Resumos
Resumo Quando uma estrutura soldada sofre impacto estrutural, a ductilidade do material é uma das características preponderantes. Contudo, com o crescente destaque e utilização dos aços de alta resistência e baixa liga (ARBL) nem sempre este fator é considerado na sua utilização. Isto pode resultar em instabilidades globais e/ou localizadas numa estrutura. Desta forma, o objetivo principal deste trabalho foi comparar o comportamento ao impacto estrutural de perfis I soldados, produzidos com ASTM A36, um aço estrutural “comum”, e EN10149-2 S700MC, aço ARBL, soldados em filete por processo de soldagem por arco elétrico com atmosfera de proteção gasosa MAG (GMAW) e utilizando metais de adição, AWS ER70S- 6 e AWS ER110S-G, que depositam metais de solda com grandes diferenças em resistência à tração e ductilidade. No desenvolvimento deste trabalho foram elaborados conjuntos soldados (CS) na forma de perfis I de chapas soldadas e mantendo-se as soldas com acabamento original. Os CS foram feitos em ambos materiais variando o metal de adição e condições de reforços. Entre os principais resultados, destaca-se o comportamento do material de alta resistência (EN10149-2 S700MC) quando submetido a carregamento dinâmico, apresentou fratura na mesa superior, com comprimentos significativamente maiores que os apresentados pelo aço ASTM A36, sob mesmas condições de soldagem e carregamento. Além disso, a presença de reforço vertical na estrutura acaba por transferir o carregamento para a mesa oposta do perfil, porém sem anular a condição de fratura no material de alta resistência.
Palavras-chave: Aço ARBL; Soldagem; Impacto estrutural; Resistência mecânica
Abstract When a weldment suffers structural impact, the base and filler metals ductility is one of the main features. However, despite the increasing use of high strength low alloy steels (HSLA), this factor is not always considered and it can result in global and/or localized instabilities within a structure. So, the main objective of this work was to compare the behavior to structural impact of welded I-profiles, made with ASTM A36 and EN10149-2 S700MC, a regular and a HSLA structural steel, respectively, using GMAW process and AWS ER70S-6 and AWS ER110S-G as filler metals, which produce weld metals with great differences in tensile strength and ductility. Besides, all weldments were made with both filler metals and the profiles with or without stiffening reinforcements (on the web), keeping the original finishing of the fillet welds. Among the main results, the behavior of the material with high strength (EN10149-2 S700MC) when subjected to dynamic loading, have shown fracture on the upper flange, with crack lengths significantly greater than those presented by ASTM A36 steel, under the same welding and loading conditions. Furthermore, the presence of vertical reinforcement acts as a stiffening of the structure and ends up transferring the load to the opposite flange of the profile, however without nullifying the fracture condition in the high-strength material.
Key-words: HSLA steel; Welding; Structural impact; Mechanical strength
1. Introdução
Os materiais de alta resistência vêm se destacando na indústria como vantajosa solução para aplicações onde se requer diminuição de massa, aumento da carga útil ou aumento dos coeficientes de segurança para estruturas. Tendo em vista seu alto limite de resistência comparados aos aços estruturais comuns, tal como ASTM A36, os aços de alta resistência e baixa liga (ARBL) tornam-se atraentes soluções para este problema. No entanto é necessário que se alerte para a pura e simples substituição de aços estruturais comuns por tais aços, pois os ARBL possuem diferentes requisitos de projeto, nos quais três fatores preponderam: rigidez, encurvamento e fadiga [1,2].
A soldagem é amplamente utilizada na junção de metais, permitindo a execução de uniões com geometrias complexas e garantia da continuidade da aparência externa das peças, bem como de sua composição química. O aumento do uso de perfis de paredes finas em estruturas metálicas tem destacado a necessidade de métodos de cálculo que racionalizem o dimensionamento das ligações, sendo necessário avaliar o comportamento destas uniões, que podem provocar o surgimento de concentradores de tensão e a fragilização local [3,4].
Apesar da aparente simplicidade das juntas soldadas, modelagens por elementos finitos mostram que são extremamente complexos os sistemas internos de tensões através dos quais a transferência de carga ocorre entre os membros. A Figura 1 demonstra uma simulação computacional através do método de elementos finitos onde as intensidades das tensões (no caso, de cisalhamento) são representadas. Na simulação exemplificada na Figura 1 - de uma junta de filete transversal com a alma submetida a tensão de tração-, considerando-se unicamente deformação elástica, verifica-se que são desenvolvidos níveis de tensões extremamente elevados, suficientes para provocar fratura na raiz ou pé, mas sob carregamento muito menor do que aquele no qual esta junta normalmente poderia operar. Entretanto, milhões de juntas deste tipo estão em serviço no mundo, suportando perfeitamente cargas muito maiores do que a aplicada nesta simulação. Este aparente paradoxo é resolvido, sabendo-se que na modelagem em questão não foi considerado o fato de na raiz e nas extremidades (pés) da junta soldada ser ultrapassado o limite da resistência ao escoamento do metal de solda (MS) e do metal base (MB), tão logo ela seja submetida a suficientemente elevado carregamento e de forma extremamente localizada [5].
Simulação computacional ilustrativa através do método de elementos finitos (regime elástico) de junta soldada de filete, com a alma sob tensão de tração. As tensões mostradas são de cisalhamento, sendo as mais elevadas indicadas pelas setas “A” seguidas pela seta “B” [5].
1.1. Materiais
Em função da significativa expansão do uso de aços estruturais, torna-se necessário aumentar os níveis de segurança e confiabilidade operacional em estruturas metálicas. Os objetivos são redução de custos, aumento da eficiência operacional e, mais importante, a eliminação de acidentes causadores de danos às estruturas e acidentes potencialmente perigosos em áreas urbanizadas. Paralelamente ao desenvolvimento de novas metodologias de avaliação de integridade estrutural, tais requisitos têm estimulado rapidamente o uso de aços ARBL como uma maneira eficaz para a utilização em estruturas sujeitas a maiores cargas e operando com menor peso e menores custos construtivos [6,7].
1.1.1. Aço microligado de alta resistência EN 1049-2 S700MC
O aço ARBL S700MC é classificado como aço microligado de alta resistência e baixa liga de microestrutura ferrítica-perlítica com alto limite elástico para conformação a frio, tendo como características a boa conformabilidade e soldabilidade. Ele é empregado em diversas aplicações que possuam como intuito elevar a resistência, diminuindo o peso das estruturas ao mesmo tempo em que estas possam suportar cargas mais elevadas [1].
É diversificado o uso de aços de ARBL na indústria, podendo-se citar exemplos como: guindastes, chassis de implementos rodoviários e na indústria automobilística.
O aço S700MC, por ser classificado como um aço microligado, possui em sua constituição elementos de liga como nióbio, vanádio e titânio, possibilitando que conserve o teor baixo de carbono, que interfere diretamente no refinamento da austenita, soldabilidade e ductilidade do material [8].
1.2. Flambagem em vigas
A flambagem vertical é um dos padrões de colapso de uma viga de aço em forma de perfil I sob flexão. Com esse padrão de colapso, a mesa comprimida se deforma na direção da alma, que suporta a mesa. Sabe-se que esse padrão de flambagem ocorre com chapas finas e, quando a viga de aço com perfil I possui as dimensões "usuais" da seção, acredita-se que a flambagem vertical não ocorra [9].
Os estudos publicados em [10] compararam os modelos de colapso de flambagem e vigas e assim é indicado um novo modelo de colapso de flambagem de vigas seguindo o modelo de Timoshenko, o qual considera que a mesa superior é modelada como um elemento de barra comprimida seguindo a teoria elástica. Ou seja, o problema de flambagem vertical pode ser substituído pelo problema de flambagem de uma barra na teoria elástica. Com esse modelo, Timoshenko propôs uma fórmula para estimar a carga crítica de flambagem (Pcr) de um elemento de barra, como na Equação 1 [10].
Onde “E” e “I são o módulo de elasticidade (ou de Young) e momento de inércia da barra,”respectivamente, “L” o comprimento da barra e “α“a constante da mola. Esta fórmula é frequentemente aproximada para o mostrado na Equação 2 e tem a função didática de mostrar a direta relação entre a carga crítica de flambagem (Pcr) e a razão EI/L.
1.3. Reforços
Segundo Gorenc et al. [11], citando a norma Australiana AS 1250 as almas das vigas são feitas relativamente espessas para anular a necessidade de reforços. No entanto, por questões econômicas, logísticas e buscando otimização das estruturas, é necessário que as espessuras dos materiais sejam reduzidas; consequentemente isso exige o emprego de reforços para que elas suportem maiores cargas. Os reforços podem ser de dois tipos:
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Reforços de suporte de cargas, posicionados abaixo dos pontos de cargas para distribuir a força verticalmente ao longo da alma e impedir a flambagem local da alma. Isso também evita trinca ou o cisalhamento das juntas soldadas entre a mesa e alma. A junta entre a extremidade dos reforços e a mesa deve ser usinada e justa para permitir a transmissão de esforços e resistência adequadas. Em vez de um ajuste usinado, as soldas também podem ser usadas se a carga não estiver sujeita a fadiga. Deve-se evitar o uso de soldas de filete transversais nas partes tensionadas das mesas.
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Reforços intermediários ou não-suporte em intervalos ao longo da viga para evitar a flambagem da alma por compressão diagonal. Figura 2 exemplifica os tipos de reforços.
1.4. Impacto estrutural
A teoria do impacto envolve a colisão de corpos, as restrições a serem condicionadas no movimento dos corpos e a implementação lagrangiana nas equações para movimento de impulso.
O conceito de impacto está relacionado fundamentalmente a um carregamento imposto em um curto período, ocorrendo a distribuição das tensões de modo não uniforme sobre o material [12].
O impacto inicia quando os corpos entram em contato e termina quando a máxima deformação é alcançada, onde a velocidade relativa normal é zero. Para impactos com velocidades suficientemente altas, nem toda deformação é recuperada devido à deformação plástica permanente e consequentemente perda de energia. Após este período, observa-se o processo de restituição dos corpos envolvidos, que definirá se as partículas vão recuperar a forma original, se vão permanecer com deformação residual ou se vão manter o contato devido a esta deformação [13].
A magnitude dos carregamentos dinâmicos e sua relação com o tempo dependem do tipo de excitação aplicada ao sistema e das propriedades dinâmicas deste. Pode-se ressaltar que sob carga de impacto, muitos materiais alteram seu comportamento, ou seja, materiais considerados dúcteis quando carregados estaticamente podem apresentar comportamento frágil quando submetidos aos carregamentos dinâmicos, isso se deve à impossibilidade de redistribuição das tensões durante curtos períodos, o que é característico dos carregamentos dinâmicos [14].
A velocidade de deformação aplicada ao corpo de prova pode influenciar a tensão de escoamento. O impacto segundo a taxa de deformação pode ser definido como quase estático, impacto de dinâmica baixa, impacto de dinâmica alta e impacto de alta velocidade. Pode-se observar na Tabela 1 as respectivas taxas de deformação existentes [15].
Com o aumento da taxa de deformação, a tensão de escoamento e o limite de resistência do material aumentam, enquanto a ductilidade diminui. A relação entre a tensão de escoamento e a taxa de deformação, à temperatura e deformação constantes, é dada pela Equação 3 [16].
Onde (C) é a tensão de escoamento quando m = 1 e (m) é conhecido como coeficiente de sensibilidade à taxa de deformação que pode ser obtido da inclinação do gráfico de log σ versus log 𝜀̇. A sensibilidade a taxa de deformação está relacionada ao aumento na tensão de escoamento (σ) devido ao aumento da taxa de deformação, para um dado grau de deformação e temperatura. Essa é uma característica de grande parte dos materiais metálicos quando deformados plasticamente acima da temperatura de recristalização. É um bom indicador das mudanças do comportamento da deformação e suas medidas fornecem uma relação entre os conceitos de discordâncias na deformação plástica e as medidas microscópicas feitas num teste de tração [16,17].
2. Materiais e Métodos
2.1. Conjuntos Soldados (CS)
Os CS (Figura 3) foram elaborados em perfil I soldado com dimensão de 80 x 200 x 400 mm (largura x altura x comprimento) e utilizando chapas com espessura de 4,76 mm (3/16”). O CS foi dimensionado conforme a norma ABNT NBR 5884:2013 [18], sendo assim definido como um perfil I da série VS, onde a relação altura pela largura é de 2,5.
Os CS foram elaborados seguindo 8 condições diferentes, variando-se o metal base (ASTM A36 e EN 10149-2 S700MC), metal de adição (AWS ER70S-6 e AWS ER110S-G), e com ou sem reforços. Nas Tabelas 2 e 3 são apresentadas as composições químicas e propriedades mecânicas, respectivamente, dos metais base (MB), e nas Tabelas 4 e 5 são apresentadas as composições químicas e propriedades mecânicas, respectivamente, dos metais de adição (MA).
Os metais de adição, com grande diferença de resistenência mecânica, foram selecionados a fim de avaliar suas influências sobre os ensaios de impacto. Criamos, assim, as seguintes diferentes condições: (i) matching, ou seja, resistência equivalente quando utilizado o AWS ER70S-6 com ASTM A36, ou a combinação do AWS ER110S-G com S700 MC; (ii) overmatching, maior resistência, quando utilizado o AWS ER110S-G com o ASTM A36 (iii) undermatching, menor resistência, quando utilizado o AWS ER70S-6 com o S700 MC.
Os reforços foram preparados com dimensão de 37 x 190 mm (largura x altura), espessura de 3 mm, posicionados, de acordo com Gorenc et al. [11], em ambos os lados da alma e centralizados no CS abaixo do ponto previsto de carregamento no ensaio de impacto, conforme mostrado na Figura 4. Eles foram soldados somente na alma do CS evitando-se o uso de soldas de filete transversais nas mesas, conforme indicado em [11].
Para cada condição foram repetidas 3 amostras, totalizando 24 CS. A Tabela 6 apresenta as condições de soldagem dos CS e a Figura 5 apresenta os CS com e sem reforços.
2.1.1. Procedimento de soldagem
Os CS foram fabricados a partir da união de chapas dos MB através do processo de soldagem por arco elétrico MAG convencional (fonte em modo tensão constante), na posição plana, corrente contínua e eletrodo polaridade positiva, com proteção gasosa de argônio + CO2 (15%) e vazão do gás de 13 l/min. Todos os cordões foram realizados com ângulos de trabalho e deslocamento neutros e a distância bico de contato-peça (DBCP) igual a 18 mm.
Os parâmetros utilizados na programação dos equipamentos de soldagem para realização dos cordões de solda desta pesquisa foram: tensão do arco (V); corrente elétrica (A); velocidade de soldagem (mm/s); e velocidade de alimentação do arame (m/min). A partir dos dados adquiridos durante a soldagem foi possível determinar a energia de soldagem média, todos itens apresentados na Tabela 7, considerando rendimento térmico igual a 100%.
2.2. Ensaio de dureza
No ensaio de microdureza foi utilizado o método Vickers. Em cada CP traçou-se o perfil de microdureza Vickers com carga de 0,5 kgf e tempo de indentação de 10 s, em uma linha transversal ao cordão de solda, 1 mm abaixo da superfície das chapas, utilizando-se um microdurômetro automático digital Inzise, modelo ISH-TDV2000 e seguindo orientação da norma (ASTM E384) [19]. O trajeto sobre o qual as microdurezas foram mensuradas foi: MB; ZAC (zona afetada pelo calor); MS (metal de solda); ZAC e MB, conforme apresentado na Figura 6.
2.3. Equipamento
Foi desenvolvido no Laboratório de Soldagem e Técnicas Conexas (LS&TC) da UFRGS um equipamento, para realizar os ensaios de impacto em estruturas soldadas, conforme pode ser visto na Figura 7. O objetivo deste equipamento é impor energias (e velocidades) variáveis de impacto a uma estrutura (soldada, nos casos estudados), permitindo assim avaliar sua resposta à diversas situações. Apesar de aparente semelhança ao equipamento de ensaios Charpy, o equipamento desenvolvido possui geometria, conceito e finalidades completamente diferentes. A peça pintada de vermelho (“martelo”) na Figura 7a possui na sua extremidade inferior um cilindro, de dimensões 63,5 x 120 mm (diâmetro x altura), a ela rigidamente conectado, através do qual ocorre o contato com a mesa (plana) do MB. Portanto, o impacto é realizado através de uma carga distribuída na “linha” formada pelo contato clindro/mesa. Na parte superior do equipamento há uma escala que indica o ângulo de lançamento do “martelo”. O equipamento é detalhadamente apresentado e o conceitos do ensaio discutido pormenorizadamente em [3] e [20,21], por exemplo.
(a) Equipamento para o ensaio de impacto desenvolvido no LS&TC; (b) Posicionamento da câmera (seta) de alta velocidade. Vide texto para descrição da realização do ensaio.
2.4. Ensaio de impacto
Os ensaios de impacto foram realizados no equipamento descrito anteriormente. A medição da energia de impacto foi feita utilizando uma câmera de alta velocidade da fabricante Phantom, modelo V411, sendo nela acoplada uma lente NIKKOR 105mm/ f2.8, da Nikon e um filtro UV. A aquisição das imagens foi feita com uma taxa de 7000 quadros por segundo e resolução de 512x512 pixels, sendo processada pelo software de aquisição PCC (Phantom Camera Control). Na Figura 7b pode-se observar o posicionamento da câmera de alta velocidade (indicada pela seta vermelha) e o ângulo de lançamento do martelo de impacto (neste caso a 120º). A câmera foi posicionada de maneira a filmar o martelo em movimento no momento do impacto [3].
O ensaio é realizado suspendendo o “martelo” até determinada altura, indicada na escala. Essa altura está relacionada à energia que o mesmo exercerá sobre a estrutura que está sendo ensaiada (medindo-se o componente horizontal da sua velocidade de deslocamento). Na Tabela 8 são apresentadas as velocidades e energias de impacto conforme a altura de lançamento do “martelo”.
3. Resultados e Discussões
As microdurezas medidas nos CS, conforme Tabela 6, nas condições 01, 03, 05 e 07 são apresentadas na Figura 8. A figura ilustra aproximadamente as diferentes regiões das juntas soldadas com suas respectivas durezas.
Dureza nas juntas soldadas. (a) Condição 01 (MB ASTM A36 e MA ER70S-6) e Condição 03 (MB ASTM A36 e MA ER110S-G) e (b) Condição 05 (MB S700MC e MA ER70S-6) e Condição 07 (MB S700MC e MA ER110S-G).
Observa-se que os aços estruturais ASTM A36 e S700MC apresentam grande diferença de dureza no metal base (MB). Nota-se, ainda, que devido os valores dos parâmetros de soldagem empregados serem praticamente os mesmos para deposição dos cordões de solda, as durezas nas zonas afetadas pelo calor (ZACs) apresentam pequenas diferenças na dureza quando comparadas à dureza no MB.
No metal de solda (MS) há comportamento bastante distinto entre as amostras. Para amostras com MB ASTM A36 há significativo aumento da dureza no MS, cerca de 100 HV0,5 quando utilizado o consumível AWS ER 70S-6, e ainda maior quando utilizado o consumível AWS ER110S-G, aproximadamente 150 HV0,5. Entretanto, para as amostras com MB S700MC não há grande diferença nas durezas do MS quando comparadas às durezas no MB e ZAC. Nota-se, porém, que a dureza é cerca de 50 HV0,5 menor quando utilizado o consumível ER70S-6.
De forma geral o MB ASTM A36 apresenta significativa variação do perfil de dureza, ainda mais acentuada quando empregado consumível “overmatching”. Porém, quando analisado o MB S700MC nota-se relativamente pequena variação no perfil de dureza, sendo a variação um pouco mais destacada quando utilizado o consumível “undermatching”.
Foram realizados ensaios de impacto preliminares nos quais foi avaliada a energia necessária para os CS apresentassem fraturas. Com base nesses ensaios, definiu-se o ângulo de lançamento do martelo de impacto a 120°. A velocidade (componente horizontal) de impacto foi medida com a câmera de alta velocidade e a energia do impacto é apresentada na Tabela 9.
3.1. Deformações no ensaio de impacto
As Figuras 9 e 10 apresentam as deformações e fraturas medidas nos CS e as Figuras 11, 12 e 13 os resultados de deformação plástica dos CS após o ensaio de impacto com ângulo de lançamento de 120°.
CS ensaiados - (a) detalhe C flambagem do reforço, D deformação da mesa inferior direita, E deformação da mesa inferior esquerda; (b) detalhe F flambagem da alma da viga.
(a) Deformação da mesa superior por CS; (b) Extensão da fratura em cada CS. Marcadores em azul representam CS em ASTM A36 e marcadores em vermelho CS em S700MC.
(a) Deformação da mesa inferior esquerda por CS; (b) Deformação na mesa inferior direita por CS. Marcadores em azul representam CS em ASTM A36 e marcadores em vermelho CS em S700MC.
(a) Deformação na alma da viga devido à flambagem; (b) Deformação nos reforços da viga devido à flambagem. Marcadores em azul representam CS em ASTM A36 e marcadores em vermelho CS em S700MC.
Conforme mencionado anteriormente, foram realizados 3 ensaios para cada condição, e nos gráficos, cada uma delas foi representada por um marcador diferente. Além disso os marcadores em azul representam os CS feitos com MB ASTM A36 e os marcadores em vermelho CS feitos com MB S700MC.
Na Figura 11a fica evidente as maiores deformações da mesa superior nos CS sem reforços. A extensão da fratura, Figura11b, foi medida na mesa inferior nas condições 02 e 04 e na mesa superior para as demais. Primeiramente realizou-se medição linear da extensão da fratura, porém observando a deformação das mesas notou-se necessidade de revisar essas medidas para acompanhar o encurvamento da fratura. Os resultados mantiveram-se semelhantes, porém com acréscimo de aproximadamente 5 mm nas condições 01 e 03 devido a maior deformação das mesas. Em vista disso, numa inspeção visual nota-se aparentemente maior extensão da fratura nos conjuntos soldados que possuem reforços.
A deformação nas mesas inferiores foi praticamente nula nos CS com MB S700MC e nos CS com MB ASTM A36 houve deformação significativa na mesa inferior apenas quando utilizados enrijecedores, conforme Figura 12. Isso evidencia a transferência dos esforços do centro do perfil, onde acontece o impacto, para a região do perfil onde ele se apoia no dispositivo para ensaio.
Em relação à alma do perfil I observa-se na Figura 13a grande deformação quando utilizado o MB ASTM A36, possivelmente indicando a ductilidade deste material além de uma redução de aproximadamente 10% da deformação quando utilizados reforços; também observa-se alteração do local de deformação da alma. No centro do perfil (ponto de impacto), Figura 9, quando sem reforços, para as extremidades (apoios) quando são utilizados os reforços, Figura 10. Quanto ao MB S700MC notou-se comportamento distinto, os CS deste MB apresentaram menor deformação devido à flambagem da alma e significativa redução da deformação quando utilizado reforços, cerca de 78% menor deformação comparado aos CS com MB S700MC sem reforços.
Quando utilizado reforços, estes também estão sujeitos à flambagem devido às forças compressivas do ensaio. Em razão disso, notou-se pequena diferença na deformação dos reforços quando comparada a aplicação com o MB ASTM A36 e S700MC.
4. Conclusão
Neste trabalho foi estudado a influência do metal de adição e da inclusão de reforços numa viga de perfil I elaborada com aços estruturais ASTM A36 e EN 10149-2 S700MC, quando submetidos à carregamento dinâmico decorrente de impacto.
Comparando-se os CS com mesmos MB e reforços, variando apenas o MA (condições 01 x 03, 02 x 04, 05 x 07 e 06 x 08) nas Figuras 11 a 13, não se notou significativa diferença nos resultados com os metais de adição AWS ER70S-6 e AWS ER110S-G.
Comparando-se os CS com mesmos MB e MA variando apenas a presença ou não de reforços (condições 01 x 02, 03 x 04, 05 x 06 e 07 x 08), os reforços apresentaram grande influência na transferência de carga da mesa superior, local de impacto, para as mesas inferiores do perfil I. Reduzindo a deformação na mesa superior (Figura 11) e aumentando as deformações nas mesas inferiores (Figura 12), principalmente nos CS com MB ASTM A36 (condições 01 a 04).
Os CS produzidos com o MB ASTM A36 e sem aplicação de reforços enrijecedores apresentaram fratura junto ao MS na mesa superior do perfil I. Porém, quando aplicado reforços, os CS apresentaram fratura junto ao MS na mesa inferior.
Os CS produzidos com o MB S700MC apresentaram fratura junto ao MS na mesa superior, independentemente da aplicação ou não de reforços.
Portanto, a aplicação de reforços enrijecedores atua de maneira eficaz aumentando o momento de inércia do perfil I e consequentemente reduzindo a flambagem da alma nos pontos onde são aplicados, porém sua aplicação acaba por transferir os esforços do ponto central onde ocorre o carregamento dinâmico para as regiões de apoio do conjunto soldado resultando assim numa flambagem local da alma próxima à mesa inferior do perfil I.
Apesar da grande diferença do limite de escoamento e limite de resistência dos MB, os CS com ambos materiais apresentaram fratura quando submetidos ao ensaio com mesma energia de impacto, conforme apresentado na Figura 11. Por isso, como conclusão final, evidencia-se a importância do minucioso conhecimento das características mecânicas para adequada utilização dos aços estruturais, pois em alguns casos, apesar de maior resistência mecânica sob carregamento estático, esses aços podem apresentar diferente comportamento quando sofrem impacto estrutural.
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Como citar: Kulmann Filho MAR, Machado IG. Resistência ao impacto estrutural de perfis I soldados. Soldagem & Inspeção. 2024;29:e2903. https://doi.org/10.1590/0104-9224/SI29.03
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
23 Fev 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
14 Fev 2023 -
Aceito
28 Nov 2023