aquele que cometeu um crime (G2).

[...] Que o preso que está hoje lá, é o cidadão que está restrito de liberdade e que vai sair. Ele continua com os direitos dele de ser pessoa. Ele perdeu o direito da liberdade. Mas o direito de pessoa humana ele tem ainda. E tem que ser garantido a ele isso (G1).

O primeiro relato acima, sobre o objetivo do seu trabalho ser o de contribuir para redimir, recuperar, ressocializar o preso e, nesse sentido, devendo esse ser tratado "humanamente" remete à Escola Penal Correcionalista que, conforme afirmam (Vay e Silva, 2012), ainda que enfraquecida em nossa legislação se mantém viva no pensamento de juristas, políticos, policiais e da sociedade em geral. A ideia de que o preso pode ser curado/reformado, como um ser fraco portador de uma patologia social, necessitado de medidas assistenciais que venham sanar sua debilidade se fortaleceria, também, na prática de atendimento de saúde dentro da prisão, entendido como um direito a ser respeitado conforme mencionado pelos gestores. Sendo assim, infligir mais sofrimento, além da privação de liberdade, não atendendo suas necessidades de saúde seria incorrer em um erro.

Há também a informação de que o preso é um desconhecido, ao menos para o setor saúde. Segundo o atual modelo de orientação do SUS, o conhecimento de uma população adscrita permite organizar adequadamente os atendimentos. Contudo, nota-se que o saber produzido sobre os presos pelo poder governamental (quantitativo, numérico), não atende eficazmente às necessidades do setor saúde. Ampliar os conhecimentos sobre os indivíduos nas instituições é fundamental para que o poder disciplinar possa ser exercido e normatize suas condutas (Foucault, 1987). É o que este autor designou prática de exame que cria homogeneidade e não permite ver a pessoa, mas apenas um contingente8.

Esse preso a gente não conhece, ele é uma interrogação no nosso estado e na maioria dos estados brasileiros. A gente sabe dele como um número, nós não sabemos quem é ele pessoa. [...] Para você ter ideia, o banco do Infopen [trata-se do Sistema Integrado de Informação Penitenciária do Ministério da Justiça] que tem todas as características de idade, de nome, de onde que ele veio, quem ele é; agora que entrou para acesso dentro da unidade de saúde. [...] Porque nenhum estado sabia qual que era a fotografia desse preso. Tem uns dados lá, um banco que a gente não tem muito acesso né, que é o Infopen, mas não diz nada para nós como saúde [...].

Quanto à percepção sobre a instituição prisão, os relatos sugerem quem seria o preso e pouca confiança nas possibilidades de recuperação ou de redenção, ainda que ela exista por testemunhar poucos casos. Quando cita "redimir", termo que faz alusão à salvação e libertação, resta saber se seria a libertação da prisão ou de um mundo do crime, parecendo que o preso já estava preso e assim possivelmente continuará... Questões sociais estruturais anteriores à reclusão, o ambiente pouco favorável, aliados às altas taxas de reincidência, apontados por outros estudos (Thompson, 1993; Torossian, 2012), respaldam tal percepção:

A gente fica muito triste quando vê essa realidade nos presídios e faz algumas comparações. Aí, você fala que é depósito de gente; que [penitenciária] não serve para nada, só serve para separar pessoas totalmente marginalizadas com características de pobreza, de falta de estudo, de pessoas que vivem no mundo das drogas. Excluídas das excluídas e que não vão se redimir, mas a partir do momento que a gente visita outras unidades e vê trabalhos positivos a gente percebe que existe uma possibilidade. Não de que ele vá se redimir totalmente, mas que a gente possa oferecer algo digno ou que ele possa, embora encarcerado, viver não sei se dignamente, mas humanamente possível, né? [...]. Para mim, ficar encarcerado já é uma prisão perpétua, mas, para muitos, eles vêm, saem, voltam, saem, retornam, como se aquilo não tivesse impacto na sua vida. Então, [...] a gente tem que entender que em uma boa parte é lugar para simplesmente segregar essas pessoas que estão em conflito com a lei, das demais pessoas e em poucas unidades [há] trabalhos que visam tratar dignamente uma pessoa que cometeu um crime, dessa forma que eu vejo (G2).

A penitenciária recolhe o pessoal que cometeu algum delito. Coloca o indivíduo lá para cumprir uma pena, dependendo do que fez, dependendo de quem está acompanhando seu processo enquanto detido, ele tem que cumprir mais pesadamente essa pena [...], porque a culpabilidade dele, a pena, é pena com mais pena que eu puder. Tem uma proposta de ressocialização [...], porque realmente existem alguns que conseguem fazer [...], que é oferecer a questão da escolaridade [...] tem alguns que terminam até o curso superior, a questão da renda, trabalha a questão da formação profissional, de aprender um ofício e dali fazer uma fonte de renda para ele. Isso existe dentro do presídio. Mas é muito incipiente [...], até a própria Fundação Nova Chance9 [...] trabalha com esse enfoque. [...] Tem tudo isso constituído, mas infelizmente é muito incipiente (G1).

Enfim, entende-se que os recursos humanos são essenciais à efetivação de programas e políticas e admite-se haver uma inter-relação entre as práticas profissionais rotineiras de saúde e as condições econômicas, sociais e simbólicas da existência (Diuana et al., 2008).

Considerações finais

O PNSSP e, recentemente, sua proposição como política, representou avanço significativo na atenção à população encarcerada, porém, sua operacionalização, ainda que relevante, mostra-se incipiente no estado, na percepção dos gestores.

A concentração da gestão na Sejudh/MT, inclusive com profissionais de saúde vinculados a ela, e não à SES/MT, sugere que a parceria estabelecida cumpre funções mais burocráticas do que operacionais. De fato, nota-se predomínio de autonomia nas decisões de gestão da saúde pela Sejudh/MT, e certo compartilhamento com a SES/MT em momentos pontuais, como quando implicam assuntos comuns nessa dimensão ou diante de situações que requerem competências técnicas específicas de saúde para as quais a instituição possui legitimidade. É compreensível que o encontro de instituições e sujeitos historicamente diferentes, gere tensões, mas, também, pode promover aprendizagem institucional que subsidia o aprimoramento do processo. Para tanto, a reflexividade é importante e não é natural, devendo ser incitada pelos envolvidos e reiterada a corresponsabilidade formalmente pactuada.

Dessa forma, os gestores nos apontam entraves à operacionalização do PNSSP, mas, também, os avanços, mostrando a não passividade e a criatividade diante deles que podem trazer inovações à gestão. Um ponto que merece destaque refere-se às incongruências nos valores que regem um e outro setor, onde segurança, disciplina, questões jurídicas na prática se tensionam com o direito ao atendimento à saúde de todo cidadão, independentemente da sua condição social. Parece que o contexto prisional imprime peculiaridades à assistência que se refletem na gestão, pois ora empreendem-se adequações mobilizando o princípio da equidade diante do diferente, ora o compromete.

As necessidades de saúde dos presos que não são supridas internamente requerem referência, e encontram entraves institucionais não somente pela organização dos serviços, mas pelas barreiras de discriminação à população atendida/presa, por vezes envoltas em nuances tecnicistas e burocráticas, afetando, assim, o direito à saúde. Então, qual integralidade seria ali possível? Qual promoção da saúde? Tal dessincronia pode afetar a gestão que deve acautelar-se para que o não cuidado não venha compor a punição.

A prisão lida com a privação de liberdade dos presos, mas, por vezes, parece se estender aos profissionais (da assistência e da gestão), colocando os gestores diante de dilemas entre o cuidado necessário, o possível e o direito à saúde de todo cidadão.

Referências

  • ARRUDA, M. B. As engrenagens da cidade: centralidade e poder em Cuiabá na segunda metade do século XX. Cuiabá: UFMT: Carlini & Caniato, 2010.
  • BARCINSKI, M. M. A.; ALTENBERND, B.; CAMPANI, C. C. Entre cuidar e vigiar: ambiguidades e contradições no discurso de uma agente penitenciária. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 7, p. 2245-2254, 2014
  • BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2011.
  • BARSAGLINI, R. A.; ARRUDA, M. B.; LOPES, V. A. Saúde penitenciária: experiência de profissionais atuantes na atenção em unidades prisionais de Cuiabá/MT e na gestão das ações no nível central (SES-MT e SEJUDH-MT). Relatório de pesquisa/Capes. Instituto de Saúde Coletiva - Universidade Federal de Mato Grosso, 2015.
  • BARSAGLINI, R. A. et al. Trabalhadores de saúde em penitenciárias em Cuiabá/MT: perfil dos profissionais e impressões sobre a instituição. In: CONGRESSO INTERNACIONAL REDE UNIDA, 11., Fortaleza, Fortaleza, 2014. Resumo. Disponível em: <Disponível em: http://conferencias.redeunida.org.br/ocs/index.php/redeunida/RU11/paper/view/702 >. Acesso em: 15 dez. 2014.
    » http://conferencias.redeunida.org.br/ocs/index.php/redeunida/RU11/paper/view/702
  • BITENCOURT, C. R. Tratado de direito penal: parte geral 1. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
  • BRASIL, Ministério da Saúde. Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário. 2. ed. Brasília, DF, 2005.
  • BRASIL. Portaria Interministerial nº 1, de 2 de janeiro de 2014. Institui a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP) no âmbito do SUS. Diário Oficial da União, nº 2, Brasília, DF, 3 jan. 2014, p. 18-19.
  • CARRARA, S. Singularidade, igualdade e transcendência: um ensaio sobre o significado social do crime. Revista Brasileira de Ciências SociaisRio de Janeiro, v. 6, n. 16, p. 80-88, 1991.
  • CARRARA, S. Crime e loucura: o aparecimento do manicômio judiciário na passagem do século. Rio de Janeiro: EdUerj, 1998.
  • CASTIEL, L. D. O buraco e o avestruz: ensaios sobre a singularidade do adoecer humano. Campinas: Papirus, 1994.
  • COELHO, E. C. Oficina do diabo e outros estudos sobre criminalidadeRio de Janeiro: Record, 2005.
  • DIUANA, V. et al. Saúde em prisões: representações e práticas dos agentes de segurança penitenciária no Rio de Janeiro. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 8, p. 1887-1896, 2008.
  • DRAIBE, S. M. Uma nova agenda social na América Latina?: pontos de partida para análise comparada dos sistemas de proteção social e suas mudanças recentes. In: SOLA, L.; LOUREIRO, M. R. (Org.). Democracia, mercado e Estado: o B de Brics. Rio de Janeiro: FGV, 2011. p. 249-288.
  • FOUCAULT, M. História da loucura na Idade ClássicaSão Paulo: Perspectiva, 1978.
  • FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 16. ed. Petrópolis: Vozes, 1987.
  • FOUCAULT, M. Os anormais. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
  • GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
  • GOIS, S. M. et al. Para além das grades e punições: uma revisão sistemática sobre a saúde penitenciária. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 5, p. 1235-1246, 2012.
  • GRECO, P. B. T. Distúrbios psíquicos menores em agentes socioeducadores dos Centros de Atendimento Socioeducativo do Rio Grande do Sul. 2011. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) - Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Ciências da Saúde, Santa Maria, 2011.
  • GUIMARÃES, M. C. L. et al. Avaliação da capacidade de gestão de organizações sociais: uma proposta metodológica em desenvolvimento. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 6, p. 1642-1650, 2004.
  • LOPES, V. A. Experiência de profissionais de saúde em unidade prisionais em Cuiabá/MT. 2014. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) - Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2014.
  • MATO GROSSO. Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Plano de Modernização do Sistema Penitenciário 2010-20Cuiabá, 2010a. Disponível em: <Disponível em: http://www2.mp.pr.gov.br/cpcrime/boletim82/cep_b82_n_11.doc >. Acesso em: 10 abr. 2014.
    » http://www2.mp.pr.gov.br/cpcrime/boletim82/cep_b82_n_11.doc
  • MATO GROSSO. Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso. Superintendência de Políticas de Saúde. Plano Estadual de Saúde de MT 2008-2011. Cuiabá, 2010b. Disponível em: <Disponível em: http://www.saude.mt.gov.br/arquivo/2909 >. Acesso em: 20 abr. 2014.
    » http://www.saude.mt.gov.br/arquivo/2909
  • MATO GROSSO. Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Diagnóstico setorial e avaliação dos programas da SEJUDH/MT: insumos para o Plano Plurianual 2012-2015. Cuiabá, 2011a. Disponível em: <Disponível em: http://www.sejudh.mt.gov.br/UserFiles/File/SEJUDH/DIAGNOSTICO%20SOCIAL%20-%20SEJUDH%20OFICIAL.pdf >. Acesso em: 20 abr. 2014.
    » http://www.sejudh.mt.gov.br/UserFiles/File/SEJUDH/DIAGNOSTICO%20SOCIAL%20-%20SEJUDH%20OFICIAL.pdf
  • MATO GROSSO. Conselho Estadual de Saúde. Ata da ducentésima sexagésima terceira reunião do CES-MT: 9 de novembro de 2011. Cuiabá, 2011b. Disponível em: <Disponível em: www.saude.mt.gov.br/arquivo/3454 >. Acesso em: 10 jan. 2013.
    » www.saude.mt.gov.br/arquivo/3454
  • MATO GROSSO. Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso. Relatório de gestão: gerência de saúde do sistema penitenciário, Sejudh/MT. Cuiabá, 2012. Disponível em: <Disponível em: http://www.sejudh.mt.gov.br/saap2.php?IDCategoria=772 >. Acesso em: 16 jul. 2014.
    » http://www.sejudh.mt.gov.br/saap2.php?IDCategoria=772
  • MATO GROSSO. Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso. Plano Estadual de Saúde de MT 2012-2015 - Superintendência de Políticas de Saúde. Cuiabá, 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.saude.mt.gov.br/upload/documento/249/versao-final-da-oficina-pes-2012-2015_030511-[249-160511-SES-MT].pdf >. Acesso em: 12 abr. 2014.
    » http://www.saude.mt.gov.br/upload/documento/249/versao-final-da-oficina-pes-2012-2015_030511-[249-160511-SES-MT].pdf
  • MATO GROSSO. Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos. Secretaria Adjunta de Administração Penitenciária: nossas unidades. Cuiabá, 2014. Disponível em: <Disponível em: http://www.sejudh.mt.gov.br/saap2.php?IDCategoria=395 >. Acesso em: 16 jul. 2014.
    » http://www.sejudh.mt.gov.br/saap2.php?IDCategoria=395
  • MORAES, P. R. B. A identidade e o papel dos agentes penitenciários. Tempo Social: Revista de Sociologia da USP, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 131-147, 2013.
  • REBELO, F.; CAPONI, S. A medicalização do crime: a penitenciária de Florianópolis como espaço de saber e poder (1933-1945). Interface: Comunicação, Saúde, Educação, v. 11, n. 22, p. 193-206, 2007.
  • ROSA, A. Detento é encontrado morto em cela da PCE; suspeita é de overdose. Midianews, Cuiabá, 29 maio 2014. Disponível em:<Disponível em:http://www.midianews.com.br/conteudo.php?sid=25&cid=199099 >. Acesso em: 30 maio 2014.
    » http://www.midianews.com.br/conteudo.php?sid=25&cid=199099
  • RUMIN, C. R. et al. O sofrimento psíquico no trabalho de vigilância em prisões. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, DF, v. 31, n. 1, p. 188-199, 2011.
  • SILVA, A. M. C. Nos braços da lei: o uso da violência negociada no interior das prisões. Rio de Janeiro: E+A, 2008.
  • SILVA, P. L. B.; MELO, M. A. B. O processo de implementação de políticas públicas no Brasil: características e determinantes da avaliação de programas e projetos. Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, Campinas, Cad. 48, p. 01-16, 2000.
  • SINDESPEN-MT. Conquista: governo do Estado publica pagamento de insalubridade para servidores penitenciários. Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado de Mato Grosso. Cuiabá, 3 out. 2013a. Disponível em: <Disponível em: http://www.sindspenmt.com.br/noticia_ver.php?id=54 >. Acesso em: 12 jul. 2014.
    » http://www.sindspenmt.com.br/noticia_ver.php?id=54
  • SINDESPEN-MT. Tuberculose: 10% dos pacientes em Mato Grosso são presos da Penitenciária Central do Estado. Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado de Mato Grosso. Cuiabá, 4 out. 2013b. Disponível em: <Disponível em: http://www.sindspenmt.com.br/noticia_ver.php?id=56 >. Acesso em: 12 jul. 2014.
    » http://www.sindspenmt.com.br/noticia_ver.php?id=56
  • SPOSATI, A. Exclusão social abaixo da linha do Equador. In: VERAS, M. P. B. (Org.). Por uma sociologia da exclusão social: o debate com Serge Paugam. São Paulo: Educ, 1999. p. 128-133.
  • TANAKA, O. Y.; TAMAKI, E. M. O papel da avaliação para a tomada de decisão na gestão de serviços de saúde. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 4, p. 821-828, 2012.
  • TEIXEIRA, C. F. et al. Produção científica sobre política, planejamento e gestão em saúde no campo da saúde coletiva: visão panorâmica. In: PAIM, J. S.; ALMEIDA-FILHO, N. (Org.). Saúde Coletiva: teoria e prática. Rio de Janeiro: MedBook, 2014. p. 585-594.
  • THOMPSON, A. A questão penitenciária. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993.
  • TOROSSIAN, M. S. Análise sobre a reincidência criminal na abordagem comportamental. Revista Eletrônica do CEAF, Porto Alegre, v. 1, n. 2, p. 01-07, 2012. Disponível em: <Disponível em: http://www.mprs.mp.br/areas/biblioteca/arquivos/revista/edicao_02/vol1no2art1.pdf >. Acesso em: 6 maio 2014.
    » http://www.mprs.mp.br/areas/biblioteca/arquivos/revista/edicao_02/vol1no2art1.pdf
  • UCHIMURA, K. Y.; BOSI, M. L. M. Qualidade e subjetividade na avaliação de programas e serviços em saúde. Cadernos de Saúde PúblicaRio de Janeiro, v. 18, n. 6, p. 1561-1569, 2002.
  • VAY, G. S.; SILVA, T. M. A escola correcionalista e o direito protetor dos criminosos. Revista LiberdadesSão Paulo, n. 11, p. 69-89, set./dez. 2012.
  • 1 Pesquisa financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), sob o Processo n. 23038.007708/2011, subprojeto "Saúde penitenciária: experiência de profissionais atuantes na atenção em unidades prisionais de Cuiabá/MT e na gestão das ações no nível central" (Barsaglini; Arruda; Lopes, 2015).
  • 2
    Para detalhamento sobre a relação entre crime e loucura, baseada principalmente nos escritos de Michel Foucault, sugerimos consultar (Carrara, 1998), e sobre a fundamentação das distintas escolas penais remetemos à (Bitencourt, 2012).
  • 3
    Formalmente as penitenciárias deveriam abrigar presos condenados e em cumprimento de pena, cabendo às cadeias os provisórios aguardando julgamento, mas é fato não só em Mato Grosso a presença de um e outro nas unidades. Ambas, no entanto, caracterizam-se pelo regime fechado.
  • 4
    Vincula-se à SES/MT e não integra o sistema prisional. Abriga pessoas em medida de segurança e situa-se no espaço da Penitenciária Central do Estado (Mato Grosso, 2010a). É assim designada distinguindo-se da "enfermaria" onde a equipe de saúde atua e, em visita em outubro de 2013, tinha ocupadas dezoito das suas vinte e oito vagas.
  • 5
    A Sejudh/MT é um dos sete órgãos que compõem o Núcleo de Segurança do Estado (Mato Grosso, 2010a).
  • 6
    A alta incidência da tuberculose é conhecida nas unidades prisionais, e o estado do Mato Grosso não escapa a esta tendência, porém, questiona-se as motivações de tal incremento então noticiado, seja a busca ativa, os casos de coinfecção, as preocupações das repercussões políticas pelo fato da capital sediar evento mundial de futebol em 2014. De qualquer modo, mereceria análise específica que foge ao objetivo desta pesquisa.
  • 7
    Não é desconhecida a situação de grande parte dos presídios e dos presos no Brasil, que somente vem à tona nos "grandes" acontecimentos, como o massacre do Carandiru, em 1992, as rebeliões coordenadas em 2006 e, recentemente, a rebelião no Maranhão, no final de 2013. Em Mato Grosso, uma matéria de jornal local fornece pistas de como pode ser a situação ao noticiar a morte de um preso por overdose decorrente de ingestão supostamente forçada da "bebida da morte" (bebida alcoólica com cocaína) informando que "na cela, havia mais de quarenta presos e ninguém soube explicar o que ocorreu" (Rosa, 2014).
  • 8
    Compilar e quantificar dados da população presa caracterizava a atuação do poder público da, então, Secretaria do Interior e Justiça de Mato Grosso desde os anos 1970. Em 1971 houve um cadastro e uma classificação geral dos presos das cadeias públicas com dados sobre crime praticado, sexo, estado civil, procedência, cor, profissão e idade. Assim, "ao levantar os traços individuais de cada preso, agrupá-los e transformá-los em dados estatísticos homogeneizando-os, a polícia fazia do preso um objeto de conhecimento. Ao mesmo tempo definia um perfil do criminoso e criava uma individuação necessária ao exercício do seu poder" (Arruda, 2010, p. 110).
  • 9
    Instituição governamental, criada em 2008, vinculada à Sejudh/MT que atua nos eixos da educação e do trabalho visando a ressocializar o preso (regimes fechado e semiaberto) e atender a sua família, por meio de ações no âmbito social, profissionalizante, de saúde, educação e assistência social. Viabiliza a comercialização dos materiais produzidos pelo preso que receberá pelo seu trabalho, nos termos da Lei de Execuções Penais, além do benefício da redução da pena: a cada três dias trabalhados, diminui um dia de sua pena (Mato Grosso, 2011a).
  • 10
    For details on the relationship between crime and madness, based mainly on the writings of Michel Foucault, we suggest consulting (Carrara, 1998), and on the basis of distinct criminal studies refer to (Bitencourt, 2012).
  • 11
    Formally prison units should house prisoners that have been convicted and are serving a sentence, leaving to the jailhouses to hold the temporaries awaiting trial, but the presence of some in units is true not only for Mato Grosso. Both, however, are characterized by the closed regime.
  • 12
    It is linked to the SES/MT and does not integrate the Prison System. It receives people under preventive detention and is located within the Central State Penitentiary (Mato Grosso, 2010a). It is so named to distinguish it from the "infirmary" where the health team works and, in a visit in October 2013, had eighteen its twenty-eight spots occupied.
  • 13
    The Sejudh/MT is one of seven agencies that make up the State Security Unit (Mato Grosso, 2010a).
  • 14
    The high incidence of tuberculosis is known in the penitentiaries, and the State of Mato Grosso is no exception to this trend, however, we question the motives of this increase reported, whether an active search, cases of coinfection, the concerns of political repercussions because the capital hosted a World Cup event in 2014. Anyway, it deserves specific analysis that is beyond the purpose of this research.
  • 15
    The situation of many penitentiaries and prisoners in Brazil is not known, they only comes up when "big" events happen such as the massacre of Carandiru, in 1992, coordinated rebellions in 2006 and recently the rebellion in Maranhão, in late 2013. In Mato Grosso, a local newspaper material provides clues as to how this situation might be in reporting the death of an inmate by overdose resulting from an allegedly forced ingestion of the "death drink" (alcoholic drink with cocaine) stating that "in the cell, there were more than forty prisoners and no one could explain what happened" (Rosa, 2014).
  • 16
    Compile and quantifying data of the prison population was the responsibility of the government, of the former Secretaria do Interior e Justiça of Mato Grosso since the 1970s. In 1971, an overall registration and classification of the inmates in public penitentiaries with data on the crime committed, sex, marital status, origin, color, profession, and age. Thus, "by discovering the individual traits of each prisoner, grouping them and turning them into statistics by homogenizing them, the police made of the prisoner an object of knowledge. At the same time created a criminal profile and the necessary individualization for the exercise of their power" (Arruda, 2010, p. 110).
  • 17
    Government institution, created in 2008, linked to Sejudh/MT operating in the axes of education and labor with the aim of re-socializing the prisoner (of both closed and semi-open regimes) and serving their families, through social actions of professional, health, education, and social assistance. It enables the sale of the materials produced by the prisoner who will receive for their work, under the Law of Criminal Executions, beyond the benefit of sentence reduction: every three days worked, decreases a day of his sentence (Mato Grosso, 2011a).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    25 Jul 2014
  • Revisado
    26 Nov 2014
  • Aceito
    29 Jan 2015
location_on
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. Av. dr. Arnaldo, 715, Prédio da Biblioteca, 2º andar sala 2, 01246-904 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: +55 11 3061-7880 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: saudesoc@usp.br
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Acessibilidade / Reportar erro