Resumos
As propriedades do cimento Portland estão diretamente relacionadas às concentrações de suas fases constituintes, principalmente a alita, a belita, a fase ferrítica e o aluminato. A alita, de composição 3CaO.SiO2 e abreviada por C3S, deve ser o constituinte majoritário do clínquer após o processamento, pois é sua reação de hidratação que confere a resistência mecânica ao cimento curado. A belita, de composição 2CaO.SiO2 e abreviada por C2S, está presente como o primeiro complexo de cal e sílica formado no aquecimento e, sendo mais estável a baixas temperaturas que o C3S, volta a se formar no resfriamento. O aluminato está presente principalmente na forma de 3CaO.Al2O3, abreviado por C3A, enquanto a ferrita aparece como constituinte principalmente na forma 4CaO.Al2O3.Fe2O 3, abreviada por C4AF. Os teores de ferrita e alumina, no entanto, alteram a estabilidade da alita, com conseqüentes alterações na reatividade do cimento. O presente trabalho estuda os efeitos de adições de Fe2O3 e Al2O3 sobre a estabilidade da alita e apresenta diagramas CCT para a decomposição da alita na presença desses compostos.
Cimento; decomposição da alita; efeitos de Fe e Al
The properties of Portland cement are directly related to the concentrations of its major phases, i.e., alite, belite, the ferritic phase and the aluminate phase. Alite, with the composition 3CaO.SiO2, known as C3S, should be the major component of the clinker after processing, once its hydration produces the high yield strengths of cured cement. Belite, with the composition 2CaO.SiO2, known as C2S, is the first lime and silica complex, formed during the heating process. It presents higher stability at low temperatures than C3S, so that it tends to be formed again during the cooling cycle, from the decomposition of alite. The aluminate phase appears mainly with the composition 3CaO.Al2O3, known as C3A, and the ferritic phase appears with the composition 4CaO.Al2O3.Fe2O 3, known as C4AF. However, the ferrite and alumina contents affect the alite stability, and consequently, its reactivity. This paper studies the effects of Fe2O3 and Al2O3 additions over the alite stability and presents CCT diagrams for the alite decomposition in the presence of these compounds.
Cement; alite decmoposition; Fe and Al effects
METALURGIA & MATERIAIS
Decomposição da fase majoritária do cimento Portland - Parte II: alita com adições de Fe e Al
Jorge Alberto Soares TenórioI; Fernando Gabriel da Silva AraújoII; Sérgio Sônego Raymundo PereiraIII; Andréa Vidal FerreiraIV; Denise Crocce Romano EspinosaV; Alexandre BarrosVI
IDr., Prof. Associado, EPUSP, REDEMAT
IIDr., Prof. Adjunto, Dep. de Física, REDEMAT/UFOP, E-mail: fgabriel@iceb.ufop.br
IIIBach. Química, Dep. Eng. Met. e de Materiais, EPUSP
IVM.Sc.,CDTN/CNEN, doutoranda REDEMAT/UFOP
VDr., Dep. Eng. Met. E de Materiais, EPUSP
VIDr., Dep. Eng. Met. e de Materiais, EPUSP
RESUMO
As propriedades do cimento Portland estão diretamente relacionadas às concentrações de suas fases constituintes, principalmente a alita, a belita, a fase ferrítica e o aluminato. A alita, de composição 3CaO.SiO2 e abreviada por C3S, deve ser o constituinte majoritário do clínquer após o processamento, pois é sua reação de hidratação que confere a resistência mecânica ao cimento curado. A belita, de composição 2CaO.SiO2 e abreviada por C2S, está presente como o primeiro complexo de cal e sílica formado no aquecimento e, sendo mais estável a baixas temperaturas que o C3S, volta a se formar no resfriamento. O aluminato está presente principalmente na forma de 3CaO.Al2O3, abreviado por C3A, enquanto a ferrita aparece como constituinte principalmente na forma 4CaO.Al2O3.Fe2O 3, abreviada por C4AF. Os teores de ferrita e alumina, no entanto, alteram a estabilidade da alita, com conseqüentes alterações na reatividade do cimento. O presente trabalho estuda os efeitos de adições de Fe2O3 e Al2O3 sobre a estabilidade da alita e apresenta diagramas CCT para a decomposição da alita na presença desses compostos.
Palavras-chave: Cimento, decomposição da alita, efeitos de Fe e Al.
ABSTRACT
The properties of Portland cement are directly related to the concentrations of its major phases, i.e., alite, belite, the ferritic phase and the aluminate phase. Alite, with the composition 3CaO.SiO2, known as C3S, should be the major component of the clinker after processing, once its hydration produces the high yield strengths of cured cement. Belite, with the composition 2CaO.SiO2, known as C2S, is the first lime and silica complex, formed during the heating process. It presents higher stability at low temperatures than C3S, so that it tends to be formed again during the cooling cycle, from the decomposition of alite. The aluminate phase appears mainly with the composition 3CaO.Al2O3, known as C3A, and the ferritic phase appears with the composition 4CaO.Al2O3.Fe2O 3, known as C4AF. However, the ferrite and alumina contents affect the alite stability, and consequently, its reactivity. This paper studies the effects of Fe2O3 and Al2O3 additions over the alite stability and presents CCT diagrams for the alite decomposition in the presence of these compounds.
Keywords: Cement, alite decmoposition, Fe and Al effects.
1. Introdução
As propriedades de hidratação e endurecimento do cimento Portland estão diretamente relacionadas à quantidade de aluminato tricálcico, ou alita, nele presente. Tenório et al.[1] investigaram a influência da velocidade de resfriamento sobre o teor final de alita, em um clínquer de cimento contendo alita pura, monofásico a altas temperaturas, de composição 3CaO.SiO2. Naquele trabalho, ficou demonstrado que praticamente toda a alita está decomposta já a 870°C, para uma velocidade de resfriamento de 0,5°C/min, enquanto, à mesma temperatura, menos de 20% em peso da alita se decompõem, para uma velocidade de resfriamento de 10°C/min.
O clínquer industrial é formado por quatro constituintes principais: alita, belita, aluminato tricálcico e ferroaluminato tetracálcico, respectivamente 3CaO.SiO2, 2CaO.SiO2, 3CaO.Al2O3, 4CaO.Al2O3.Fe2O 3, ou, ainda, C3S, C2S, C3A e C4AF, na nomenclatura especial dos compostos do cimento Portland.
O C3S é o principal constituinte do clínquer, sendo o maior responsável pelas propriedades mecânicas do cimento após hidratação e cura. Em trabalhos recentes, Stanìk e Sulovský[2] estudaram os efeitos do polimorfismo da alita sobre a resistência do cimento, enquanto Velez et al.[3] estudaram o módulo elástico de cada uma das fases constituintes do cimento, porém sem estudarem diretamente os efeitos do percentual de alita na amostra.
A alita representa 50% a 70% do peso do clínquer, enquanto o C2S representa 15% a 30%, o C3A 5% a 10% e o C4AF representa 5% a 15%. O C3S é um composto metaestável à temperatura ambiente, podendo se decompor em C2S e CaO, e sua incorporação ao clínquer é feita através do resfriamento rápido da carga do forno.[4,5]
No aquecimento de uma mistura contendo apenas carbonato de cálcio e sílica, para a formação de alita pura[1], a formação de C2S se dá principalmente entre 1100 e 1200°C, enquanto a formação de C3S se inicia apenas a 1400°C e segue lentamente até temperaturas superiores a 1500°C. A formação dessas fases se dá por difusão no estado sólido, o que explica as baixas velocidades de reação observadas.
O clínquer industrial, por sua vez, é produzido a partir de uma mistura contendo calcário, argila e, eventualmente, bauxita, que contribuem também com outros elementos metálicos importantes no processo, como o alumínio, o ferro e o magnésio, além de outros metais na forma de impurezas[6,7]. O alumínio e o ferro estão presentes em concentrações relativamente altas e formam o aluminato tricálcico, C3A, e o ferroaluminato tetracálcico, C4AF, que são fases intersticiais entre os cristais de alita e belita. Os efeitos da presença de impurezas, nas concentrações de alita e belita nos clínqueres, vêm sendo estudados por vários autores, como Masaki e Maki[8] , que mostram a influência da presença de MgO e SO3, durante o reaquecimento prolongado, e Altun[9], que estuda a influência dos teores de CaF2 e MgO. Ambos concluem que os efeitos estão relacionados a alterações na viscosidade das fases líquidas, provocadas pelas impurezas. Entretanto não há trabalhos estudando as implicações diretas dos teores dos próprios constituintes das fases líquidas do cimento.
A formação de C4AF se dá a temperaturas na faixa entre 1100 e 1250oC, enquanto a formação de C3A se dá tipicamente na temperatura de 1100oC, quando ocorre a conversão do C12A7, formado entre 900 e 1100°C [4,5]. A temperaturas próximas de 1300°C, o C3A e o C4AF começam a se fundir, formando uma fase líquida, localizada na interface dos grãos, que envolve os cristais de C2S já formados. A presença dessa fase líquida acelera a reação de formação do C3S, posto que a difusão é acelerada. A velocidade de difusão e, conseqüentemente, a capacidade de clinquerização, está relacionada à quantidade e à viscosidade da fase líquida.
O C3A pode apresentar-se sob três formas: cúbica, ortorrômbica e tetragonal. Duas formas sempre podem coexistir e existem diferenças de reatividade entre as três formas: a cúbica hidrata-se mais rapidamente que as duas outras formas, que são semelhantes[10]. O ferro-aluminato apresenta-se com a estrutura ortorrômbica e constitui-se de uma solução sólida de composição C2(AxF1-x)2 O5, sendo que x varia entre 0 e 0,7, e o C4AF é a composição predominante, com x = ½ [11]. O C4AF apresenta valor hidráulico baixo e tem pequena participação na resistência aos esforços mecânicos do cimento. Sua propriedade principal é a resistência à corrosão química e é também responsável pela coloração cinzenta do clínquer[11].
O Al e o Fe, presentes na mistura para a produção do clínquer, além de terem papel fundamental na formação da alita, são essenciais às propriedades finais do cimento, pois determinam as fases presentes e suas concentrações no clínquer após o resfriamento. O resfriamento do clínquer é uma das fases mais importantes da sua formação, pois dele depende a estabilidade, o idiomorfismo e a decomposição dos cristais de alita, a formação de belita secundária, o conteúdo de cal livre secundária e a formação do aluminato cálcico, sendo que estes dois últimos componentes condicionam os fenômenos de expansão no cimento.[11]
No presente trabalho, serão estudados os efeitos das concentrações de ferro e alumínio sobre a estabilidade da alita pura durante o resfriamento, em várias velocidades. São geradas curvas CCT para a alita na presença de Fe2O3 e Al2O3.
2. Procedimento experimental
Alita pura pulverizada, produzida com o procedimento descrito por Tenório et al.[3], foi dopada com 0,8% de Fe2O3. Após a dopagem, a mistura foi homogeneizada por cerca de 1 hora e foram produzidos cinco conjuntos de 6 briquetes cada. Cada conjunto foi mantido a 1450ºC, por cerca de 20 minutos, e resfriado com velocidades de 10, 8, 5, 3 e 1ºC/minuto respectivamente. Para cada velocidade de resfriamento foi retirado um briquete, nas temperaturas de 1200, 1120, 1040, 960, 880 e 800ºC, seguido de têmpera em álcool e estocagem em estufa. Foi feita uma análise química de cada um dos briquetes, para a determinação do teor de CaO e cálculo do teor de C3S, conforme descrito por Tenório et al.[3].
Alita pura foi também dopada com 0,8% de Al2O3. A composição 0,8% foi escolhida para que se possa fazer a comparação com os resultados obtidos para a alita dopada com 0,8% de Fe2O3. Para a alita dopada com Al2O3, realizou-se o mesmo procedimento experimental que para a alita dopada com Fe2O3.
A partir dos dados obtidos, foram construídas curvas CCT para a alita dopada com Fe e para a alita dopada com Al, que foram comparadas às curvas de decomposição da alita pura, apresentadas por Tenório et al.[3].
3. Resultados e discussão
As Figuras 1 e 2 mostram o percentual, em peso da amostra, de cal livre resultante da decomposição das amostras de alita dopada, respectivamente, com 0,8% de Fe2O3 e com 0,8% de Al2O3, no resfriamento a partir de 1450°C, para as velocidades de resfriamento de 10, 8, 5, 3 e 1°C/min, nas temperaturas de 1200, 1120, 1040, 960, 880 e 800ºC.
- Percentual, em peso da amostra, de cal livre resultante da decomposição de amostras de alita dopada com 0,8% de Fe2O3, no resfriamento a partir de 1450°C, em função da velocidade de resfriamento.
- Percentual, em peso da amostra, de cal livre resultante da decomposição de amostras de alita dopada com 0,8% de Al2O3, no resfriamento a partir de 1450°C, em função da velocidade de resfriamento.
A porcentagem em peso de C3S decomposto foi calculada a partir da equação C3S => CaO + C2S. Como o peso molecular do C3S é de 228 g/mol, o do CaO é de 56 g/mol e o do C2S é de 172 g/mol, verifica-se que o CaO que pode ser liberado da decomposição da alita representa 24,6% da massa total. Desta forma, cada 1% em peso de CaO liberado corresponde a 4,065% em peso de C3S.
As Figuras 3 e 4 mostram o percentual em peso de alita decomposta durante o resfriamento de amostras de alita dopada, respectivamente, com 0,8% de Fe2O3 e com 0,8% de Al2O3, no processo de resfriamento a partir de 1450°C, em função da velocidade de resfriamento.
- Percentual em peso de alita decomposta durante o resfriamento de alita dopada com 0,8% de Fe2O3, no resfriamento a partir de 1450°C,em função da velocidade de resfriamento.
- Percentual em peso de alita decomposta durante o resfriamento de alita dopada com 0,8% de Al2O3, no resfriamento a partir de 1450°C, em função da velocidade de resfriamento.
Com base na extrapolação dos dados das Figuras 3 e 4, foram construídos os diagramas CCT (transformação em resfriamento contínuo) apresentados nas Figuras 5 e 6, mostrando a dissociação de alita dopada, respectivamente, com 0,8% de Fe2O3 e com 0,8% de Al2O3, em belita e cal livre, no resfriamento a partir de 1450°C.
- Curvas CCT para o C3S, de amostras de alita dopada com 0,8% de Fe2O3, no resfriamento a partir de 1450°C, com velocidades de resfriamento de 10, 8, 5, 3 e 1°C/min.
- Curvas CCT para o C3S, de amostras de alita dopada com 0,8% de Al2O3, no resfriamento a partir de 1450°C, com velocidades de resfriamento de 10, 8, 5, 3 e 1°C/min.
Uma comparação das curvas CCT para o C3S, da alita dopada com 0,8% de Al2O3 e da alita dopada com 0,8% de Fe2O3, com as curvas CCT de decomposição da alita pura obtidas por Tenório et al.[3], revela que a adição de alumina as desloca para tempos mais longos, enquanto a adição de ferrita as desloca para tempos mais curtos, ou seja, a adição de alumina estabiliza a alita, enquanto a adição de ferrita acentua sua decomposição no resfriamento.
Embora os efeitos de estabilização da alita pela alumina e de desestabilização pela ferrita sejam opostos, eles não se cancelam, pois são de intensidades diferentes, sendo o efeito da ferrita mais pronunciado, como mencionado na literatura[1]. Isto pode ser visto na Figura 7, que mostra a quantidade de CaO, resultante da decomposição da alita no resfriamento a 10°C/min, em função da temperatura, para a alita pura e para as alitas dopadas com 0,8% de Fe2O3 e com 0,8% de Al2O3.
- CaO resultante da decomposição da alita no resfriamento a 10°C/min, em função da temperatura, para a alita pura e para a alita dopada com 0,8% de Fe2O3 e alita dopada com 0,8% de Al2O3.
A Figura 7 mostra que, para uma taxa de resfriamento de 10°C/min, a adição de 0,8% de Al2O3 ao clínquer reduz em aproximadamente 0,5% o teor de CaO gerado pela decomposição da alita, enquanto a mesma adição de Fe2O3 aumenta esse mesmo teor em quase 12%. A adição de 0,8% de alumina, portanto, promove a diminuição de 2% no C3S decomposto, enquanto a adição de 0,8% de ferrita promove o aumento de 48% no C3S decomposto.
4. Conclusões
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Foi construído um diagrama CCT do C3S, para a alita dopada com 0,8% de Fe2O3, para resfriamentos a partir de 1450°C, a partir da análise química para medida da formação de cal livre.
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Foi construído um diagrama CCT do C3S, para a alita dopada com 0,8% de Al2O3, para resfriamentos a partir de 1450°C, a partir da análise química para medida da formação de cal livre.
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O diagrama de resfriamento contínuo do C3S, para a alita dopada com 0,8% de Fe2O3, apresenta uma velocidade de decomposição mais elevada do que a da alita pura, enquanto, para a alita dopada com 0,8% de Al2O3, a velocidade de decomposição é menor.
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A adição de 0,8% de alumina promove a diminuição de 2% no C3S decomposto, enquanto a adição de 0,8% de ferrita promove o aumento de 48% no C3S decomposto.
5. Referências bibliográficas
Artigo recebido em 18/05/2003 e aprovado em 30/07/2003.
Referências bibliográficas
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
13 Out 2003 -
Data do Fascículo
Jun 2003
Histórico
-
Aceito
30 Jul 2003 -
Recebido
18 Maio 2003