Resumo
Objetivo: analisar os resultados obtidos com a implantação de um espaço grupal de acolhimento na sala de espera de um Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), utilizada como ferramenta de acesso ao trabalhador e ambiente de mobilizações interventivas.
Métodos: pesquisa-intervenção realizada em 2016. Foram desenvolvidas 20 intervenções na sala de espera do serviço, abertas aos usuários que desejassem participar. Organizaram-se rodas de conversas temáticas sobre o mundo do trabalho e o processo saúde-doença, registradas em diários de campo, com 4 a 15 participantes e duração média de 40 minutos.
Resultados: apontam-se dois eixos de estruturação: a violência no trabalho e o sofrimento pela atividade de trabalho, destacando-se a ruptura do silêncio do trabalhador, seus modos de sofrimento e a dialogicidade sobre o processo saúde-doença, assim como a ampliação do acolhimento estritamente clínico-especializado para uma ótica de análise do trabalho.
Conclusão: a construção de um espaço grupal de acolhimento na sala de espera foi essencial na elaboração de vínculos e na produção de saúde a partir da troca de saberes e afetos, sem substituir os grupos terapêuticos, de modo a ampliar a rede de apoio ofertada ao trabalhador.
Palavras-chave: sala de espera; coletivo de apoio; mobilizações interventivas; atividade de trabalho; saúde do trabalhador.
Abstract
Objective: to analyze the results that came out after a collective space for users embracement was allocated in the waiting room of an Occupational Health Reference Center (Cerest) and the employment of this space as a tool for accessing workers as well as an environment for intervention and mobilizations.
Methods: intervention study. In 2016, 20 interventions, open for all users who wanted to participate, were carried out in the waiting room. Thematic conversations rounds about the world of work and the health-disease process were organized. They lasted for an average of 40 minutes, with 4 to 15 participants, and were recorded in field diaries.
Results: two structural axes were pointed out: violence at work and work-related suffering. The following was highlighted: the workers’ silence breaking, their ways of suffering, and the dialogic exchange about the health-disease process, as well as the enlargement of user embracement, moving it from a strictly specialized clinical process to a work analysis perspective.
Conclusion: the construction of a collective space for users embracement in the waiting room was fundamental for forging bonds and producing health by exchanging knowledge and fondness, without replacing therapeutic groups, so as to expand the support network provided to workers.
Keywords: waiting room; user embracement; interventions; work activity; occupational health
Introdução
Há um desafio histórico, no campo da Saúde do Trabalhador (ST), em firmar e alcançar o objetivo de garantir aos sujeitos, adoecidos pelos processos de trabalho, promoção de saúde no trabalho, além de assistência adequada e recuperação de agravos1. Outro desafio consiste em romper com a fragmentação do olhar em torno do sujeito, desconsiderando, por vezes, o trabalho como algo central na relação saúde-doença, bem como identificar as queixas sem individualizá-las, reconhecendo a realidade concreta do mundo do trabalho2. Para Cardoso e Araújo3, no Brasil, o campo da ST se firmou apenas em 2002, com a criação da Rede Nacional de Atenção à Saúde do Trabalhador (Renast).
O Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) é um serviço especializado e estratégico da Renast, atendendo trabalhadores formais, informais, autônomos, desempregados, estagiários e aposentados com agravos relacionados ao trabalho. Sua atuação deveria se orientar pela abordagem clínico-epidemiológica e de planejamento, reconhecendo a saúde dos trabalhadores como prática teórica e participativa1.
Para a psicologia há, também, grandes desafios em atuar nesse campo. Apesar de permanecer fortemente criticado pelo foco na produtividade e eficiência, o(a) psicólogo(a) do trabalho e das organizações, nos últimos anos, amplia seu olhar para as questões relacionadas ao adoecimento, sofrimento e prazer no trabalho, reconhecendo seu papel na estruturação da identidade do sujeito4. Desse modo, o olhar não deve se voltar somente para a busca pela “cura”, possibilitando ao trabalhador apenas o retorno ao desempenho de suas funções, mas a oportunizar a ressignificação dos modos de vida, numa reabilitação social norteada pela visão crítica dos processos de trabalho.
Este trabalho teve como objetivo apresentar a análise dos resultados obtidos com a criação de um espaço grupal de acolhimento na sala de espera de um Cerest, utilizado como ferramenta de acesso ao trabalhador e lugar potencial de mobilizações interventivas.
Percursos metodológicos
As mobilizações realizadas e este artigo alinham-se às perspectivas e ações das clínicas do trabalho, enquanto conjunto de teorias que abordam as relações dos sujeitos com seu trabalho, as consequências e possíveis formas de intervir nessas relações2. Entre essas clínicas, encontramos a psicodinâmica do trabalho, a psicossociologia, a ergologia e a clínica da atividade. Todas elas se interessam pela relação trabalho-subjetividade, embora a partir de apropriações e perspectivas diferentes entre si. Atribuindo importância capital às diferentes situações reais de trabalho, essas abordagens colocam no centro de suas análises tanto as situações profissionais portadoras de sofrimento quanto aquelas que possibilitam criar e construir novos modos de sentir e agir. Dois pilares centrais para as clínicas do trabalho são, portanto, a saúde e o desenvolvimento na experiência de vivenciar um trabalho real.
Neste trabalho, nossa ênfase recai particularmente sobre a clínica da atividade, voltada à investigação-intervenção sobre o desenvolvimento humano permeada e tornada possível pela atividade profissional. Baseando-se na premissa de “transformar para compreender”, a clínica da atividade - cujo principal precursor é Yves Clot - busca “permitir ao sujeito transformar funcionamentos realizados em objeto de um novo funcionamento a fim de estudar o desenvolvimento real-possível e impossível e os seus princípios”5.
Trata-se de uma pesquisa-intervenção realizada no primeiro semestre de 2016 em um Cerest Regional no estado do Rio Grande do Norte, que se desenvolveu por observações gerais, análise de documentos (manuais e normas técnicas), diálogos e acompanhamentos do acolhimento ao trabalhador, além de participação, com a equipe do Cerest, em eventos do município voltados para o tema. A pesquisa se concretizou mediante aprovação do Comitê de Ética da Universidade Federal do Rio Grande do Norte pelo processo de número 1.048.365.
As intervenções ocorriam uma vez por semana, pela manhã, nos dias de atendimento psiquiátrico, por haver maior número de usuários presentes. A atividade era aberta para quem desejasse participar, não sendo obrigatória a permanência durante a discussão, ou caso chegasse o momento do atendimento. A equipe, composta de pesquisadores e alunos voluntários, dava início às intervenções apresentando a proposta da “sala de espera”, discorrendo sobre um tema escolhido de acordo com as necessidades percebidas no período de observação e após algumas seções, conforme demanda apresentada nos encontros. Raramente o mesmo usuário participava de mais de um encontro. Foram realizadas 20 intervenções na sala de espera, com variações de 4 a 15 participantes e duração média de 40 minutos cada uma.
Os encontros foram registrados em diários de campo, contemplando as afetações e a descrição das atividades. Os registros nos auxiliavam nos estudos temáticos de preparação para as próximas salas de espera. A equipe se dividia em facilitadores dos grupos e apoiadores; estes eram responsáveis pelo registro escrito dos encontros, que posteriormente seriam complementados pelos facilitadores em reunião da equipe de pesquisa. O diário foi a alternativa mais apropriada ao perfil do público, como apontam Zaccarelli e Godoy6, por ser menos invasiva no contato com grupos de difícil acesso.
Analisou-se o material registrado a partir da leitura inicial de todos os diários, em seguida, houve uma reunião de equipe para debater e convergir os principais conteúdos elucidados no discurso dos participantes. Essa dinâmica, em articulação com os pressupostos teóricos, definiu as dimensões de análise (I. A violência no trabalho; II. O sofrimento pela atividade de trabalho).
Desenvolvimento
A demanda
Inicialmente, buscou-se formar grupos terapêuticos de forma a ampliar a atuação da psicologia nesse cenário, porque o serviço disponibilizava apenas atendimento clínico individual. Essa proposta tinha como objetivo promover a criação de um espaço de acolhimento para os trabalhadores, tendo como escopo a compreensão do trabalho, por meio de uma releitura crítica da realidade, oportunizando aos participantes reinventar outros modos de falar da sua atividade laboral7.
Os serviços de atendimento ao público possuem, em geral, um espaço onde os usuários aguardam atendimento - a sala de espera. Segundo Rodrigues8, nesse local comumente ocorre desgaste físico e emocional, ansiedade, angústia e comentários negativos devido ao tempo de espera. Em contrapartida, Teixeira e Veloso9 percebem esse espaço como um lugar dinâmico, onde ocorre troca de experiências e no qual as pluralidades podem emergir de forma interativa. De nossa parte, assumimos a compreensão de que essas duas maneiras aparentemente opostas de pensar acabam reafirmando a sala de espera como um espaço rico de produção, construção e reinvenção, concebendo o lugar como dinamicidade de ação.
Outrossim, nos chamou atenção o silêncio que naquele espaço permanecia irrompível, diferentemente dos ambientes de espera de outros serviços. A esse respeito, Tittoni e Nardi10 apontam o “Império do Silêncio”, um tipo de norma estabelecida pelas organizações de trabalho, incorporada e trazida pelos trabalhadores, que proíbe a circulação de informações sobre adoecimento e acidentes de trabalho na empresa - uma estratégia para coibir qualquer possibilidade de formação de resistência coletiva em relação às condições de trabalho. Desse modo, percebemos a necessidade de desenvolver atividades na sala de espera, reconhecendo que a ST só se constrói numa prática teórica10.
As intervenções começaram na antessala para divulgar os dias e horários que iniciaríamos as atividades em grupo, convidando-os a participar. Ao apresentar a proposta, fomos surpreendidos por uma aparente resistência e pelo questionamento: falar em grupo não seria se expor demais? (sic). Essa questão promoveu uma discussão sobre julgamentos, o acolhimento e a importância do falar. Esclarecemos que a proposta seria oferecer um momento de acolhida, em que os trabalhadores reconhecessem na fala do outro suas próprias angústias e anseios, podendo, assim, se sentirem amparados pelos que compartilham da mesma realidade11.
Na data planejada para início das atividades, nenhum usuário compareceu. Avaliando as estratégias utilizadas para atraí-los, a fim de compreender essas ausências, percebemos que havia, primeiro, o desafio de conquistar sua confiança para então fazê-los se reconhecerem em grupo. A partir disso apostamos na sala de espera como um espaço de acolhimento grupal, em que poderíamos proporcionar ao trabalhador o empoderamento por meio da fala e da reelaboração da relação saúde-doença, reconhecendo o sujeito segundo suas facetas criativas e construtivas, visualizando e legitimando o lugar do sofrimento gerado pelo trabalho2.
Outrossim, partindo da compreensão de Zimmerman12, o fato de existirem pessoas reunidas num mesmo espaço não garante que sejam um grupo - na melhor das hipóteses, apenas um agrupamento. Ainda segundo esse autor, o agrupamento emerge à condição de grupo quando os integrantes partilham objetivos e os transformam em interesses comuns - como se, a partir da sua constituição, as diversas identidades individuais passassem a ser uma só: a identidade do grupo. Assim, nosso desafio passou a ser proporcionar, a cada encontro, um ambiente seguro e acolhedor para que os usuários compartilhassem do desejo de indagar sobre a atividade de trabalho e construíssem uma identidade grupal, ainda que “transitória”.
A sala de espera: espaço grupal de acolhimento
Inicialmente, na sala de espera, questionamos como os trabalhadores compreendiam o Cerest e sua importância. Eles destacaram as dificuldades que tiveram para obter seus serviços e apontaram que foram “encaminhados” por colegas de trabalho. Essa é uma dificuldade nacional, pois até hoje as políticas públicas de ST percebem a necessidade de manter a afirmação do trabalho como fator determinante no processo saúde-doença no rol das principais ações para dirimir essa dificuldade3. Os autores Keppler e Yamamoto13 constataram que 39 de 40 unidades do Cerest investigadas nacionalmente elegeram o sistema “porta aberta” como principal estratégia de acolhimento aos trabalhadores devido à dificuldade de referência e contrarreferência, descumprindo seu papel de polo irradiador da Renast ao permanecer como porta de entrada e único serviço voltado às questões de saúde e trabalho.
A intervenção
A seguir, descreve-se a intervenção em dois eixos de discussão. No eixo I, a violência no trabalho, discutem-se as multifaces da violência no mundo do trabalho apontadas pelos usuários; o eixo II, o sofrimento pela atividade de trabalho, problematiza o reconhecimento e acolhimento das angústias geradas pela enfermidade relacionada ao trabalho.
Eixo I. A violência no trabalho
Com a pergunta disparadora: “Como se percebe a violência nos locais de trabalho?”, iniciamos a reflexão sobre o conceito de violência conforme proposto pelo Ministério da Saúde14. Ele se apresenta na forma de agressão física, mas também moral, implicando a negação de direitos, desrespeito de gênero e racial, acarretando danos psicológicos e espirituais, incluindo violência institucional etc. A partir desse conceito, problematizamos a ideia de casualidade, as consequências desse tipo de evento na vida do trabalhador e os impactos para a família. Dito isso, uma trabalhadora relatou sofrer assédio moral no trabalho. Com o cuidado de não generalizar o ato, discutimos, em linhas gerais, sobre assédio moral, como proposto por Soboll15, nos requintes de crueldade que essa violência caracteriza ao manipular no outro o que ele tem de frágil, levando-o a acreditar que se resume à ofensa dita pelo assediador.
Refletimos também sobre a precariedade das informações e a importância de emitir a Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT) cuja omissão já é um meio de negar o direito e violentar o trabalhador. Um participante se apresentou como advogado e comentou sobre a fragilidade do trabalhador e o quanto é difícil se apropriar de seus direitos. Com isso, outra usuária o questionou: O que é CAT? (sic). O usuário-advogado prontamente respondeu, donde se observou um primeiro efeito do compartilhamento de informações. A discussão fluiu, e essa troca nos afirmou a importância dos encontros e o quanto podem ser potencializadores e necessários na rotina de um serviço de atendimento ao trabalhador por oportunizar a partilha de conhecimentos advindos de sua própria experiência, conforme pressupostos da clínica da atividade. Ainda, apresentamos um fluxograma de serviços a serem procurados em casos de acidente de trabalho, elaborado em um evento da Procuradoria do Trabalho.
Se nas décadas de 1980 e 1990 as Lesões por Esforços Repetitivos e os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT) se apresentavam como desafio, neste momento, estamos diante de situações de trabalho das quais emergem formas diversas de violência psicológica, incluindo o assédio moral e as expressões clínicas de sofrimento mental relacionado ao trabalho que, muitas vezes, surgem como desdobramentos da ocorrência das próprias LER/DORT16.
A esse respeito, um trabalhador se identificou como motorista e relatou ter sofrido nove assaltos enquanto trabalhava, declarando-se traumatizado. Contudo, seu maior sofrimento, em seu relato, associava-se mais ao assédio moral do qual foi vítima na empresa. Muito emocionado, relatou não conseguir dormir bem à noite porque tem pesadelos com o que viveu, nem transitar nas proximidades da empresa. A ocorrência de assédio moral pode ser considerada evento de trauma no trabalho, deixando consequências para a vida do sujeito, que repercutem, via de regra, mesmo em seu contexto familiar. Ademais, são comuns relatos de dificuldade de concentração, desinteresse pelo trabalho, pela vida social, sinais de agitação, dificuldade de concentração e desenvolvimento de doenças psicossomáticas, além de insônia e isolamento15.
Percebemos que, nos dias em que esse assunto foi debatido, havia desconforto dos usuários para iniciarem a participação. Em consequência, começávamos com uma explanação sobre assédio moral, considerando-o como situações abusivas de caráter intencional que se repetem na rotina de trabalho visando macular a imagem de um sujeito ou grupo, desqualificando-o profissionalmente, proporcionando situações vexatórias que colocam em questão a dignidade e a saúde psíquica da vítima15.
Assim, a violência psicológica do tipo assédio moral foi identificada como pano de fundo do relato de todos os participantes deste estudo. Quando a violência está na moral, instalada nas relações interpessoais, há um enviesamento da análise, alertado por Vieira, Lima e Antunes-Lima17, ao se restringir apenas às relações humanas, desconsiderando, às vezes, a análise do trabalho. Esta é compreendida considerando que o assédio moral deve ser buscado por meio da articulação entre as características pessoais dos sujeitos em conflito e os aspectos concretos do trabalho (políticas da organização e suas exigências).
Um usuário relatou: Em nenhum momento me senti compreendido pela psicóloga da empresa que trabalho e nem pelos colegas, muitas vezes virei foi motivo de chacota (sic). Ainda compartilhando suas vivências, declarou: mas o que mais me deixa triste nessa situação é que, depois de tanta violência dos assaltos, a única coisa que a empresa perguntava era levaram quanto? (sic). Com a voz embargada, confessou que aquela frase o fazia se sentir um nada. Quanto a isso, Soboll15 discorre sobre o assédio organizacional como forma de violência que se efetiva pelas estruturas políticas e de gestão das organizações marcadas por práticas abusivas e que ferem a dignidade humana. Quase como em efeito dominó, os demais iam se colocando e compartilhando situações semelhantes; conduzimos a discussão tentando evitar uma possível banalização do tema.
Discutindo sobre o que é ser trabalhador nos dias atuais, um jovem nos questionou sobre o fim da escravidão, discorreu sobre a origem da palavra “trabalho” relacionada a “castigo” e comparou com as condições atuais. Abordamos a maneira como o sentido do trabalho se modificou ao longo da história. Assim, outro usuário do serviço se identificou como motorista, enfatizando: e hoje o trabalho tira a dignidade do homem! (sic), e elogiou esse momento de discussão, mas o descaracterizou enquanto ação resolutiva diante do seu contexto de vulnerabilidade no trabalho e de violência urbana. Permanecemos em silêncio até que outro trabalhador relatou uma de suas experiências de quando era porteiro de uma escola, num episódio em que fora humilhado pelo pai de um aluno.
Com base nas falas apresentadas, destacamos a contribuição das ações micropolíticas, pois as problematizações propostas naquele espaço têm potencial para transformar a ociosidade da espera em troca de informações e experiências - um momento de mobilização afetiva. Como nos lembra Clot18, oportunizar o diálogo sobre a atividade laboral e provocar novos modos de enxergar o mundo do trabalho é o nosso objetivo primeiro.
Eixo II. O sofrimento pela atividade de trabalho
Com inspiração nas falas dos trabalhadores, levamos à discussão o tema “rede de apoio”, questionando quem ou quais lugares compõem essa rede. Rapidamente, um usuário do serviço disse: Todo o apoio que eu recebo é da minha família, não imagino como aguentaria passar por essa situação sem eles (sic). Por outro lado, uma usuária relatou não se sentir compreendida por sua família: O maior apoio que eu recebo é de algumas amigas do trabalho. Me protegem, compreendem meu choro e me ajudam nos esquecimentos que tenho no trabalho, principalmente com o ponto (sic).
Essa usuária estava bastante agitada, se emocionou e contou um pouco dos 15 anos que trabalhou em uma empresa e sua inconformidade em se ver como está, se negando a aceitar que o emprego a deixou naquele estado. Bastante ansiosa, acrescentou:
Tenho pressa no tratamento, não gosto quando a psicóloga daqui fica me fazendo perguntas sobre minha mãe que morreu, meus irmãos… Eu quero falar do agora, quero que ela diga o que eu preciso fazer agora pra ficar boa! (sic).
Nessa fala podemos perceber as consequências do sofrimento relacionado ao trabalho marcado no corpo, na subjetividade, nos relacionamentos interpessoais, na percepção de si e na relação com o trabalho, como se tivesse amputado seu poder de ação, deixando-a subordinada aos saberes de especialistas18.
Igualmente, um jovem descreveu sua experiência como açougueiro, trouxe exemplos de negação de direitos, falou sobre o apoio relativo do sindicato, apontando poucas conquistas, considerando que a empresa passou a demitir os funcionários sindicalizados. Outros usuários compartilharam suas experiências e iniciaram uma discussão acerca do papel dos sindicatos e do enfraquecimento de seu poder de luta na conquista e manutenção dos direitos trabalhistas. Aos sindicatos, conforme apontam Silva, Bernardo e Souza19, destaca-se a necessidade real de incorporarem as questões da saúde mental dos trabalhadores nas discussões e pautas, visto que, no conteúdo das cláusulas negociadas e reinvindicações, elas pouco aparecem, sendo as questões salariais e de benefícios o foco das lutas sindicais.
Complementando, um trabalhador destacou a religião como uma estratégia de apoio. Falou da importância de identifica-se com o que faz, de amar o trabalho e reconhecer seu lugar na vida. Clot18 afirma isso quando discute a importância do reconhecimento na clínica da atividade. Para o autor, não se trata somente do reconhecimento do outro, mas da capacidade do trabalhador de se reconhecer no que faz, no poder de agir que lhe é proporcionado, na sua capacidade de afetar e ser afetado pela (ou na) atividade de trabalho. Esse poder de ação é compreendido como possibilidades de criar, de encontrar novos objetivos e descobrir novos aspectos da atividade. É justamente em virtude do poder de ação que pode ser desenvolvido o “trabalho bem feito”20, definido como “aquele no qual podemos nos reconhecer individualmente e coletivamente em acordo com uma história profissional que tem continuidade e da qual nos sentimos parte”21.
Outra usuária concordou, relatando:
Eu também gostava do que eu fazia, mas não aguentava mais ser cobrada pra atender com rapidez. O ruim do meu trabalho era quando as pessoas me tratavam mal por demorar na fila do caixa que eu era operadora (sic).
Esses trabalhadores, apesar de falarem a partir de categorias profissionais distintas, para Druck22, são uma classe só, que sofre e resiste aos “novos velhos” desafios do modelo flexível do capitalismo, ou seja, da precarização social do trabalho.
Outrossim, questionamos como o sofrimento é percebido pelo trabalhador, pelo outro e pelas organizações. Apesar de repetirmos a temática, as discussões tomaram rumos próprios, misturando-se a história dos presentes, sua receptividade e nossa capacidade de acreditar naquele momento como atividade de transformação micropolítica. Zamboni e Barros23 discutem a micropolítica partindo do conceito-ferramenta da Atividade, prevendo a análise do trabalho para além de uma forma preconcebida e moldada, mas enfatizando os processos de produção enquanto contexto estruturante e legitimando a necessidade de uma análise que exista na intervenção, em prol das lutas coletivas.
De tal modo, apresentando-se como motorista, um trabalhador descreveu que foi sua família que percebeu seu adoecimento. Ao chegar em casa, sua filha disse: Vixe, chegou a nuvem negra (sic). Acrescentou que estava vivenciando situações de muito estresse no trabalho e constantes assaltos que o levaram a procurar serviços de saúde. Outro trabalhador, apresentando-se como marceneiro, relatou que, para a empresa, o trabalho é produção e, se ele não está produzindo, não serve. Relatou:
Ninguém acreditava que eu tava doente, porque eu não tava sangrando, não tinha uma ferida que eles pudessem ver e, por isso, tanto os meus colegas de trabalho como minha família, tirando minha esposa, duvidavam que eu tava doente (sic).
A esposa que o acompanhava acrescentou:
isso incomoda bastante, porque ele precisou tirar raios X da cabeça, levar laudos pras pessoas acreditarem que ele tava mesmo sentindo aquilo, porque diziam que era frescura, que ele não queria trabalhar (sic).
O hesitar sobre a veracidade do adoecimento parte de uma construção social ainda baseada na compreensão “cartesiana” do sujeito, relacionando adoecimento a “vagabundagem”, concebendo saúde como antônimo de doença e estabelecendo uma dualidade, que é inexistente, entre trabalho e não trabalho10. Em consequência, os trabalhadores se veem sozinhos e culpados por seu adoecimento, tendo que, além de viver o sofrimento, provar que ele existe, suportando dúvidas, questionamentos e insinuações maldosas. Isto é, uma situação de agravamento da “dor” vivida em função das múltiplas violências associadas.
Tocado pela fala, outro trabalhador, identificando-se como policial, discorreu sobre a similitude do seu sofrimento e destacou mudanças de comportamento no trato com sua família, acrescentando:
É muita coisa pra um policial dar conta. Se ele não tá bem, ao invés dele ser o apaziguador de um conflito, ele passa a gerar outra vítima. As pessoas não entendem isso e, ainda por cima, na corporação, os homens têm vergonha de assumir que tão doentes, porque é sinal de fraqueza, o que não deve acontecer porque a gente lida com arma. Se eu não tiver bem, eu tenho que ser o primeiro a falar, e o capitão reconhecer pra não piorar pra todo mundo. (sic)
Uma trabalhadora complementou: Eu também trabalho com arma, e tô proibida de usar. Sou guarda municipal e a violência tá aterrorizando todo mundo (sic). Nesse momento refletimos que, apesar de cada trabalhador relatar situações pessoais, compartilhavam o mesmo contexto de precariedade das condições de trabalho: violência urbana e a fragilidade das relações de trabalho. Assim, falamos da importância de estar com o outro, de reconhecer o sofrimento e se perceber num coletivo. Afinal, é por meio do trabalho que construímo-nos enquanto história coletiva24.
Por fim, outro trabalhador se pronunciou: A empresa não percebe, ou não quer perceber, que os trabalhadores tão doente, ela só quer saber do lucro e, se você reclama, é demitido (sic). Com isso, refletimos sobre o cenário atual marcado pela reestruturação produtiva, pela internacionalização da economia e por inovações tecnológicas como fatores que impactam diretamente nas condições de vida da população. Para Mendes e Wunsch25, esse cenário é marcado não só pelo aumento das doenças relacionadas ao trabalho ou pelo surgimento de novas patologias, mas também pela precarização das condições de trabalho, inclusive no que se refere a salário, e faz que cada vez mais trabalhadores de diversas profissões assumam mais de um vínculo empregatício. Outro trabalhador deu o exemplo do motorista de ônibus, que aceita atuar na dupla função (dirigir e cobrar).
Reflexões críticas
Ao longo das intervenções, os participantes compartilharam o quanto é difícil obter informações sobre seus direitos e como são incompreendidos em relação à credibilidade do seu adoecimento, seja nos locais de trabalho, pela chefia e colegas, seja pelos familiares. Refletir sobre essas falas nos fez perceber que o silêncio existente na sala de espera era o silêncio da dor, o silêncio de quem se sente incompreendido e desistiu de lutar para provar que sofre (pelo trabalho). A sala de espera, nesse primeiro momento, era um espaço no qual o trabalhador se confrontava com sua impotência, uma representação de tudo aquilo do que buscava fugir. Ultrapassar essa barreira nos exigiu, primeiramente, a compreensão do trabalho enquanto categoria estruturante da vida das pessoas, além de considerarmos a flexibilização, a individualização e a solidão no local de trabalho, as metas, o assédio e a terceirização como fatores adoecedores26.
Proporcionar um espaço em que os trabalhadores dialogassem sobre seu processo saúde-doença e atividade de trabalho, de modo a compartilhar o desejo de transformar essa atividade, configurou-se como nosso papel6, assim como promover um espaço de leitura crítica da realidade e sua apropriação ativa, estimulando nos participantes uma atitude investigativa enquanto multiplicadores e construtores dos saberes e experiências. Podemos elencar como produto final dessa intervenção a construção do conhecimento que pode transformar a realidade, iniciada pela ruptura do silêncio - dando voz ao trabalhador. A criação desse espaço de circulação de afetos e saberes, em pleno meio institucional do Cerest, mostra, ademais, como diria Tosquelles27, a urgência em “cuidar da instituição” que cuida do trabalho.
A construção de um espaço grupal de acolhimento na sala de espera, mesmo que transitório, não retira sua essencialidade na construção de vínculos e na produção de saúde a partir da troca de saberes e afetos, ampliando a própria rede de apoio ofertada pelo Cerest, que ainda se restringia ao atendimento clínico tradicional, especialista. Por se tratar de um serviço de equipe multidisciplinar, sugere-se a integração desses saberes por intermédio da continuidade dessa prática na sala de espera pela própria equipe do Cerest - e nos demais Cerests - também como uma possibilidade de atuação interinstitucional, com a participação dos sindicatos e conselhos de saúde, compartilhando saberes e aproximando o trabalhador do processo de cuidado por meio da educação em saúde, do ativismo e protagonismo político.
Para além disso, nesse período pudemos compartilhar das dificuldades que regem o serviço. Por vezes não realizamos as intervenções devido a questões estruturais. Ademais, a equipe de apoio da intervenção não pôde continuar, o que inviabilizou a concretização dos grupos terapêuticos.
Considerações finais
Essa pesquisa-intervenção teve como objetivo desenvolver uma prática que não reproduzisse o modelo de clínica tradicional, fechado em si, mas voltado para uma atuação que valorizasse a participação e a experiência do trabalhador sobre seu trabalho. Conseguimos romper com uma prática psicológica focada apenas no atendimento clínico, destacando a necessidade da atuação mais integrativa e compartilhada por equipes multidisciplinares que promovam diálogos que permitam construir um campo de conhecimento interdisciplinar e se articulem com os outros atores sociais. Alertamos para o limite em conceber nos sujeitos somente um sofrimento intrapsíquico, reconhecendo-os como trabalhadores em risco laboral (que sofrem, adoecem e podem morrer pelo trabalho).
Ainda, apontou-se o uso da sala de espera como uma ferramenta estratégica no acesso ao trabalhador em sofrimento pelo trabalho e espaço potencial para provocar modos de existir. Destacamos, como desafio de cada encontro, a necessidade de romper o silêncio, não somente da espera por um atendimento, mas que simbolizava a ausência de voz da classe trabalhadora imersa em meios de produção que destituem o lugar do trabalho enquanto atividade de sentido, significado, de reinvenção dos modos de existir no trabalho e na vida.
Portanto, nosso esforço consistiu em transformar um momento marcado por afetos passivos, por assim dizer, em ações ativas - nesse caso, relacionadas ao falar sobre, à percepção de uma vivência e destinos compartilhados pelos trabalhadores. A sala de espera deixa, por alguns momentos, de ser um “não-lugar” para ser reapropriada como lugar próprio de fala e circulação de afetos, porém não se inscrevendo como ferramenta substitutiva aos grupos terapêuticos, nos quais o vínculo é mais permanente. Apontamos este recurso como possibilidade para próximas intervenções, assim como sua efetividade nos serviços de ST.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
18 Out 2018 -
Data do Fascículo
2018
Histórico
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Recebido
14 Ago 2017 -
Revisado
05 Dez 2017 -
Aceito
09 Fev 2018