Resumo
O artigo apresenta um diálogo entre as experiências brasileiras, canadenses e italianas quanto aos desafios colocados por avaliações éticas “externas” (feitas por comitês de ética e órgãos correlatos) e “internas” (resultante dos debates dos/as próprios/as pesquisadores/as) à história oral. Pretende demonstrar as diferentes maneiras de lidar com as imposições estranhas à área, revelar as estratégias de ação colocadas em prática e destacar questões centrais para o trabalho responsável com história oral. O espírito que anima a escrita é o de repensar as próprias experiências e de aprender com as alheias.
ética na pesquisa; história oral; Brasil; Canadá; Itália
Abstract
This article presents a dialogue between the experiences of Brazil, Canada, and Italy in addressing the challenges posed by ethical evaluations, both “external” (by ethics committees and related bodies) and “internal” (in debates among researchers themselves), of oral history. It attempts to demonstrate the different ways impositions from outside the area have been handled, the action strategies adopted, and issues central to responsible work in the sphere of oral history. It is written with the spirit of rethinking one’s own experiences and learning from those of others.
research ethics; oral history; Brazil; Canada; Italy
O presente artigo explora o debate sobre a ética na história oral por meio da comparação entre diferentes realidades nacionais, atentando para políticas de avaliação ética na pesquisa “envolvendo seres humanos”, e para os princípios adotados pelos/as praticantes dessa metodologia de pesquisa. A escolha do Brasil, do Canadá e da Itália para o exercício comparativo se deve à riqueza e à diversidade da experiência e da tradição da história oral nesses países e também à contemporaneidade dos seus debates sobre ética.
O caso brasileiro
No Brasil, a avaliação ética dos projetos de história oral segue atualmente os parâmetros da resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que complementa em alguns aspectos e substitui em outros as resoluções CNS 196/1996 (Brasil, 10 out. 1996) e 466/2012 (Brasil, 2012). O documento de 1996 instituiu o sistema brasileiro de avaliação ética da pesquisa envolvendo seres humanos, formado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e pelos Comitês de Ética (CEPs). O chamado sistema CEPs/Conep está abrigado no CNS, ligado ao Ministério da Saúde.
O sistema funciona baseado nas premissas da bioética. Como explica Cynthia Sarti (2015, p.86), o campo de estudos da bioética nasce “na tentativa de regulamentar o comportamento ético das pesquisas experimentais do campo biomédico, em resposta às atrocidades cometidas em nome da ciência contra indivíduos e populações”. Marcada pelo propósito de evitar “as experiências de violência do século XX, em particular na Alemanha nazista”, também, segundo a pesquisadora, “a bioética não se confunde com o campo da ética, que a transcende e a ela antecede; mas configura uma construção histórica da questão em função de problemas suscitados pelas próprias ciências da saúde, que implicam intervenção nos corpos, e pelas tecnologias a ela associadas” (Sarti, 2015, p.86).
Extrapolando a área da saúde, a avaliação da ética na pesquisa no Brasil foi ampliada para todas as áreas do saber, inclusive para as ciências humanas e sociais. Entidades como a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (Anpepp), a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS) e seus/suas pesquisadores/as, já no início desse processo, envolveram-se em iniciativas críticas quanto à avaliação de projetos por parâmetros externos às suas áreas (Duarte, 2017).
Quando o sistema começou a ser implantado no Brasil, em 1996, os/as praticantes de história oral estavam envolvidos/as na criação da Associação Brasileira de História Oral (ABHO), que se deu em 1994, e no lançamento de sua revista, História Oral, em 1997. Naquele contexto, foi publicada a primeira edição de Usos e abusos da história oral (Amado, Ferreira, 1996), obra que se tornou clássica para os/as interessados/as na metodologia. Congressos regionais, nacionais e internacionais começavam a ser realizados, como o décimo Congresso Internacional de História Oral, no Rio de Janeiro, em 1998, que resultou na publicação de História oral: desafios para o século XXI (Ferreira, Fernandes, Alberti, 2000). Em 1997, a revista Projeto História, da PUC-SP, publicou o dossiê “Ética e história oral”. Os dados indicam o vigor organizativo e editorial, os propósitos de dar visibilidade às pesquisas feitas no Brasil, de dialogar com pesquisadores/as estrangeiros/as, de contribuir para a formação dos/as praticantes e de conquistar legitimidade acadêmica para a metodologia. Nas publicações mencionadas, no entanto, o tema da avaliação ética externa das pesquisas não foi contemplado, o que sugere que esse não era, ainda, um problema para a história oral no Brasil.
Desde o início da década de 2000, no entanto, entidades das ciências humanas e sociais se envolveram em mobilizações para pressionar a Conep no sentido de que as particularidades de suas pesquisas fossem reconhecidas no processo de avaliação ética. Como registra a cronologia organizada por Luís Fernando Dias Duarte (2017), foram promovidos eventos, publicados livros e estimulada a participação em uma consulta pública que visava alterar a regulamentação criada em 1996, o que veio a se efetivar por meio da resolução CNS 466/2012. Em um dos artigos da coletânea Antropologia e ética: o debate atual no Brasil (Víctora et al., 2004), o antropólogo Luís Roberto Cardoso de Oliveira (2004, p.33) diferenciava as pesquisas “em” seres humanos das pesquisas “com” seres humanos: “No caso da pesquisa ‘em’ seres humanos, a relação com os sujeitos, objeto da pesquisa, tem como paradigma uma situação de intervenção, na qual esses seres humanos são colocados na condição de cobaias”. Ainda segundo Oliveira, “no caso da pesquisa ‘com’ seres humanos ... o sujeito da pesquisa” assume “o papel de ator (ou de sujeito de interlocução)” (p.34; destaque do autor). As observações dirigidas ao campo da antropologia são pertinentes também à história oral. Relatos sobre os problemas enfrentados em pesquisas das ciências sociais quando submetidas aos CEPs podem ser encontrados na obra mencionada e em outras (Fleisher, Schuch, 2010; Duarte e Sarti, 2013; Sarti, 2015).
A resolução CNS 466/2012 manteve a inspiração na bioética e exigências como a apresentação de detalhados Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLEs), a previsão de potenciais riscos gerados pela pesquisa aos/às participantes e a proposição de estratégias de indenização caso tais riscos se efetivassem; assim como o princípio da privacidade dos/as participantes da pesquisa durante todas as suas fases e a submissão ao sistema CEPs/Conep de projetos de todas as áreas do conhecimento, ainda que os comitês fossem formados basicamente por profissionais da saúde.
Reconhecendo o mal-estar disseminado entre as entidades e pesquisadores/as, a resolução CNS 466/2012 previu a redação de uma “resolução complementar” para tratar das particularidades das pesquisas nas ciências humanas e sociais. Para dar conta da tarefa, a Conep criou o Grupo de Trabalho Ciências Humanas e Sociais (GT CHS), que funcionou entre 2013 e 2015, contando com a participação de representantes de quase duas dezenas de entidades da área, bem como de técnicos e gestores da Conep. Em clima de tensão e conflito, o grupo redigiu uma minuta de resolução que foi submetida à consulta pública e ao crivo da Conep. Depois de aprovada pelo CNS, essa minuta se transformou na resolução CNS 510/2016, hoje em vigor.
Quando as entidades das ciências humanas e sociais foram convidadas pela Conep para participar do GT CHS em 2013, seus representantes tiveram que decidir entre duas estratégias de atuação: (1) rejeitar o sistema CEPs/Conep e orientar-se por códigos de ética próprios; (2) lutar pela adequação do sistema à realidade das suas pesquisas. A completa rejeição do sistema mostrou-se inapropriada, pois poderia impedir o acesso a financiamentos públicos, à publicação dos resultados em determinadas revistas acadêmicas e à realização das pesquisas em certas instituições. A elaboração de códigos de ética foi enfrentada por algumas áreas (ABA, 2012; SBS, 2019; Carta..., maio 2015). Ainda assim, os projetos das áreas que já contavam com códigos próprios de ética não ficaram isentos da avaliação pelo sistema CEPs/Conep.
A segunda estratégia – buscar a adequação do sistema às particularidades das ciências humanas e sociais – foi colocada em prática a partir de 2013, por meio da participação de representantes das entidades no GT CHS. A Associação Nacional de História (Anpuh Brasil) e a ABHO participaram do GT.1 Cerca de um ano após o encerramento dos trabalhos do grupo, junto com a historiadora Ângela de Casto Gomes, da Universidade Federal Fluminense (UFF), entrevistei o professor Luís Fernando Dias Duarte, do Museu Nacional. Ambos haviam participado do GT, ele representando a ABA, ela como representante da Anpuh Brasil e da ABHO. O professor Luís Fernando assim narrou o começo dos trabalhos:
A minha manifestação nessa primeira reunião do GT foi bastante áspera, fazendo um retrospecto de todas as humilhações e mal-estares sentidos até aquele momento e falando da pouca expectativa que nós tínhamos em relação ao que viria a acontecer. O Jorge Venâncio2 ... disse que ia haver toda a liberdade, que nós teríamos todas as condições de trabalhar, para isso que tínhamos sido convidados e tal. Éramos convidados. Então, com isso, também baixei um pouco a bola da exposição mais antagonista e começamos a trabalhar (Duarte, 12 dez. 2016).
Essa fala é indicativa da desconfiança inicial em relação à possibilidade de diálogo entre os/as representantes das instituições e o sistema de avaliação estabelecido. As dificuldades também decorriam da diversidade de origem dos membros do GT. Recorro novamente às palavras do professor Luís Fernando:
Uma coisa que sempre me chamou atenção era a dificuldade que nós tínhamos de nos entender, porque (risos) eu não sabia nada sobre métodos de pesquisa em psicologia, nem profissionalmente em história oral, e vice-versa etc. As questões que eram pertinentes, do ponto de vista ético, para as psicologias são muito diferentes das questões que são pertinentes para a sociologia, antropologia, direito etc. Isso foi um aprendizado duro – que nós nos fizéssemos entender entre nós. Além do mais, [havia] as dissonâncias dentro dos próprios saberes (Duarte, 12 dez. 2016).
A professora Ângela de Castro Gomes chamou a nossa atenção, por exemplo, para o grande número de membros do grupo, para a “diversidade de associações, portanto, de perspectivas” e para “uma flutuação às vezes de representantes – o que significava um trabalho [adicional] para aquele novo membro tomar pé do que se estava falando”. A professora Ângela também registrou que havia “um conjunto diferenciado de pessoas que comparecia às reuniões do GT, algumas vezes não sistematicamente, apareciam em algumas reuniões, não vinham mais, apareciam outras pessoas. Quer dizer, isso exigia que os membros do GT tivessem um contínuo esforço de controle daquilo que estava sendo desenvolvido” (Duarte, 12 dez. 2016).
No período entre 2013 e 2015, enquanto funcionava o GT CHS, os/as profissionais de história oral no Brasil se dedicaram a pensar sobre as dimensões éticas do seu trabalho e as formas de adaptar as cobranças do sistema CEPs/Conep às particularidades de suas pesquisas. Em maio de 2014, o 12º Encontro Nacional de História Oral (Teresina-PI), teve como tema “Política, ética e conhecimento” (ABHO, 2014). No mesmo ano, a revista História Oral publicou o dossiê “Ética e história oral” (Grinberg, Frotscher, 2014). Também em 2014, como presidenta da ABHO, fui convidada para a Jornada Ética e História, promovida pela Anpuh Brasil, na Unirio, da qual também participaram as historiadoras Ângela de Castro Gomes e Verena Alberti, profissionais que trabalham com história oral. Ao final dos debates, foi criada uma comissão para redigir uma “Carta de princípios éticos” a ser submetida à assembleia da associação, em julho de 2015, em Florianópolis (Nota..., 2014). As três pesquisadoras mencionadas fizeram parte da comissão.
A minuta da “Carta de princípios éticos” foi divulgada no site da entidade em junho de 2015 (Carta..., maio 2015). Sua escrita levou em conta fatores como: a regulamentação da profissão do/a historiador/a em tramitação no Congresso Nacional; as discussões sobre o lugar da história e da memória, tendo em vista o funcionamento de diversas comissões da verdade, relativas à última ditadura; o crescimento das demandas feitas aos/às historiadores/as pelos meios de comunicação; a limitação do mercado de trabalho frente ao alto número de profissionais formados; a ênfase na produtividade de pesquisadores e de programas de pós-graduação pelas agências de fomento; e, finalmente, os crivos “dos comitês de ética existentes, sabidamente orientados por outro tipo de lógica científica”. Considerando esses fatores conjunturais elencados, “uma longa tradição de reflexão interna à própria disciplina” e a existência de um rico debate sobre história e ética em “outras comunidades historiográficas”, a carta apresentou uma lista de princípios gerais. Entre eles, há um que trata especificamente da história oral:
No caso do uso da metodologia de história oral, é fundamental que o entrevistado conheça os objetivos da pesquisa e consinta explicitamente em dela participar, podendo este consentimento ser expresso de forma escrita ou oral. Cabe ao historiador cumprir fielmente os termos do consentimento, especialmente no que diz respeito à divulgação ou não da identidade dos envolvidos e à autorização ou não do uso dos registros produzidos. A garantia do anonimato reside no compromisso de não só omitir o nome do entrevistado como informações que possam identificá-lo. Possibilitar que os sujeitos envolvidos na pesquisa tenham acesso ao conhecimento construído a partir dos seus relatos é um procedimento altamente recomendável (Carta..., maio 2015).
Os princípios listados dialogam com a prática da história oral, mas também com alguns pontos centrais da discussão que estava em curso no GT CHS. Entre eles se encontrava a questão do registro do consentimento (a opção de ser registrado oralmente em vez de por escrito) e a possibilidade da divulgação ou não da identidade dos/as envolvidos/as (e não a obrigatoriedade do anonimato, como previsto nas resoluções CNS 196/1996 e 466/2012).
Em 2015, eventos regionais da ABHO abriram espaço para a discussão do tema, como aconteceu em Parintins (AM), em Salvador (BA) e em Niterói (RJ) (ABHO, 2015a, 2015b). No mesmo ano, a diretoria da ABHO enviou suas sugestões à consulta pública destinada a avaliar a minuta da nova resolução CNS, redigida pelo GT CHS, e conclamou seus/suas associados/as a participarem dela. Alguns dos pontos defendidos pela ABHO em sua contribuição à consulta pública foram contemplados na resolução CNS 510/2016: a menção à Lei de Acesso à Informação (Brasil, 18 nov. 2011), a possibilidade de identificação dos/as entrevistados/as, a opção de registrar o consentimento verbalmente, o compromisso de elaboração de formulário próprio para a submissão de projetos das ciências humanas e sociais na Plataforma Brasil (portal pelo qual os projetos são encaminhados à Conep e distribuídos aos CEPs) e a menção à composição equitativa da Conep. Não foi contemplada a demanda referente à exclusão dos trabalhos de conclusão de curso de graduação (TCCs) da avaliação pelos CEPs. A questão da previsão e gradação dos riscos que as pesquisas poderiam gerar aos/às participantes não foi tratada na resolução.
Pode-se dizer que a resolução CNS 510/2016 representou avanços em relação à 466/2012. Ela não menciona a palavra “bioética”, inicia com o registro dos pressupostos próprios que baseiam a pesquisa nas ciências humanas e sociais, e não com princípios gerais que deveriam ser observados em toda e qualquer pesquisa. Com base em tais princípios, o artigo nono trata dos direitos dos/as participantes, os quais cito textualmente:
I – ser informado sobre a pesquisa; II – desistir a qualquer momento de participar da pesquisa, sem qualquer prejuízo; III – ter sua privacidade respeitada; IV – ter garantida a confidencialidade das informações pessoais; V – decidir se sua identidade será divulgada e quais são, entre as informações que forneceu, as que podem ser tratadas de forma pública; VI – ser indenizado pelo dano decorrente da pesquisa, nos termos da Lei; e VII – o ressarcimento das despesas diretamente decorrentes de sua participação na pesquisa (Brasil, 24 maio 2016).
Antes de passar ao caso canadense, no entanto, considero válido compartilhar algumas observações sobre o debate brasileiro da ética na história oral, que se distingue do debate acerca dos comitês de ética. No contexto de funcionamento do GT CHS, como já mencionado, a revista História Oral lançou um dossiê sobre ética contendo apenas três artigos. Eles foram escritos por um antropólogo brasileiro (Duarte, 2014), um historiador argentino (Pozzi, 2014) e uma historiadora brasileira (Costa, 2014). O primeiro autor, que não pratica a história oral, tratou das disputas e articulações relacionadas ao sistema CEPs/Conep e ao GT CHS; o segundo apresentou e comentou o caso do Boston College (tema que será retomado adiante); a terceira tratou do papel da interpretação e da escuta nos resultados de uma pesquisa em particular. Dessa resposta tímida ao chamado da revista, pode-se inferir que a mobilização em torno da questão dos comitês de ética que ganhou corpo nos eventos acadêmicos, na contribuição para a escrita da “Carta de princípios éticos” da Anpuh Brasil e na participação da ABHO no GT CHS não resultou em publicações, como aconteceu em áreas vizinhas, como a antropologia e a sociologia.
Apesar disso, não se pode negar a existência do debate brasileiro sobre ética na história oral. Ainda que não esteja nas pretensões do presente artigo recuperar tal debate, pode-se lembrar alguns de seus marcos e temas, começando pelos dossiês “Ética e história oral”, publicados nas revistas Projeto História (1997) e História Oral (2014). Algumas pistas sobre os temas que preocupavam os/as oralistas brasileiros/as no final da década de 1990 podem ser encontrados nas perguntas feitas a Alessandro Portelli (1997) e Alistair Thomson (1997), palestrantes estrangeiros participantes do evento que deu origem ao primeiro dossiê. As questões dirigidas a Portelli giraram em torno de disponibilização e publicação de entrevistas, direitos autorais, transcrição, diferenças culturais, hierarquias de poder, dialetos, estranhamento e identificação entre pesquisador/a e entrevistado/a. Thomson foi inquirido sobre amizade e postura profissional, tratamento de experiências dolorosas, riscos emocionais, paixão pelo tema pesquisado, repercussão pública dos trabalhos e relações entre memória individual e memória das comunidades. Como se vê, as questões disseram respeito ao processo de realização da entrevista, ao produto resultante da mesma e ao lugar da interpretação. Ainda que todas essas questões se refiram aos cuidados necessários em “pesquisas envolvendo seres humanos”, elas revelam preocupações diferentes daquelas que orientavam os então recém-criados comitês de ética. Outros temas, como o compromisso da “devolução” dos resultados da pesquisa aos participantes, as trocas entre as pessoas envolvidas e os desafios em projetos de memórias de empresas foram contemplados nos artigos de Janaína Amado (1997) e Marieta de Moraes Ferreira (1997), duas das profissionais pioneiras na história oral brasileira.
Do outro dossiê mencionado, destaco o artigo de Cléria Botelho da Costa (2014), intitulado “A escuta do outro: os dilemas da interpretação”. Tomando por base a entrevista concedida por um agricultor ligado ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, em Brasília, a autora refletiu sobre o seu papel e o dele na interpretação do material resultante da pesquisa. Para responder à insatisfação do entrevistado – que não concordara com a interpretação feita sobre a sua narrativa –, a pesquisadora dedicou-se a refletir a respeito de seu próprio fazer e voltou a dialogar com o entrevistado. Desse processo nasceu um belo artigo que ensina sobre a postura de escuta do outro (inseparável da história oral) e o compromisso da interpretação, etapa indispensável da metodologia.
O artigo de Costa pode ser tomado com um exemplo do formato que a discussão acerca da ética na história oral tem assumido no Brasil. Ela acontece no seio de publicações sobre resultados pontuais de pesquisas, oportunidades em que são debatidas as escolhas relativas à temática e ao perfil das pessoas entrevistadas, as circunstâncias e os cuidados na interação com os/as participantes, as seleções operadas no momento da análise, os usos de entrevistas feitas por terceiros no ensino de história, a presença da subjetividade, os silenciamentos e ênfases, os traumas e temas sensíveis, as relações entre história e memória, experiência e testemunho, passado e presente, indivíduo e coletividades etc.3 Trata-se de um esforço contínuo, ainda que pulverizado, de autorreflexão, esforço movido por preocupações geralmente diversas das exigências dos comitês de ética.
O caso canadense
Com base nos artigos de Nancy Janovicek (2015) e de Anna Sheftel e Stacey Zembrzycki (2016), explorarei elementos do debate sobre ética e história oral no Canadá. Os trabalhos foram escolhidos porque sua escrita é contemporânea ao debate em torno da resolução CNS 510/2016 e porque permitem refletir a respeito da tensão entre a avaliação institucional e aquela que tem sido feita pelos/as próprios/as praticantes da metodologia.
O artigo “Oral history and the ethical practice after TCPS2” faz parte da coletânea The Canadian oral history reader, organizada por Kristina R. Llewellyn, Alexander Freund e Nolan Reilly, publicada em 2015. A intenção de Janovicek é avaliar a segunda edição do Tri-Council Policy Statement: Ethical Research Involving Humans (TCPS2), documento que registra a política nacional elaborada pelas agências financiadoras canadenses para pesquisas em saúde, ciências e humanidades. A primeira versão do documento tinha sido aprovada em 1998. Como no caso brasileiro, cujo sistema nacional de avaliação da ética na pesquisa foi criado em 1996, o sistema canadense foi criticado por pesquisadores/as das ciências sociais e humanidades devido à sua “definição restritiva de pesquisa, baseada no modelo médico” (Janovicek, 2015, p.75).4 Diferentemente daqui, no entanto, a institucionalização da história oral se deu em 1974, com a criação da Canadian Oral History Association e, no ano seguinte, com o lançamento de sua revista, a Oral History Forum d’Histoire Orale. Ou seja, foi um processo que antecedeu em duas décadas o lançamento da política sobre ética na pesquisa (About, s.d.).
Depois de 1998, a pesquisa histórica no Canadá passou a ser submetida à avaliação dos Research Ethic Boards (REBs), órgãos similares aos CEPs brasileiros, e às suas imposições burocráticas. Nesse contexto, “pesquisadores se sentiram desencorajados a entrevistar pessoas. Estudantes de graduação ficaram particularmente relutantes em trabalhar com história oral ... a submissão [de projetos] para aprovação ética muitas vezes atrasava por tempo demasiado a pesquisa” (Janovicek, 2015, p.75). Alguns pontos centrais da crítica dos/as praticantes da história aos REBs eram a ênfase na privacidade e na confidencialidade e as limitações para o uso secundário dos dados recolhidos na pesquisa. Os/as praticantes da história oral tentaram resistir às imposições de anonimato, argumentando que os standards profissionais não se adequavam ao anonimato. Na verdade, “a disciplina da história não dá credibilidade a fontes anônimas; todas as fontes devem ser acessíveis a outros/as pesquisadores/as para que eles/as possam verificar o rigor da pesquisa e desenvolver a historiografia” (p.79).
Com o objetivo de proteger a confidencialidade, foram colocados “limites para o uso de dados e para identificar antecipadamente qualquer uso secundário dos mesmos. Mais significativamente, as orientações aos pesquisadores eram de destruir suas fontes” (no original, destroy your data), na direção contrária dos parâmetros da história oral que requerem dos/as “pesquisadores/as tornar as evidências orais disponíveis para outros/as pesquisadores/as para verificação” (Janovicek, 2015, p.81). Uma consequência adicional dessa política foi a dificuldade para depositar gravações em arquivos públicos.
Outros pontos de desacordo eram: as formas de documentar o consentimento dos/as participantes; as preocupações em não produzir danos para os/as colaboradores/as (a discussão dos riscos, como no caso brasileiro); e as regras envolvendo populações autóctones (Indigenous..., 2020). No que se refere ao último ponto, a primeira versão do TCPS exigia dos/as pesquisadores/as que estudavam essas populações “que conseguissem aprovação escrita dos conselhos indígenas (band councils) para entrevistar membros da sua comunidade” (Janovicek, 2015, p.87). O objetivo era proteger a população aborígene e ao mesmo tempo valorizar o papel das lideranças indígenas como guardiães da sua cultura. Mas essa política não considerava que as vozes dissidentes, “como as de mulheres que tinham perdido seu status” (p.88), poderiam ser excluídas se a permissão para a pesquisa fosse baseada exclusivamente na decisão dos líderes.
Como Janovicek (2015) explica, parte dos problemas mencionados foi resolvida na segunda versão do TCPS (conhecida como TCPS2), lançada em 2010, depois de três anos de discussão entre o Interagency Panel on Research and Ethics e pesquisadores/as das ciências sociais e humanidades. De acordo com a autora, a política inicial de anonimato foi mudada. A nova orientação “reconhece que os/as pesquisadores/as de história oral não necessitam proteger a privacidade” (Janovicek, 2015, p.79), pois podem, como tem sido a prática, oferecer aos/às participantes a escolha de revelar ou não sua identidade. O mesmo ocorreu com a resolução brasileira sobre ética, em 2016, na qual a opção por manter ou não o anonimato foi aprovada. O TCPS2 também reconheceu os benefícios do uso secundário dos dados, especialmente na pesquisa histórica. Como explicado por Janovicek (2015, p.82), “pesquisadores/as devem solicitar consentimento para o uso secundário dos dados antes de conduzir a entrevista”.
No que se refere às regras de pesquisa envolvendo populações indígenas, o TCPS2 permitiu incluir como participantes da pesquisa pessoas que não são parte da liderança formal e recomendou ter grupos de mulheres e outras organizações indígenas como parceiros/as da pesquisa. Discussões éticas ainda mais profundas envolvendo populações autóctones têm sido levantadas mais recentemente no Canadá, à luz de teorias decoloniais. Elas questionam a epistemologia ocidental na qual a história oral se baseia e a comparam com as tradições orais, “de longe, um processo mais complexo de transmitir tradições políticas e culturais, bem como de preservar o passado” (Janovicek, 2015, p.86).
Uma consideração final do artigo de Janovicek está relacionada ao descompasso entre a nova política de ética e sua implementação em nível institucional. Barreiras para a pesquisa têm sido colocadas pelos REBs, apesar das mudanças na política geral sobre ética. A autora também considera que os comitês estão preocupados em “proteger as universidades mais do que os participantes vulneráveis da pesquisa” (Janovicek, 2015, p.93). Ainda assim, sua conclusão é otimista: o TCPS2 deveria ser encarado como ferramenta para dar continuidade ao debate aberto entre comunidade, pesquisadores/as e universidades. Janovicek (2015, p. 93) sugere ainda o reconhecimento de que “as práticas éticas adotadas pelos/as profissionais da história oral têm evoluído no tempo, de acordo com experiências de campo e em resposta aos desenvolvimentos das metodologias e questões históricas”.
A evolução da discussão ética no tempo é cuidadosamente explorada pelas pesquisadoras Anna Sheftel e Stacey Zembrzycki (2016), no artigo “Who’s afraid of oral history? Fifty years of debates and anxiety about ethics”. A proposta foi traçar a história das preocupações dos/as praticantes de história oral na América anglo-saxônica. Tal história se baseou na literatura sobre ética e história oral publicada (em inglês) nos últimos 50 anos e considerou a existência de três fases diferentes e, às vezes, sobrepostas: (1) o positivismo do pós-Segunda Guerra Mundial; (2) a “virada subjetiva” ou história oral pós-moderna, a partir do final dos anos 1970; (3) a mescla das características das fases precedentes, desde o início dos anos 1990. As fases apresentadas dialogam com aquelas elencadas por Alistair Thomson (2007), no clássico “Four paradigm transformations in oral history”. Porém, mais do que “transformações de paradigma”, para Shelftel e Zembrzycki, as fases são vistas como debates em curso, para os quais não há como definir exatamente o início e o final. As autoras querem mostrar que as preocupações éticas foram diferentes em cada fase e produziram ansiedade, temores profissionais e políticos e, por sua vez, diferentes respostas.
Na primeira fase, que foi dos anos 1940 até o final da década de 1970, a história oral era considerada um “tipo de prática arquivística” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.341). Para os manuais do período, os/as pesquisadores/as tinham que “capturar cada aspecto do diálogo na gravação; preparar rigorosas transcrições e apresentá-las aos/às narradores/as para aprovação; e, finalmente, chegar a um acordo que deveria respeitar os desejos dos/as narradores/as no que se refere ao conteúdo e aos usos futuros de suas entrevistas” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.341). Os primeiros guias de ética incluíam noções de responsabilidade dos/as pesquisadores/as, direitos dos/as narradores/as e obrigações das instituições de guarda. Nesse momento, as preocupações éticas eram guiadas principalmente pela necessidade de mostrar as características científicas da história oral.
Na segunda fase, desde os anos 1970, pesquisadoras/es feministas e progressistas começaram a refletir sobre “a fluidez da memória como um campo de estudo, a intersubjetividade do encontro proporcionado pela história oral e o seu impacto sobre as histórias registradas” ou sobre “a dinâmica de poder entre pesquisadores/as e narradores/as que determina o que é dito e o que não é dito” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.345). Nessa fase, a dimensão de “processo” da história oral – e os/as participantes dela – tornou-se tão ou mais importante do que o “produto”. Essa mudança trouxe um novo conjunto de temores, relacionados à construção de relacionamentos autênticos, em ser justo/a com os/as narradores/as e em democratizar “o conteúdo, o processo e a audiência para a história” (p.340).
Ao lado da abordagem feminista, nesse tópico são destacados os trabalhos de Alessandro Portelli (1981, 1991) e de Michael Frisch (1990). No caso do pesquisador italiano, é mencionado o texto “The peculiarities of oral history”, publicado em inglês em 1981, mas cuja versão original data de 1978. Desse trabalho, Sheftel e Zembrzycki, (2016, p.348) retomam a ideia segundo a qual “o valor das fontes orais está precisamente na sua diferença em relação aos registros arquivísticos tradicionais”, argumento que se contrapunha às exigências de objetividade que marcariam a primeira fase da história oral na América do Norte. Também é explorada a obra posterior de Portelli (1991) na qual a prática é associada a uma “ética particular de igualdade, baseada na diferença” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.349). Essas menções à história oral italiana são próximas daquelas presentes na análise de Alistair Thomson (2007) acerca das mudanças de paradigma na história oral. Thomson destacou a contribuição europeia (no caso, italiana) para uma nova abordagem da subjetividade, mencionando os nomes de Portelli e de Luiza Passerini.
Na proposta de Sheftel e Zembrzycki, o debate mais recente sobre ética na história oral (terceira fase) teria se iniciado na década de 1990. Nesse momento, a literatura de história oral
atenta para duas coisas. Primeiro, pergunta como nós podemos reconhecer as cambiantes dinâmicas de poder no seio das entrevistas, especialmente quando continuamos a alargar o escopo de nossas pesquisas para a inclusão de comunidades sub representadas e para novas formas de entrevistar e coletar histórias em nosso trabalho. Segundo, os/as praticantes têm estado cada vez mais interessados/as em como as questões éticas clássicas podem ser contempladas em entrevistas feitas em circunstâncias excepcionalmente precárias, como guerras, opressão extrema e outros contextos sensíveis (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.351).
As autoras reconhecem que a literatura recente mostra uma tensão interessante entre as abordagens positivistas e pós-modernas, como acontece na história oral queer (Boyd, Ramirez, 2012), por exemplo:
De um lado, os/as praticantes da história oral estão retornando às suas raízes documentárias, na medida em que reconhecem que certas vozes precisam desesperadamente ser amplificadas, mas, por outro lado, o extremo desequilíbrio de poder e os contextos precários de seus projetos também os/as empurram para profundas discussões sobre subjetividades e sobre a natureza de construção da entrevista (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.351).
Considerando essa tensão que marca a fase contemporânea da história oral, Sheftel e Zembrzycki (2016, p.351) refletem acerca de um novo conjunto de temores relacionados ao desejo de “fazer história oral como um ato equilibrado”. Primeiro, o temor de falhar na minimização dos danos. Aqui, um dos desafios diz respeito a como minimizar danos num contexto de crise e como gerir os riscos de “desestabilizar pessoas que já se encontram em situações precárias” (p.355). Frente a tais temores, as autoras lembram que entrevistas de história oral não são inerentemente positivas ou negativas em situações de trauma, mas que elas podem enfatizar a agência dos/as participantes e produzir “trabalho regenerativo de memória” (p.355). Ao mesmo tempo, argumentam que somos desafiados/as a decidir entre publicar ou não declarações que podem destruir a causa ou a imagem de uma pessoa, mesmo quando ela tiver autorizado a publicação.
O segundo medo mencionado é o de perder o controle. O desafio aqui é equilibrar a autoridade do/a pesquisador/a e do/a participante, especialmente quando a pesquisa pode vir a ser usada para amplificar vozes perigosas, com as quais não concordamos. É o caso de trabalhos com perpetradores de atrocidades, como líderes militares argentinos ou membros da Ku Klux Klan. Aqui, o equilíbrio demandado é entre a construção de relacionamentos que permitam conduzir entrevistas significativas e éticas e o cuidado para não deturpar nossas motivações políticas. Nessas situações, as autoras sugerem que não sejamos ingênuos/as e que tentemos não ser manipulados/as. O desafio é manter controle sobre a ética e o conteúdo do nosso trabalho.
O terceiro temor mencionado é o de não sermos “bons/boas” praticantes de história oral. “Bom”, todavia, “tem significados variantes, dependendo da orientação metodológica do/a pesquisador/a: para um/a positivista, uma boa entrevista será definida por seu rigor, enquanto, para um/a feminista, bom se referirá ao potencial emancipatório e ao processo equitativo da entrevista” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.360). Se as duas abordagens estiverem mescladas é ainda mais difícil se sentir como um/a bom/boa praticante da história oral. Além disso, há as regras externas dos comitês institucionais.
Geralmente, de acordo com as autoras, nossa concepção sobre o que é correto não se encaixa com a avaliação externa. Explicando sua própria experiência com os REBs, mesmo cientes de que as regras gerais passaram por revisões – como vimos na análise de Janovicek (2015) –, Sheftel e Zembrzycki (2016, p.362) avaliam os comitês como sendo “modelados na pesquisa conduzida no campo médico e então a maioria de suas exigências tende a ser irrelevante para a pesquisa com história oral”. Ainda assim, a revisão dos REBs é necessária para obter permissão de conduzir entrevistas em faculdades e universidades canadenses e ter acesso a financiamento. Em geral os comitês solicitam a previsão dos riscos potenciais para pesquisadores/as e narradores/as antes da entrevista e o adiantamento de conclusões sobre o processo “que ainda está para ser experimentado”. Aqui, o desafio é equilibrar os standards positivistas dos comitês de ética e “as preocupações de nossa área no que se refere a colaboração, igualitarismo, advocacy e cuidado” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.362).
Nesse ponto, as autoras comentam a política de avaliação ética nos EUA explicando que o US Department of Health and Human Services recomendou a exclusão dos projetos de história oral da avaliação institucional (Institutional Review Boards – IRBs), considerando que “o campo já tem seu próprio código de ética” (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.363). A isso, adiciono a informação de que o documento “Princípios e boas práticas” da Oral History Association está em sua quinta edição (OHA, 2018). Janovicek também se referiu à política de ética nos EUA, com base no estudo de Zachary Schrag. Ela explicou que
a política de ética e o desenvolvimento dos comitês (IRBs) nos Estados Unidos demonstram como policy-makers bem-intencionados, em busca de uma política universal desenhada primeiramente sobre modelos médicos de pesquisa, criaram barreiras para os/as pesquisadores/as das ciências sociais. Significativamente, ‘os cientistas sociais não têm poder político para moldar o desenvolvimento da política de ética e dos IRBs’ (Janovicek, 2015, p.92; destaques meus).
Frente a tal avaliação, Janovicek (2015) sugere a realização de mais pesquisas históricas sobre as origens do sistema canadense e o seu paralelismo com o sistema dos EUA. A autora também reforça que “mais recentemente, os/as pesquisadores/as canadenses das ciências sociais e humanidades foram bem-sucedidos/as em sua pressão por importantes alterações na política” relativa à avaliação ética das pesquisas (p.92). Até que ponto, os/as praticantes da história oral no Brasil poderão chegar aos mesmos resultados? Ainda não há como responder à pergunta. Não há dúvida quanto à mencionada falta de “poder político [das ciências humanas e sociais] para moldar o desenvolvimento da política de ética” (p.92). Apesar de a resolução CNS 510/2016, hoje em vigor, ter trazido importantes mudanças (fruto da pressão política das entidades), está para ser avaliado de que maneira a mudança na política geral repercutirá na prática dos comitês de ética em cada uma das instituições de pesquisa.
Voltando aos temores que Sheftel e Zembrzycki (2016) reconhecem na história oral contemporânea, chegamos ao medo das potenciais implicações do nosso trabalho. Nesse tópico, as autoras discutem o caso do Boston College: histórias contendo relatos sensíveis sobre o Irish Republican Army (IRA), baseadas em entrevistas e publicadas por Edy Moloney, foram requisitadas pela polícia. Elas permitiram a identificação de personagens específicos, ainda vivos, levando à prisão do líder do Sinn Féin, Gerry Adams, em 2011.5 De acordo com as autoras,
o projeto falhou nas suas obrigações éticas e nas promessas que foram feitas aos/às narradores/as, resultando em sérias consequências legais ... Houve uma mescla de falhas éticas de relacionamento e de procedimento, nas quais o problema foi tanto os mecanismos de confidencialidade quanto os relacionamentos que permitiram que pessoas revelassem informação perigosa que poderiam não ter revelado (Sheftel, Zembrzycki, 2016, p.363).
O caso nos ajuda a lembrar as “variadas vidas que nossos projetos podem ter que estão, muitas vezes, fora do nosso controle” (p.364).
O caso italiano
A Associação Italiana de História Oral (Aiso) publicou em 2015 um documento intitulado “Buone pratiche per la storia orale”, cujos processos de escrita e conteúdo serão analisados nas páginas que se seguem (Aiso, 2015). Antes disso, vale lembrar que a entidade italiana de história oral foi criada em 2006. A prática, no entanto, é bem mais antiga, remontando à década de 1950, quando começou a se desenvolver fora do ambiente universitário, caracterizada pelo ativismo político e pela interdisciplinaridade. Em meados da década de 1990, Portelli (1996, p.392) procurou explicar o paradoxo da história oral italiana: reconhecimento internacional pela sua sofisticação versus invisibilidade na Itália. Na mesma época, o pesquisador britânico John Foot (1998, p.172) avaliou que “a história oral italiana pode estar marginalizada como disciplina, mas suas lições e qualidades têm penetrado cada área das humanidades”. O quadro sofreu modificações ao longo das últimas duas décadas, com o aumento do reconhecimento nas universidades, ainda que a interdisciplinaridade tenha se mantido. Isso resultou numa rica e diversificada produção, nem sempre reconhecida internacionalmente (Casellato, 2007).
Em artigo redigido por três dos participantes do grupo que elaborou a minuta das “Buone pratiche” apresentada à Aiso (Bonomo, Casellato, Garrucho, 2016), é destacada a importância do esforço de autorregulação quanto à prática da história oral. Tal autorregulamentação levou em conta o quadro legislativo que afeta a pesquisa histórica, mas sobretudo os “princípios e regras do ofício que cada um de nós aprendeu de nossos mestres (e mestras) da história oral e que cada geração e cada pesquisador/a têm feito seus, desenvolvendo-os e adaptando-os à própria pesquisa e às mudanças do contexto social” (p.15). Os autores e a autora se referem às/aos praticantes da história oral como uma “comunidade de prática”: uma comunidade ao mesmo tempo “de trabalho e de aprendizado: aprendemos o ofício não só nos livros, mas também no campo, fazendo pesquisa e trabalhando, compartilhando com nossos colegas relações sociais, atividade, técnicas e também significados do nosso ofício” (p.15-16).
O artigo em questão indica que os documentos elaborados por associações de oralistas de outros países (especialmente no contexto anglo-saxão) serviram de ponto de inspiração para a escrita das “Buone pratiche”. Um dos pressupostos do trabalho era a lei não ser suficiente para regular “o recolhimento, a conservação, o tratamento e a publicação de fontes orais nas suas múltiplas implicações” (Bonomo, Casellato, Garrucho, 2016, p.16), sendo necessário o reconhecimento da responsabilidade coletiva da parte da comunidade dos praticantes para formalizar de maneira autônoma aquelas “normas de boa conduta” que são geralmente seguidas por aqueles/as – pesquisadores/as, arquivistas, colaboradores/as – que manejam as fontes com a devida consciência e atenção.
Em outro artigo que trata da elaboração do documento “Buone pratiche”, Casellato (2016) explora três macroimpulsos que estariam na sua origem, indicando fatores mais gerais que afetavam a história oral dentro e fora das fronteiras nacionais e o risco, que começava a se desenhar, de ver a pesquisa dos/as oralistas submetida à avaliação de sujeitos externos. Nessa reflexão fica claro o diálogo entre o movimento internacional da história oral e as características particulares da prática na Itália.
O primeiro macroimpulso se referia às novas tecnologias e aos temas que elas trouxeram para a história oral, como a reprodução de conteúdo digitalizado e a proteção à privacidade. Conforme Casellato (2016, p.76), as novas tecnologias “ampliam o acesso às entrevistas e tendem a gerar disputas entre os diversos atores envolvidos (produtores, usuários e responsáveis pelos acervos digitais)”. As transformações digitais trouxeram questões legais relacionadas ao processamento de informações pessoais (privacidade e consenso informado) e à propriedade intelectual (copyright), representando um segundo macroimpulso para a escrita do documento em questão. Entre as preocupações jurídicas e institucionais decorrentes das transformações digitais estavam o relacionamento entre novas e velhas coleções de entrevistas, a possibilidade de reutilizar entrevistas coletadas antes que a formalização do consenso informado fosse requerida, as pressões institucionais, especialmente de agências financiadoras, por standards mais claros e explícitos quando a pesquisa se refere a seres humanos; as discussões sobre open access à pesquisa científica e, finalmente, as demandas da história pública. A avaliação externa (referência às agências financiadoras), como foi visto nos casos brasileiro e canadense, é listada como uma das várias questões a ser enfrentadas pelos/as praticantes da história oral. A questão da privacidade, elemento central na avaliação institucional no Brasil e no Canadá, também foi destacada pelos/as oralistas da Itália. A relação entre transformações digitais e privacidade, que aparece entre as preocupações italianas, no entanto, não foi mencionada nos materiais dos outros dois países examinados para este artigo. Além disso, na caracterização dos temores que marcam a história oral contemporânea proposta por Sheftel e Zembrzycki (2016), o digital turn não recebeu destaque.
O terceiro macroimpulso esteve relacionado com questões internas da profissão e da disciplina. Nesse ponto, é interessante a distinção entre profissão e disciplina, pois os/as colegas italianos/as reconheceram a diminuição, nos tempos recentes, da percentagem de profissionais que se dedicam à história como um campo acadêmico. Muitas pessoas têm feito pesquisa histórica sem “um enquadramento estável dentro da universidade” (Casellato, 2016, p.77). O trabalho realizado em espaços como escolas, museus, fundações culturais, imprensa, arquivos e por pesquisadores/as independentes tem contribuído para a produção e a difusão do conhecimento histórico. Uma evidência desse processo teria sido a criação, em 2016, da Associazione Italiana di Public History (AIPH, 2018). A preocupação com o trabalho dos/as historiadores/as em espaços extra-acadêmicos também consta na “Carta de princípios éticos” (Carta... 2015) da Anpuh Brasil, a qual se refere ao crescimento do número de profissionais formados e às demandas dos meios de comunicação social.
A escrita do documento da Aiso foi guiada pelos impulsos já descritos, bem como pelo propósito dos/as pesquisadores/as italianos/as de “repensar procedimentos e implicações do próprio ofício” no confronto com a historiografia de outros países (Casellato, 2016, p.78). Um dos fóruns para tal debate tem sido os encontros bianuais da International Oral History Association (Ioha), que têm criado oportunidades para reflexão sobre as questões éticas relacionadas ao uso de fontes orais, especialmente nos EUA, na América Latina, na África do Sul e na Europa pós-comunista.
O documento “Buone pratiche di storia orale” também foi resultante do propósito de contribuir para a preparação dos novos pesquisadores e sua formação continuada e para a necessidade de responder a demandas relativas a processos que tramitaram na Justiça italiana envolvendo pesquisas de história oral. Em 2007, por exemplo, dois geógrafos das universidades de Veneza e de Pádua, bem como o editor do livro Il grigio oltre le siepi: geografie smarrite e racconti del disagio in Veneto (Valerani, Varotto, 2005), tiveram problemas com a Justiça. A obra trazia narrativas sobre uma mobilização contra uma indústria química cujos proprietários se sentiram difamados pelo livro. Os autores processados solicitaram aos colegas da história oral que demonstrassem que eles haviam agido de forma correta em relação às fontes. Para responder a tais demandas, a Aiso consultou associações de história oral de outros países que já tinham definido seus códigos de ética. Problemas similares vinham acontecendo com publicações feitas por institutos de história da resistência, nas quais algumas pessoas se sentiram difamadas por causa de testemunhos orais coletados e publicados ou reclamaram por não reconhecer nas publicações as palavras exatas ditas na entrevista. Houve recurso a advogados, requisição de mudança em textos e tentativas de retirar obras das livrarias. Processos judiciais envolvendo temas como privacidade, direito autoral, difamação de terceiros, associados à disponibilização das entrevistas na internet, ainda na avaliação de Casellato (2016, p.85), poderiam se tornar virais, e isso exigiu o investimento na escrita de um código próprio de boas práticas.
Na Itália, diferentemente do contexto anglo-saxão e, em minha opinião, próximo do contexto brasileiro, as discussões sobre ética na história oral tinham sido deixadas, até pouco tempo atrás, à mercê da “sensibilidade e dos escrúpulos de cada pesquisador ou pesquisadora” (Casellato, 2016, p.87). Nos anos 1990, de acordo com o historiador, juristas e arquivistas refletiram acerca de problemas legais relacionados às fontes orais. O tema da privacidade foi contemplado em documento de 2001 sobre o processamento de dados pessoais para fins de pesquisa histórica (Allegato A.2..., 14 mar. 2001). No que se refere à história oral, foi definido o uso de uma modalidade simplificada e não necessariamente escrita de consenso informado dos/as entrevistados/as. Em 2003, houve uma primeira regulamentação em relação à privacidade (Codice..., 19 set. 2018).
Considerando os impulsos mais amplos e as demandas internas mencionadas, ao longo de 2013, a Aiso foi desafiada a redigir orientações éticas para o uso das fontes orais. Em outubro de 2013, um grupo formado por historiadores/as, juristas e arquivistas foi designado para dar conta da tarefa, que contou com diversas reuniões, bem como consultas a praticantes da metodologia e a grupos de pesquisa. O documento escrito por essa comissão foi aprovado ao final de 2015, num encontro da Aiso. Reconhecendo que em outros países a discussão sobre ética na pesquisa com seres humanos (da medicina às ciências sociais) vinha sendo condicionada por agências financiadoras externas às universidades, e não pelas necessidades dos/as próprios/as pesquisadores, o documento da Aiso foi apresentado como uma “operação preventiva” considerando cenários análogos e visando “preencher o vácuo entre a norma codificada da lei e as práticas não formalizadas” (Casellato, 2016, p.91). Assim, uma autorregulamentação poderia prevenir “o risco de que normas relevantes para o trabalho de historiadores/as orais fossem eventualmente ditadas por sujeitos externos” (p.91).
O documento “Buone pratiche di storia orale” apresenta um conjunto de princípios que são sumarizados no artigo de Bonomo, Casellato e Garrucho (2016, p.18): a liberdade de pesquisa e o interesse público no recolhimento de depoimentos orais; a relação pessoal baseada no respeito recíproco e a adesão consciente e informada dos participantes; a entrevista como uma narração dialógica; o empenho na formação de colaboradores/as e estudantes; o compromisso em não colocar em perigo os/as participantes e pesquisadores/as; o respeito a privacidade, honra, reputação e imagem dos/as participantes e de terceiros; o direito/dever de buscar a verdade; o princípio da pertinência na utilização de informações pessoais; a escolha adequada de instrumentos de registro; a garantia da acessibilidade das fontes recolhidas para outras pessoas interessadas; a responsabilidade dos/as pesquisadores/as quanto à integridade da pesquisa e à dignidade das pessoas entrevistadas.
Considerações finais
Por conta dos limites de um artigo, não foi possível explorar desdobramentos mais recentes da discussão/regulamentação sobre ética na pesquisa, como a falta de adequação da Plataforma Brasil à resolução CNS 510, em 2017, para o caso brasileiro; a revisão do TCPS2 em 2018, no caso canadense; e os debates italianos visando à atualização do documento “Buone pratiche di storia orale”.6 Esses processos são indicativos de que o debate acerca de ética e história oral continua em curso. Pelas mesmas limitações, não foram exploradas questões relativas àquilo que Thomson (2007) classificou como a mais recente mudança de paradigma na história oral, representada pelo digital turn, tema mencionado apenas no documento italiano. Refletir sobre a ética na história oral digital se tornou questão premente no contexto da pandemia de covid-19, momento no qual este artigo foi escrito.7 Também não foi possível resgatar o pulverizado debate brasileiro sobre ética na história oral para além do tema dos comitês de ética. Finalmente, o artigo não tratou das questões éticas fomentadas pelas teorias decoloniais aplicadas à história oral, ainda que a experiência canadense, especialmente quanto à história indígena, possa ser explorada no Brasil.8 Ou seja, o artigo se encaminha para as conclusões indicando que há vários desdobramentos que poderiam/deveriam ser enfrentados.
O exercício comparativo proposto revelou a importância da mobilização dos/as profissionais da história oral para a definição das boas práticas no seu trabalho e para o enfrentamento das políticas gerais de avaliação que tendem a desconsiderar as suas especificidades. Como foi demonstrado, a participação ativa de praticantes de história oral ajudou a reconfigurar os sistemas de avaliação ética no Brasil e no Canadá, que, por meio da resolução CNS 510/2016 e do TCPS2, respectivamente, se afastaram dos princípios da bioética e dos standards de pesquisa da área da saúde. Em nível institucional, no entanto, ainda há um longo caminho para que o espírito de tais mudanças seja incorporado pelos CEPs brasileiros e REBs canadenses.
O caso italiano reforçou a relevância do trabalho coletivo e associativo para a definição dos princípios gerais que auxiliam no trabalho responsável com as fontes orais. Indicou que o aprendizado construído na pesquisa e compartilhado entre os/as praticantes é ferramenta fundamental no enfrentamento das batalhas políticas, jurídicas e institucionais. A proximidade entre as orientações definidas nos três países para o que é considerado uma “boa história oral”, por sua vez, é indicativa da existência de uma “comunidade de prática” em âmbito internacional.
A proposta de Shelfel e Zembrzycki de analisar a ética na história oral a partir dos temores e ansiedades que ao longo do tempo orientaram os debates entre os/as praticantes da América anglo-saxônica instiga a buscar evidências empíricas para melhor refletir sobre as realidades brasileira e italiana. Outros medos poderiam ser listados, assim como outras respostas a eles. De qualquer forma, considero fecundo concluir o artigo sugerindo que os temores podem ser encarados como cuidados e cautelas, e a ansiedade, como fator de mobilização.
AGREDECIMENTOS
O artigo compõe o projeto de pesquisa “História oral e história pública: diálogos, desafios e perspectivas (os casos do Brasil, da Itália e do Canadá)”, desenvolvido no Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Parte da pesquisa se deu durante estágio de professora visitante na Ca’Foscari Università di Venezia, na Itália (de novembro de 2019 a fevereiro de 2020), sob a supervisão do professor Alessandro Casellato. Registro meu agradecimento a Ângela de Castro Gomes, Meri Frotscher Kramer e Vanderlei Machado pela leitura prévia do manuscrito.
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NOTAS
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1
As entidades foram representadas, num primeiro momento, por Ângela de Castro Gomes, da Universidade Federal Fluminense, e, depois, por Wenceslau Gonçalves Neto, da Universidade Federal de Uberlândia, e por Benito Schmidt, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
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2
Jorge Venâncio, médico, coordenador da Conep.
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3
Para alguns exemplos do tratamento dados aos temas listados, ver Rovai (2013); Frotscher, Stein, Olinto (2014); Pinto (2015); Alberti (2016); Maciel (2017); Rodeghero, Machado (2017).
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4
Nessa e nas demais citações de textos publicados em outros idiomas, a tradução é minha.
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5
Ver também Pozzi (2014).
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6
Sobre o preenchimento da Plataforma Brasil para as pesquisas regidas pela resolução CNS 510/2016, ver Brasil (8 dez. 2017). Para a nova revisão do TCPS2, ver Tri-Council... (2018); para a revisão em curso do documento “Buone pratiche”, ver Aiso (2019).
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7
Alguns seminários virtuais trataram do tema já no primeiro semestre de 2020. Naquele promovido pela Associação Estadunidense de História Oral (OHA), “Oral history at a distance: remote interviewing webinar”, as questões éticas e jurídicas foram o primeiro tema a ser tratado. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=WsSTWkVTit0. Acesso em: 8 jun. 2020. A Aiso (2020) promoveu o seminário “Fare storia orale a distanza (e in emergenza)”, em 12 de junho de 2020. Ainda sobre o tema, ver Santhiago e Magalhães (2020).
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8
Ver trabalhos de pesquisadoras indígenas, como Sringley e Sutherland (2018) e Radu (2018), bem como estudos que repensam o feminismo por meio da história oral decolonial: Sringley e Zembrzycki (2018).
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
06 Jun 2022 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2022
Histórico
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Recebido
4 Set 2020 -
Aceito
19 Dez 2020