Resumo
Este artigo analisa a formação internacional de Maria Palmira Macedo Tito de Morais, como bolsista da Fundação Rockefeller no campo da enfermagem, durante o Estado Novo português. Compreende-se de que forma os contextos locais influenciaram as ações da agência filantrópica internacional, o que culminou em disputas com a Organização Mundial da Saúde pela presença da enfermeira portuguesa em seus quadros. São utilizados como fonte dois dossiês sobre Maria Tito de Morais e seus dois cartões de bolsista, coletados no Rockefeller Archive Center, um relatório da Direção Geral de Saúde de Portugal e o periódico A Tribuna, consultado na Hemeroteca Digital brasileira. Conclui-se que as estratégias utilizadas pela Fundação Rockefeller, ao financiar a formação de Maria Tito de Morais com o intuito de cooptá-la para seu staff, não garantiram o controle sobre sua trajetória profissional.
história da enfermagem; trajetória científica; Estado Novo português; Fundação Rockefeller; Maria Palmira Macedo Tito de Morais (1912-2003
Abstract
The article analyses Maria Palmira Macedo Tito de Morais’ international nursing education as a Rockefeller Foundation fellow, during the Portuguese Estado Novo. It studies the local contexts influence on the international philanthropic agency’s actions, culminating in disputes with World Health Organization over the Portuguese nurse as staff. The sources are two dossiers on Maria Tito de Morais and her two fellowship cards collected at the Rockefeller Archive Center, a report of the Directorate-General of Health of Portugal and the journal A Tribuna, consulted at the Brazilian Digital Library. In conclusion, the Rockefeller Foundation’s strategies, when funding Maria Tito de Morais’ education aiming to hire her did not guarantee control over her professional trajectory.
history of nursing; scientific trajectory; Portuguese Estado Novo; Rockefeller Foundation; Maria Palmira Macedo Tito de Morais (1912-2003
Este artigo analisa a trajetória formativa internacional da enfermeira Maria Palmira Macedo Tito de Morais, durante o Estado Novo português. Ela foi bolsista da Fundação Rockefeller em dois momentos: entre 1936 e 1939, com a ampliação do financiamento para a formação de europeus na América do Norte, e entre 1958 e 1961, quando a agência filantrópica internacional, anteriormente direcionada à saúde pública, favoreceu a formação de profissionais no campo das ciências biomédicas. A investigação é norteada pela seguinte questão: como a trajetória de Maria Tito de Morais demonstra fragilidades na atuação da Fundação Rockefeller em perspectiva internacional?
A análise de trajetórias e/ou biografias é importante para compreender tensões entre o individual e o coletivo. Segundo Schmidt (2004SCHMIDT, Benito Bisso. Em busca da terra da promissão: a história de dois líderes socialistas. Porto Alegre: Palmarinca, 2004., p.22-23), há sempre pontos de contato entre as vivências e concepções de indivíduos e as de seus contemporâneos, pois todos compartilham em maior ou menor grau determinados códigos culturais que permitem a convivência e a comunicação. Visibilizar trajetórias de enfermeiras pode funcionar como um caminho para a construção da identidade profissional em enfermagem (Padilha, Nelson, Borenstein, 2011); auxiliar na compreensão sobre a elaboração do capital simbólico das enfermeiras no desempenho de suas atividades (Santos et al., 2018SANTOS, Silvia Alves dos et al. Capital simbólico do trabalho das visitadoras sanitárias da Fundação Serviço de Saúde Pública, Alagoas/Brasil. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.25, n.3, p.817-839, 2018.); e, entre inúmeras outras possibilidades, revelar o protagonismo de mulheres financiadas por agências internacionais e que redefiniram a imagem social presente nos padrões de formação e de ensino propostos nos primórdios da enfermagem (Campos, 2013CAMPOS, Paulo Fernando de Souza. Memorial de Maria de Lourdes Almeida: história e enfermagem no Brasil pós-1930. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.20, n.2, p.609-625, 2013.).
O corpus documental utilizado é composto por dois dossiês sobre Maria Tito de Morais, dois cartões de bolsista, o relatório da Direção Geral de Saúde de Portugal e notícias de jornal. A metodologia é pautada no pensamento de Carlo Ginzburg (2007)GINZBURG, Carlo. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: Ginzburg, Carlo. Mitos, emblemas e sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. sobre a importância dos sinais. As fontes foram analisadas a partir do paradigma “indiciário” descrito pelo autor, no qual os pequenos detalhes revelam aspectos que não estão evidentes na composição ampla do documento. Embora os dossiês sobre Maria Tito de Morais possam indicar, a priori, que ela seria uma bolsista-padrão que correspondeu às expectativas da Fundação Rockefeller, informações específicas e pouco destacadas apontam para uma possibilidade interpretativa mais complexa.
Este trabalho se insere nos estudos que questionam os limites de atuação da Fundação Rockefeller, a exemplo da obra organizada por Schneider (2002)SCHNEIDER, William H. Rockefeller Philanthropy & Modern Biomedicine: international initiatives from World War I to Cold War. Blomington: Indiana University Press, 2002., para quem, talvez, a lição mais ampla a ser apreendida com as mudanças complexas na pesquisa biomédica após a década de 1920 é a capacidade limitada de o financiamento das agências controlar ou prever a influência de suas cessões. Para o autor, essa proposição surpreende porque os programas dessas instituições envolviam, frequentemente, países e populações inteiras, além de pesquisadores que geralmente tinham outras fontes de financiamento (p.5), o que dificultava a execução de seus planos.
A Fundação Rockefeller surgiu em 1913, fruto da filantropia do milionário John Rockefeller Jr., que acumulava riquezas com extração, refino e venda de petróleo nos EUA (Farley, 2004FARLEY, John. To cast out disease: a history of the International Health Division of the Rockefeller Foundation (1915-1951). Oxford: Oxford University Press, 2004.). Ela esteve presente em diferentes lugares do mundo, como China, Itália, Grã-Bretanha, África e América do Sul, com grande volume de investimento no Brasil. Criou instituições de ensino sob a orientação do Relatório Flexner, publicado em 1910, que criticou o excesso de alunos, a falta de professores em tempo integral, e apontou outros problemas na formação médica nos EUA de fins do século XIX e início do século XX (Marinho, 2013MARINHO, Maria Gabriela Silva Martins da Cunha. Elites em negociação: breve história dos acordos entre a Fundação Rockefeller e a Faculdade de Medicina de São Paulo (1916 1931). In: Marinho, Maria Gabriela Silva Martins da Cunha; Mota, André (org.). Caminhos e trajetos da filantropia científica em São Paulo: a Fundação Rockefeller e suas articulações no ensino, pesquisa e assistência para a medicina e saúde (1916-1952). São Paulo: Universidade de São Paulo; Universidade Federal do ABC; CD.G Casa de Soluções e Editora, 2013. p.79-176.); realizou campanhas para erradicar enfermidades como a ancilostomíase, a febre amarela e a malária (Cueto, 1995CUETO, Marcos. The cycles of erradication: the Rockefeller Foundation and Latin American Public Health 1918-1940. In: Weindling, Paul (ed.). International health organizations and movements 1918-1939. Cambridge: Cambridge University Press, 1995.); e ofereceu bolsas de estudos para a formação de profissionais de saúde pública principalmente nos centros de ensino que apoiava (Batista, Ferreira, 2021). A agência internacional pautava suas ações no “efeito-demonstração” (realizava uma experiência-“modelo” que, posteriormente, seria gerida e replicada pelo país beneficiado) e na formação de “elementos-chave”, multiplicadores dos saberes adquiridos com seu apoio. O programa de bolsas da Fundação Rockefeller foi o principal meio utilizado para formar esses agentes. Seu objetivo era selecionar indivíduos de destaque, promessas nas áreas de interesse definidas pelo programa geral da instituição, e ajudar a prepará-los para contribuir significativamente em pesquisa, ensino ou saúde pública no futuro (History of the..., s.d.).
Entre os estudantes beneficiados com bolsas da Rockefeller estiveram os irmãos Maria e Augusto Tito de Morais. Filha de Carolina Loureiro de Macedo de Morais e de Tito Augusto de Morais, Maria Tito de Morais nasceu em Lisboa, em 24 de fevereiro de 1912. Antes disso, o casal deu à luz Manuel Alfredo Tito de Morais, em 28 de junho de 1910, pouco mais de três meses após o início da República em Portugal.1 1 A Primeira República portuguesa durou de 5 de outubro de 1910, com a revolução contra a monarquia daquele país, e se estendeu até o golpe de 28 de maio de 1926, quando foi implantada a ditadura, transformada em Estado Novo, entre 1933 e 1974. E, em 12 de abril de 1921, nasceu Augusto, em Lourenço Marques (atual Maputo). A trajetória científica de Augusto, que recebeu uma bolsa para estudar em Harvard, ainda não foi analisada pela historiografia.
O fim da monarquia portuguesa teve a participação ativa do almirante Tito de Morais, patriarca da família, que, em 5 de outubro de 1910, comandou o cruzador São Rafael e bombardeou o Palácio das Necessidades, empurrando a família real para Mafra e daí para o exílio (Assembleia da República, 2010ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA. Manuel Alfredo Tito de Morais: homenagem do antigo presidente da Assembleia da República no centésimo aniversário do seu nascimento. Lisboa: Divisão de Edições da Assembleia da República, 2010. Disponível em: https://www.parlamento.pt/ArquivoDocumentacao/Documents/tito_p.pdf. Acesso em: 1 jun. 2021.
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, p.6). Ele militou no Partido Republicano e ocupou cargos na República portuguesa: deputado na constituinte de 1911, senador até 1913, ministro da Marinha em 1919, capitão dos Portos da Índia de 1913 a 1916 e governador-geral da Índia em 1926. Manteve atividade antifascista até o fim da vida. Seus filhos seguiram, desde cedo, os ideais republicanos e democráticos, o que lhes rendeu o exílio de Portugal (p.7).
Manuel Tito de Morais, mais velho, engajou-se na luta democrática, transitou por países como Itália, Argélia, Angola (onde se envolveu no movimento anticolonialista) e se exilou no Brasil entre 1961 e 1963. Na Junta Revolucionária Portuguesa, órgão diretivo da Frente Patriótica de Libertação Nacional (criada por democratas de diversos movimentos e do Partido Comunista), Manuel representou a Resistência Republicana Socialista, que ele ajudou a transformar em Ação Socialista Portuguesa, em 1964 (Assembleia da República, 2010ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA. Manuel Alfredo Tito de Morais: homenagem do antigo presidente da Assembleia da República no centésimo aniversário do seu nascimento. Lisboa: Divisão de Edições da Assembleia da República, 2010. Disponível em: https://www.parlamento.pt/ArquivoDocumentacao/Documents/tito_p.pdf. Acesso em: 1 jun. 2021.
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, p.8-10), como resistência ao Estado Novo.
Sob o controle de António de Oliveira Salazar, o Estado Novo se iniciou em Portugal em 1933 e perdurou até 25 de abril de 1974, com a Revolução dos Cravos. Segundo Rampinelli (2014RAMPINELLI, Waldir José. Salazar: uma longa ditadura derrotada pelo colonialismo. Lutas Sociais, v.8, n.32, p.119-132, 2014., p.120-123), o salazarismo foi um regime autoritário que ganhou estabilidade por motivos internos e externos. No campo interno, Salazar lançou mão de uma estratégia econômica, política e social que consistia na defesa de um mundo rural tradicional, com grande parcela da população analfabeta, oposta a qualquer reforma fundiária e agrícola modernizante; existia uma classe dominante interna caracterizada pela sua debilidade econômica global, por sua dependência externa, por sua divisão e pela falta de setores que hegemonizassem processos de conservação ou de mudança; e, por fim, a debilidade social demonstrava a falta de políticas das entidades de classe, principalmente do operariado, pela ausência do desenvolvimento industrial.
Entre os fatores externos estava o fato de o regime ter sido implantado em um país pouco industrializado, cuja principal produção se baseava na agricultura tradicional resistente à modernização; Lisboa era uma metrópole colonialista fortalecida pela política adotada por Salazar, caracterizada pelo nacionalismo extremado e por uma verticalidade administrativa; e, por fim, Salazar revalorizou a posição de seu governo na Guerra Civil Espanhola, manteve uma falsa neutralidade durante a Segunda Guerra Mundial, obtendo vantagens econômicas como a própria manutenção do regime e a integridade territorial do império colonial, em busca de apoio dos governos democráticos ao Estado Novo então ameaçado pelo movimento antifascista.
O salazarismo perseguiu aqueles que acusou de comunistas. A participação da família Tito de Morais em movimentos democráticos e socialistas (também acusados de comunistas) não gerou represálias da Fundação Rockefeller a Maria Tito de Morais, diferente do que ocorreu com personalidades médicas brasileiras.
Estudos recentes demonstram ressalvas da Fundação Rockefeller ao financiamento de bolsistas declaradamente comunistas, ou mesmo suspeitos dessa orientação política. Um exemplo é apresentado na análise da trajetória do parasitologista Samuel Barnsley Pessoa, realizada por Hochman e Paiva (2020)HOCHMAN, Gilberto; PAIVA, Carlos Henrique de Assunção. Parasitology and communism: public health and politics in Samuel Barnsley Pessoa’s Brazil. In: Birn, Anne-Emanuelle; López, Raul Necochea (ed.). Peripheral nerve: health and medicine in Cold War Latin America. Durham/London: Duke University Press, 2020., cuja prática profissional esteve ligada ao comunismo no contexto do Estado Novo brasileiro e na eclosão da Segunda Guerra Mundial. Além disso, eles mostram como, no período de 1946 a 1964, as conexões entre parasitologia e comunismo se desenrolaram no contexto da Guerra Fria. É possível citar, também, o trabalho de Paloma Porto (2021)PORTO, Paloma. Em nome da “neutralidade”: as dinâmicas nas políticas de financiamento científico do ICB. In: Gomes, Ana Carolina Vimieiro; Marques, Rita de Cássia (org.). A Ciência no ICB UFMG: 50 anos de história. Belo Horizonte: Fino Traço, 2021. p.199-201. sobre as dinâmicas nas políticas de financiamento científico no Instituto Biológico da Universidade Federal de Minas Gerais. Ela discute como os programas da Divisions of Natural Sciences e da Medical Education and Public Health, que financiaram a formação de professores das escolas médicas da América Latina para as ciências biomédicas, atribuíam poder de veto aos homens de campo da Rockefeller em relação a bolsistas dedicados a alguns temas específicos de estudo.
Além desta introdução, o texto está dividido em três outras seções: uma delas analisa a primeira viagem de Maria Tito de Morais aos Estados Unidos e as dificuldades encontradas por mulheres portuguesas no acesso à formação profissional; posteriormente, demonstram-se os conflitos na segunda viagem formativa, na década de 1950, e as frustrações da Fundação Rockefeller sobre a impossibilidade de controlar os destinos dos profissionais que financiou. Por último, as considerações finais relacionam aspectos da trajetória estudada.
De Portugal para a América do Norte: o financiamento de enfermeiras pela International Health Division
A educação ocupou um lugar importante na trajetória de vida de Maria Tito de Morais. Ela sabia que, para se profissionalizar, precisaria romper com limites impostos a muitas mulheres do contexto em que vivia. Segundo Almeida (2014ALMEIDA, Jane Soares de. Mulheres no cotidiano: educação e regras de civilidade. Dimensões, v.33, n.2, p.336-339, 2014., p.340, 343), com a nação lusitana tradicional da primeira metade do século XX, as responsabilidades femininas nunca deveriam transpor a esfera do lar nem ser objeto de trabalho assalariado. O magistério representou uma das poucas carreiras abertas às mulheres, mesmo que houvesse conquistas em outras áreas, a exemplo da enfermagem.
Maria Tito de Morais não frequentou a escola regular além do ensino básico, dificuldade encontrada também por algumas de suas compatriotas entre 1920 e 1930. No que diz respeito à escolarização portuguesa, Candeias e Simões (1999)CANDEIAS, António; SIMÕES, Eduarda. Alfabetização e escola em Portugal no século XX: Censos Nacionais e estudos de caso. Análise Psicológica, v.1, n.17, p.163-194, 1999. analisaram os censos populacionais entre 1900 e 1960 e afirmaram que o acesso à cultura escrita foi lento naquele país, em processo duplamente periférico no contexto europeu: periferia em relação ao “núcleo duro” da alfabetização e, no decorrer do século XX, periferia em relação aos limites Sul, Leste e Oeste, que historicamente foram menos impregnados pela cultura escrita. Enquanto a maior parte da Europa registrava 98% de taxa de alfabetização em 1950, Portugal apresentava apenas 55%, sendo que, em 1900, apenas 25% da população lusitana sabia ler e escrever. Mesmo assim, devido às condições financeiras razoáveis de sua família, Maria Tito de Morais continuou a estudar em casa e, além dos cursos de música e artes domésticas, concluiu o equivalente ao quinto ano do Liceu, com mais um ano em francês e dois em português (Hill, 13 abr. 1936).
Historicamente, a formação da enfermagem em Portugal diferiu de outros países da Europa pela ausência de mulheres religiosas. Segundo Silva (2012)SILVA, Helena da. Relações de género na enfermagem em Portugal. Tempos Históricos, v.16, n.1, p.17-39, 2012., a ordem hospitaleira de São João de Deus (masculina) desempenhou um papel crucial nos cuidados a doentes em Portugal desde o século XVII, e a longa tradição da enfermagem masculina não foi ignorada na construção das primeiras escolas de formação de enfermeiros.
Entre as instituições criadas ao longo do século XIX, e que se dedicaram ao ensino da enfermagem, é possível identificar o primeiro curso, nos Hospitais da Universidade de Coimbra, em 1881; e uma escola de enfermeiros, em Lisboa, em 1886 (ambas instituições tiveram interregnos em seu funcionamento). Já o Hospital Geral de Santo António, administrado pela Santa Casa de Misericórdia do Porto, tinha enfermeiros e enfermeiras divididos por sexo: enfermeiros cuidavam de pacientes homens, e enfermeiras cuidavam de mulheres (Silva, 2012SILVA, Helena da. Relações de género na enfermagem em Portugal. Tempos Históricos, v.16, n.1, p.17-39, 2012., p.20). No Porto, tal como em Coimbra e em Lisboa, a escola aceitava alunos dos sexos masculino e feminino. Mas a tradição masculina na enfermagem e a baixa escolaridade feminina impediram o acesso de mulheres à profissão por muito tempo. Os registros de matrícula da Escola de Enfermagem do Porto indicam que os homens correspondiam à maioria das inscrições em vários momentos. Em 1921, por exemplo, o sexo masculino representava 83% das inscrições e mais de 70% em outros três anos (Silva, 2012SILVA, Helena da. Relações de género na enfermagem em Portugal. Tempos Históricos, v.16, n.1, p.17-39, 2012.). As possibilidades de profissionalização nesse campo começaram na década de 1930, com o envio de moças portuguesas à América do Norte para estudar, financiadas pela Fundação Rockefeller. No seu retorno, almejava-se que atuassem como multiplicadoras de conhecimento em instituições, a exemplo do Centro de Saúde e da Escola Técnica de Enfermagem, ambos de Lisboa, instituídos, respectivamente, em 1939 e 1940.
A ideia de convencer seu pai, almirante Tito de Morais, a procurar o médico José Alberto de Faria (Faria, s.d.),2 2 José Alberto de Faria nasceu em Lisboa, em 13 de agosto de 1888. Formou-se na Escola de Medicina Médico-Cirúrgica de Lisboa, em 1911, com a tese Tuberculina no uso clínico. Entrou ainda jovem para os serviços de saúde pública. Tornou-se subdelegado de Saúde Pública de Lisboa em 1914, foi chamado para servir na Direção Geral de Saúde em 1916, após o aparecimento da peste bubônica. E, em 12 de outubro de 1926, foi nomeado inspetor-chefe de Epidemias e Profilaxias de Moléstias Infecciosas. Subiu ao cargo de diretor-geral de Saúde em 20 de dezembro de 1928, pela aposentadoria de Ricardo Jorge. diretor geral de Saúde, e pedir uma bolsa à International Health Division (IDH)3 3 Desde o seu surgimento lhes foram atribuídos diferentes nomes: International Health Comission (IHC), entre 1913 e 1916; International Health Board (IHB), de 1916 a 1927; e, de 1927 até o seu fechamento, em 1951, funcionou como IHD. para estudar enfermagem nos Estados Unidos, em 1936, partiu da jovem portuguesa. A entrevista realizada na candidatura deixou o staff da Fundação Rockefeller empolgado. Com apenas 25 anos, ela demonstrava seriedade e bom preparo. George Strode,4 4 Strode formou-se em medicina pela Universidade da Pensilvânia e ingressou no Conselho de Saúde em 1920, após serviço de guerra na França. Após três anos à frente da Diretoria de Saúde do Brasil, dirigiu o escritório da International Health Division (IHD) em Paris até a Segunda Guerra Mundial. Descrito como “equilibrado com bom senso”, era um administrador, em vez de um homem de laboratório. diretor da IHD na Europa e responsável pelo processo seletivo, analisou cinco candidatos, dos quais três foram selecionados: Jaime Pereira, para engenharia sanitária; Maria Angélica Lima Basto e Maria Palmira Tito de Moraes, para enfermagem (Memo n.73, 5 maio 1936). Naquele momento, Maria M. Monjardino, primeira estudante portuguesa financiada pela Rockefeller, já se dedicava à enfermagem nos EUA.
Em 1936, praticamente não havia instalações para a formação de enfermeiros em Portugal. O ensino sanitário foi iniciado no país em 1901, com uma lei que criava o Instituto Central de Higiene. Esse centro de ensino, que tinha outras funções, como promover trabalhos de higiene prática, propagar as descobertas no campo da higiene e realizar análises laboratoriais, foi vinculado pedagogicamente à Faculdade de Medicina de Lisboa, em 1911, mas entregue ao Ministério do Interior, como parte da Diretoria Geral de Saúde, em 1929.
Os encontros internacionais sobre o papel das Escolas de Higiene na Europa demonstram a importância que elas tinham para a formação profissional em saúde. A Sociedade das Nações se reuniu com diretores das escolas de Higiene, em maio e em julho de 1930, em Paris, na França, e em Dresden, na Alemanha, e concluiu que esse tipo educacional era o melhor para o treinamento de técnicos sanitários, o que deveria ocorrer com o apoio de instituições públicas e/ou privadas, de acordo com as condições locais (Faria, 1934FARIA, José Alberto de. Administração sanitária por José Alberto de Faria, diretor geral de Saúde Pública. Lisboa: Imprensa Nacional de Lisboa, 1934., p.293-294). No relatório elaborado pelo professor Prausnitz e aprovado na Conferência de Dresden, discutiu-se a necessidade de diferentes categorias obterem treinamento com conhecimento técnico mais aprofundado sobre higiene, a exemplo de inspetores sanitários, “enfermeiras” e parteiras (Faria, 1934FARIA, José Alberto de. Administração sanitária por José Alberto de Faria, diretor geral de Saúde Pública. Lisboa: Imprensa Nacional de Lisboa, 1934., p.294).
Naquele momento, identificavam-se escolas de higiene nos EUA, no Brasil, mas também em Varsóvia, Budapeste, Londres, Zagreb, Praga, Atenas e Paris, com duração de ensino variável e pautadas no trabalho de pesquisa. Na Polônia, por exemplo, havia centros de demonstração sanitária em dispensários de higiene social para a formação prática dos sanitaristas e enfermeiras visitadoras, sendo que o mais importante estava localizado no bairro Mokotów, em Varsóvia. Ciente desse quadro e após a proposta apresentada por José Alberto de Faria para Salazar, que ainda era ministro das Finanças em 1929, a Fundação Rockefeller decidiu estender seu auxílio a Portugal. A instituição já havia financiado a criação de escolas de higiene como a Johns Hopkins, em Baltimore; a Universidade de Harvard, em Boston; além de instituições em Toronto, Londres, Praga, Varsóvia, Budapeste, Belgrado, Zagreb, São Paulo, Angorá, Calcutá, bem como o ensino de medicina em Canadá, EUA, Londres, Bruxelas, Lyon, Hong-Kong e Singapura (Faria, 1934FARIA, José Alberto de. Administração sanitária por José Alberto de Faria, diretor geral de Saúde Pública. Lisboa: Imprensa Nacional de Lisboa, 1934., p.298-299).
O médico Daniel O’Brien, membro da seção de ciências médicas da Fundação Rockefeller, passou por Portugal e organizou um encontro entre Faria e George Strode. Logo após, o português recebeu uma correspondência com as seguintes determinações: (a) era necessária autorização do Conselho Administrativo da Rockefeller para firmar cooperação com os portugueses; (b) uma investigação seria realizada in loco para decidir como a agência interviria em Portugal sem violar os limites do seu programa atual; (c) em caso de cooperação, o auxílio seria inicialmente modesto, com oferta de bolsas de estudo para que um grupo de jovens melhorasse seus conhecimentos em higiene; (d) o trabalho seria desenvolvido por um grupo técnico especializado, o pessoal deveria se dedicar em tempo integral ao serviço, e os salários deveriam ser suficientemente altos para atrair médicos e enfermeiras da “melhor classe” sem recorrer a outros trabalhos (Faria, 1934FARIA, José Alberto de. Administração sanitária por José Alberto de Faria, diretor geral de Saúde Pública. Lisboa: Imprensa Nacional de Lisboa, 1934., p.302).
Ao retornar dos EUA, em 9 de novembro de 1931, Strode comunicou informalmente a aprovação da cooperação e, em 25 de abril de 1932, visitou Portugal para estudar as condições de auxílio que pudessem ser oferecidas. Ele chegou acompanhado do médico Rolla Hill, que se tornaria representante da Rockefeller em Portugal e, em janeiro de 1933, compartilhou a seguinte mensagem: “Os membros da International Health Division da Fundação Rockefeller estão autorizados a informar oficialmente o Governo de Portugal que a Fundação aceita o seu convite de colaborar com ele dentro dos limites que os diretores científicos podem, de tempos em tempos, aprovar” (Faria, 1934FARIA, José Alberto de. Administração sanitária por José Alberto de Faria, diretor geral de Saúde Pública. Lisboa: Imprensa Nacional de Lisboa, 1934., p.307).
A partir desse acordo, médicos e enfermeiras foram enviados aos EUA. As bolsas de Maria Tito de Morais e de Maria Angélica Basto foram aprovadas para o período de um ano, a partir de 1 de setembro de 1936 (Sawer, 25 jun. 1936), estendidas, posteriormente, até 1939. A situação das portuguesas apresentava a especificidade de mulheres que desejavam se profissionalizar em saúde, mas que nunca tiveram contato com esse campo em suas vidas. Isso as diferenciava, por exemplo, das brasileiras também financiadas pela agência filantrópica internacional. A criação da Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN) no Rio de Janeiro, a partir da Missão Parsons, em 1923, garantiu experiências práticas das alunas em instituições como o Hospital Geral de Assistência, Hospital São Sebastião (doenças infectocontagiosas), Hospital Arthur Bernardes (assistência materno-infantil) e na Maternidade Pro Matre (Ferreira, Salles, 8 out. 2019). Elas já eram, portanto, enfermeiras profissionais.
Com o objetivo de se aproximar do campo sanitário, as candidatas portuguesas passaram o verão de 1936 nas enfermarias e na sala de cirurgia de um hospital de Lisboa, visitaram o Ministério da Saúde para estudar sua organização, em companhia de Maria Monjardino, e frequentaram repartições onde enfermeiras visitantes ou assistentes sociais trabalhavam: “A secção de Epidemias, o Posto de Assistência à Infância e o inquérito à tuberculose de Villa Franca foram os mais visitados” (Hill, 20 ago. 1936, p.1). O staff da Rockefeller desejava oferecer ao menos uma ideia da organização do Departamento de Saúde e do trabalho realizado nele, para que as bolsistas julgassem criticamente semelhanças e divergências entre o que viam em Portugal e o que veriam nos EUA.
A formação das portuguesas na América do Norte se iniciou na Western Reserve University. Desde o início, Maria Tito de Morais demonstrava insegurança em relação a seu próprio trabalho, o que também ocorreu na experiência formativa de 1958 a 1961. Trechos de documentos, como “ela sentiu que não estava agindo tão bem quanto deveria, ou tão bem quanto ela é capaz de fazer, e que provavelmente os professores não estavam satisfeitos com seu trabalho”, ou “ficou desanimada porque não fez melhor” (Memorandum by Dr. Hill, 23 jan. 1937), apresentam as impressões da Rockefeller sobre as expectativas de uma jovem em torno da sua própria atuação, demasiadamente exigente consigo.
As “três Marias” se incorporaram à classe da escola de enfermagem e se tornaram populares. O sobrenome Tito rendeu o apelido de “Mosquito Tito” à portuguesa, que não se incomodava e suportava as provocações americanas com tranquilidade (From Miss..., 6 abr. 1937). Embora Maria Tito de Morais não fosse a preferida entre elas, talvez tenha sido a que galgou maior destaque ao longo da carreira.
Uma questão que marcou os primeiros anos de formação diz respeito ao diploma de enfermeira. Segundo Rolla B. Hill (citado em Memo n.93, 1 set. 1938, p.1):
Uma das poucas objeções à Escola de Cleveland [Western Reserve University] é que as meninas sempre foram tratadas como alunas especiais, e depois de passarem dois anos lá e fazer todo o trabalho necessário – no caso da Srta. Lima Basto e talvez outras, melhor que a maioria da turma – nada têm a mostrar a não ser uma carta do Reitor informando que já passou algum tempo na Escola.
Eu entendo que Srta. Tito de Morais e Srta. Cato [sic] devem fazer o curso regular em Toronto. Talvez lhes seja possível obter como certificado oficial ou diploma desta Escola.
A Western Reserve University não se dispunha a oferecer a certificação às estudantes estrangeiras, questão resolvida com seu encaminhamento para a Escola de Enfermagem da Universidade de Toronto, no Canadá. O diploma era considerado uma conquista importante, especialmente no retorno a Portugal, porque funcionava como elemento de distinção profissional em um contexto no qual poucas mulheres tinham acesso a formação semelhante.
Enquanto as estudantes se dedicavam à enfermagem, o staff da Rockefeller discutia os seus rumos em terras portuguesas. A enfermeira Mary Beard questionava George Strode se não seria necessária uma aproximação maior entre eles para escolher as próximas bolsistas. Ao mesmo tempo, indicava que Maria Basto parecia mais madura que Monjardino e Tito de Morais, por isso deveria ter um papel importante na Escola Técnica de Enfermagem de Lisboa (Beard, 25 fev. 1938). O escritório de Paris, de onde as ações da Rockefeller na Europa eram coordenadas, propunha a criação de uma escola em um prédio alugado, com uma enfermeira, uma secretária e uma governanta. As outras duas enfermeiras seriam designadas para o centro de saúde, onde continuariam o serviço de enfermagem no dispensário de tuberculose. As principais críticas se voltavam para a possibilidade de instituir um serviço improvisado, visto que o médico Francisco Gentil (Enquadramento Histórico, 15 jul. 2007, p.10)5 5 Francisco Soares Branco Gentil nasceu em Alcácer do Sal, em 1878, e faleceu em Lisboa, em 1964. Trabalhou no Instituto Português de Oncologia, com o cargo de presidente da comissão diretiva, de 1923 a 1961. A ele também é devida a concepção de um hospital-faculdade e a introdução do ensino científico da enfermagem, em 1940. já havia criado um projeto de escola que não recebeu apoio. Além disso, não se descartava inaugurar uma escola em Coimbra, em associação com os missionários Franciscanos de Maria (Crowell, 26 mar. 1938).
Antes mesmo do retorno de Maria Tito de Morais a Portugal, que ocorreu antecipadamente por causa da guerra, em 4 de outubro de 1939, a agência filantrópica internacional esperava que o governo salazarista cumprisse a promessa de oferecer empregos oficiais às enfermeiras, mesmo que não houvesse nenhuma garantia sobre isso. Uma correspondência entre Rolla B. Hill e José Alberto de Faria discutia os problemas a ser enfrentados pelas três primeiras enfermeiras formadas nos EUA. Maria Monjardino era filha do médico com mesmo sobrenome e que teve “dificuldades com o governo por causa de sua nomeação como professor assistente há vários anos. Ele acaba de ser destituído de seu cargo na Suprema Corte. Parece que agora ele é persona non grata, e a parte non grata pode se estender para sua filha” (Excerpt Dr. Faria, 27 jul. 1938, p.1). Possivelmente a nomeação do doutor Monjardino ocorreu na República, benefício que o identificou como defensor daquele regime e, consequentemente, opositor ao salazarismo. Maria Basto era filha de um ex-ministro monárquico que também tinha conflitos com o governo, caso repetido pelo pai de Maria Tito de Morais, cuja atuação na República já foi mencionada (Excerpt Dr. Faria, 27 jul. 1938, p.1).
As dinâmicas locais tinham grande potencial para modificar os planos da Fundação Rockefeller, especialmente com os conflitos decorrentes do regime salazarista. Contudo, a documentação apresenta um papel de destaque profissional para Maria Tito de Morais em seu retorno a Portugal. Ela trabalhou no centro de saúde até 7 de outubro de 1940, quando a Escola Técnica de Enfermeiras, criada pelo decreto-lei n.30447, de 17 de maio de 1940, foi inaugurada em Lisboa e instalada no número 18 da avenida da República (Ferreira, 2012FERREIRA, Óscar Manuel Ramos. História da Escola Técnica de Enfermeiras (1940-1968): aprender para ensinar e profissionalizar. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade de Lisboa, Lisboa, 2012., p.103).
A contratação da profissional em tempo integral pela Escola de Enfermeiras foi negociada com os responsáveis pelo Centro de Saúde de Lisboa, a cujo quadro ela pertencia. O médico Almiro Maia de Loureiro, que foi assistente de Francisco Gentil e bolsista da Rockefeller, precisava da enfermeira para desenvolver os projetos do Centro. Ele pretendia cedê-la apenas em tempo parcial. Por outro lado, Gentil demonstrava objeções a sua participação como docente, possivelmente porque a família dela pertencia a um grupo oposicionista e suas concepções políticas lhe desagradavam. Mas, em Portugal, não havia outra profissional de enfermagem com as qualificações adequadas para exercer a docência na nova instituição educativa.
A transferência de Maria Tito de Morais para a Escola obrigou alterações no programa de enfermagem de saúde pública do Centro. A situação piorou quando Maria Monjardino informou a intenção de deixar seu posto de trabalho em janeiro de 1941, para se casar, o que obrigou sua colega a regressar (Ferreira, 2012FERREIRA, Óscar Manuel Ramos. História da Escola Técnica de Enfermeiras (1940-1968): aprender para ensinar e profissionalizar. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade de Lisboa, Lisboa, 2012., p.144-145). Enquanto Monjardino interrompia sua trajetória profissional para exercer as atribuições socialmente esperadas para mulheres, em cunho privado e familiar, Maria Tito de Morais se empenhava para atender a uma demanda profissional que pouquíssimas portuguesas tinham qualificação para resolver.
Entre 1946 e 1950, ela retornou aos estudos, dessa vez na Faculdade de Letras de Lisboa, por onde se licenciou, em 1951 (Personal…, 1958). Com a proibição do trabalho no Centro de Saúde e na Escola de Enfermagem, por determinação salazarista, deixou Lisboa. Mas, devido ao reconhecimento internacional da sua atuação, foi contratada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O novo emprego lhe renderia trabalhos no Brasil e, posteriormente, uma segunda bolsa da Fundação Rockefeller.
Maria Palmira Tito de Morais e as frustrações da Fundação Rockefeller na enfermagem
Quando Maria Tito de Morais recebeu a proposta da Fundação Rockefeller para uma segunda bolsa de estudos, na década de 1950, ela trabalhava no Rio de Janeiro como consultora de enfermagem da OMS/Repartição Sanitária Pan-americana e finalizava o “Levantamento de recursos e necessidades de enfermagem no Brasil (1956-1958)”, coordenado pela enfermeira baiana Haydeé Guanais Dourado. Essa pesquisa começou a ser planejada no sétimo Congresso Brasileiro de Enfermagem, em 1954, na cidade de São Paulo, e teve como objetivo conhecer melhor a realidade daquele campo no país, por exemplo, número de enfermeiras, suas condições de formação e de trabalho.
A portuguesa atuou ao lado de Guanais Dourado, que também foi bolsista da Fundação Rockefeller duas vezes. O relatório final da pesquisa foi entregue em 30 de outubro de 1958, com 46 recomendações dirigidas ao Ministério da Educação, ao Ministério da Saúde e às instituições que mantinham escolas de enfermagem, entre outras (Malta, 2012MALTA, Daniela Vieira. O processo de organização do Levantamento de Recursos e Necessidades de Enfermagem no Brasil (1954-1958). Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012., p.19-20, 94).
Naquele momento, Maria Tito de Morais era solteira, tinha 46 anos e uma ampla experiência profissional. Trabalhou no Centro de Saúde de Lisboa e na Escola Técnica de Enfermeiras de Lisboa entre aproximadamente 1939 e 1949. Conhecia Índia, Leste e Oeste da África Portuguesa, África do Sul, Oriente Médio, Europa (Itália, Grécia, Suíça, França, Inglaterra e Espanha), EUA e Canadá, América Central e Brasil, em grande medida pelas funções desenvolvidas na OMS. Falava inglês, português e francês em nível excelente, possuía nível bom em italiano e espanhol, e compreendia alemão e árabe razoavelmente (Personal…, 1958). Assessorou o governo da Síria em questões de enfermagem e foi membro sênior da equipe de Educação de Enfermagem no Irã até ser enviada ao Brasil. Segundo Marcolino Candau, presidente da OMS:
Em todas as suas atribuições, a senhorita Tito de Morais tem demonstrado real capacidade e tem estabelecido excelentes relações com os governantes. Ela manifestou o interesse em cargos mais altos na Organização e apreciou a possibilidade de continuar estudando enfermagem, a fim de se preparar melhor para a promoção (citado em Mcandau-Jcbugher, 17 abr. 1958, p.1).
Maria Tito de Morais esperava retornar às suas atividades na agência multilateral, ao final do período de estudo, continuar a aconselhar enfermeiras nacionais e internacionais sobre planejamento e serviços de enfermagem em saúde pública e realizar atividades de ensino e pesquisa na área de enfermagem. O Teachers College, da Columbia University, a recebeu no final de 1958. De acordo com Ferreira e Salles (8 out. 2019), a instituição era uma das escolhidas pela Fundação Rockefeller, assim como o Philadelphia General Hospital, na School Nursing of Toronto, para garantir distinção profissional a enfermeiras bolsistas e lhes abrir caminho para ocupar posições de poder na estrutura burocrática e na condução de escolas de enfermagem no Brasil, como a EEAN. Em dezembro de 1957, aproximadamente um ano antes de iniciar os estudos, a candidata fez uma viagem aos EUA e foi encorajada por Virginia Arnold, diretora assistente da Fundação Rockefeller, a conversar com alguns integrantes da Columbia University sobre os seus planos futuros, para estreitar relações profissionais. Ela teria criado uma excelente impressão entre as pessoas que conheceu (Arnold, 21 jan. 1958).
Ao analisar as correspondências entre Arnold e Robert Briggs Watson,6 6 Robert Watson foi administrador do escritório da Fundação Rockefeller no Rio de Janeiro na década de 1950. identifica-se que, antes da implementação da bolsa de Maria Tito de Morais, já havia interesse da Rockefeller em incorporá-la ao seu staff. Virgínia Arnold (21 jan. 1958, p.2) deixou explícitos os motivos pelos quais ainda não poderia lhe fazer o convite:
Em relação à possível contratação de MPTdeM [Maria Palmira Tito de Morais] pela RF [Fundação Rockefeller], não tratei deste ponto com o JCB por duas razões: (1) ainda não posso justificar uma segunda enfermeira na equipe e (2) por causa da bolsa, MPTdeM não estaria disponível por mais um ano ... você sabe que eu sinto que ela seria um grande trunfo para o programa de enfermagem da RF.
A possibilidade de contratar Maria Tito de Morais foi discutida em outros momentos. Em outubro de 1958, Robert Watson afirmou que ela preenchia bem as especificações para o emprego, mas não era uma pessoa forte. Nos dois últimos anos, desde que a conhecia, ela ficou doente várias vezes. Ao mesmo tempo, julgou que a enfermeira não tomava decisões firmes e citou a questão da viagem aos EUA como exemplo a ser considerado (Excerpted..., 1 out. 1958).
Sobre esta última questão, exposta por Watson, inicialmente houve um acordo para que a viagem ocorresse de navio, e a passagem foi reservada. Em seguida, Tito de Morais pensou que não conseguiria chegar a tempo, devido a compromissos no Brasil, e cancelou o bilhete sem informar ao staff da Rockefeller (Excerpted..., 1 out. 1958). A enfermeira teria afirmado que seguiria se tivesse a certeza de que poderia chegar um ou dois dias após o esperado, mas, quando Watson tentou reservar outra passagem, não conseguiu. A Fundação Rockefeller estabeleceu uma série de critérios e procedimentos desde o início da política de bolsas, mas falhas na comunicação entre membros dos escritórios da agência internacional e os bolsistas eram recorrentes, como nesse caso. Um exemplo pode ser observado no episódio que envolveu o baiano Euvaldo Diniz Gonçalves, na década de 1920. Ele se casou e não comunicou à Fundação Rockefeller. A informação só chegou ao staff às vésperas da sua viagem, o que implicava uma modificação urgente no valor da bolsa, visto que esse se diferenciava em função do acompanhamento do cônjuge na viagem (Batista, 2020b, p.326).
Sem bilhete para navegar, Maria Tito de Morais seguiu de avião para os EUA. O voo atrasou em cinco horas a sua chegada, devido à revolução que ocorria na Venezuela, um processo que certamente ela aprovava. Na escala realizada em Caracas, soldados com metralhadoras cercaram o avião e impediram, por um tempo, sua partida (Arnold, 8 set. 1958). A ditadura de Marcos Pérez Jiménez, implantada em 13 de junho de 1953, chegava ao final. O Nuevo Ideal Nacional, que ele propagava, era um projeto modernizador, de forte perspectiva anticomunista e que apontava para a consolidação capitalista da estrutura econômico-social venezuelana (Rodríguez, 2011RODRÍGUEZ, Frank. Marcos Pérez Jiménez y Gustavo Rojas Pinilla: dos modelos de dictaduras desarrollistas en América Latina. Anuario de Historia Regional y de las Fronteras, v.16, n.1, p.317-328, 2011.). Aquele episódio pode ter fomentado esperanças na enfermeira, que assistia a tudo de dentro do avião, em relação a uma derrocada também do Estado Novo português.
Por fim, Robert Watson questionou se haveria um compromisso moral por parte da Rockefeller ou da própria Maria Tito de Morais com a OMS, uma vez que a bolsa era destinada a sua permanência na agência de origem. Embora ele pudesse esperar até o final da formação para saber se ela era a candidata mais desejável ao cargo, isso atrasaria o desenvolvimento do programa de enfermagem no Brasil (Excerpted..., 1 out. 1958).
Em contraposição a Watson, Virgínia Arnold defendia a atuação da portuguesa. Para ela, Maria Tito de Morais era “superior”, porque tinha uma formação mais rica, maior experiência e formação cultural que agregava valor no campo internacional. Ela reconheceu que a enfermeira teve problemas de saúde no Brasil, mas, após conhecê-la pessoalmente, compreendeu que aquele não era um empecilho. A umidade do Rio de Janeiro e o fato de residir em um hotel (e, portanto, não ter controle sobre a preparação dos alimentos) eram agravantes nas questões gastrointestinais. Além disso, Arnold minimizou a indecisão de Maria Tito de Morais sobre a viagem de navio, visto que “na área em que a determinação é importante, ou seja, no seu trabalho, ela é bastante clara em seu pensamento” (Excerpted, 24 out. 1958, p.1). Por fim, não considerava delicado com Marcolino Candau dar uma bolsa a uma de suas funcionárias e imediatamente lhe oferecer um emprego na Fundação Rockefeller: “Acredito que ela [Maria Tito] sente a responsabilidade de retornar à OMS por pelo menos um ano por causa da bolsa” (p.1).
Em 20 de junho de 1958, o financiamento da enfermeira foi aprovado para um período que não excedesse 12 meses e contava com a recomendação de integrantes dos diferentes organismos da saúde internacional, a exemplo de Robert Watson e Virgínia Arnold; Agnes W. Chagas, conselheira regional de Enfermagem da Repartição Panamericana de Saúde e Kenneth Courtney, da mesma instituição. Além disso, Maria Tito de Morais era a terceira indicação de Marcolino Candau para financiamento da Rockefeller (Fellowship for…, 20 jun. 1958).
A enfermeira recebeu o valor mensal de 250 dólares e uma pensão para a sua família, em Portugal, dependente sua. O almirante Tito de Morais faleceu em 14 de julho de 1963, aos 83 anos, segundo o periódico paulista A Tribuna (Faleceu..., 14 jul. 1963, p.2), com uma doença que o acompanhou por muitos anos. Essa enfermidade, associada ao desprezo do governo salazarista, que pode ter lhe imputado sanções financeiras, talvez tenha influenciado na condição de dependente de Maria Tito de Morais.
A postura da Fundação Rockefeller não deu ênfase à posição política da enfermeira e de sua família. Segundo Rampinelli (2014RAMPINELLI, Waldir José. Salazar: uma longa ditadura derrotada pelo colonialismo. Lutas Sociais, v.8, n.32, p.119-132, 2014., p.127-128), as guerras coloniais foram responsáveis pela queda do salazarismo em Portugal. Por isso, o governo ditador explorou a conjuntura internacional bipolar, recorrendo à tese de que o comunismo se apossaria das colônias portuguesas caso a metrópole se retirasse delas. Manuel, irmão de Maria Tito de Morais, foi preso na cadeia do Aljube e, após pagar fiança, sem conseguir emprego em Lisboa, seguiu para Angola, onde se envolveu intensamente na luta anticolonial (Assembleia da República, 2010ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA. Manuel Alfredo Tito de Morais: homenagem do antigo presidente da Assembleia da República no centésimo aniversário do seu nascimento. Lisboa: Divisão de Edições da Assembleia da República, 2010. Disponível em: https://www.parlamento.pt/ArquivoDocumentacao/Documents/tito_p.pdf. Acesso em: 1 jun. 2021.
https://www.parlamento.pt/ArquivoDocumen...
, p.9). Mesmo que os meios oficiais dos EUA adotassem, por conveniência do momento, uma aparente política de cooperação com as nações coloniais, documentos oficiais comprovam que o anticolonialismo crescia no país (Rampinelli, 2014RAMPINELLI, Waldir José. Salazar: uma longa ditadura derrotada pelo colonialismo. Lutas Sociais, v.8, n.32, p.119-132, 2014., p.128).
A enfermeira Virginia Arnold parecia não ter conhecimento sobre os conflitos políticos nos quais a família Tito de Morais se envolveu no contexto europeu. Ela se incomodou com a suspeita de que a enfermeira não desejava abdicar da cidadania portuguesa para receber a norte-americana e se perguntou sobre uma possível relação “política” de Maria Tito de Morais com amigos portugueses. Mesmo assim, estava convicta de que, se uma proposta lhe fosse feita, ela aceitaria trabalhar na agência norte-americana:
Um ponto do problema tornou-se um pouco mais claro em minha mente. No momento de nossa conversa com JCB sobre o emprego do MPTdeM [Maria Palmira Tito de Morais], surgiu a questão da cidadania norte-americana. No momento da conversa com JCB, fiquei com a impressão de que a MPTM não queria abdicar da sua cidadania portuguesa. Como você sabe, ela é uma pessoa muito orgulhosa. No entanto, soube agora que ela discutiu recentemente esse ponto com a sua família e amigos próximos em Portugal. Fiquei sabendo que a família dela está completamente de acordo com os seus desejos nesse ponto, mas alguns de seus amigos (políticos?) não estão, por causa de sua grande força e apoio (Arnold, 21 jan. 1958, p. 2).
A “força e o apoio” enfatizados pelos amigos de Maria Tito de Morais se referiam à sua participação no Movimento de Unidade Democrática. Ela integrou ativamente a campanha para a eleição presidencial do general Norton de Matos, opositor do Estado Novo, em 1949, e os protestos contra a prisão de democratas. Por esse motivo foi demitida, no mesmo ano, do Centro de Saúde de Lisboa, e um ano mais tarde impedida de exercer quaisquer funções na Escola Técnica de Enfermagem, no Instituto Português de Oncologia e em todos os organismos do Estado (Associação…, s.d.). Mesmo distante de seu país, mantinha uma atuação política expressiva, fruto do engajamento de uma família “símbolo da República”, imagem que poderia ser enfraquecida pela adoção de uma nova nacionalidade, considerada traição à pátria.
Vista como aparentemente livre de associações com o comunismo na instituição financiadora e vivendo nos EUA, Maria Tito de Morais passou a frequentar a Universidade, em setembro de 1958, e o desejo de obter o doutorado no Teachers College contribuiu para a renovação da bolsa por mais um ano, a partir de 8 de setembro de 1959. Entre o final de 1958 e o início de 1959 estudou assuntos voltados especificamente para a orientação em enfermagem, como é possível observar no Quadro 1:
A enfermeira dispendeu esforços para conseguir o título de doutora. Ao se candidatar ao programa em Filosofia com especialização em Consultoria em Educação de Enfermagem, submeteu-se ao exame CAVD, exigido principalmente para os estudantes que não tinham o inglês como língua materna (Bunge, 14 dez. 1958). Foi elogiada em diversos momentos pela sua atuação e pelo acúmulo de trabalho. Diferente de outras candidatas ao doutorado, a formação anterior em letras a colocou em vantagem nas artes liberais. Geralmente, os enfermeiros interessados em se tornar doutores em filosofia tinham diploma de bacharel, com especialização em enfermagem e deficiência na outra área.
O staff de enfermagem da Rockefeller esboçava uma “grande preocupação com a falta de vontade ou incapacidade da OMS de colocar a enfermeira portuguesa em uma posição compatível com sua capacidade e habilidade” (Excerpt, 18 dez. 1959, p.1). Ela era considerada uma pessoa extraordinariamente capaz, que possuía talentos não utilizados ao máximo pela OMS, sendo mais bem aproveitados se fosse incorporada pela agência filantrópica norte-americana.
Maria Tito de Morais precisava se matricular em cursos até junho de 1960, o que implicava cursar um número máximo de créditos até o final de 1959 e o início de 1960. Para Hattie Jarmon (16 fev. 1959, p.1), oficial de admissões do Teachers College, “isso significaria uma carga muito pesada, principalmente no que diz respeito ao projeto de pesquisa e à elaboração do relatório”. Uma alternativa seria concluir as disciplinas do curso até junho de 1960 e o projeto de pesquisa e o relatório após retornar para seu cargo na OMS. Nesse caso, precisaria voltar à universidade para a apresentação do relatório final e para os exames orais.
Mas ela não foi devidamente orientada sobre a matrícula do segundo semestre daquele ano, e Virginia Arnold precisou intervir na situação. Para a supervisora, a confusão foi causada por uma disputa entre o Teachers College e a Columbia University, e, por isso, afirmou que foi desagradável com todos os envolvidos “para resolver essa bagunça” (VA Diary, 3 fev. 1960, p.1). Ela considerava que o doutor G. Watson, orientador de Maria Tito de Morais na Columbia University, era a principal fonte de dificuldade, mesmo que de forma não intencional, visto que era “um daqueles professores de alto nível que não se importam com os requisitos da Universidade, regulamentos etc. Na verdade, ele admitiu para mim que não manteve MPTdeM [Maria Palmira Tito de Morais] bem-informada sobre todos os requisitos” (p.1).
Esse episódio implicou a redução do prazo para a entrega do trabalho final da enfermeira, que escreveu uma carta para Virginia Arnold culpabilizando-se pelo ocorrido. Entre as questões abordadas por ela, lamentava não ter preenchido todos os requisitos necessários para se formar em junho de 1960, pois não conseguiria terminar o relatório final até 24 de fevereiro, data que lhe foi informada para o depósito do documento, enquanto tinha esperança de fazê-lo em abril. Maria Tito de Morais demonstrava seu empenho no estudo: inscreveu-se no maior número de créditos permitidos; foi aprovada em exames de francês e espanhol; e iniciou estudos em alemão quando as regras da universidade mudaram e exigiram que um dos idiomas da prova fosse germânico e o outro latino. Além disso, por não ter conseguido ainda terminar o rascunho do trabalho, sentia-se “extremamente envergonhada com esse fracasso” (Morais, 10 fev. 1960, p.1-2).
Ela demonstrava não ter percepção do conflito entre o Teachers College e a Columbia University, além de, aparentemente, não desconfiar do quanto era desejada pela Fundação Rockefeller. Desculpava-se reiteradamente, porque imaginava não atender às expectativas depositadas sobre si. Arnold tentou desconstruir essa percepção:
Como estou familiarizada com as dificuldades que você encontrou, espero que você não sinta que é devido à sua incapacidade de realizar um trabalho de nível de doutorado. Pelo contrário, já demonstrou excepcional capacidade nesta área e apenas repito que não foi devidamente informada sobre o calendário dos vários requisitos para o grau de PhD. Do ponto de vista da Fundação, sentimos que o seu desempenho foi excepcional e temos toda a confiança na sua capacidade (Arnold, 10 mar. 1960, p.1).
Aquele não foi um caso isolado. Devido a duas outras confusões institucionais, o diretor do programa de bolsas estava furioso com os principais envolvidos no Teachers College e queria remover as cinco enfermeiras que mantinha lá. Como isso poderia penalizá-las, pensava em mantê-las, mas não enviar mais bolsistas para aquela instituição (Arnold, 23 jun. 1960, p.1).
Antes de terminar sua bolsa, Maria Tito de Morais viajou para Los Angeles e San Francisco, na Califórnia, Portland, Seattle e Nova York para visitar escolas e programas de enfermagem, até se desligar, em 31 de agosto de 1960. A prática era comum entre os bolsistas e mesmo para as pessoas que faziam viagens curtas financiadas pela agência filantrópica em anos anteriores (Batista, Ferreira, 2021; Batista, 2020c). O que não se esperava é que Maria Tito de Morais fosse designada imediatamente para um cargo em Alexandria, vinculada à OMS, sem chances de integrar o staff da Rockefeller. Caíram por terra os planos da instituição filantrópica e o investimento realizado durante dois anos em uma enfermeira que desejavam para si, mesmo que, para todos os efeitos, fosse treinada para atuar em outra organização.
Essa questão deixou Virginia Arnold e Robert Watson consternados, o que contribuiu para que Ernani Braga escrevesse do Brasil para Marcolino Candau e solicitasse a cessão da profissional, por parte da OMS, à Fundação Rockefeller. Segundo Braga, ele desejava levar Maria Tito de Morais para o setor de enfermagem da agência filantrópica norte-americana, naquele momento a cargo apenas de Arnold, pagando-lhe os salários e as despesas decorrentes da função que desempenharia (Braga, 29 jul. 1960). Além da carta de Ernani Braga, Robert Watson conversou com um amigo da OMS que encontraria Marcolino Candau na Europa, explicou a situação e solicitou uma intervenção a seu favor. Contudo, acreditava que a enfermeira teria que servir em Alexandria, para só depois ser liberada (Watson, 2 ago. 1960). Todas as possibilidades de articular a cessão de Maria Tito de Morais foram tentadas, mas sem lograr êxito.
Em uma avaliação sobre os erros cometidos nesse processo, Virginia Arnold afirmava que o staff da Fundação Rockefeller falhou em relação à bolsista por dois motivos: atrasou em tomar a decisão de prosseguir com a sua contratação; e Lyle Creelman, chefe da seção de enfermagem da OMS, e Elizabeth Hill, sua adjunta, bloquearam os esforços realizados por eles para incorporar a enfermeira ao seu quadro. Para Arnold, era um fato conhecido que Creelman não gostava da enfermeira portuguesa e já a havia impedido em outros momentos, quando tarefas interessantes estavam disponíveis ou quando havia oportunidades de promoção. Por fim, soube de uma carta de Marcolino Candau (que ela não leu porque não sabia português), na qual ele expressou relutância em ceder Maria Tito de Morais, porque a OMS lidava geralmente com governos, e não com organizações privadas, como a Rockefeller. Arnold afirmou que não desistiria de prosseguir com aquele assunto (Clipped..., 15 set. 1960).
Em 21 de novembro de 1960, a Fundação Rockefeller registrou que o trabalho de doutorado da enfermeira finalizaria e que um seminário avançado seria apresentado após a conclusão. Ela promoveu mudanças significativas como diretora do Instituto Superior de Enfermagem de Alexandria; foi nomeada chefe adjunta da Seção de Enfermagem da OMS em 1962 e, em 1966, tornou-se enfermeira consultora do Escritório Regional da OMS na Europa: “Observa-se que o seu desempenho superior e longa experiência com a OMS serão um grande trunfo para os enfermeiros e a profissão de enfermagem na região coberta pelo seu escritório” (Fellowship card, s.d.). Ela não foi incorporada ao staff da Rockefeller no restante da sua vida profissional.
Considerações finais
A análise de trajetórias é uma possibilidade interessante para compreender fissuras em normas e limitações na atuação das agências internacionais. Os percursos realizados pelos integrantes do Programa de Bolsas da Fundação Rockefeller oferecem uma dessas oportunidades, visto que os contextos locais, nacionais e internacionais se contrapuseram, em muitos momentos, ao que a instituição propunha.
O início da política de bolsas, no final dos anos 1910, foi marcado por um processo desordenado, em que a seleção dos candidatos não atendia necessariamente aos critérios impostos. Embora se desejasse o envio dos melhores profissionais, seguindo as normas estabelecidas pela instituição, inclusive no que diz respeito aos temas de pesquisa; análises historiográficas recentes demonstram que a oferta de pessoal era maior que a demanda, e as tentativas da instituição de impedir indicações políticas de bolsistas muitas vezes não eram exitosas, visto que nem sempre os profissionais mais bem qualificados eram enviados e, mesmo com a prioridade de temas que norteavam o trabalho da Rockefeller, bolsistas conseguiram negociar ou driblar as determinações, seguir itinerários e estudar temas almejados (Batista, Ferreira, 2021; Batista, 2020a, 2020b, 2019; Batista, Silva, 2020).
Em 1924, o IHB elaborou um documento denominado Informations concerning fellowships awarded by International Health Board of The Rockefeller Foundation (MHFMUSP, 1924MHFMUSP, Museu Histórico Prof. Carlos da Silva Lacaz/da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Informations concerning fellowships awarded by International Health Board of The Rockefeller Foundation. Pasta Rockefeller Foundation, Código de Referência MHFM TEXT-Rockefeller Foundation (Rockefeller Foundation, New York). 1924.), no qual tentava estabelecer, formalmente, critérios para a seleção de bolsistas em saúde pública. Entre as muitas determinações, estava a procura por candidatos com elevada qualificação profissional e científica, assim como qualidades de líder, idade preferencial menor que 35 anos e garantia de que o candidato receberia um emprego apropriado após a conclusão da bolsa. Foram instituídos formulários e procedimentos-padrão, valores para bolsistas solteiros e casados, tipo de despesas que eram cobertas pela agência, deixando explícitas quais despesas relativas a cônjuges não seriam pagas. Por fim, explicitava aspectos relativos a procedimentos, recepção, habitação e deslocamentos no local de estudo, entre outros.
Embora esses critérios fossem propostos com validade universal, o caso de Maria Tito de Morais demonstra a especificidade do contexto português em relação às normas para a concessão de bolsas. O caráter rural, a baixa alfabetização e as dificuldades de acesso das mulheres ao ensino impuseram desafios à agência filantrópica, que precisou construir estratégias que viabilizassem a formação das enfermeiras. Isso se manifesta, por exemplo, na observação das candidatas a enfermagem nos espaços de saúde de Lisboa, quando nunca haviam tido contato com essa área em suas trajetórias. O seu envio para Toronto, visto que não podiam ser certificadas na Western Reserve University, também se configura como um movimento para garantir documentos formais que comprovassem a formação.
O regime salazarista se contrapôs aos pais daquelas mulheres, o que causou preocupação, por parte do staff da Fundação Rockefeller, em relação à sua efetiva contratação no serviço público. A ruptura esperada não ocorreu naquele momento, e as poucas enfermeiras diplomadas de Portugal atuaram nas duas principais instituições de saúde destinadas à sua formação. Contudo, Maria Monjardino abdicou da vida profissional para contrair matrimônio, e o posicionamento político de Maria Tito de Morais lhe rendeu a proibição de trabalhar no Centro de Saúde e na Escola de Enfermeiras, rompendo com as expectativas da Fundação Rockefeller sobre a reprodução do conhecimento que ela adquiriu na formação internacional, para preparar novas enfermeiras portuguesas. De certa forma, o “elemento-chave” chamado Maria Tito de Morais deixava de exercer sua função principal, devido a conflitos de cunho político local.
Suas qualificações e competências lhe renderam um contrato com a OMS e o trânsito por diferentes países, o que permitiu agregar ampla experiência no campo da prática de enfermagem em perspectiva global. O desejo de ascender na carreira implicou a concessão de uma segunda bolsa. Embora a Rockefeller treinasse Maria Tito de Morais com a justificativa de que ela retornaria à OMS, havia um movimento silencioso para que ela assumisse um lugar junto a Virgínia Arnold, na seção de enfermagem da agência filantrópica internacional. Contudo, a OMS não cedeu a enfermeira, deixando os membros do staff da Rockefeller consternados. Todo o investimento realizado, pensando ser revertido para a própria Fundação, foi direcionado para a agência multilateral da qual a bolsista era oriunda, em uma demonstração clara de que os rumos dos bolsistas da Fundação Rockefeller não lhe pertenciam.
Em todo esse processo, a enfermeira demonstrava esforço para alcançar os objetivos traçados, mesmo que em muitos momentos não confiasse no seu potencial. Propor um caminho para si diferente daquele trilhado por mulheres portuguesas, especialmente durante o primeiro financiamento, tinha também seu preço, seus medos, suas inseguranças. Embora Maria Tito de Morais não tivesse plena consciência disso, ela era disputada por duas organizações internacionais, o que revela a competência de mulheres que atuaram incisivamente na construção do conhecimento internacional sobre saúde.
AGRADECIMENTO
Este artigo é fruto de pesquisa realizada com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, processo 150221/2022-3.
REFERÊNCIAS
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NOTAS
-
1
A Primeira República portuguesa durou de 5 de outubro de 1910, com a revolução contra a monarquia daquele país, e se estendeu até o golpe de 28 de maio de 1926, quando foi implantada a ditadura, transformada em Estado Novo, entre 1933 e 1974.
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2
José Alberto de Faria nasceu em Lisboa, em 13 de agosto de 1888. Formou-se na Escola de Medicina Médico-Cirúrgica de Lisboa, em 1911, com a tese Tuberculina no uso clínico. Entrou ainda jovem para os serviços de saúde pública. Tornou-se subdelegado de Saúde Pública de Lisboa em 1914, foi chamado para servir na Direção Geral de Saúde em 1916, após o aparecimento da peste bubônica. E, em 12 de outubro de 1926, foi nomeado inspetor-chefe de Epidemias e Profilaxias de Moléstias Infecciosas. Subiu ao cargo de diretor-geral de Saúde em 20 de dezembro de 1928, pela aposentadoria de Ricardo Jorge.
-
3
Desde o seu surgimento lhes foram atribuídos diferentes nomes: International Health Comission (IHC), entre 1913 e 1916; International Health Board (IHB), de 1916 a 1927; e, de 1927 até o seu fechamento, em 1951, funcionou como IHD.
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4
Strode formou-se em medicina pela Universidade da Pensilvânia e ingressou no Conselho de Saúde em 1920, após serviço de guerra na França. Após três anos à frente da Diretoria de Saúde do Brasil, dirigiu o escritório da International Health Division (IHD) em Paris até a Segunda Guerra Mundial. Descrito como “equilibrado com bom senso”, era um administrador, em vez de um homem de laboratório.
-
5
Francisco Soares Branco Gentil nasceu em Alcácer do Sal, em 1878, e faleceu em Lisboa, em 1964. Trabalhou no Instituto Português de Oncologia, com o cargo de presidente da comissão diretiva, de 1923 a 1961. A ele também é devida a concepção de um hospital-faculdade e a introdução do ensino científico da enfermagem, em 1940.
-
6
Robert Watson foi administrador do escritório da Fundação Rockefeller no Rio de Janeiro na década de 1950.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
09 Out 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
24 Mar 2022 -
Aceito
15 Jul 2022