Resumo
Atualmente a obesidade é considerada um dos maiores desafios da saúde pública. Ela vem sendo enfrentada a partir do incentivo de mudanças comportamentais individuais, exaltando a perda de peso como forma inquestionável de garantir saúde. Tendo em vista este contexto e a importância das Diretrizes brasileiras de obesidade sobre o campo da obesidade, sua influência sobre a prática profissional, o tipo de tratamento incentivado e o processo decisório em relação aos corpos gordos, foi realizada uma análise deste documento, associada à emergente discussão de como o discurso da saúde justifica e reproduz a gordofobia da sociedade. A análise se deu primeiramente em relação à patologização do corpo gordo e como isto é acompanhado de uma valorização do corpo magro. Em seguida, discute-se a abordagem normativa do peso, que propõe intervenções individuais sempre focadas na perda de peso. Pode-se notar que o discurso presente nas Diretrizes reforça a saúde inerente dos corpos magros, reproduz estereótipos relacionados ao corpo gordo e relaciona diretamente quilos perdidos com melhor nível de saúde.
Palavras-chave: Gordofobia; Obesidade; Gordo; Patologização; Perda de Peso
Abstract
Obesity is now considered one of the greatest public health challenges of the 21st century and has been fought against with the promotion of individual behavioral changes, glorifying weight loss as an unquestionable way to ensure health. Given this context and the importance of the Brazilian Guidelines for Obesity on the obesity field, its influence on professional practice, on the type of treatment that is to be encouraged and on the decision-making process concerning fat bodies, an analysis of this document was performed, as it is associated with an emerging discussion on how the health discourse justifies and reproduces anti-fat bias in society. The analysis first concerned the pathologization of fat bodies and how this is accompanied by a valuation of lean bodies. It is then followed by a discussion on the normative approach of weight, which proposes individual interventions that are always focused on weight loss. The discourse present in these guidelines reinforces the inherent health of lean bodies, reproduces stereotypes related to fat bodies, and directly relates lost pounds to better health.
Keywords: Anti-fat Bias; Obesity; Fat; Pathologization; Weight Loss
Nos últimos 20 anos, a América Latina tem passado por uma rápida transição epidemiológica e nutricional, caracterizada pelo aumento da prevalência do sobrepeso e obesidade, e a diminuição da desnutrição, devido a mudanças como industrialização, urbanização, sedentarismo e mudanças de hábitos alimentares (Silva, 2017). Consequentemente, diversos estudos vêm associando a influência da obesidade no perfil de morbidade e mortalidade da população devido às altas incidências de doenças cardiovasculares, câncer e diabetes (Ferreira, 2014; Kruse et al., 2012).
A partir dos anos 1980, a obesidade começou a ganhar destaque na agenda pública internacional como questão de saúde pública. Isso ocorreu a partir da institucionalização da temática e a elevação do seu estatuto epidemiológico para o grau de epidemia (Dias et al., 2017; Poulain, 2013; Seixas; Birman, 2012). Segundo Poulain (2013), essa institucionalização se deu pela criação de diversas entidades, como a National Obesity Society e a International Obesity Taskforce (IOTF); pela realização do primeiro congresso internacional em 1974; pela publicações de relatórios pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1990; e pela criação de associações para o estudo da obesidade. No Brasil, foi fundada, em 1986, a Associação Brasileira para o estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).
Tornou-se comum a utilização da expressão “epidemia mundial”. A palavra epidemia está associada, de modo geral, a doenças contagiosas. A obesidade seria a primeira epidemia não infecciosa da história, talvez para exagerar a ideia de que qualquer pessoa pode “pegá-la” (Poulain, 2013; Seixas; Birman, 2012). Justificada pelo seu caráter global, a obesidade vem sendo tratada enquanto condição dramática pela midiatização alarmista, como se fosse um desastre iminente (Poulain, 2013; Seixas; Birman, 2012). Como uma epidemia instalada de forma apocalíptica, logo se constitui o “combate à obesidade”, a que usualmente estão associadas campanhas de perseguição e extermínio, como o combate à corrupção, à prostituição infantil e às drogas (Rigo; Santolin, 2012). O que induz um cenário de guerra contra a obesidade que pode facilmente se tornar uma guerra contra as pessoas gordas, a partir de ações discriminatórias e julgamentos (Farrell, 2011).
Outro motivo pelo qual a obesidade é considerada um dos maiores desafios da saúde pública do século XXI é o seu impacto econômico sobre os sistemas de saúde (Ferreira, 2014). Dessa forma, a pessoa gorda é vista como um fardo, pois demanda mais dos cofres públicos do que alguém com peso normal (Palma et al., 2012). Não por acaso, “é frequente ouvir em programas de notícias na televisão que pessoas obesas custaram aos cofres públicos X reais” (Rangel, 2018, p. 114). Ou seja, devido a esses supostos prejuízos, as pessoas gordas têm a obrigação de emagrecer (Rigo; Santolin, 2012).
Desse modo se intensifica o foco nas ações comportamentais, e a saúde pública “passa a enfatizar mais ainda a responsabilidade individual e a autodisciplina no ambiente político neoliberal, que se ajusta bem às medidas de austeridade diante das crises financeiras globais” (Castiel; Moraes; Paula, 2016, p. 104). Fomentar mudanças comportamentais individuais tem baixo custo e não confronta a indústria de alimentos, pelo contrário: até mesmo estimula o mercado dos industrializados maquiados de saudáveis como produtos diet, light, com adição de fibras, entre outras estratégias de marketing (Dias et al., 2017).
Por conseguinte, o conhecimento científico acaba disseminando um rol de soluções simplistas para fenômenos complexos, aplicando-o de forma reducionista, patologizante e totalmente direcionado ao âmbito biológico e comportamental. Isso é utilizado na regulação moral que parte dos profissionais de saúde, ao julgarem indivíduos saudáveis como responsáveis e aqueles que adoecem como irresponsáveis. Os que adoecem são criticados pela sua falta de autocuidado e são considerados negligentes em relação a sua saúde, gerando sensações de remorso, arrependimento e vergonha, como se tivessem cometido um pecado. O medo do ridículo e da inadequação funciona como um inibidor de certas atitudes; por isso, o autocuidado funciona como um controle social informal, no sentido da higiene comportamental, que torna os “indivíduos pessoalmente responsáveis pela gestão de riscos socialmente gerados” (Castiel; Álvarez-Diaz, 2007, p. 61).
Considerando esse contexto, este artigo analisou o documento Diretrizes brasileiras de obesidade publicado pela Abeso, que é uma sociedade multidisciplinar sem fins lucrativos e que reúne diversas categorias profissionais envolvidas com o estudo da obesidade, da síndrome metabólica e dos transtornos alimentares. A Abeso trabalha com a perspectiva de propagar que a obesidade é uma doença grave que precisa de prevenção, diagnóstico e tratamento precoce. A associação atua no sentido de ser uma fonte de informações científicas sobre obesidade. Em função disso, publicou as Diretrizes brasileiras de obesidade, atualizadas em 2016, que contêm recomendações baseadas em evidências científicas da melhor qualidade disponível (Abeso, 2016).
De acordo com a Abeso, as Diretrizes desenvolvidas pretendem melhorar a prática médica a partir de recomendações práticas, viáveis, clinicamente flexíveis e de fácil utilização. Por isso, as Diretrizes podem ser utilizadas como base para a regulamentação de procedimentos nos serviços de saúde e para embasar a tomada de decisão dos profissionais (Abeso, 2016). Considerando a importância dessas Diretrizes sobre o campo da saúde, sua influência sobre a prática profissional, o tipo de tratamento incentivado e o processo decisório em relação aos corpos gordos, justifica-se a análise deste documento a fim de refletir sobre o modo como os documentos de saúde acabam por justificar e reproduzir a gordofobia, o que se reflete nas políticas públicas, nos serviços de saúde e na prática profissional.
Mas o que seria a gordofobia? Segundo Rangel (2018, p. 19), a gordofobia “é utilizada para denominar o preconceito, estigmatização e aversão englobados por meio de uma opressão estrutural na sociedade que atinge as pessoas gordas”.
[É] uma forma de discriminação estruturada e disseminada nos mais variados contextos socioculturais, consistindo na desvalorização, estigmatização e hostilização de pessoas gordas e seus corpos. As atitudes gordofóbicas geralmente reforçam estereótipos e impõem situações degradantes com fins segregacionistas; por isso, a gordofobia está presente não apenas nos tipos mais diretos de discriminação, mas também nos valores cotidianos das pessoas. (Arraes, 2014 apud Silva, Cantisani, 2018, p. 372)
A desvalorização e a estigmatização podem ser exemplificadas por diversos (pré) julgamentos que pressupõem que a pessoa gorda é deprimida, descontrolada, fracassada e descuidada, preconceitos tão naturalizados que a própria pessoa gorda incorpora uma imagem de si inapta e doente. Outro imaginário gordofóbico é o da inaptidão física do corpo gordo, o qual usualmente é visto como um corpo sedentário, preguiçoso e incapaz de realizar atividades físicas. Ou seja, a gordofobia está impregnada na nossa concepção de corpo, projetando limitações, culpa e exclusão das pessoas gordas (condenadas ao exílio). Essa exclusão está enraizada até mesmo na percepção das pessoas gordas de que seu próprio corpo não merece ser vivido, sempre buscando modos de fugir dele na contínua possibilidade (ou obrigação) de emagrecer, afinal ser gordo é um problema reversível (Piñeyro Bruschi, 2016).
Porém, a gordofobia ainda nem é reconhecida enquanto uma opressão. Segundo Poulain (2013), ela é vista como uma questão de saúde e, por isso, é um preconceito mais aceito devido ao discurso médico que o legitima. Pois o atual discurso da saúde associa a magreza ao cuidado com o corpo, motivo pelo qual o corpo magro é considerado garantia de saúde e, por consequência, é visto como adequado/normal. O discurso científico aborda a obesidade como uma doença e formaliza o emagrecimento como uma questão de saúde. Por esse viés, a área da saúde declara guerra contra a obesidade e a justifica pela aparente preocupação com a saúde da população. “A justificativa mais comum ao questionar o corpo do outro é a da preocupação com sua saúde” (Rangel, 2018, p. 25).
Todo esse discurso em torno da obesidade visa realmente o bem-estar das pessoas gordas? Os documentos de saúde podem justificar e reproduzir gordofobia? Essas perguntas servirão como guia das duas análises das Diretrizes brasileiras de obesidade (2016). A primeira em relação à patologização do corpo gordo, isto é, ao modo como é realizado o diagnóstico, a discussão dos riscos, a criação da categoria sobrepeso e o modo como isto está acompanhado de uma valorização do corpo magro e da sua inquestionabilidade enquanto saudável. E a segunda em relação à abordagem normativa de peso, que propõe intervenções individuais sempre focadas na perda de peso, como dietas restritivas, fármacos e cirurgia bariátrica, acompanhadas do automonitoramento.
Patologização do corpo gordo
A patologização do corpo gordo é um discurso atualmente consolidado, inquestionável e fundamentado pelas ideias de sobrepeso e obesidade. A obesidade é definida de forma simplista pela OMS como o acúmulo anormal ou excessivo de gordura corporal, que afeta e prejudica a saúde. Segundo a Portaria nº 424, de 19 de março de 2013, a obesidade é uma condição crônica e um fator de risco para outras doenças. A Abeso considera a obesidade uma doença grave, conforme explicitado na sua missão. Conforme Poulain (2013), a obesidade foi oficialmente integrada à Classificação Internacional de Doenças (CID) em 1990. Anteriormente, ela era considerada um fator de risco - pois as pessoas não morrem de obesidade, mas, sim, de doenças favorecidas por ela. Isso, de acordo com o autor, demarca a alteração de seu estatuto epidemiológico.
Em 1995, o Índice de Massa Corporal (IMC) foi proposto enquanto parâmetro de diagnóstico universal da obesidade e condição necessária para definir a obesidade como doença. A generalização do IMC demonstra uma modificação radical, porque, a partir dele, tem-se uma definição quantitativa para a obesidade, definida por um índice de massa corporal igual ou superior a 30. A partir do IMC, é possível identificar o quanto a pessoa se afasta do padrão de normalidade - já que normal é ter o corpo magro -, tendo no biológico o elemento essencial para definir o que seria um desvio da normalidade. Assim, anormal é ter o corpo gordo.
Essa difusão sem precauções apresenta o risco de se transformar num instrumento de “norma médica” em um sistema classificatório de “norma social” (Poulain, 2013). Assim, um fenômeno social (a existência de corpos gordos) é vivido pelas pessoas como uma doença, deixando de ser apenas um atributo físico no momento em que foi associado ao imaginário estigmatizado do corpo anormal e não saudável construído por valores socioculturais e discursos científicos que impõem expectativas em torno do que seria o normal e saudável (Ferreira, 2014).
Logo, a norma não produz apenas médias estatísticas, mas carrega também aquilo que é considerado desejável num momento histórico de determinada sociedade, o que é adequado e deve ser incorporado por todos como norma. Quando o indivíduo não alcança e ameaça o tipo ideal de corpo, sua atitude é entendida como negligência e é produzida uma forte exclusão social em relação aos corpos gordos, que são discriminados, rejeitados e culpabilizados.
Esta patologização fica evidente nas Diretrizes da Abeso que consideram a obesidade como o prenúncio da morte precoce e do desenvolvimento de outras doenças (evitáveis), conforme o trecho: “tendência a encurtar a vida, abrindo caminho para perigosas enfermidades” (Abeso, 2016, p. 22). Além disso, “a corpulência não é apenas uma enfermidade em si, mas o prenúncio de outras. A morte súbita é mais comum naqueles que são naturalmente gordos do que nos magros” (Abeso, 2016, p. 10), o que de certa forma reforça a crença na longevidade e ausência de doenças dos corpos magros.
A inquestionabilidade da saúde das pessoas magras é um exemplo de gordofobia, pois estas acabam vivendo em situação de privilégio e, mesmo que de forma involuntária e inconsciente, se beneficiam dessa opressão. É possível exemplificar a valorização do corpo magro e sua inquestionabilidade enquanto sinônimo de saúde nas Diretrizes brasileiras de obesidade, onde pode ser acessada a tabela de classificação internacional da obesidade segundo o IMC e o risco de doenças crônicas/mortalidade. Nas Diretrizes de 2009/2010, o IMC menor que 18,5 (classificado como “baixo peso”) possuía “baixo” risco de comorbidades (Abeso, 2009, p. 11).
A falta de especificação torna incerto o que a tabela está propondo como associação: seriam doenças associadas à obesidade? Ou riscos à saúde acarretados pela IMC? Lembrando que o conceito de doença crônica é muito abrangente, as Diretrizes não especificam a quais doenças está se referindo. De forma imprudente, a tabela pode transmitir a falsa ideia de que a magreza possui baixo risco, sem apontar que o baixo peso está associado à desnutrição; afeta o crescimento físico e o desenvolvimento cognitivo; favorece o aparecimento de doenças infectocontagiosas e degenerativas; e limita a capacidade física (Guedes et al., 2013). Ele também pode estar associado a transtornos alimentares, osteoporose, má nutrição, deficiências nutricionais e maior risco de mortalidade (Strawbridge; Wallhagen; Shema, 2000).
Como indicado pela Abeso, essa tabela é baseada no relatório Obesidade: prevenindo e gerenciando a epidemia global, da OMS de 2000, que indica que o baixo peso possui riscos “elevados” de outros problemas clínicos. Por que, então, omitir essa informação? Essa simplificação apenas estimula a ideia de que quanto mais magro melhor, pois até mesmo com o peso abaixo da eutrofia o indivíduo possui menor risco de adoecimento e, portanto, maior saúde. Fica nítido a valorização do corpo magro independentemente do seu afastamento das fronteiras do peso normal, pois o ideal é ser o mais magro possível, de acordo com a Abeso. Na tabela, o “peso normal” está associado ao risco “médio” de comorbidades, ou seja, é menos arriscado estar com “baixo peso” do que com o peso ideal. Esta tabela fica ainda mais confusa, pois na indicação de “sobrepeso” não está determinado o risco de comorbidades, porém esta categoria entra na população-alvo das intervenções e, para ele, é indicado o mesmo tratamento da obesidade, aspecto que vamos aprofundar mais à frente.
Na tabela das Diretrizes de 2016, o IMC menor que 18,5 (classificado como “magro” ou “baixo peso”) possui risco de doença “normal ou elevado” (Abeso, 2016, p. 16), mostrando mudança em relação à edição anterior, em que era mais explícita a valoração da magreza. Entretanto, esta ideia se mantém, pois inclui a magreza na categoria de normalidade, reforçando que o corpo magro é uma forma de expressão natural da diversidade corporal. Isto não se dá no caso do sobrepeso, que apresenta maior aproximação com o corpo gordo e, assim, torna-se alvo das mesmas recomendações e controle, pois nessa versão está associado ao risco “pouco elevado” de doença.
Atualmente, tem-se outorgado o direito de intervenção ao sobrepeso munido do discurso do risco, tomando o risco como uma categoria de pré-doença - até porque o sobrepeso já é considerado uma forma de pré-obesidade (Rigo; Santolin, 2012). Afinal, “o desvio deve ser reprimido, os indivíduos devem ser medicalizados e normalizados” (Gaudenzi; Ortega, 2012, p. 25). Consequentemente, nas políticas públicas o sobrepeso aparece anexado à obesidade de forma que as recomendações para prevenção e tratamento são praticamente as mesmas. Esta falta de diferenciação entre pré-patogênico e a própria doença cria o perigo da iatrogenia, pois reforça o medo de engordar e permite medicalizar até mesmo uma situação fora dos critérios diagnósticos.
Isto porque os “fatores de risco estão sendo manejados na prática clínica como se fossem doenças em geral, doenças crônicas. Nesse processo, a diferença entre prevenção e cura está se tornando cada vez mais apagada” (Tesser, 2017, p. 7). Segundo Poulain (2013), há o risco da luta contra a obesidade se voltar contra o sobrepeso, justificando a busca obsessiva e irrealista pela perda de peso. Dessa maneira, amplia-se a população de risco, o que se justifica porque nada é mais lucrativo do que tratar (pré) doenças, intervir em assintomáticos, prevenir o saudável de adoecer e medicalizar a culpa, expondo estas pessoas a potenciais danos (Tesser, 2017). Mas, afinal, por que unir sobrepeso e obesidade? A disseminação da categoria “excesso de peso”, que agrega sobrepeso e obesidade, é outra forma de avolumar a epidemia. No entanto, isso iguala o risco de sobrepeso e obesidade? (Poulain, 2013). Não há consenso nas evidências sobre o risco do sobrepeso, pois não necessariamente há o aumento de mortalidade (Matheson; King; Everett, 2012).
Não se pensa nos efeitos que a utilização de categorias como excesso de peso ou sobrepeso podem ter sobre a vida cotidiana. Uma tentativa bem-intencionada de alarmar sobre os riscos do sobrepeso pode aumentar a culpa e o auto-ódio (Strawbridge; Wallhagen; Shema, 2000). A pesquisa de Robinson, Hunger e Daly (2015) examinou o efeito que a percepção do excesso de peso tem sobre o risco de ganho de peso futuro em adultos dos Estados Unidos e do Reino Unido. As políticas públicas partem do pressuposto de que as pessoas com excesso de peso subestimam seu peso e, portanto, que identificar-se seria um requisito para o sucesso da gestão do próprio peso; porém, não se encontrou nenhuma pesquisa que tenha examinado os efeitos da subestimação do peso. E, de acordo com a referida pesquisa, a qual utilizou três grandes coortes, perceber-se com excesso de peso apresenta maior risco de ganho de peso no futuro, tendo em vista que estar acima do peso é uma condição estigmatizada, que gera angústia e que pode estar associada a comer mais em resposta ao estresse. As consequências negativas relacionadas à autoidentificação evidenciam o cuidado que as intervenções de saúde pública precisam ter (Robinson; Hunger; Daly, 2015).
Além disso, estudos recentes apontam que a obesidade sozinha não aumenta o risco de morte, contrariando a maior parte da literatura. É o caso da pesquisa de Kuk et al. (2018), que acompanhou 54.089 indivíduos em cinco estudos de coorte e que descobriu que um em cada 20 indivíduos com obesidade não apresentava outras anormalidades metabólicas. E, além disso, comprovou que pessoas com obesidade metabolicamente saudável não possuem taxa de mortalidade mais elevada, ao contrário da dislipidemia, da hipertensão ou da diabetes, que isoladas estão mais fortemente associadas com o alto risco de mortalidade. A pesquisa conclui que é preciso pesquisas futuras que elucidem os benefícios provenientes da insistência da recomendação de perda de peso para obesos metabolicamente saudáveis.
Abordagem focada na perda de peso
De acordo com Tylka et al. (2014), as diretrizes de tratamento para a obesidade que dominam grande parte da medicina ocidental atualmente constituem uma “abordagem normativa de peso”, que presume que toda pessoa acima do peso requer intervenção. E que esta intervenção deve estar focada no peso, tanto na prevenção individualizada como nas recomendações de tratamento, os quais muitas vezes são ineficazes, podem gerar potenciais danos e são invasivos, como as dietas, fármacos e a cirurgia bariátrica.
A exclusividade das intervenções de forma individualizada está relacionada com a visão etiológica da obesidade que ainda é preponderante. O discurso mais popularizado e disseminado explica a causa da obesidade de forma restrita, recorrendo à teoria do balanço energético positivo, que seria o aumento da ingestão de calorias e a diminuição de atividade física, o que resulta no acúmulo de gordura corporal (Kruse, 2012). Por isso, as recomendações focam no indivíduo e no balanço energético negativo, como recomendado pelas Diretrizes Brasileiras de Obesidade: “diminuir o consumo de calorias na alimentação e exercícios para aumentar o gasto calórico” (Abeso, 2016, p. 55).
Por que, mesmo já sendo consenso que a etiologia da obesidade é complexa e multifatorial, ainda é preponderante entre os profissionais a visão de que a obesidade é responsabilidade do sujeito e que os fatores externos possuem menor impacto? (Puhl; Heuer, 2010). As Diretrizes chegam a mencionar que “a etiologia da obesidade é complexa e multifatorial, resultando da interação de genes, ambiente, estilos de vida e fatores emocionais […] o ambiente moderno é um potente estímulo para a obesidade” (Abeso, 2016, p. 33).
Porém, mesmo que as Diretrizes mencionem a influência do ambiente - e não apenas aspectos individuais - no aumento do peso, elas reduzem todas as recomendações ao biológico e às intervenções individuais, tratadas como se estivessem sob o domínio pessoal e dependessem exclusivamente da força de vontade, numa lógica de resolução individual de problemas coletivos. Como, por exemplo, no trecho “o paciente deve ser abordado individualmente sob a história do peso e dos problemas de saúde dele advindos e a motivação para agir contra os fatores obesogênicos ambientais” (Abeso, 2016, p. 37). Ou seja, não se muda o ambiente; o foco está sempre na motivação de agir contra esse contexto totalmente desfavorável à perda de peso.
A saúde pública, progressivamente, tem se restringido ao âmbito das mudanças comportamentais individuais. Isso quer dizer que a saúde retira sua responsabilidade de intervenção sobre o processo saúde-doença, ao concentrar suas ações no fomento da autovigilância, ou vulgarmente “se cuidar”, que reforça essa concepção individualista da saúde, determinada pela superação pessoal. Porém, nem todos poderão ser bem-sucedidos, visto que o poder econômico é determinante para adquirir um estilo de vida saudável. O corpo promove e distingue as classes sociais, já que é utilizado pela nobreza para marcar e manter sua distinção (Ferreira, 2014; Foucault, 2017b). Por isso, possuir um corpo magro e malhado é uma conquista bem mais acessível para as classes ricas, pois o estilo de vida saudável garante certo status social.
A maioria das pessoas não escolhe o estilo de vida que leva, porque possui condições socioeconômicas desfavoráveis. Por isso, a pobreza está associada a maiores riscos, já que tais pessoas sobrevivem de forma considerada desregrada, desviada e irresponsável (Castiel; Álvarez-Diaz, 2007). As Diretrizes relembram que a obesidade apresenta maiores taxas nas populações com maior grau de pobreza e menor nível educacional (Abeso, 2016). Por trás dessa afirmação, geralmente perpassa a questão da falta de informação, no sentido de que as pessoas gordas são vistas como ignorantes em relação a sua alimentação, porque lhes falta acesso à informação “correta”, como se faltasse apenas a informação.
Segundo Foucault (2017b), parte-se do princípio de que não se pode cometer o mal voluntariamente e conhecendo-o, isto é, se a pessoa souber quais alimentos não são saudáveis não os consumirá. Por isso, a saúde pública tem priorizado produzir evidências científicas, devido à circulação massiva de informações efêmeras e incertas sobre saúde, gerando uma ansiedade generalizada sobre o que faz “bem” e o que faz “mal”. Reduzindo a educação em saúde ao ato de repassar informações antecipatórias sobre os riscos a fim de capacitar as pessoas a realizarem escolhas racionais e conscientes, ou seja, a fazerem sua própria gestão de risco.
Nada melhor pra exemplificar do que as recomendação das dietas, que nas Diretrizes são tratadas de forma grotesca e surreal, naturalizando a fome e a pobreza como algo positivo, afinal emagrecem, e incentivando a pessoa a passar fome como estratégia de obtenção de saúde, conforme o trecho “coma o desjejum como rei, almoce como príncipe e jante como pobre” (Abeso, 2016, p. 86).
Assim, é institucionalizando um projeto individual de emagrecimento - a qualquer custo - enquanto estratégia de saúde, pois a salvação só é garantida aos que perdem peso. Nas Diretrizes, a perda de peso aparece como objetivo central. Isto fica evidente quando se recomenda a realização de “dietas que contenham 1.200 a 1.500 kcal por dia para mulheres e 1.500 a 1.800 kcal por dia para homens, independentemente da composição de macronutrientes, frequentemente levam à perda de peso” (Abeso, 2016, p. 76). Trata-se de uma supervalorização de dietas hipocalóricas, as quais seriam benéficas em qualquer situação: “dietas hipocalóricas poderiam potencialmente levar a benefícios em doenças neurológicas como demência, em redução da velocidade evolução tumoral, melhora da imunidade e cardioproteção” (Abeso, 2016, p. 77), de acordo com estudos em animais e relatos de casos em humanos.
Porém, há muitos estudos que questionam a efetividade dessas dietas, como o artigo de Dulloo, Jacquet e Montani (2012), o qual esclarece como a dieta pode predispor o aumento da gordura corporal. Para isso, faz uma reanálise de estudos que demonstram a superação de gordura pós-inanição devido à autorregulação da composição corporal, que tende a recuperar a gordura de forma mais rápida que o tecido magro. O artigo aponta outros estudos em que pessoas que fazem dieta para perder peso possuem maior propensão para ganhar peso no futuro do que pessoas que não realizam dietas. Os autores expressam a preocupação se a dieta não pode estar paradoxalmente promovendo o oposto do que pretende (Dulloo; Jacquet; Montani, 2012).
De acordo com a OMS, 95% das pessoas que fazem dieta e conseguem emagrecer ganham novamente todo o peso perdido ou até mesmo mais em cinco anos. As dietas restritivas não resultam em perda de peso significativa, tendo em vista que a longo prazo as pessoas recuperam o peso em ciclos repetidos de perda e recuperação do peso, chamados de flutuação de peso ou efeito sanfona - processo que é mais prejudicial à saúde do que manter o peso (Dulloo; Jacquet; Montani, 2012; Mann et al., 2007). De acordo com os estudos referenciados na revisão de Mann et al. (2007), a flutuação de peso aumenta o risco de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, diabetes, aumento do colesterol da lipoproteína de alta densidade, aumento da pressão arterial sistólica e diastólica, e suprime a função imune.
Isto também é comprovado na revisão de Mann et al. (2007), que avaliou se dietas restritivas são um tratamento eficaz para obesidade. De acordo com os estudos, as perdas não são mantidas, porque cerca de um a dois terços das pessoas que fazem dietas recuperam mais peso do que perderam durante a dieta. As dietas podem resultar em perda de peso a curto prazo. Os estudos acabam abordando apenas as melhorias a curto prazo e não acompanham o que acontece quando o peso é recuperado. A revisão conclui que os benefícios são pequenos quando comparados com os danos potenciais e questiona se é um tratamento seguro e eficaz para obesidade. Além do que, as dietas restritivas promovem uma relação transtornada com a comida (Dulloo; Jacquet; Montani, 2012).
O emagrecimento, acima de qualquer bem-estar, também está representado nas Diretrizes quando defende os “substitutos de refeições são úteis e eficazes como parte de um plano estruturado de modificação da dieta em pacientes com sobrepeso e obesidade para redução do peso corporal” (Abeso, 2016, p. 85). As Diretrizes apresentam estudos que avaliam o efeito da substituição de refeições por refeições preparadas ou por suplementos alimentares, como shakes, sopas e barras de cereais, e afirma que o “seu uso demonstrou resultados positivos no tratamento da obesidade” (Abeso, 2016, p. 81). As Diretrizes citam especificamente que “a Herbalife vende suplementos nutricionais e fitoterápicos em comprimidos, cápsulas, bebidas e barras energéticas para controle de peso, melhora da nutrição, bem-estar e estética” (Abeso, 2016, p. 82), mencionando que vários estudos identificaram dano hepático em pessoas que consumiram produtos da marca citada. Porém, há uma postura de defesa por parte do documento ao concluir que “ainda permanece totalmente especulativo o que poderia ter sido a causa de dano hepático” (Abeso, 2016, p. 82). Há, portanto, o incentivo à indústria do emagrecimento, sem se preocupar com a iatrogenia gerada pelas recomendações que defende, mesmo sendo referência também em estudo de transtornos alimentares.
Para cumprir com o perpétuo projeto de emagrecimento daqueles viciados em comida as Diretrizes recomendam associar com as dietas a terapia cognitivo-comportamental, “visando a modificação de hábitos prejudiciais” (Abeso, 2016, p. 95). A terapia cognitivo-comportamental reforça a motivação em relação ao tratamento, de forma a evitar recaídas e o, consequente, ganho de peso, instrumentalizando a pessoa gorda a ter as habilidades necessárias para manter as mudanças comportamentais (Abeso, 2016). A Abeso dá exemplos como: manter fora da lista de compras os alimentos indesejados, não utilizar o controle remoto, evitar atividades como o cinema (pois está associado à ingestão excessiva de calorias) e “evitar ser o responsável pela alimentação de outros” (Abeso, 2016, p. 95). Esses exemplos reforçam o estereótipo de que a pessoa gorda passa o dia deitada no sofá comendo, restringem sua participação em atividades de confraternização e socialização - porque estas envolvem comida -, e presumem que ela não sabe alimentar seus filhos.
Portanto, a habilidade para manter o controle de peso prevê a vigilância constante e eterna que atinge de forma mais incisiva e estigmatizada as pessoas gordas, devido ao corpo visto como inadequado, conforme explicitado no trecho “o sucesso em longo prazo depende de constante vigilância” (Abeso, 2016, p. 56). A pessoa precisa adotar uma relação de vigia de si mesma e de automonitoramento, que “é realizado pelo próprio paciente, através de registros da ingestão alimentar, dos episódios de compulsão e dos eventos desencadeantes […] documentar pensamentos equívocos em relação à alimentação, sobre o peso e o aspecto corporal” (Abeso, 2016, p. 95). Para cuidar da saúde é preciso desenvolver uma atenção vigilante sobre si para, em seguida, confessar a verdade para o profissional de saúde. Segundo Foucault (2017a), a confissão já está tão incorporada que não é percebida enquanto prática autoritária de controle, que coage a partir de relações de poder.
A falsa confissão das pessoas gordas pode ser verificada no trecho: “o consumo calórico pode ser avaliado por meio do hábito alimentar, usando diários alimentares ou listas de checagem de alimentos, mas a interpretação das informações precisa ser cuidadosamente analisada em razão da subestimação ser comum” (Abeso, 2016, p. 33). Método que corrobora o estigma da pessoa gorda como mentirosa - para si e para os profissionais - pois subestima a quantidade que come. Afinal, se está acima do peso, a pessoa deve comer mais que o necessário e não deve comer nada saudável. Trata-se de uma visão gordofóbica, pois há uma relação entre aquele que fala e aquilo de que fala, já que não parece verídico um gordo falando que come coisas consideradas saudáveis, na medida em que é imprescindível ter um corpo magro para acreditar que a pessoa se alimenta corretamente. Se for magro, pouco será questionado se possui alimentação saudável, embora muitas vezes nem se esforce para ter um corpo magro. A pessoa magra tem maior direito à discrição, já a pessoa gorda possui um corpo condenado à intervenção a qualquer momento, uma vez que qualquer um se sente no direito de aconselhar e questionar suas atitudes.
Na lógica de que os quilos perdidos são diretamente relacionados com melhor nível de saúde e no contexto - muito provável - de fracasso e incapacidade de perder peso com dietas restritivas, o uso de medicamentos que possuem efeitos colaterais é a via recomendada para cuidar da saúde. De acordo com as Diretrizes, “o tratamento medicamentoso deve ser indicado na presença de sobrepeso associado a fatores de risco ou de obesidade” (Abeso, 2016, p. 84). Elas indicam que o tratamento farmacológico deve se iniciar na “prevenção secundária para impedir a progressão da doença para um estágio mais grave e prevenir complicações” (Abeso, 2016, p. 55). E, por ser uma doença crônica, é necessária a manutenção do medicamento ao longo da vida, pois não há cura (Abeso, 2016). As Diretrizes incentivam o uso da sibutramina - potencial emagrecedor “sem danos” -, fármaco que, segundo a Abeso, demonstrou bons resultados até mesmo com crianças e adolescentes, o que recomendaria sua utilização até mesmo em pacientes hipertensos controlados. Também reiteram que os efeitos colaterais do medicamento - boca seca, constipação, cefaleia, insônia - não justificam a parada.
Ou então, as Diretrizes recomendam um tratamento ainda mais invasivo: a cirurgia bariátrica, a qual funciona como uma desnutrição programada, pois limita a capacidade gástrica e/ou interfere na absorção. É um procedimento que apresenta diversos riscos de complicações e que a cada ano vem se consolidando enquanto o método mais eficaz para o tratamento da obesidade. Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, o número de cirurgias aumentou 46,7%, entre os anos 2012 e 2017, e o Brasil é o segundo país do mundo em número de cirurgias bariátricas. Este número só tende a crescer com a ampliação do rol de comorbidades associadas, que aumentou de seis para 21, conforme Resolução nº 2.131/2015, do Conselho Federal de Medicina.
Conclui-se, portanto, que nas Diretrizes há um discurso que reforça a saúde inerente aos corpos magros, que reproduz estereótipos relacionados ao corpo gordo e que relaciona diretamente quilos perdidos com melhor nível de saúde. Não se questiona como estas recomendações repercutem no cotidiano das pessoas e quais são os efeitos adversos diante dessa forma de zelar pela saúde que perpassa o emagrecimento a qualquer custo.
É preciso avaliar as práticas agressoras ao corpo que acompanham esse percurso de alcançar o corpo considerado saudável e os possíveis efeitos contraproducentes dessa abordagem de recuperação da saúde focada na perda de peso e na mudança comportamental individual. Pois ela privilegia um modelo de corpo biológico em detrimento da concepção integral, ocultando o estresse, a ansiedade, o isolamento e o medo gerado pela busca do corpo saudável (Gaudenzi; Ortega, 2012; Tesser, 2017).
Nesse contexto, torna-se imperativo reconhecer os limites técnicos e éticos das tradicionais intervenções biomédicas diante da baixa resolutividade dessas intervenções, pois elas não têm sido efetivas na redução da prevalência da obesidade (Dias et al., 2017), tendo em vista que a epidemia obesidade não foi revertida em nenhuma população pelas medidas de saúde pública atualmente utilizadas (Swinburn et al., 2011).
A adesão ao tratamento individual é baixa, pois as ações são prescritivas e insustentáveis, e não alteram o contexto social (Dias et al., 2017). Por isso, é urgente refletir sobre o contexto e sua influência, para implantar estratégias de prevenção que ultrapassem o âmbito individual, como políticas públicas mais amplas. Desenvolver novas abordagens de tratamento, com uma “abordagem inclusiva do peso” que considere a diversidade natural dos corpos, que acredite que a saúde pode ser promovida independentemente do peso e que procure erradicar a estigmatização do peso no âmbito da saúde (Tylka et al., 2014). Ou seja, abordagens que foquem principalmente no bem-estar das pessoas gordas.
Afinal, as pessoas gordas não merecem ser discriminadas como forma de incentivo para emagrecerem. Essa gordofobia em nome da saúde age contra o bem-estar das pessoas gordas, sendo prejudicial para o seu próprio cuidado com a saúde. É impossível uma vida com saúde sofrendo discriminação e com permanente ódio de si mesmo (Piñeyro Bruschi, 2016). Como o ódio pode ajudar no cuidado com o corpo (Piñeyro Bruschi, 2016)?
Toda essa insistência para emagrecer e o estigma que culpabiliza o indivíduo acabam se tornando fatores de risco, como apontado em alguns estudos. Exemplos de resultados negativos são: o aumento da probabilidade de se engajar em comportamentos alimentares danosos à saúde; menor participação em atividades físicas devido ao preconceito sofrido nesses ambientes; a propensão a praticar medidas de controle de peso insalubres; e maior vulnerabilidade para depressão, ansiedade, baixa autoestima, isolamento social e insatisfação corporal (Puhl; Heuer, 2010; Puhl; Andreyeva; Brownell, 2008). Por isso, é urgente discutir e reconhecer as possíveis atitudes gordofóbicas nas recomendações de saúde, pois estas repercutem no planejamento das políticas públicas, na formação e na prática profissional dos serviços de saúde.
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>. Acesso em: 25 jun. 2019.
» https://bit.ly/2uUbzCv
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Mar 2020 -
Data do Fascículo
2020
Histórico
-
Recebido
27 Jul 2019 -
Aceito
18 Dez 2019