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Uma história de conceitos na saúde pública: integralidade, coordenação, descentralização, regionalização e universalidade

A history of public health concepts: integrity, coordination, decentralization, regionalization, and universality

Resumos

O Sistema Único de Saúde conferiu visibilidade a uma série de conceitos próprios da organização de sistemas de saúde. Entre eles a integralidade, que delimita fronteiras comuns com quase todos os demais princípios do Sistema, tem sido objeto de ampla literatura no Brasil. Com base em extensa revisão de fontes primárias e secundárias, este artigo apresenta uma recuperação histórica dos conceitos de integralidade, descentralização, regionalização e universalidade - ideias e conceitos que em grande parte se conformam e se interligam no ideário da organização dos serviços sanitários pelo modelo dos Centros de Saúde distritais.

saúde pública; integralidade; descentralização; regionalização; universalidade


Brazil's Unified Health System (Sistema Único de Saúde) has highlighted a series of concepts specific to the organization of healthcare systems. Among these, integrity - which shares boundaries with almost all other System principles - has been the object of much academic production in Brazil. Based on an extensive review of primary and secondary sources, the article offers a historical recovery of the concepts of integrity, decentralization, regionalization, and universality - ideas and concepts that in good measure are shaped by and interlinked with the set of ideals of the organization of sanitary services according to the district health centers model.

public health; integrity; decentralization; regionalization; universality


ANÁLISE

Uma história de conceitos na saúde pública: integralidade, coordenação, descentralização, regionalização e universalidade* * Artigo originado da tese de doutoramento do autor. Ver Mello, 2010.

A history of public health concepts: integrity, coordination, decentralization, regionalization, and universality

Guilherme Arantes MelloI; Ana Luiza d'Ávila VianaII

IProfessor adjunto do Departamento de Medicina Preventiva da Escola Paulista de Medicina/ Universidade Federal de São Paulo. Rua Borges Lagoa, 1341. 04038034 - São Paulo - SP - Brasil. gmello@unifesp.br

IIProfessora do Departamento de Medicina Preventiva/ Faculdade de Medicina/Universidade de São Paulo. Av. Dr. Arnaldo 455, 2o andar. 01246-903 - São Paulo - SP - Brasil. anaviana@usp.br

RESUMO

O Sistema Único de Saúde conferiu visibilidade a uma série de conceitos próprios da organização de sistemas de saúde. Entre eles a integralidade, que delimita fronteiras comuns com quase todos os demais princípios do Sistema, tem sido objeto de ampla literatura no Brasil. Com base em extensa revisão de fontes primárias e secundárias, este artigo apresenta uma recuperação histórica dos conceitos de integralidade, descentralização, regionalização e universalidade - ideias e conceitos que em grande parte se conformam e se interligam no ideário da organização dos serviços sanitários pelo modelo dos Centros de Saúde distritais.

Palavras-chave: saúde pública/história; integralidade; descentralização; regionalização; universalidade.

ABSTRACT

Brazil's Unified Health System (Sistema Único de Saúde) has highlighted a series of concepts specific to the organization of healthcare systems. Among these, integrity - which shares boundaries with almost all other System principles - has been the object of much academic production in Brazil. Based on an extensive review of primary and secondary sources, the article offers a historical recovery of the concepts of integrity, decentralization, regionalization, and universality - ideas and concepts that in good measure are shaped by and interlinked with the set of ideals of the organization of sanitary services according to the district health centers model.

Keywords: public health/history; integrity; decentralization; regionalization; universality.

O debate sobre a organização assistencial dos serviços sanitários é reescrito praticamente do zero com a avassaladora proposta do Centro de Saúde distrital (CS), difundida em nível mundial pela Fundação Rockefeller/Universidade Johns Hopkins nos anos 1920. Tal preconização foi originalmente materializada no Brasil por meio da reforma do Serviço Sanitário paulista de 1925, logo vista em outros estados (Mello, Viana, 2012).1 1 Para o pleno entendimento da questão deve-se ter em mente que o CS inaugura um conhecimento na organização sanitária da saúde pública, e, por isso, parte do universo conceitual daquele início equivale ao próprio debate contemporâneo de 'sistemas de saúde' - expressão que só ganha sentido conceitual em meados da década de 1970.

Desde então poucas ideias estiveram tão presentes no discurso sanitário assistencial quanto aquelas que de algum modo se ligam à representação do 'integral' e que chegaram ao Sistema Único de Saúde (SUS) por meio do abrangente princípio doutrinário da integralidade. Na dualidade técnico-política característica do campo da saúde pública, a ideia de 'integração' e sua nítida aspiração ao 'polo técnico' (posteriormente também humanístico) tiveram que lidar com conceitos de vetor eminentemente político, como descentralização, regionalização e, com certa pertinácia, universalidade.

Antes de apresentá-los, porém, é preciso superar o sentido atemporal instigado pela naturalização de emprego desses conceitos no cotidiano do SUS, uma vez que 'regionalização', 'integralidade' e 'universalidade' estão ausentes como expressão literal em grande parte desse percurso.

Os conceitos apresentados neste texto surgem e se avolumam de forma indiciária no decorrer de um doutoramento sobre os CS (Mello, 2010).2 2 Sobre "sinais indiciários", ver Ginzburg, 2009. Foram inicialmente revisados os periódicos científicos nacionais e internacionais (língua inglesa) mais relevantes na saúde pública entre a segunda e a oitava décadas do século XX, além dos Anais dos Congressos Brasileiros de Higiene. As referências encontradas nos artigos foram utilizadas para novas buscas. A análise do contexto político é indubitavelmente tributária de Brandão (2007). Certamente a propriedade diacrônica desta revisão faz com que sejam necessárias leituras complementares sobre pontos específicos.

O conceito de integração e coordenação

"The word 'comprehensive' as applied to medicine is too comprehensive as a word".

(Wolf Jr., 1964, p.11)3 3 Excepcionalmente manteve-se aqui a citação na língua original, uma vez que no Brasil comprehensive foi desde o início traduzido por 'integral', enquanto que em Portugal optou-se por 'abrangente'. A primeira impressão brasileira de Starfield (2002) inicialmente traduz comprehensive por 'abran-gente' para logo na sequência utilizar "integral" (a transição está nas páginas 46-47).

O anseio da coordenação dos serviços sanitários não apenas surge com o ideário dos CS, mas foi, na realidade, sua própria razão de existir. A reunião de serviços em um mesmo local tinha por base o modelo de eficiência e produtividade das lojas de departamento que se tornou conhecido como "all-under-one-roof-principle" (Stoeckle, Candib, 1969; Ramos, 1972). Wilinsky (1927) apresenta assim a ideia:

Nós temos visto uma evolução na vida empresarial resultando na loja de departamentos, abrigando sob um telhado oportunidades de compras que variam de agulhas e dedais a automóveis e lotes de casas. Em anos mais recentes, nós temos visto o nascimento, crescimento e desenvolvimento na área da saúde e bem-estar de uma instituição que tem sido chamada apropriadamente de 'loja de departamento de saúde', mas tecnicamente descrita como 'centro de saúde' (grifos do original).4 4 "We have seen an evolution in business life resulting in the department store, housing under one roof shopping opportunities varying from needles and thimbles to automobiles and house lots. In more recent years we have seen the birth, growth and development in the health and welfare field of an institution which has aptly been called the 'department store of health,' but technically described as the 'health center'". Nesta e nas demais citações de texto em outros idiomas, a tradução é livre.

Desde o primeiro instante se destacava entre os principais argumentos do novo modelo de organização dos serviços sanitários no país a eficiência administrativa proporcionada pela melhoria da 'coordenação' das atividades sanitárias. O 'entrosamento', como também era referido, evitava o desperdício de recursos ao prevenir a "duplicidade inútil e antieco-nômica dos órgãos" (Vieira, 1936, p.5), usualmente repartidos "em dispensários especia-lizados, que nada ou pouco se comunicam entre si" (Souza, Vieira, 1936, p.3). Com alguma experiência acumulada, esses autores não hesitavam em afirmar: "A coordenação de serviços, não só de dispensários como de visitas, 'de preferência oriundos do mesmo teto', tornou os resultados muito mais apreciáveis, contínuos, eficientes e duradouros" (p.5; grifos do original).

Com o apelo do "rendimento máximo", o conceito de coordenação recebeu especial reforço na Conferência Europeia de Higiene Rural (Conférence..., 1931), reafirmada aqui por Barreto (1939, p.11).

À frente do Departamento Nacional de Saúde (DNS), João de Barros Barreto foi o grande difusor do conceito, que claramente já se expandia dos limites distritais para todo o conjunto das relações nacionais no campo da saúde pública - expediente com visível enredo de um pan-americanismo sanitário:

Recomendou, muito de próximo, a Conferência Pan-Americana dos Diretores de Saúde, reunida em Washington, que se mantenha a tendência não só de unificar tecnicamente a ação da Saúde Pública, mas também de coordenar, administrativamente, os seus programas e realizações (Barreto, 1938, p.289).

Até aquele momento a ideia de coordenação circunscrevia-se meramente à eficiência administrativa, sem que ainda se ativesse ao problema da fragmentação e especialização da assistência que comporia o futuro conceito de "coordenação do cuidado" (Stoeckle, Candib, 1969). A crescente complexidade da organização faria com que ainda nos anos 1930, mas de forma mais patente na década seguinte, emergissem dois conceitos que se entrelaçariam à coordenação. Menos aparente na literatura, surgia o conceito de integration (Pomeroy, 1929; Mountin, 1949). Em contraste com o presente dualismo que defendia um CS exclusivamente preventivo, esse conceito se relacionava à 'integração' - no sentido físico - entre serviços preventivos e curativos. Podia ser visto na nova proposta do Comprehensive Health Center, que previa a contiguidade entre CS e recursos hospitalares básicos (Terris, 1963). Sob a benemerência da Fundação Rockefeller, em 1942 Garrido Morales descreve o desenvolvimento de um Comprehensive Health Service em Porto Rico. No Brasil esse modelo viria a ser propalado pelo Serviço Especial de Saúde Pública (Sesp) sob o conceito de 'unidades mistas'; antes, porém, Fontenelle (1941, p.103, grifos originais) já anunciava a nova: "Com a criação de um 'Centro de Saúde' em cada qual, em uma fórmula muito original, nessa época, para a execução 'completa e integral' dos serviços locais, com a máxima autonomia de desempenho, sob comando único".

O segundo conceito refere-se justamente à comprehensive,5 5 A respeito da tradução de comprehensive, ver nota 3. que, embora já aparecesse nos serviços, aflora com especial vigor no discurso da educação médica no contexto de fragmentação social, familiar e individual do pós-guerra: "Após a Segunda Guerra Mundial, no entanto, como uma reação contra a tendência crescente em direção à especialização na medicina americana, apareceu uma nova ênfase que foi rotulada de 'atenção integral' [comprehensive care] (Reader, Soave, 1976, p.391)6 6 "After World War II, however, as a reaction against the growing tendency toward specialization in American medicine, a new emphasis appeared that was labelled 'comprehensive care'". , conceito que aporta no país como "medicina integral". Segundo Rodolfo Mascarenhas et al. (1972, p.2) a "fase da medicina integral" mais precisamente teve "início teórico com a criação da UNRRA (Associação das Nações Unidas para Socorros e Reabilitação)" em 1943, voltada para a "assistência social global" dos países devastados pela guerra.7 7 Com o apoio da Fundação Rockefeller, a UNRRA tinha o paulistano Geraldo de Paula Souza em seus quadros.

No final dos anos 1940, a consciência da transição epidemiológica fez com que a American Hospital Association e a American Public Health Association batessem definitivamente o martelo sobre a indissociabilidade de medicina preventiva e curativa, com ampla repercussão no debate internacional (Coordination..., 1948). Aquele 'dualismo' tão ardentemente defendido pelos próceres - com particular veemência entre nós (Souza, Vieira, 1936) - perde sentido. Como corolário a integração idealizada do cuidado médico - comprehensive - adquire uma dimensão prática que invariavelmente a remeteria também aos conceitos de coordenação e continuidade do cuidado: "Se o esforço de melhoria dos métodos habituais for bem-sucedido, isso deveria resultar em cuidado médico coordenado que se estendesse através do tempo, e isso pode ser denotado adequadamente como 'integral'" (Reader, 1954, p.760).8 8 "If the effort of improving on customary methods is successful, it should result in coordinated medical care extending through time, and this may be denoted properly as 'comprehensive'". Nesse entorno observa-se o início da mudança no principal posto de enunciação do discurso sanitário, até então oriundo de eminentes sanitaristas, para o universo acadêmico.9 9 A reunião de escolas médicas norte-americanas na Conferência de Colorado Springs em 1952 teve um papel importante nesse processo ao redefinir o novo sujeito do discurso e sua matriz discursiva: sai de cena a 'higiene' para ceder espaço à nova 'medicina preventiva' (Wolf Jr., 1964; Desrosiers, 1996) - referencial tornado pan-americano por meio das famosas conferências de Viña Del Mar (Chile) em 1955 e Tehuacán (México) em 1956 (Mascarenhas, Wilson, Bourroul, 1961-1962). Tal mudança também coincide com a aposentadoria da benemerência Rockefeller e posterior entrada da filantropia da Fundação Kellogg's com seu foco na educação médica. Os primeiros projetos acadêmicos de medicina compreensiva não tardam a ser descritos, dando clareza à reciprocidade entre abrangência clínica e integração dos serviços. Sendo assim, de um lado se comprometiam com a abrangência do olhar sobre a família; aspectos psíquicos da pessoa e emocionais do adoecer; a continuidade da supervisão clínica entre ambientes ambulatorial, hospitalar e domiciliar; além daqueles objetos puramente subjetivos como compaixão e boa vontade. De outro, reafirmavam o que o tempo confirmaria ser impreterível: que o "cuidado centralizado, contínuo e humano" do paciente, exige a capacidade de coordenação de um serviço comunitário com especialidades e hospital de referência (Reader, 1953, p.39)

De fato, seja nos serviços ou na educação médica, o conceito de integração grassa atrelado à organização e oferta de serviços médicos a populações socialmente vulneráveis. O centro coordenador de tal organização sanitária e medicina integral não poderia ser outro, como já revelavam as palavras do sanitarista argentino Francisco Menchaca em 1950:

Não escapará ao leitor nossa tendência a uma assistência mais humanizada e mais integral, e ao mesmo tempo mais bem organizada ... o interesse de destacar a coordenação da saúde como função principal e imprescindível do que se é dado a chamar 'Centro de Saúde'. Alguns acreditam que sem essa coordenação não se pode considerar um organismo 'Centro de Saúde'.10 10 "No escapará al lector nuestra tendencia hacia una asistencia más humanizada y más integral, y al mismo tiempo mejor organizada ... el interés de destacar a la coordinación de la sanidad como función principal e imprescindible de lo que se da en llamar 'Centro de Salud'. Alguno cree que sin tal coordinación no puede considerarse a un organismo 'Centro de Salud'".

No âmbito continental, os conceitos de integração e coordenação sofreriam nova inflexão dentro do universo discursivo do planejamento que dominou a cena dos anos 1960, centralizando a pauta da Reunião dos Ministros de Saúde das Américas em Washington (OPS, 1963) e da 17a Conferência Sanitária Pan-americana (OPS, 1968).11 11 O informe brasileiro descreve a falta de coordenação entre o governo federal, os estados, os serviços paraestatais e privados, com ênfase para o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS): "Não existe coordenação entre as unidades sanitárias e os hospitais das mesmas áreas. Essa falta de coordenação não permite às unidades sanitárias atender aos pacientes que necessitam de hospitalização" (OPS, 1968, p.10).

O cenário brasileiro

Embora fervilhassem em cenários específicos e acadêmicos, paradoxalmente os conceitos de integração e coordenação perdem notável visibilidade no Brasil dos anos 1950. Três fatores contribuíram nesse sentido: a criação, em 1953, do Ministério da Saúde, arena na qual é ressaltada a dimensão política do processo (Hamilton, Fonseca, 2003) - época na qual o discurso sanitário internacional também migra para a educação médica; o redirecionamento do foco político da saúde pública para o urbano/previdência social (Borges, 1951); e o otimismo sanitário ensejado pelas novas possibilidades terapêuticas de controle e erradicação das doenças transmissíveis (Lima, Fonseca, Hochman, 2005).

Nos dois primeiros casos reafirmava-se a política de separação entre medicina preventiva e curativa constituída desde os primórdios varguistas (saúde pública/rural/coletivo/prevenção vs. previdência/urbano/indivíduo/assistência) (Fonseca, 2007). No terceiro, a política de saúde pública federal viu seu foco completamente alterado. Um boa evidência disso é encontrada no 'Programa de saúde pública do candidato Juscelino Kubitschek', que respira otimismo sanitário em cada linha de suas sessenta páginas. O momento serviu também a uma ruptura com o discurso sanitário vigente, de modo que o 'programa' omite qualquer referência tanto aos CS quanto aos personagens que dominaram as políticas federais de saúde nas três décadas precedentes (Programa..., 1955).

Nesse ínterim, a 'integração' quase se tornou sinônimo do Sesp (e talvez se possa dizer que com ela efetivamente toma dimensão conceitual): no terreno das práticas, aplicada na organização de uma extensa rede rural nos estados; e na teoria, descrita em sua profícua publicação científica, a Revista do Sesp. Na realidade, como programa limitado ao esforço de guerra, a vocação para a atuação nas fronteiras do desenvolvimento rural fora sua própria condição de sobrevivência no pós-guerra, e o talento para a 'integração sanitária' regional seu ânimo de subsistência na carestia dos rincões em que atuava (Campbell, Miller, Franca, 1954; Franca, Fischer, 1955). Rapidamente ficou evidente para o Sesp que a dimensão curativa era condição sine qua non para a integração, o que o levou a incluir assistência clínica em suas unidades muito antes dos serviços estaduais (Penido, 1958).

O conceito de integração sanitária tinha tamanho relevo no pensamento sespiano, que no início dos anos 1970 Reinaldo Ramos (1972, p.230) não titubeia em definir três períodos para a saúde pública no Brasil, tendo como parâmetro a "evolução das ideias e realizações no campo da integração": a era pré-CS; o tempo que se seguiu aos primeiros CS; e, finalmente, o período que se inicia em 1942, "caracterizado pela fundação do SESP e o desenvolvimento da administração hospitalar em bases científicas". Um conceito de integração sanitária que impressionava positivamente até radicais tenazes do porte de Gentile de Mello (1960). Embora na organização dos serviços integrais prevalecesse a raiz integration sua alteridade comprehensive sobre o "homem como um ser integral" também já se mostrava comodamente inserida no senso técnico comum da saúde pública (Prado, 1962, p.102). Jarbas Karman, conhecido arquiteto no campo da saúde, faz uma interessante síntese dos conceitos sespianos, ao discorrer sobre o planejamento ideal de unidades sanitárias, de especial interesse aqui: a defesa do modelo dos CS, "entrosamento da medicina curativa e preventiva", como unidades mistas mais apropriadas à "execução prática ao moderno conceito de 'medicina integral'"; a preconização de que "hospitais e serviços de saúde devem coordenar seus esforços e integrar as suas funções"; e a visão do "homem uno e indivisível, e a família substituindo o indivíduo no conceito de unidade de vida" (Karman, 1962, p.106-108; grifos do original).

Por outro lado, o discernimento entre os conceitos de integração e coordenação nos textos da época nem sempre é de fácil compreensão ao leitor contemporâneo (como de fato ocorreu neste estudo): "Não podem mais existir, separadamente, serviços de medicina curativa e preventiva. Ambos se coordenam intimamente e mesmo se integram, conforme as condições diversas" (Mascarenhas, Castro, 1955, p.8). Nesse caso, com o mesmo sentido recém-exposto: coordenação com referência à necessidade de planejamento comum, coordenação de ações e comunicação entre CS e hospitais no tocante aos exames de laboratório, raio-X, pessoal, fichário etc.; e integração apensa à ideia de contiguidade física das ações, particularmente relacionada às unidades mistas (integração que ainda paira sobre serviços preventivos e curativos separados).

Rodolfo Mascarenhas, ao seu estilo, foi um dos que mais se ocupou em buscar os aprimoramentos conceituais em saúde pública. Esteve entre os primeiros a incorporar a "pessoa" ao conceito de 'integração' na literatura nacional, em seu "esforço para uma filosofia do conhecimento integrado, na medicina e saúde pública" (Mascarenhas, Piovesan, 1961, p.186).

Conforme o texto mencionado, a integração tinha seu óbice na excessiva "quebra da unidade" promovida pela ciência, problema que repercutia no corpo de conhecimentos, nos indivíduos e na coletividade. No indivíduo, pela fragmentação do cuidado em decorrência da falta de coordenação entre as especialidades médicas (fruto de ensino plenamente curativo em ambiente e "situação absolutamente artificial"). Na saúde pública, pela dificuldade do trabalho em "equipe integrada com vários tipos de profissionais"; na manutenção da dicotomia entre medicina preventiva e curativa; na falta de participação ativa da população; e principalmente no "tecnicismo sanitário" que, operando em favor do paternalismo, se contrapunha ao estímulo de uma "ideologia ativadora da população", o que, em última análise, reverberava no conhecimento pela baixa integração curricular entre as próprias disciplinas da medicina, e com outras áreas do saber. Na formação profissional todos esses fatores dificultavam a percepção do "homem como unidade integrada" (Mascarenhas, Piovesan, 1961, p.184-186).

Em meados da década aquele antigo 'dualismo' já era letra morta no discurso - essa própria expressão praticamente desaparecida - , e a integração se elaborava em sua unicidade - ou "concepção unionista", como referida por Souza e Vieira (1936, p.15) - , distada da ideia de ajuntamento dos serviços: "Uma das características da Saúde Pública é a sua aplicação integral a uma comunidade, sem a separação artificial entre medidas preventivas e medidas curativas" (Mascarenhas, 1964, p.53).

Numa das mais significativas referências didáticas da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Mascarenhas et al. (1972, p.2-3) esclarecem os principais campos conceituais que a integração alcança nos anos 1970, em abrangência em que pouco lhe poderia escapar nos limites da saúde pública (a integração "sistêmica" é a grande ausente): (a) integração do homem; (b) integração da saúde do homem; (c) integração do binômio saúde-doença; (d) integração da medicina preventiva e curativa; (e) integração da saúde pública; (f) integração em saúde pública no nível local; (g) integração em saúde pública no nível local distrital; (h) integração em saúde pública no nível regional.

Reinaldo Ramos é um dos poucos autores em que se vê o conceito de integração sob a perspectiva desenvolvimentista, na qual a 'integração' do setor saúde é prevista como elemento tecnológico inerente ao desenvolvimento econômico e social do Estado nacional. Referida por "integração intersetorial", sua consecução haveria que necessariamente ser precedida pela articulação interna da saúde pública, que delimitava o conceito "mais limitado ... de integração intrassetorial" (Ramos, 1972, p.5-6). Citadas apenas na introdução de sua tese, cujo objeto se restringia à 'integração intrassetorial', as principais áreas de integração intersetorial seriam quatro: (a) produção de seus insumos fundamentais por outros setores ("trata-se, em última análise, de um problema de compatibilização de metas"); (b) determinação de sua contribuição para o produto interno bruto, isto é, seu impacto sobre a economia; (c) participação em bens ou serviços de interesses comuns com outras áreas; (d) participação como setor de infraestrutura em projetos regionais (sobretudo de natureza agroindustrial) (Ramos, 1972, p.5).

A 'integração' só viria a se tornar um conceito 'ministerial' na década de 1980 com o natimorto Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde (Prev-Saúde), divulgado em 1980 durante a sétima Conferência Nacional de Saúde (CNS). A despeito de sua responsabilidade restringida aos serviços básicos, é notável a influência do conceito de 'integralização das ações de saúde' com a diretriz doutrinária que se estabeleceria poucos anos depois no SUS:

A compreensão global do homem em suas dimensões biológica, psíquica e social concretiza-se na prática dos serviços de saúde, através da prestação de ações integrais de saúde. Entende-se por ações integrais de saúde o conjunto articulado das medidas prestadas de promoção, proteção, recuperação e reabilitação (Brasil, s.d., p.14).

Não foi possível precisar os motivos que levaram às novas denominações 'integralização' e 'integralidade', mas certamente a integração entre ações preventivas e curativas estiveram sempre no cerne desses conceitos: "A chamada integralização, como já referimos anterior-mente significa a não separação das medidas preventivas e curativas" (Bodstein, Fonseca, 1989). Trazendo o conceito no próprio nome, as Ações Integrais em Saúde (AIS) objetivavam romper "com a concepção dominante de dicotomia entre os serviços e ações preventivas e curativas, abrindo alas para as modernas concepções de integralidade" (Bertone, Gevaerd, Cordoni, 1989).12 12 Como possíveis motivações não se devem desconsiderar o próprio processo de renovação linguística como elemento de ruptura política ou epistêmica nem a completa rejeição ao Sesp da radicalidade dos anos 1970-1980, como dito, quase sinônimo do conceito de integração no país.

Descentralização (e municipalismo)

Toda a tutela prolongada produz infalivelmente uma certa incapacidade, e esta incapacidade serve de pretexto para continuar a tutela indefinidamente.

(Bastos, 1937, p.43)

Não é pretensão deste artigo revisar o complexo conceito de descentralização, mas apenas recuperar alguns componentes semânticos que a ele se acrescentaram no campo da saúde pública brasileira.13 13 Para um contexto internacional específico, ver Mills, 1990. A 'descentralização' figurava entre os principais conceitos do novo modelo de organização sanitária exportado por Johns Hopkins nos anos 1920. Exprimia o ideal de aproximação física dos serviços com a população servida, representada na própria noção distrital (Stoeckle, Candib, 1969), visão expressa por Souza e Vieira (1936, p.31): "A divisão por funções foi substituída pela divisão por distritos, permitindo, com diz Jansen de Mello, uma verdadeira descentralização". De fato, porém, o termo já vinha de longa trajetória conceitual no debate político, o que inevitavelmente cotejaria ambas as dimensões no discurso da saúde pública.

O tempero conceitual do liberalismo à brasileira - utilizado em fartas pitadas no receituário da Era Vargas - fora idealizado entre 'nova geração de republicanos' por Oliveira Vianna (1999, p.477; grifos do original):

a única solução, que pode conciliar o princípio da unidade e da autoridade política nacional com o imperativo da 'descentralização administrativa', imposta pela nossa desmedida extensão territorial, é - não a descentralização 'política (municipalismo, Federação ou Confederação)'; mas, pura e simplesmente aquilo que os tratadistas chamam 'desconcentração'.

Essa recomendação contribui para o desenlace do nó górdio que se estabelece entre o princípio da descentralização preconizada no modelo de organização sanitária dos CS, nessa época um discurso sanitário uníssono, e o ideal da centralização varguista. João de Barros Barreto foi o grande artesão dessa costura:

Representava, até bem pouco tempo, um dos mais debatidos problemas de administração sanitária, para o Rio de Janeiro, decidir entre o sistema de organização centralizada e o outro, o descentralizado ou da divisão distrital. Avaliados inconvenientes e vantagens, patenteou-se ... dever tocar a preferência a uma fórmula mista, a da descentralização sem excesso (Barreto, Fontenelle, 1935).

Dessa forma o ideal da descentralização distrital como desconcentração administrativa firma-se na semântica setorial, como se vê em Fontenelle (1941, p.107):

[o sistema de organização distrital] teve que aguardar até 1934, quando foi feita uma reforma dos serviços de Saúde Pública, que mandou adotar, para todo o Distrito Federal, o plano de organização descentralizada, com a criação da Inspetoria dos Centros de Saúde e a divisão da cidade em 12 distritos sanitários. ... Com a reforma de Janeiro de 1937, ... procurei alargar ainda mais a descentralização, passando aos Centros de Saúde algumas outras funções sanitárias até então exercidas por Inspetorias e órgãos centrais.

Como fica visível no trecho citado de Oliveira Vianna, a questão das relações intergover-namentais também se manteve historicamente nessa órbita conceitual, criando desde o início afinidades eletivas entre descentralização, municipalismo e federalismo - seguramente uma questão que carece de olhar mais apurado do que se pretende aqui.14 14 Essas afinidades variam ao longo do tempo, e o olhar contemporâneo deve estar atento ao progressivo imaginário democrático que se fortalece na esfera da descentralização e, em particular, ao período mais intenso de mescla conceitual com o federalismo que se segue à Constituição de 1988 (Souza, 2005 ). Essa autora lembra ainda que apenas as esferas federal e estadual participam do campo teórico do federalismo, o que deixa a partilha municipal para o âmbito do debate da descentralização. O ideal municipalista manteve-se à espreita de seu lugar ao sol, exigindo renitentes desconversas desde os primeiros códigos sanitários. Depois de idas e vindas a respeito do papel do município na autoridade sanitária no Brasil monárquico, a Constituição repu-blicana enfim definiu toda a administração pública local como encargo dos municípios e estados. Apesar de não haver referência específica à saúde pública na primeira Carta Magna - que, como rememora Souza (2005, p.107), "seguiu a promessa descentralizadora do mote republicano: cen-tralização, secessão; descentralização, unidade" - , Rodolpho Telarolli Júnior (1996, p.200) descreve com clareza a repercussão paulista no campo sanitário: "O princípio da autonomia municipal esteve no centro das discussões parlamentares que acompanharam a tramitação do projeto de reforma do serviço sanitário de 1893".

As aparências de modernidade republicana, entretanto, não se furtavam à cultura do 'pacto coronelista' em reforçar continuamente a dependência municipal através de sua fragilidade financeira, reproduzindo, a seu modo, a 'política dos governadores' na esfera federal. Paradoxalmente justificadas na retórica da autonomia municipal, o código de 1892 e reformas subsequentes, em particular a de 1896, assumem clara orientação esta-dualizante (Telarolli Júnior, 1996). Transladar o liberalismo norte-americano para o contexto brasileiro e defender a autoridade municipal revelava-se imprevisto sisifismo até para os mais obstinados liberais:

Emílio Ribas, republicano desde o final da monarquia ... era mais um dos que defendiam o princípio da autonomia municipal exclusivamente no campo da retórica. ... Em sua opinião, as 'excessivas' prerrogativas municipais em saúde e saneamento eram a principal dificuldade a ser removida, através da criação de mecanismos que facilitassem a intervenção estadual nos problemas de saúde e saneamento dos municípios (p.226).

No vigor nacionalista da segunda década do século XX, amadurece o diagnóstico inverso, apregoando a necessidade de uma orientação federal comum como passo anterior para lidar com o 'imenso hospital': "A ausência de centralização dos serviços de higiene, muito bem o acentuou o nosso eminente diretor da Saúde Pública, constitui obstáculo a uma ação inteligente de conjunto, capaz de resolver o grande problema de profilaxia rural" (O Sr. Carlos Chagas, 29 jul. 1921). Apaziguar os ânimos quanto à transitoriedade dessa proposição fazia-se oportuno, intenção explicitada logo de início por Amaury de Medeiros na reorganização do serviço sanitário de Recife (PE) em 1923:

Sou radicalmente contrário à substituição das instituições estaduais pelas federais. Deve ser transitória a interferência das autoridades sanitárias federais no Estado, como transitória deve ser a ação das autoridades sanitárias estaduais nos municípios. Tão transitória como o domínio do pai sobre o filho. A higiene permanente do Estado e dos Municípios deve ser custeada e mantida com os próprios elementos locais. Os serviços locais precisam ser, cada vez mais, municipalizados (Medeiros, s.d., p.4).

O propósito do fortalecimento de uma burocracia nacional em saúde pública acentua o ideal da centralização, levando Barros Barreto (1937, p.339) a desdizer constantemente a acusação de centralização de poder em face de seu caráter de "unificação técnica e da coordenação administrativa dos serviços de saúde pública em todo o país". O problema sanitário dos sertões, segundo o médico, imputava-se em grande parte à "displicência, à falta de orientação dos dirigentes estaduais, à falta de técnicos especializados e à carência de recursos financeiros". Contudo, para ele a maior parcela de culpa pela desorganização sanitária dos estados se devia mesmo à escassez de um papel orientador incisivo da parte do governo federal.

Essa defesa de uma hierarquia coordenada pela esfera federal fazia eco em São Paulo, ora com mais ora com menos sutileza: "A tendência, no Brasil, é da centralização, a partir do governo atual, pois, desde o primeiro império nada prosperou em nossa terra que não fosse centralizado" (Bannitz, 1942, p.21). Borges Vieira (1945, p.11), mais ponderado, concorda sem se comprometer: "faz-se mister uma congregação de esforços coordenados e contínuos, entre todas as unidades da Federação, sob a égide do governo da União a atuar quando necessário e a orientar e coadjuvar as atividades estaduais e municipais".

Por trás desse tipo de posicionamento não se disfarçava a desconfiança com as oligarquias políticas locais, na linha de análise de Oliveira Vianna, que via o poder local como mera extensão do domínio fazendeiro:

Nessa terra de barões onde manda quem pode e obedece quem tem juízo, o homem comum só conseguia encontrar alguma garantia de vida, liberdade e relativa dignidade se estivesse a serviço de algum senhor. Fora disto estava inteiramente desprotegido - a não ser que o Estado interviesse. Aqui, ao contrário da Europa e dos Estados Unidos, o Estado não deveria ser tomado como principal ameaça à liberdade civil, mas como sua única garantia (Brandão, 2007, p.101).

Barreto (1939, p.7) esclarece os prós e os contras da descentralização política no pensamento sanitário epocal:

Se o sistema da descentralização permite amoldar-se talvez melhormente o serviço às exigências locais, arregimentarem-se para sua execução, com maior facilidade, elementos mais conhecedores dos costumes e hábitos da população, obtendo-se, assim, possivelmente, boas vantagens com menores despesas, tem por outro lado os inconvenientes de mais se poder furtar a normas e preceitos básicos gerais, de escapar menos facilmente às exigências nefastas da política, de regra mais ativa, mais acesa e mais recalcitrante nos municípios.

No período de redemocratização que se seguiu a 1945, o municipalismo adquire renovado vigor e apelo doutrinário como pauta para a Constituição de 1946: "Não seria exagerado supor que se buscou, em larga medida, convertê-lo em mito 'fundador' da segunda República" (Melo, 1993, grifo do original). Para esse autor, tratava-se de um aparente paradoxo varguista explicado pela intenção velada de se estabelecer uma relação política direta com os municípios, esvaziando o papel dos estados. No terreno sanitário, entretanto, a 'descentralização municipalista' viria adquirir sua maior visibilidade na terceira CNS, em 1963.

Defendida enfaticamente pelo secretário-geral Mário Magalhães, a municipalização era pautada em duas fronteiras: reconhecimento local dos problemas, operacionalidade dos serviços e menor normatividade; e mais concretamente pela extinção do Sesp e transferência de seus serviços para as municipalidades (Brasil, 1992, p.193). Todavia sua força retórica era superior à consistência da fundamentação apresentada. Mascarenhas (1963, p.225) bem assinala o debate da época (revelando as alteridades conceituais):

Há os que propugnam pela federalização da saúde pública, apontando a incapacidade financeira da maioria dos Estados e da quase totalidade dos governos municipais. Outros defendem a necessidade de reforçar a descentralização já existente, melhorando os serviços de saúde pública nos Estados. Ainda há os municipalistas, que desejam dar muito mais responsabilidades, em matéria de saúde, aos governos locais.

Ele mesmo havia provido o argumento central ao demonstrar que o sistema tributário vigente no país inviabilizava a municipalização dos serviços locais (Mascarenhas, 1948; Mascarenhas, Ferreira, 1950), opinião ratificada uma década depois: "Os governos municipais não estão, financeira, técnica e politicamente capacitados para a direção integral das unidades sanitárias locais" (Mascarenhas, 1963, p.239). Não que desaprovasse a ideia, pelo contrário, via no serviço local uma responsabilidade do município; mas não sem a garantia de sua capacidade comprovada por um padrão sanitário mínimo: rede de água e esgotos mantida em condições satisfatórias; capacidade comprovada de direção nos serviços de higiene e de assistência médico-social ao doente crônico, à gestante e à criança; condi-ções de financiar pelo menos 50% do custo de manutenção dos órgãos; convênio com previsão da contribuição financeira do estado e da União; e acordo de supervisão técnica estadual (Mascarenhas, 1963).

Mas se os fundamentos davam conta do argumento técnico, antigas percepções se remoíam: "outros motivos desaconselham a entrega das unidades locais de saúde aos governos municipais: a influência nefasta da politicagem municipal em atividades técnicas dos governos locais" (Mascarenhas, 1963).

Em São Paulo, o ideal da desconcentração é enfim assumido como uma das balizas mestras da reforma promovida por Walter Leser na Secretaria de Saúde em 1968: "descentralização executiva com centralização normativa"; ideário que alcançaria os anos 1980 (Mello, Ibañez, Viana, 2011, p.858).

Estavam estabelecidas as bases de uma controvérsia de diferentes gerações e correntes de pensamento político e acadêmico, desassossegando o sono daqueles que pensariam o SUS: descentralização versus desconcentração. O certo é que essas incertezas não eram novas ou exclusivas do Brasil. Ainda em 1927 angustiava-se Michael Davis: "Até que ponto a coordenação significa administração centralizada? A questão que os Estados Unidos tiveram por cento e cinquenta anos, entre o governo federal e os estados, o centro de saúde tem hoje entre si e as suas agências constituintes" (1927, p.438).

Regionalização

Regionalização em seu mais amplo conceito significa muito mais do que médicos e hospitais.

(Grant, 1955, p.74) 15 15 "Regionalization in its broadest concept means much more than doctors and hospitals."

Atribui-se de forma consistente a primazia do conceito de regionalização à proposta de reorganização do serviço médico inglês apresentada em 1920 pelo conhecido Informe Dawson (Ministerio..., 1964). No entanto, tão certo quanto o vanguardismo da proposta é sua notável ausência do universo referencial do ideário norte-americano dos CS distritais - modelo benemeritamente exportado para todos os recantos planetários pela força de difusão da Fundação Rockefeller (Mello, Viana, 2012).16 16 Dawson retornaria à cena pan-americana pelas mãos da Opas no forte contexto de planejamento e regionalização em saúde dos anos 1960 (Ministério..., 1964). Embora adiante com clareza o olhar regional - sua referência estrita ao conceito de 'regionalização' certamente incorre em anacronismo - e uma série de preceitos modernos como a própria 'coordenação', sua real influência sobre a conformação do discurso norte-americano e pensamento clássico brasileiro é uma incógnita, uma vez que não surge em suas referências. Alguns indícios parecem significativos. Joseph W. Mountin tinha grande apreço pelo princípio geral do Ministério da Reconstrução inglesa, justamente o responsável pelo estudo de Dawson (Grant, 1953). O próprio John Grant, figura central nessa conceituação, foi quem recomendou a tradução do documento à Opas (Ministério..., 1964, p.V).

O 'distrito' era seu plano regional elementar, pesado no binômio população e área geográfica (Barreto, Fontenelle, 1935). Descrições engenhosas refletiam o momento ainda pré-conceitual da ideia de organização espacial coordenada dos serviços sanitários:

Muitos municípios teriam que ser agrupados, sob a centralização, no mais importante, no Centro-Sede, dispondo-se, em torno, pequenos centros satélites, daquele dependentes (Souza, Vieira, 1936, p.45).

Na capital como no interior, o sistema por assim dizer ganglionar das unidades sanitárias, sensíveis a todos os incidentes sanitários ... (Vieira, 1936, p.12).

É preciso que o Centro de Saúde seja, no distrito sanitário, um verdadeiro sistema solar em torno do qual girem todas as atividades de higiene (Bannitz, 1942, p.18).

De fato a ideia de 'regionalização' na organização sanitária era incipiente, retroagindo seus elementos pré-conceituais concretos à experiência chinesa com o Programa de Reconstrução Rural na década de 1930. Nele, o médico John Grant, ligado à Fundação Rockefeller, compôs a liderança de um extenso programa comunitário de saúde envolvendo uma região urbano-rural de cerca de quatrocentas mil pessoas. Com prioridades de intervenção definidas epidemiologicamente, o programa investiu na capacitação em massa em parceria com o Peking Union Medical College, com destaque para os agentes locais de saúde, ou medical-helper - que mais tarde surgiriam revolucionariamente nos médicos de pés descalços (Grant, 1963).

A partir dessa e de outras experiências, a ideia de regionalização ganha um corpo teórico conceitual principalmente nos anos 1950. Seu foco era dirigido em particular à integração CS, hospital de ensino, formação e treinamento continuado para determinada região. O conceito de integração já não bastava, e Grant (1953, p.10) em memória ao renomado sanitarista norte-americano Joseph Mountin, lembrou que o antigo mestre já postulava que a "integração requer regionalização para implementação".17 17 "integration requires regionalization for implementation."

É, porém, na segunda metade dos anos 1960, década do 'planejamento em saúde' por excelência, que o conceito de regionalização adquire sua forma contemporânea também relacionada ao desenvolvimento regional. Essa questão - naturalmente imbricada com a descentralização - foi amplamente trabalhada e difundida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (WHO, 1968). O brasileiro Marcolino Candau, diretor da OMS, introduz o debate:

A meio caminho entre o nível local - onde os problemas altamente técnicos não podem ser resolvidos - e o nível nacional - onde um equilíbrio teórico às vezes é visto - a região é a plataforma sobre a qual o plano de saúde pública pode ser criado, longe o suficiente de contingências locais para considerá-las com desprendimento, mas perto o suficiente para apreciar a sua importância; longe o suficiente das autoridades centrais para objetividade, mas perto o suficiente para influenciá-las (WHO, 1968, p.1).18 18 "Midway between the local level - where highly technical problems cannot be solved - and the national level - where a sometimes theoretical equilibrium is sought - the region is the platform on which the public health plan can be fashioned, far enough from local contingencies to regard them with detachment, but near enough to appreciate their importance; far enough from the central authorities for objectivity, but near enough to influence them."

Nesse início o conceito de região foi definido como:

uma área geográfica de um país que é o objeto de planejamento para desenvolvimento socioeconômico. Ela geralmente coincide com uma ou mais unidades administrativas e frequentemente é caracterizada por propriedades topográficas, demográficas, culturais, sociais ou econômicas especiais, o que faz necessário ou desejável o planejamento em separado (WHO, 1968, p.6).19 19 "a geographical area of a country which is the object of planning for socio-economic development. It usually coterminous with one or more administrative units and often characterized by special topographic, demographic, cultural, social or economic properties which make separate planning necessary or desirable."

No Brasil a visibilidade da regionalização se revela nos Anais do 17oCongresso Brasileiro de Higiene, em 1968, quando, ao contrário das edições anteriores, o conceito se torna orgânico da ideia de integração nas áreas de administração e planejamento. A partir da década de 1970 já é comum encontrar o conceito nos projetos de reorganização sanitária.

Universalidade (socialização da medicina)

"Cada hora tem sua verdade" e nossa verdade, no momento, é encarar o exercício da profissão médica sob duas formas: a liberal e a socializada.

(Borges, 1951)

A criação do Ministério da Educação e Saúde Pública em 1930, início do governo Vargas, é aventada como prenúncio federal da universalidade da assistência na saúde pública brasileira por Cristina Fonseca (2007). Certamente cabe um exame mais detido sobre a questão que foge ao escopo deste texto. Aqui interessa primeiro considerar que uma empreitada nessa direção deve distinguir os limites históricos do termo 'universalidade'; levando sua recuperação semântica à ideia da 'socialização da medicina', assinalada precocemente por Souza e Vieira (1936, p.33): "No seu conjunto, o terreno começava a ser desbravado, para enfrentar a inevitável socialização, para qual caminha a medicina".

Passada uma década da criação do ministério, do mesmo posto de enunciação se pode observar a tendência do conceito em se afastar da fatalidade, afinando-se como direito social: "Todos têm direito à saúde e os doentes e desvalidos têm direito à assistência. A socialização da medicina cada vez mais se afirma" (Vieira, 1945, p.4).

Durval Rosa Borges, antevendo a influência dos ideais ingleses de Beveridge sobre a previdência brasileira, foi quem de modo mais precoce e específico se ocupou em problematizar a alternativa liberal diante da 'inevitável' socialização da medicina (1943). Com notável tino do porvir, conclamou os médicos a assumir as rédeas desse processo: "Só assim não teremos surpresas, nem decepções, quando forem adotadas medidas, que atinjam a Medicina e os médicos. 'Que estas sejam ditadas e orientadas pela própria classe'" (p.10, grifo original). Era uma a preocupação essencial: "A Medicina Liberal subsistirá, ou será substituída pela medicina de Estado, completamente socializada? Estes quesitos atingem agora justamente nestes anos em que a nossa Previdência Social terá que se unificar e tomar rumos definitivos" (p.77).

Não se tratava de rejeição ao desígnio, mas aos valores correlacionados: "Na verdade, não podemos e ninguém poderá negar que a socialização da Medicina é a única solução idônea para atender aos reclamos, inconscientes alguns, da nossa gente" (Borges, 1943, p.126). Se não se podia evitar uma classe de "médicos-funcionários", que esse assalariamento ficasse reservado aos sanitaristas em funções de controle, avaliação e prevenção social, de forma que "a clínica privada ficaria livre e a filosofia liberal, salva" (p.79). Em resumo: "Medicina Preventiva para o Estado, e Medicina Liberal para o artesão médico" (p.84).

Certo clima fantasmagórico transparece do comentário de Mascarenhas (1949, p.16) quando enfatiza que a problemática do debate norte-americano acerca do medical care equivaleria entre nós "à tão discutida, à tão temida 'socialização da medicina'" (grifos do original). Não passariam dois anos para que ao assunto fosse reservado um dos cinco temas do terceiro Congresso da Associação Paulista de Medicina. Estavam lá próceres do pensamento médico paulistano, como Humberto Pascale, Samuel Pessoa e Durval Borges.

Em furtivo darwinismo social, a assistência médica como direito social era aceita como uma 'evolução' natural da sociedade, cabendo apenas encontrar-lhe o melhor caminho: "A socialização da medicina em nosso meio é uma realidade. Atingiu capital e interior. Não adianta desejá-la ou não. Cumpre aceitá-la e batalhar para que se torne justa e útil" (Benevides, 1951, p.481). Em um mundo politicamente polarizado, restava equacionar uma forma de harmonização entre solidariedade e 'dever' médico e a doutrina liberal, tema sempre envolto em névoa soviética. Havia dois universos a considerar:

a) o da socialização total, onde ao lado da medicina, seriam socializados todos os meios de produção e de atividade humana; b) o da socialização parcial, no qual a medicina seria socializada, apesar do regime vigente no país, com o objetivo de estender a toda comunidade os benefícios da assistência médica mantida pelo estado (Silveira, 1951, p.485).

As cerca de 130 páginas dedicadas ao tema nos anais do encontro indicam a incoerência da socialização 'unilateral' da medicina em um país não orientado pela doutrina socialista. Enquanto a sociedade brasileira mantivesse seu alinhamento ao capitalismo, a segunda opção era obviamente a única aceitável, e o seguro social previdenciário tido como o melhor caminho para a medicina assistencial. A interminável tensão semântica do conceito de 'público', testemunhariam as décadas, marcava grave oposição ao sentido de estatal para a 'nacionalização dos serviços' (a liberdade de escolha do médico não é detalhe na ideologia liberal):

Socialização é um processo mais amplo, em que os serviços pertencem à coletividade e a ela são prestados sem pagamento, o Estado não o explorando em seu benefício, nem em benefício de outrem. ... ou seja, a chegada até o povo de assistência médica, como um serviço público. ... um serviço público, oferecido a todos independentemente de suas posses, não sendo o médico pago diretamente pelo cliente, mas pelo Estado ou instituições assistenciais. A livre escolha do médico geralmente desaparece, embora existam importantes exceções, como na Inglaterra, onde a escolha pode ser feita, até certo limite (Borges, 1951, p.448).

Notório comunista, Samuel Pessoa (1951, p.17) admitia nexo no pressuposto de que a total "transformação do médico artesão em funcionário" do Estado ou de empresas não era o caminho imediato, seja pela impossibilidade operacional, seja porque o assalariamento contribuiria apenas para "aumentar a classe dos explorados".

Desde que a Medicina, bem como toda a sociedade, marcha incontestavelmente para um regime socialista, o médico deve lutar para que a socialização de sua classe só se processe no conjunto da socialização de todos os meios de produção e de distribuição (sociedade socializada) e não como fato isolado numa sociedade capitalista.

O 'eixo' da saúde socializada não poderia ser outro: "organizar os Postos de Higiene e Centros de Saúde de modo a torná-los de fato eficientes, eixo que serão, no futuro, da assistência médico-sanitária socializada" (Pessoa, 1951, p.519). Essa socialização não poderia admitir a desarmonia corrente entre as filhas de Esculápio, Higeia e Panaceia: "divorciaram-se completamente as atividades hospitalares das de saúde pública ... ambos se completam, porque o programa de saúde pública começa antes do nascimento do indivíduo, continua durante a vida e vai até depois da morte" (Pessoa, 1949, p.553).

Contrariando, porém, o vaticínio de Pessoa, a conjuntura política e social das décadas seguintes - sem perder de vista a função orientadora da Organização Pan-americana de Saúde (Opas) - desacelera o debate social e setorial, retrai a atuação da saúde pública, e a questão do acesso à medicina curativa é enfim transferida para as políticas previdenciárias (Possas, 1981).

A radicalização do pensamento sanitário da década seguinte inicia a reversão desse processo, principalmente pela atuação do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes). Seu marco discursivo é estabelecido no primeiro Simpósio de Política Nacional de Saúde, em 1979, quando 'o direito à saúde como direito universal e inalienável' é aprovado como princípio (Cordeiro, 2004). A exemplo do que ocorre com a integração sanitária e integralidade, a socialização da saúde subsume-se definitivamente no conceito de universalidade.

A renovação política e de nomenclaturas do sanitarismo dos anos 1970 fez com que na década seguinte já não tivesse qualquer sentido aludir à "socialização da medicina". No poente de uma era sanitária, Mascarenhas (1976, p.114) respondia a seu próprio questionamento, num classicismo nitidamente fora de moda: "A socialização dos serviços médicos é inevitável? Podemos afirmar que sim, principalmente nos países em desen-volvimento, onde a grande maioria da população sobrevive com salários anelásticos muito baixos".

Aparentemente distante do pensamento clássico, a sétima CNS, com seu icônico Prev-Saúde, trança de modo indelével os conceitos da integralização, regionalização, descentralização e universalidade dentro de uma política de Estado (Brasil, 1980). Discurso, conceitos e mentalidade se aproximam como nunca.

Considerações finais

Com o intuito de contribuir para a história do SUS, este texto almejou a recuperação inicial de alguns dos principais conceitos sanitários em sua trajetória no pensamento clássico da saúde pública brasileira em tempos de centros de saúde. Esses conceitos certamente continuaram suas jornadas semânticas e pedem olhares mais específicos sobre os agitados anos 1980.20 20 Para uma extensiva análise sobre federalismo, ver Viana, 1994.

É difícil, entretanto, resistir ao salto histórico no exercício de enxergar algum direcionamento mais aparente para o século XXI. A universalidade, noção contemporânea imbuída de direito de cidadania e valores positivos de saúde, parece inquietar-se em sua ilimitabilidade, espreitada pela judicialização da saúde. O debate da descentralização adentra período de desaceleração, instado pelas consequências de seu desarrimo histórico com os ideais da regionalização (história bem representada nas normativas do SUS). Renovam-se os ideais da integração - integration - entre assistência e saúde pública.21 21 Em junho de 2012, o American Journal of Public Health dedicou um suplemento à questão (v.102, Issue S3).

Por fim, apontam-se indícios de rupturas epistêmicas em dois campos conceituais. Primeiro, a integralidade lança-se em duas frentes mais visíveis: de um lado sobre aquele componente intersetorial esquecido no tempo, ávido pela capacidade indutiva do SUS em ciência, tecnologia e inovação (Guimarães, 2005; Viana, Elias, 2007; Viana, Bousquat, Ibañez, 2012); e de outro, sobre a ideia de 'redes integradas de atenção à saúde', um tanto ainda afeita à recuperação dos conceitos de coordenação e continuidade do cuidado, mas com presença inédita de novos componentes gerenciais e outros assumidamente subjetivos como "colaboração" e "interdependência", opondo-se à tradição do pensamento burocrático (Hartz, Contandriopoulos, 2004). Na segunda frente, o amadurecimento do conceito de regionalização deverá ser decisivo na dinâmica de todo esse conjunto (Viana, Lima, 2011), especialmente ao incorporar a lógica dos sistemas complexos adaptativos. Como lembra Araújo (2008, p.51), influenciado pela ideia da circularidade entre o conceito e o real de Reinhart Koselleck: todo conceito "é sempre uma posição provisória entre o linguístico e o extralinguístico".

Notas

Recebido para publicação em novembro de 2010.

Aprovado para publicação em abril de 2012.

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  • *
    Artigo originado da tese de doutoramento do autor. Ver Mello, 2010.
  • 1
    Para o pleno entendimento da questão deve-se ter em mente que o CS inaugura um conhecimento na organização sanitária da saúde pública, e, por isso, parte do universo conceitual daquele início equivale ao próprio debate contemporâneo de 'sistemas de saúde' - expressão que só ganha sentido conceitual em meados da década de 1970.
  • 2
    Sobre "sinais indiciários", ver Ginzburg, 2009.
  • 3
    Excepcionalmente manteve-se aqui a citação na língua original, uma vez que no Brasil
    comprehensive foi desde o início traduzido por 'integral', enquanto que em Portugal optou-se por 'abrangente'. A primeira impressão brasileira de Starfield (2002) inicialmente traduz
    comprehensive por 'abran-gente' para logo na sequência utilizar "integral" (a transição está nas páginas 46-47).
  • 4
    "We have seen an evolution in business life resulting in the department store, housing under one roof shopping opportunities varying from needles and thimbles to automobiles and house lots. In more recent years we have seen the birth, growth and development in the health and welfare field of an institution which has aptly been called the 'department store of health,' but technically described as the 'health center'". Nesta e nas demais citações de texto em outros idiomas, a tradução é livre.
  • 5
    A respeito da tradução de
    comprehensive, ver nota 3.
  • 6
    "After World War II, however, as a reaction against the growing tendency toward specialization in American medicine, a new emphasis appeared that was labelled 'comprehensive care'".
  • 7
    Com o apoio da Fundação Rockefeller, a UNRRA tinha o paulistano Geraldo de Paula Souza em seus quadros.
  • 8
    "If the effort of improving on customary methods is successful, it should result in coordinated medical care extending through time, and this may be denoted properly as 'comprehensive'".
  • 9
    A reunião de escolas médicas norte-americanas na Conferência de Colorado Springs em 1952 teve um papel importante nesse processo ao redefinir o novo sujeito do discurso e sua matriz discursiva: sai de cena a 'higiene' para ceder espaço à nova 'medicina preventiva' (Wolf Jr., 1964; Desrosiers, 1996) - referencial tornado pan-americano por meio das famosas conferências de Viña Del Mar (Chile) em 1955 e Tehuacán (México) em 1956 (Mascarenhas, Wilson, Bourroul, 1961-1962). Tal mudança também coincide com a aposentadoria da benemerência Rockefeller e posterior entrada da filantropia da Fundação Kellogg's com seu foco na educação médica.
  • 10
    "No escapará al lector nuestra tendencia hacia una asistencia más humanizada y más integral, y al mismo tiempo mejor organizada ... el interés de destacar a la coordinación de la sanidad como función principal e imprescindible de lo que se da en llamar 'Centro de Salud'. Alguno cree que sin tal coordinación no puede considerarse a un organismo 'Centro de Salud'".
  • 11
    O informe brasileiro descreve a falta de coordenação entre o governo federal, os estados, os serviços paraestatais e privados, com ênfase para o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS): "Não existe coordenação entre as unidades sanitárias e os hospitais das mesmas áreas. Essa falta de coordenação não permite às unidades sanitárias atender aos pacientes que necessitam de hospitalização" (OPS, 1968, p.10).
  • 12
    Como possíveis motivações não se devem desconsiderar o próprio processo de renovação linguística como elemento de ruptura política ou epistêmica nem a completa rejeição ao Sesp da radicalidade dos anos 1970-1980, como dito, quase sinônimo do conceito de integração no país.
  • 13
    Para um contexto internacional específico, ver Mills, 1990.
  • 14
    Essas afinidades variam ao longo do tempo, e o olhar contemporâneo deve estar atento ao progressivo imaginário democrático que se fortalece na esfera da descentralização e, em particular, ao período mais intenso de mescla conceitual com o federalismo que se segue à Constituição de 1988 (Souza, 2005 ). Essa autora lembra ainda que apenas as esferas federal e estadual participam do campo teórico do federalismo, o que deixa a partilha municipal para o âmbito do debate da descentralização.
  • 15
    "Regionalization in its broadest concept means much more than doctors and hospitals."
  • 16
    Dawson retornaria à cena pan-americana pelas mãos da Opas no forte contexto de planejamento e regionalização em saúde dos anos 1960 (Ministério..., 1964). Embora adiante com clareza o olhar regional - sua referência estrita ao conceito de 'regionalização' certamente incorre em anacronismo - e uma série de preceitos modernos como a própria 'coordenação', sua real influência sobre a conformação do discurso norte-americano e pensamento clássico brasileiro é uma incógnita, uma vez que não surge em suas referências. Alguns indícios parecem significativos. Joseph W. Mountin tinha grande apreço pelo princípio geral do Ministério da Reconstrução inglesa, justamente o responsável pelo estudo de Dawson (Grant, 1953). O próprio John Grant, figura central nessa conceituação, foi quem recomendou a tradução do documento à Opas (Ministério..., 1964, p.V).
  • 17
    "integration requires regionalization for implementation."
  • 18
    "Midway between the local level - where highly technical problems cannot be solved - and the national level - where a sometimes theoretical equilibrium is sought - the region is the platform on which the public health plan can be fashioned, far enough from local contingencies to regard them with detachment, but near enough to appreciate their importance; far enough from the central authorities for objectivity, but near enough to influence them."
  • 19
    "a geographical area of a country which is the object of planning for socio-economic development. It usually coterminous with one or more administrative units and often characterized by special topographic, demographic, cultural, social or economic properties which make separate planning necessary or desirable."
  • 20
    Para uma extensiva análise sobre federalismo, ver Viana, 1994.
  • 21
    Em junho de 2012, o
    American Journal of Public Health dedicou um suplemento à questão (v.102, Issue S3).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      01 Nov 2010
    • Aceito
      01 Abr 2012
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