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Estudo da Técnica Tig Keyhole por Meio do Análise Comparativo entre Duas Tochas de Alta Produtividade na União de Chapas de Aço Carbono de Meia Espessura

Study of the Tig Keyhole Technique Through Comparative Analysis Between Two High Productivity Torches in Joints of the Middle Thickness Carbon Steel Plates

Resumo

Na bibliografia de referência comum, a soldagem por meio da técnica Keyhole sempre foi associada a processos de soldagem com uma alta concentração de energia, como o processo Laser ou o processo Plasma. Novos avanços em tochas TIG estão mudando a forma em como o processo de soldagem TIG deveria ser considerado. Um exemplo desses novos avanços é a tocha comercialmente conhecida como Infocus, que segundo seus fabricantes a principal característica da tocha é a capacidade de concentração de energia na ponta do eletrodo, por médio de um aumento na potência de refrigeração do eletrodo, diferenciando à Infocus de uma tocha convencional TIG. Tal concentração de energia permite à tocha Infocus trabalhar com a técnica Keyhole. Portanto, é objetivo do presente trabalho estudar a factibilidade de uma tocha convencional TIG de usar a técnica Keyhole, com as mesmas condições de trabalho que a tocha comercialmente conhecida como Infocus. Através dos ensaios realizados foi possível confirmar que o processo TIG consegue trabalhar com a técnica Keyhole, sem necessidade de uma tocha com características especiais. Porém, o eletrodo da tocha Infocus possui uma vida maior, em comparação a um eletrodo convencional da mesma composição, aumentando a produtividade do processo.

Palavras-chave:
Keyhole; TIG; CF-TIG; Infocus

Abstract

In the common reference bibliography, the welding through Keyhole technique it always associated with welding processes with a high energy concentration, such as Laser processes or Plasma processes. New advances in TIG torches are changing the way as the TIG welding process should be considered. An example of these new advances is the commercially known as Infocus torch, which according to its manufacturers, the main feature of these torch is his capacity of energy concentration on the electrode tip, through an increase the electrode cooling power, which differentiate the Infocus of one conventional TIG torch. This concentration of energy allows the torch Infocus to work with Keyhole technique. Therefore, the objective of this work was to study the feasibility of a conventional TIG torch to use the Keyhole technique, with the same working conditions that the torch commercially known as Infocus. Through tests it was possible to confirm that the TIG process can effectively work with Keyhole technique, without need for a special torch. However, the electrode of the torch Infocus has a greater life compared to a conventional electrode of the same composition, increasing the productivity.

Keywords:
Keyhole; TIG; CF-TIG; Infocus

1 Introdução

O aumento da produtividade dos processos de soldagem se obtém através de alguma modificação na fonte de soldagem, novos designs de tochas ou, às vezes, na utilização de técnicas de aproveitamento das propriedades do arco voltaico. Uma técnica usada por alguns processos de soldagem de alta concentração de energia, é a técnica Keyhole, que é possível de utilizar quando a pressão que o arco voltaico exerce sobre a poça metálica, produze um furo passante de metal líquido que é fechado à medida em que a tocha avança ao longo da solda. O furo passante é mantido como resultado da combinação da alta densidade de energia localizada e a pressão do arco, permitindo que as correntes de metal liquido flua ao redor do Keyhole, coalescendo sem perda de material na região posterior da poça fundida. Aquela coalescência final o distingue de um processo de corte [11 Jarvis BL, Ahmed NU. Development of keyhole mode gas tungsten arc welding process. Science and Technology of Welding and Joining. 2000;5(1):1-7. http://dx.doi.org/10.1179/136217100322910624.
http://dx.doi.org/10.1179/13621710032291...
].

A literatura clássica menciona que o Keyhole está restrito para processos com uma alta densidade de energia, como o LASER, o Feixe de elétrons e o Plasma [22 American Welding Society. Handbook welding. Miami: AWS; 1990. v. 2.

3 Lancaster JF. The physics of welding. Oxford: Pergamon Press; 1984.
-44 Scotti A, Reis RP. Fundamentos e prática da soldagem a Plasma. São Paulo: Artliber; 2007.]. Porém, as medidas de segurança necessárias para usar o LASER, além do tamanho do equipamento, restringem a aplicação do processo na indústria. Enquanto a soldagem pelo processo plasma encontra-se limitada ao tamanho da tocha, que é relativamente grande, devido ao bocal constritor do arco que está incorporado dentro do design da tocha, afetando diretamente no posicionamento da tocha na junta e restringindo sua aplicação. Além disso, deve-se mencionar o alto investimento na compra de aqueles processos.

O processo de soldagem TIG foi usado por anos para produzir soldas de alta qualidade em uma grande variedade de materiais. Porém, ele nunca foi considerado muito produtivo, além de não possuir uma grande concentração de energia como o processo de soldagem Plasma. No modo melt-in, forma geralmente usada pelo processo TIG, e com altas correntes de soldagem o processo fornece uma alta penetração, devido ao efeito combinado da transferência de calor por condução e convecção no metal liquido e a depressão da superfície da poça pela pressão do arco. Alguns trabalhos aproveitam aquela depressão na poça de soldagem, para aproximar ou submergir a ponta do eletrodo no material de base, conseguindo dessa forma incrementar substancialmente a penetração [55 Lukens WE. Mechanical properties of HSLA steel buried gas tungsten arc weldments. Welding Journal. 1987;7:215s-218s.]. Na pratica, trabalhar com altas correntes dificulta o controle da poça fundida, especialmente quando a penetração não é total. Bolhas de gás retidas dentro do cordão, além do "Humping" ou "Costas de dragão" são defeitos característicos do processo TIG [66 Schwedersky MB, Dutra JC, Okuyama MP, Gonçalves e Silva RH. Soldagem TIG de elevada produtividade: Influência dos gases de proteção na velocidade limite para formação de defeitos. Soldagem e Inspeção. 2011;16:333-340.], para correntes superiores aos 350 A.

Na bibliografia atual se encontram estudos que demonstram que o processo TIG é capaz de trabalhar com a técnica Keyhole [11 Jarvis BL, Ahmed NU. Development of keyhole mode gas tungsten arc welding process. Science and Technology of Welding and Joining. 2000;5(1):1-7. http://dx.doi.org/10.1179/136217100322910624.
http://dx.doi.org/10.1179/13621710032291...
,77 Schnick M, Fuentes JE, Zschetzsche J, Füssel U, Schuster H, Krink V, et al. Cathode focussed TIG - fundamentals and applications. In: Proceedings of the 63rd International Conference of the International Institute of Welding; 2010 July 11-17; Istanbul, Turkey. Istanbul: IIW; 2010. Document XII-1985-10.

8 Jarvis BL. Keyhole gas tungsten arc welding: a new process variant [tese de doutorado]. Wollongong: Faculty of Engineering, University of Wollongong; 2001.

9 Lohse M, Füssel U, Schuster H, Friedel J, Schnick M. Keyhole welding with CF-TIG. Welding in the World. 2013;57(5):735-741. Document XII-2141-13.
-1010 Rosellini C, Jarvis L. The keyhole TIG welding process: a valid alternative for valuable metal joints. Welding International. 2009;23:616-621.]. Porém, aqueles trabalhos limitam as possibilidades de usar a técnica a duas tochas, conhecidas comercialmente como Infocus e K-TIG. Resultados bons foram obtidos com as duas tochas para variados tipos de ligas, como aços austeníticos, ligas de titânio, aços inoxidáveis duplex e zircônio. Os estudos demonstram que é possível completar juntas de até 12 mm de espessura em um passe só, usando a técnica Keyhole [88 Jarvis BL. Keyhole gas tungsten arc welding: a new process variant [tese de doutorado]. Wollongong: Faculty of Engineering, University of Wollongong; 2001.,99 Lohse M, Füssel U, Schuster H, Friedel J, Schnick M. Keyhole welding with CF-TIG. Welding in the World. 2013;57(5):735-741. Document XII-2141-13.]. Destacam-se os trabalhos feitos por [66 Schwedersky MB, Dutra JC, Okuyama MP, Gonçalves e Silva RH. Soldagem TIG de elevada produtividade: Influência dos gases de proteção na velocidade limite para formação de defeitos. Soldagem e Inspeção. 2011;16:333-340.,88 Jarvis BL. Keyhole gas tungsten arc welding: a new process variant [tese de doutorado]. Wollongong: Faculty of Engineering, University of Wollongong; 2001.], que caracterizam a tocha denominada comercialmente como Infocus, a qual é descrita com a capacidade de produzir uma constrição catódica, provocando assim, um arco mais concentrado e com propriedades superiores a uma tocha convencional TIG. Este caso é atribuído ao diferenciado desempenho do sistema de refrigeração do eletrodo, design e material da tocha, fazendo com que somente uma parte ínfima da extremidade do eletrodo emita elétrons. Isto, então, passou a ser a justificativa para a referida constrição do arco e a obtenção de determinadas características das soldas produzidas. Talvez o mais destacável da Infocus é o design do eletrodo, com dimensões reduzidas e padronizadas, que permitem uma fácil troca de eletrodos (Figura 1). Além disso, o design diferenciado do eletrodo da Infocus está projetado para aproveitar ao máximo o sistema de refrigeração da tocha, oferecendo uma maior transferência de calor por condução com o corpo interno da tocha, aumentando dessa maneira a vida útil do eletrodo [1111 Fuentes MJ, Schnick M, Schuster H, Zschetzsche JD-I, inventores. Kjellberg Finsterwalde Plasma Und Maschinen Gmbh, cessionário. Brenner für das Wolfram-Inertgas-Schweißen, Elektrodeneinheit für uns Verfahren yum Betreiben des Brenners. Germany patent DE 102009008250A1. 2010 Ago 5.].

Figura 1
Eletrodo usado pela tocha Infocus. Adaptado da patente da Infocus [1111 Fuentes MJ, Schnick M, Schuster H, Zschetzsche JD-I, inventores. Kjellberg Finsterwalde Plasma Und Maschinen Gmbh, cessionário. Brenner für das Wolfram-Inertgas-Schweißen, Elektrodeneinheit für uns Verfahren yum Betreiben des Brenners. Germany patent DE 102009008250A1. 2010 Ago 5.].

Segundo a bibliografia estudada o Keyhole no processo TIG só é relacionado às tochas de soldagem Infocus [77 Schnick M, Fuentes JE, Zschetzsche J, Füssel U, Schuster H, Krink V, et al. Cathode focussed TIG - fundamentals and applications. In: Proceedings of the 63rd International Conference of the International Institute of Welding; 2010 July 11-17; Istanbul, Turkey. Istanbul: IIW; 2010. Document XII-1985-10.] e K-TIG [11 Jarvis BL, Ahmed NU. Development of keyhole mode gas tungsten arc welding process. Science and Technology of Welding and Joining. 2000;5(1):1-7. http://dx.doi.org/10.1179/136217100322910624.
http://dx.doi.org/10.1179/13621710032291...
]. Portanto, é objetivo desse trabalho estudar a factibilidade de uma tocha convencional TIG de usar a técnica Keyhole, com as mesmas condições de trabalho que a tocha comercialmente conhecida como Infocus.

2 Materiais e Métodos

A configuração da bancada de ensaios consta de um sistema de deslocamento da peça, onde a tocha foi mantida fixa para facilitar a aquisição de imagens (Figura 2). Uma tocha convencional TIG com capacidade de até 500 A de corrente foi utilizada para comparar a tocha Infocus. O gás de proteção utilizado foi argônio mais 5% de hidrogênio, com uma vazão de 18 l/min. Para garantir a estabilidade do Keyhole foi usado argônio como gás de purga, com uma vazão de 6 l/min. O eletrodo utilizado nas duas tochas foi a liga EWLa-1.5 de 6,35 mm de diâmetro, com um ângulo de afiação de 30° e um truncamento na ponta de 0,5 mm de diâmetro.

Figura 2
Bancada de ensaios.

Utilizou-se o processo de corte por plasma para dimensionar o material. Os corpos de prova de aço carbono SAE 1020 foram constituídos de duas chapas de 100×300×6,35 mm. Na superfície em ambos os lados da junta foi efetuado um lixamento prévio para remoção da carepa de laminação que se forma sobre o material. As chapas foram ponteadas em cada uma das extremidades para formar a junta.

Para garantir que os resultados não foram casualidades circunstanciais, os ensaios foram repetidos três vezes. Portanto, cada variável analisada no trabalho é a média das medições feitas.

3 Resultados e Discussão

3.1 Tocha infocus

Primeiramente, a tocha Infocus foi utilizada para procurar a combinação de parâmetros que produziram um Keyhole estável e repetível. A Figura 3 apresenta o melhor resultado obtido, para 520 A de corrente e com uma velocidade de soldagem de 55 cm/min. O arco voltaico se observa estável, embora uma espécie de cauda é formada pelo arco na zona de fechamento do Keyhole (Figura 3a). No caso da raiz durante o Keyhole, a Figura 3b mostra como o jato de plasma do arco sai de forma estável pelo furo passante. Enquanto a face e a raiz do cordão possuem uma boa aparência superficial (Figura 3c, d), embora é possível perceber uma leve mordedura ao longo dos lados da face do cordão (Figura 3e).

Figura 3
Tocha Infocus usando a técnica Keyhole com 520 A de corrente, 55 cm/min e 3 mm de distância eletrodo-peça (a) arco voltaico aceso (b) raiz do Keyhole (c) aparência superficial da face (d) aparência superficial da raiz (e) macrografia do cordão.

Repetindo os resultados obtidos na Figura 3 foi possível realizar 43 uniões em média por eletrodo, com uma mínima de 40 e máxima de 47 uniões. A vida do eletrodo da tocha Infocus (EWLa-1.5) é mostrada na Figura 4, observando-se que a superfície do eletrodo sempre se manteve limpa, sem coloração e livre de óxidos. Depois do 10° Keyhole nota-se o crescimento de um tipo de anel próximo à ponta do eletrodo. Segundo Matsuda et al. [1212 Matsuda F, Ushio M, Fujii H, Sadek AA. Effect of surface coating around tungsten electrode on formation of "Rim". Transactions of JWRI. 1987;16(1):211-214.] aquele anel é composto por dendritas de tungstênio, e a rapidez de formação dele depende principalmente da composição do eletrodo e do conteúdo de oxigênio no gás de proteção.

Figura 4
Desgaste do eletrodo da tocha Infocus (EWLa-1.5) depois de 43 juntas de 27 cm utilizando 520 A de corrente.

3.2 Tocha TIG convencional

Para comparar os resultados obtidos com a tocha Infocus foi utilizada a tocha TIG da empresa Binzel, modelo 27B. Na Figura 5 é possível observar o Keyhole conseguido com a tocha convencional. O arco voltaico se nota estável, sem uma diferença significativa à tocha Infocus, de fato, observa-se a formação da cauda pelo arco (Figura 5a). Não se observa diferencia na qualidade superficial tanto da face como da raiz do cordão de solda, em comparação com a tocha Infocus (Figura 5b, c). Além disso, nota-se o aparecimento de mordeduras aos lados da face do cordão (Figura 5d).

Figura 5
Tocha TIG convencional usando a técnica Keyhole com 520 A de corrente, 55 cm/min e 3 mm de distância eletrodo-peça (a) arco voltaico aceso (b) aparência superficial da face (c) aparência superficial da raiz (d) macrografia do cordão.

Segundo os resultados apresentados na Figura 5 é possível dizer que o processo TIG consegue trabalhar com a técnica Keyhole, sem precisar de uma tocha com determinadas propriedades especiais. De fato, na Figura 6 observa-se a geometria clássica do Keyhole no material de base, usando uma tocha convencional TIG.

Figura 6
TIG Keyhole com tocha convencional e eletrodo EWLa-1.5.

A principal diferença entre as duas tochas é a vida do eletrodo de tungstênio. No caso da tocha convencional TIG, usando um eletrodo EWLa-1.5, se conseguiram realizar em média 27 uniões, em comparação das 43 que a tocha Infocus realiza. Destaca-se que no eletrodo EWLa-1.5 em uma tocha convencional, o aparecimento de dendritas de tungstênio sobre a superfície da ponta, começa desde o primeiro Keyhole, enquanto o anel de dendritas se constitui desde o quinto Keyhole (Figura 7). Além disso, observou-se que no último Keyhole a ponta do eletrodo explode, sofrendo uma importante mudança na geometria da ponta do eletrodo e modificando assim as propriedades do arco voltaico e a estabilidade do Keyhole. A explosão da ponta do eletrodo aconteceu tanto na tocha Binzel como na Infocus.

Figura 7
Desgaste do eletrodo de tungstênio com 1,5% de lantânio depois de 27 juntas de 27 cm utilizando 520 A de corrente.

3.3 Efeito da velocidade de soldagem sobre o TIG Keyhole

Uma vez encontrados os parâmetros para um Keyhole estável e repetível, independente da tocha TIG usada, procedeu-se a estudar o efeito que possui a velocidade de soldagem sobre a estabilidade do TIG Keyhole, usando a tocha TIG convencional. Ao aumentar a velocidade de soldagem foi percebido que a geometria do furo passante mudava, especificamente o buraco da raiz. Na Figura 8 se observa o descrito, para 3 velocidades de soldagem diferentes, notando-se como o buraco da raiz do Keyhole se desloca no sentido contrário ao sentido de avanço da tocha, quando se aumenta a velocidade de soldagem.

Figura 8
Comportamento do Keyhole em diferentes velocidades de soldagem com 520 A de corrente, argônio com 5% de hidrogênio como gás de proteção e 3 mm de distância eletrodo-peça.

Para uma velocidade de 67 cm/min o Keyhole é estabelecido, mas o desgaste da ponta do eletrodo é tão rápido que não consegue completar a junta. A Figura 9 mostra diferentes estados do Keyhole durante um mesmo cordão, percebendo que incialmente existe um Keyhole estável, mas com o passar do tempo o buraco some, provocando a instabilidade da poça. Por outro lado, como se pode observar na Figura 10, o eletrodo tem um desgaste excessivo quando o buraco desaparece.

Figura 9
Efeito do desgaste do eletrodo sobre o Keyhole para uma velocidade de 67 cm/min para um mesmo cordão.
Figura 10
Desgaste do eletrodo para uma velocidade de soldagem de 67 cm/min com argônio-5% hidrogênio como gás de proteção, usando a técnica Keyhole.

O desgaste excessivo do eletrodo para elevadas velocidades, tem relação com a posição do buraco da raiz do Keyhole. Como foi mencionado anteriormente, o buraco da raiz se desloca no sentido contrário ao sentido de avanço da tocha quando se aumenta a velocidade de soldagem, portanto, isso dificulta a saída do jato de plasma pelo buraco da raiz, fazendo que ele retorne em direção à ponta do eletrodo desgastando severamente a superfície posterior do eletrodo, como se observa na Figura 10. Situação similar foi observada para ensaios realizados com a tocha Infocus, com as mesmas condições de trabalho, porém, o eletrodo da Infocus consegue realizar mais de uma junta baixo estas condições de trabalho não recomendadas. O fator que faz a diferença entre a vida dos eletrodos das duas tochas é o sistema de refrigeração de cada uma. Nas Figuras 11 e 12, mostra-se uma comparação realizada entre a tocha convencional TIG e a Infocus, utilizando uma câmera termográfica, demonstrando-se a superioridade da Infocus ao momento de resfriar o eletrodo, fator influente na vida do eletrodo. Na Figura 12 se observa que depois de 7 segundos de apagar o arco voltaico de 520 A, a Infocus possui uma temperatura de 30 °C, enquanto a tocha convencional TIG tem 210 °C aproximadamente, demorando mais de um minuto em conseguir chegar aos 30 °C.

Figura 11
Imagens termográficas obtidas após de fazer uma junta de 27 cm com 520 A de corrente para as duas tochas estudadas.
Figura 12
Curvas temperatura-tempo após se fazer uma junta de 27 cm com 520 A de corrente para (a) Infocus (b) TIG convencional.

Na Figura 13 se encontram as macrografias das juntas feitas para velocidades de soldagem entre 55 e 65 cm/min. Em uma velocidade de 65 cm/min se observa uma face e raiz do cordão irregular, provocadas pela instabilidade do Keyhole.

Figura 13
Aparência superficial e transversal das juntas para diferentes velocidades de soldagem usando Ar+5%H como gás de proteção, 520 A de corrente e 3 mm de distância eletrodo-peça.

Realizando um análise geométrica das macrografias é possível notar que na medida em que se aumenta a velocidade de soldagem as larguras da face e da raiz da junta diminuem, como se verifica na Figura 14. O reforço da raiz e a ZAC também diminuem com o aumento na velocidade de soldagem, observado na Figura 15. A tendência à diminuição dos parâmetros geométricos do cordão se deve à menor quantidade de energia disponível para fundir material e, portanto, o cordão será cada vez mais estreito para maiores velocidades de soldagem, até o ponto que o Keyhole perca a estabilidade, como acontece desde os 65 cm/min em diante.

Figura 14
Análise das larguras da face e raiz das juntas para diferentes velocidades de soldagem, usando a tocha convencional TIG.
Figura 15
Reforço da raiz e Zona Afetada pelo Calor (ZAC) para diferentes velocidades de soldagem, usando a tocha convencional TIG.

Através das análises feitas é possível dizer que quanto maior for a corrente maior será a velocidade de soldagem, mas com isso, também se elevará a taxa de desgaste do eletrodo. Nesse sentido, a tocha Infocus demonstra uma grande superioridade, já que ela consegue trabalhar com altos níveis de corrente sem prejudicar a vida do eletrodo, devido ao sistema de refrigeração otimizado que possui.

3.4 Influência da distância entre o eletrodo e a peça

Um parâmetro importante no processo TIG é a distância entre a ponta do eletrodo de tungstênio e o material de base (DEP), devido à variação que sofrem as propriedades do arco com as mudanças nessa distância. A relevância desse parâmetro é tanta que existem dispositivos como o AVC (Arc Voltage Control) para garantir que ele seja constante. Portanto, é essencial saber a influência da DEP sobre o TIG Keyhole, Na Figura 16 são apresentadas as macrografias da seção transversal das juntas feitas para diferentes DEP, demonstrando que com a mistura argônio mais 5% de hidrogênio como gás de proteção é possível trabalhar com até 8 mm de DEP, garantindo penetração total da junta. Para distâncias maiores a 8 mm, o acendimento do arco voltaico se torna difícil por meio de alta frequência.

Figura 16
Influência da distância eletrodo peça no TIG Keyhole com argônio mais 5% hidrogênio como gás de proteção.

O aumento da DEP tem a tendência de aumentar a largura da face do cordão (Figura 17), o qual se deve ao maior diâmetro do arco de soldagem sobre a peça. A DEP não tem uma influência significativa sobre a largura da raiz (Figura 17), embora se aprecia que a raiz tende a diminuir, o qual se deve à perda de pressão no arco de soldagem ao ficar com o eletrodo mais afastado da junta.

Figura 17
Largura da face e raiz para as juntas feitas com argônio mais 5% hidrogênio como gás de proteção para diferentes DEP.

No caso do efeito da DEP sobre o reforço da raiz, não se tem uma tendência clara. O Ar+5%H faz com que o reforço tenha uma variação de aproximadamente 0,2 mm, que pode ser considerada pouco significativa. A Figura 18 apresenta os resultados mencionados. A mistura Ar+5%H fornece geometrias de cordão mais homogêneas, o qual se deve ao arco com maior energia e maior pressão.

Figura 18
Reforço da raiz para as juntas feitas com argônio mais 5% hidrogênio como gás de proteção para diferentes DEP.

O gráfico da ZAC apresentado na Figura 19 considera só o comprimento total da área recristalizada no material de base, ou seja, não está incluso o comprimento da área fundida. Da Figura 19 se observa que a variação da área recristalizada é depreciável com o aumento da DEP, diminuindo assim a distorção na microestrutura no material de base. Porém, na Figura 17 se nota como o cordão aumenta a largura de material fundido enquanto a DEP aumenta.

Figura 19
ZAC para as juntas feitas com argônio mais 5% hidrogênio como gás de proteção para diferentes DEP.

A potência do processo evidentemente varia com a DEP, devido ao princípio de funcionamento do arco no processo TIG [33 Lancaster JF. The physics of welding. Oxford: Pergamon Press; 1984.]. Portanto, como se observa na Figura 20, ao aumentar a DEP aumenta a potência usada para realizar uma união.

Figura 20
Potência utilizada para as juntas feitas com argônio mais 5% hidrogênio como gás de proteção para diferentes DEP.

Enquanto à estabilidade do processo TIG Keyhole frente a variações na DEP, na Figura 21 é possível observar como o arco é estável e com a mesma geometria até os 4 mm de DEP, depois dessa distância o arco se torna relativamente instável e a geometria do arco muda, formando-se uma cauda que se eleva com o aumento da DEP. A elevação e o crescimento da cauda se deve ao maior tamanho do arco voltaico pelo lado da face da junta, porém, ele mantem um buraco de raiz quase similar, segundo foi verificado na Figura 17. Portanto, para DEP maiores que 4 mm, parte do arco de plasma que saía pela raiz do Keyhole, começa a sair pela face da junta. Condições similares foram verificadas no estudo da velocidade de soldagem.

Figura 21
Estabilidade do TIG Keyhole para diferentes distâncias eletrodo peça usando argônio mais 5% hidrogênio como gás de proteção, 520 A de corrente e 55 cm/min.

O efeito da DEP sobre a geometria do cordão, como foi mostrado, é bastante considerável. Nos dois trabalhos feitos por [11 Jarvis BL, Ahmed NU. Development of keyhole mode gas tungsten arc welding process. Science and Technology of Welding and Joining. 2000;5(1):1-7. http://dx.doi.org/10.1179/136217100322910624.
http://dx.doi.org/10.1179/13621710032291...
,88 Jarvis BL. Keyhole gas tungsten arc welding: a new process variant [tese de doutorado]. Wollongong: Faculty of Engineering, University of Wollongong; 2001.] é comentado que as melhores propriedades geométricas foram conseguidas para DEP negativas, ou seja, com a ponta do eletrodo dentro do Keyhole, técnica similar à usada por Lukens [55 Lukens WE. Mechanical properties of HSLA steel buried gas tungsten arc weldments. Welding Journal. 1987;7:215s-218s.] "Buried GTAW". Lohse et al. [99 Lohse M, Füssel U, Schuster H, Friedel J, Schnick M. Keyhole welding with CF-TIG. Welding in the World. 2013;57(5):735-741. Document XII-2141-13.] descreve um comportamento similar tanto para aço carbono como inox. Porém, o problema para realizar o Keyhole com DEP negativa é o início e o final do cordão, o qual requereria equipamentos e programação especial.

4 Conclusões

Através dos ensaios e análises realizados é possível concluir que:

  • Uma tocha convencional TIG consegue trabalhar com a técnica Keyhole, utilizando as mesmas condições de trabalho que a tocha comercialmente conhecida como Infocus. Porém, evidenciou-se que a vida dos eletrodos utilizados pela tocha Infocus possuem uma vida um 163% maior, para uma mesma composição de eletrodo. O aumento da vida do eletrodo conseguido pela Infocus se deve ao sistema de refrigeração diferenciado que possui.

  • Observou-se que a estabilidade do Keyhole é fortemente influenciada pela velocidade de soldagem, afetando diretamente a forma em como o jato de plasma flui através do Keyhole. Uma velocidade de soldagem excessiva afeta a geometria e estabilidade do Keyhole, especificamente do buraco da raiz, provocando que o jato de plasma circule irregularmente pelo furo passante no material de base, retornando para face do cordão e batendo no eletrodo, fato que talvez provoque um aumento na temperatura da ponta e acelere o desgaste do eletrodo.

  • A distância entre a ponta do eletrodo e a peça (DEP) possui uma forte influência sobre a geometria do cordão e a estabilidade do Keyhole. Entre maior seja a DEP maior será a largura do cordão e menor será a largura da raiz. Além disso, ao aumentar a DEP se observou que a geometria do arco voltaico muda, tornando o Keyhole gradualmente mais instável.

  • No caso do TIG Keyhole entre menor seja a DEP melhor serão as propriedades geométricas do cordão, e mais estável será Keyhole.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2015

Histórico

  • Recebido
    15 Fev 2015
  • Aceito
    15 Set 2015
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