RESUMO
Este trabalho apresenta uma análise das perspectivas teórico-epistemológicas de uma amostra de 140 artigos de política educacional, de autores brasileiros, publicados entre 2010 e 2012. A maioria dos trabalhos foi classificada na categoria teorização combinada, a qual remete ao pluralismo metodológico. Concluiu-se que: a) há necessidade de aprofundar as discussões sobre o pluralismo metodológico e das possibilidades e dos limites da teorização combinada como fundamento para a pesquisa do campo da política educacional; b) o aprofundamento do estudo da epistemologia e das teorias que têm sido usadas na pesquisa em educação emerge como uma tarefa relevante no contexto atual, uma vez que o referencial teórico exerce um papel fundamental na pesquisa.
PALAVRAS-CHAVE: política educacional; epistemologia; pluralismo
RESUMEN
Este trabajo presenta un análisis de las perspectivas teórico-epistemológicas de una muestra de 140 artículos de política educativa, de autores brasileros, publicados entre 2010 y 2012. La mayoría de los trabajos fueron clasificados en la categoría de teorización combinada, la cual remite al pluralismo metodológico. Se concluye que: a) hay necesidad de profundizar las discusiones sobre el pluralismo metodológico y de las posibilidades y límites de la teorización combinada como fundamento para la investigación del campo de la política educativa; b) la profundización del estudio de la epistemología y de las teorías que se han usado en esta investigación en educación emerge como una tarea relevante en el contexto actual, ya que el referencial teórico ejerce un papel fundamental en la investigación.
PALABRAS CLAVE: política educativa; epistemología; pluralismo
ABSTRACT
This paper presents an analysis of the theoretical and epistemological perspectives of a sample of 140 papers on education policy, written by Brazilian authors, and published between 2010 and 2012. Most works were classified in the combined theorization referring to methodological pluralism. It was concluded that: a) there is a need to deepen the discussions on methodological pluralism and the possibilities and limits of combined theorization as theoretical underpinning for the research on education policy field; b) the deepening of the studies on epistemology and the theories that have been used in education research emerges as an important task in the current context, as the theoretical framework plays a key role in research.
KEYWORDS: education policy; epistemology; pluralism
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é analisar as perspectivas teórico-epistemológicas que têm sido empregadas em pesquisas de/sobre política educacional no Brasil, com base na análise sistemática de uma amostra de 140 artigos de autores brasileiros, publicados entre 2010 e 2012, em sete periódicos, a saber: Cadernos de Pesquisa; Educação & Sociedade; Educação e Políticas em Debate (EPD); Ensaio: avaliação e políticas públicas em educação; Jornal de Políticas Educacionais (JPE); Revista Brasileira de Educação (RBE); Revista Brasileira de Política e Administração da Educação (RBPAE). Na definição do corpus foram excluídos os artigos de autores estrangeiros e os de comentários e críticas. Assim, os artigos selecionados referem-se a pesquisas de natureza teórica ou empírica.1
O presente trabalho é parte de uma pesquisa mais ampla, que objetivou analisar uma série de aspectos relacionados à epistemologia das políticas educacionais, por meio da metapesquisa. O ponto de partida das pesquisas sobre epistemologias da política educacional é a constatação de que o campo da política educacional está em permanente expansão e continuamente em construção. Pôde-se observar uma quantidade substancial de pesquisas sobre políticas educacionais. Ao lado disso, verifica-se que ainda são poucos os estudos sobre referenciais teóricos que têm sido empregados nas pesquisas. Dessa forma, o desenvolvimento de estudos teórico-epistemológicos de política educacional pode ser considerado extremante importante e necessário para o contínuo fortalecimento como campo acadêmico.
A presente pesquisa classifica-se como um estudo de metapesquisa, ou seja, a análise de um conjunto de artigos que resultaram de investigações de natureza teórica ou empírica, tendo como foco a análise do referencial teórico-epistemológico que a fundamentou e outros elementos teórico-epistemológicos relevantes. A metapesquisa diferencia-se dos estudos de revisão de literatura, revisão sistemática, estado da arte e estado do conhecimento. Nessa perspectiva, revisão de literatura é o levantamento e a análise das produções sobre um tema específico, como uma etapa de um projeto de pesquisa. Tem por objetivo identificar o que tem sido pesquisado, sintetizar as principais conclusões, identificar as lacunas existentes. A revisão sistemática (systematic review) é uma alternativa mais rigorosa que a revisão de literatura, pois busca identificar todas as evidências disponíveis sobre determinado tema, comparando-as e sintetizando os resultados de forma explícita (Torgerson, 2003). O estado da arte ou estado do conhecimento são pesquisas de caráter bibliográfico, que assumem o desafio de
[...] mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários. (Ferreira, 2002, p. 258)
É possível considerar que o estado do conhecimento, de modo geral, é uma pesquisa mais ampla, que visa compreender como uma temática vem sendo abordada ao longo do tempo. Já o estado da arte pode referir-se à situação da pesquisa em determinado momento, por exemplo, na última década. Na metapesquisa, o pesquisador está interessado em compreender os meandros da pesquisa, sua fundamentação teórica, opções metodológicas, relação entre teoria e dados, procedimentos utilizados na aplicação e/ou geração de teorias etc. Assim, na metapesquisa, não há a intenção de comparar resultados entre as pesquisas ou sintetizar suas contribuições ou conclusões, como geralmente se faz na revisão de literatura. Também não há a intenção de verificar como a pesquisa de uma temática específica vem evoluindo ao longo do tempo, como se faz no estado do conhecimento. Os resultados da metapesquisa podem contribuir para a compreensão da pesquisa de determinado campo, em um contexto espaço-temporal específico. A partir dela, é possível identificar as tendências teórico-epistemológicas, as lacunas, as fragilidades e os pontos fortes das pesquisas que o envolvem.
ALGUNS DADOS SOBRE O CONTEXTO DOS ARTIGOS DA AMOSTRA
Na primeira etapa da pesquisa, constatou-se que os periódicos selecionados publicaram 636 artigos no período de 2010 a 2012. Em seguida, foi realizada a seleção de artigos de política educacional, excluindo-se os artigos de autores estrangeiros, os artigos de outras temáticas, bem como 33 artigos de política educacional, de autores brasileiros que se constituíam em comentários ou críticas (18,9% do total de artigos de política educacional). A amostra final compreendeu um total de 140 artigos, sendo 53 de pesquisas de natureza teórica ou análise documental (38%) e 87 de pesquisa empírica (62%). Uma decisão importante foi a não inclusão dos artigos sobre gestão democrática e de gestão educacional e escolar. Embora muitos estudos dessas temáticas estejam relacionados à política educacional, considera-se que a análise epistemológica de tais estudos seria mais adequada em uma outra pesquisa.
Os artigos analisados abordavam uma grande variedade de temas, sendo os mais recorrentes: financiamento e regime de colaboração (13 artigos); análise de programas específicos - Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE), Plano de Ações Articuladas (PAR), Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), Programa Universidade Para Todos (PROUNI), Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) - (11 artigos); educação superior: expansão e regulação (10 artigos); público e privado (9 artigos); avaliação e regulação (7 artigos); Plano Nacional de Educação (PNE) (7 artigos); política municipal de educação (7 artigos); carreira, remuneração e valorização do professor (5 artigos); federalismo (5 artigos).
Com relação aos procedimentos metodológicos, a maior parte das pesquisas de natureza empírica adotou métodos mistos (quantitativos e qualitativos). Os procedimentos mais recorrentes foram os seguintes: análise documental (34 artigos); análise de dados estatísticos: microdados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), dados do IDEB, dados de avaliações do desempenho de alunos de redes estaduais ou municipais, dados de matrículas, tabelas salariais (34 artigos); entrevistas (21 artigos); questionários (9 artigos); observação (3 artigos); grupo focal (2 artigos).
Os autores dos artigos eram professores universitários, docentes de programas de pós-graduação em educação (PPGE) ou outros, egressos de PPGE, doutorandos ou mestrandos. Com relação à distribuição geográfica, observa-se que a maioria dos autores era oriunda da região Sudeste (45,7%) e Sul (25,7%). A região Nordeste contava com 17,1%; Centro-Oeste, 7,9%; e a região Norte, 3,6%. Essa distribuição desigual reproduz, de certa forma, a distribuição dos PPGE no Brasil.
Com relação à abrangência das pesquisas, a maioria enfocava políticas nacionais (62 artigos), estaduais (26 artigos) e locais (30 artigos). Embora algumas pesquisas classificadas como abrangência nacional, estadual ou local estabelecessem relações com o contexto internacional/global, as pesquisas dessa categoria eram a minoria, pois apenas 6 artigos enfocavam aspectos internacionais/globais.
É importante considerar que os artigos da amostra foram produzidos em um contexto de ampliação de políticas educacionais e do investimento na área educacional e, ainda, em um contexto no qual diversas questões foram objeto de debate público, tal como o PNE. O contexto político, econômico, social e cultural dessa ampliação não deixou de ser caracterizado por fragilidades e contradições, tais como: abertura de espaços para a participação do setor privado na definição de políticas educacionais; utilização de recursos públicos para o setor privado; criação de políticas gerencialistas e baseadas em modelos de eficiência e eficácia; definição de políticas substantivas com limitada participação etc. Nesse quadro, os pesquisadores de política educacional foram desafiados a desenvolver pesquisas sobre uma grande variedade de políticas, com focos bastante diferenciados, sendo algumas com certo caráter potencialmente emancipatório e outras com um viés gerencialista.
REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
A pesquisa baseia-se no enfoque das epistemologias da política educacional (Tello, 2012), nos conceitos de teorização combinada e teorização adicionada (McLenann, 1996) e na proposta da metapesquisa em política educacional (Mainardes e Tello, 2016; Tello e Mainardes, 2012, 2015b).
Considera-se a política educacional como um campo teórico e como um campo acadêmico. Como campo teórico, a política educacional tem como antecedentes as teorias e as produções da ciência política, cuja emergência pode ser situada na década de 1940 (Stremel, 2016). A política educacional, como campo acadêmico, vem constituindo-se, no Brasil, desde o final da década de 1960, com a criação de associações (Associação Nacional de Política e Administração da Educação - ANPAE, por exemplo, em 1961); a utilização do termo política educacional em publicações e documentos oficiais; a criação de disciplinas, departamentos, revistas especializadas, eventos, redes de pesquisa etc.2 Nesse sentido, a realização de pesquisas sobre o desenvolvimento desse campo é essencial para se compreender como os pesquisadores têm empregado os referenciais teóricos e como esse campo vem avançando no que diz respeito a termos teórico-metodológicos e epistemológicos. As pesquisas sobre referenciais teórico-epistemológicos podem contribuir de forma significativa para o fortalecimento da política educacional como campo teórico e acadêmico.
Tello (2012), com base na teoria de Pierre Bourdieu, considera que o enfoque das epistemologias da política educacional é um esquema analítico-conceitual que pode ser empregado pelo próprio pesquisador para o exercício da reflexividade e da vigilância epistemológica, bem como para desenvolver estudos de metapesquisa de política educacional.
O enfoque das epistemologias da política educacional possui três componentes analíticos: a perspectiva epistemológica, o posicionamento epistemológico e o enfoque epistemetodológico (Tello, 2012). A perspectiva epistemológica é a perspectiva teórica que o pesquisador emprega em seu processo de investigação (exemplo: marxismo, neomarxismo, estruturalismo, pós-estruturalismo, pluralismo etc.). O posicionamento epistemológico decorre da própria perspectiva epistemológica ou dela deveria decorrer, em uma investigação consistente e coerente. O posicionamento epistemológico pode ser entendido também como o posicionamento político do pesquisador. Alguns exemplos de posicionamento epistemológicos são: crítico, crítico-radical, crítico-analítico, reprodutivista, neoinstitucionalista, jurídico-institucional, empirista, neoliberal, entre outros.
O enfoque epistemetodológico é o modo como se constrói metodologicamente a pesquisa com base em determinada perspectiva epistemológica e posicionamento epistemológico. Nenhuma metodologia é neutra e, por essa razão, ao explicitar as suas bases epistemológicas, o pesquisador deve preocupar-se com a vigilância epistemológica em sua pesquisa (metodologia, análise de dados, argumentação, conclusões etc.), cuja construção parte da perspectiva epistemológica e do posicionamento epistemológico. Em linhas gerais, o enfoque epistemetodológico está relacionado ao nível de coerência entre o referencial teórico, opções metodológicas, análises e conclusões. Pode ser analisado na existência ou não de um fio condutor que articula os elementos da pesquisa. Envolve a leitura sistemática e a análise da configuração textual.
Os conceitos de teorização combinada e teorização adicionada (McLenann, 1996) foram também relevantes na análise dos artigos. McLenann (1996) explica que estratégias explicativas combinadas são legítimas e talvez promissoras. Teorização combinada, nesse sentido, é um esforço de articular teorias ou conceitos oriundos de diferentes teorias, com o objetivo de compor um quadro teórico consistente para fundamentar determinada análise. Tal esforço demanda fazer escolhas teóricas e justificá-las, o que implica um exercício de reflexividade e de vigilância epistemológica. Já a noção de teorização adicionada significa a adoção mais ou menos aleatória de teorias, conceitos, ideias de diferentes teorias e perspectivas epistemológicas, resultando em um conjunto de ideias e conceitos sem coerência, unidade e articulação teórica. O resultado do simples adicionamento e da sobreposição de ideias de diferentes autores resulta em uma tentativa fracassada da definição de um referencial teórico, o qual pode ser considerado frágil, desarticulado e epistemologicamente pouco coerente.
A metapesquisa refere-se ao processo de tomar um conjunto de textos como objeto de reflexão e análise. No caso da metapesquisa fundamentada no enfoque das epistemologias da política educacional, busca-se identificar como os pesquisadores trabalham com as questões epistemológicas, teorias ou conceitos que fundamentam a sua pesquisa e como são apresentadas em seus relatórios de pesquisa. Assim, busca-se identificar uma série de elementos e características, tais como: a perspectiva epistemológica, o posicionamento epistemológico, o enfoque epistemetodológico, o tipo de pesquisa (natureza teórica, pesquisa empírica, comentários ou críticas), marcos teóricos (conceitos empregados), os níveis de abordagem e abstração (descrição, análise e compreensão) e de outros aspectos relacionados ao uso de teorias e perspectivas epistemológicas na pesquisa em política educacional (Mainardes, 2017; Mainardes e Tello, 2016; Tello e Mainardes, 2012, 2015b).
No sentido metodológico, a pesquisa partiu da seleção de artigos de política educacional, de autores brasileiros publicados entre 2010 e 2012, em sete periódicos antes mencionados. A partir da leitura sistemática, buscou-se identificar, em cada artigo, a perspectiva epistemológica, o posicionamento epistemológico, o nível de coerência interna (epistemetodologia), marcos teóricos, nível de abstração, argumentação e a abrangência da pesquisa (local, nacional, global).
Neste trabalho, exploram-se os dados relacionados às perspectivas teóricas dos artigos da amostra. Tendo em vista que a teoria combinada mostrou-se como a perspectiva teórica empregada na maioria dos trabalhos, busca-se evidenciar o papel dessa perspectiva e de alguns de seus limites.
PERSPECTIVAS TEÓRICO-EPISTEMOLÓGICAS NA PESQUISA NO CAMPO DA POLÍTICA EDUCACIONAL
O objetivo central da pesquisa foi o de analisar os artigos do ponto de vista epistemológico, explorando como os pesquisadores têm operado com teorias, bem como a articulação entre teoria, dados e análise. Ball (2006, 2011) defende a necessidade urgente de teoria na pesquisa em educação e na formação de pesquisadores. Para o autor, a teoria ocupa um papel central na tomada de decisões epistemológicas. A teoria contribui para garantir robustez conceitual, assim como para oferecer um método para a reflexividade e para a compreensão das condições sociais da produção de conhecimento. Ball sugere também a importância da “violência” que a teoria possui, como uma ferramenta reflexiva na prática da pesquisa, seu papel de desafiar ortodoxias conservadoras e fechadas, parcimônia e simplicidade. O papel da teoria é manter algum senso de obstinação e complexidade do social.
Os 140 artigos da amostra foram classificados em 16 categorias (Tabela 1). É importante destacar que toda tipologia ou classificação é arbitrária e está relacionada a propósitos específicos. Além disso, em virtude de sua natureza arbitrária, os mesmos objetos podem ser classificados de formas diferentes.3
Com relação à explicitação da perspectiva epistemológica que fundamenta a análise, constatou-se que apenas 5 artigos da amostra (3,5%) explicitaram uma perspectiva epistemológica: Ferretti (2011), a perspectiva marxiana; Oliveira et al. (2010), abordagem crítico-dialética; Masson (2012) e Saldanha e Oliveira (2012), a concepção materialista histórico-dialética; Souza, A. L. L. (2012), a perspectiva histórico-filosófica. Em alguns casos, autores de outras perspectivas epistemológicas são utilizados na análise (e.g., Ferretti, 2011; Oliveira et al., 2010). Em outros 3 artigos, a perspectiva teórica foi explicitada: Machado e Aniceto (2010), a teoria das representações sociais; Pereira e Velloso (2012), a teoria do discurso (Laclau e Mouffe); e Barreto (2010), a análise crítica do discurso. Nos demais 132 artigos, as perspectivas teórico-epistemológicas foram depreendidas pela leitura e análise dos artigos, pois não havia tal explicitação pelos próprios autores.
Com base nos conceitos de reflexividade e de vigilância epistemológica,4 considera-se que a explicitação da perspectiva teórico-epistemológica pode aumentar a consistência da pesquisa, a coerência entre teoria e análise de dados e conclusões e o rigor na pesquisa.5 No entanto, a explicitação por si só não garante que os elementos da pesquisa estejam alinhados e coerentes e que o pesquisador efetivamente opere satisfatoriamente com o referencial adotado. Nos casos do emprego da teorização combinada, a apresentação de justificativas e do papel das teorias ou conceitos utilizados na pesquisa pode ser um aspecto essencial. Tal explicitação evidencia o uso consciente e reflexivo da teoria e da vigilância epistemológica.
Com relação ao posicionamento epistemológico, a partir da amostra foi possível definir as seguintes categorias: a) analítico (78 artigos); crítico-analítico (29 artigos); empirista (20 artigos); crítico-normativo (9 artigos); crítico-radical (3 artigos); e culturalista (1 artigo). Os artigos classificados como posicionamento epistemológico empirista são os que apresentam dados estatísticos ou dados de pesquisa, mas com pouca análise e pouca ou nenhuma teorização.6
Com relação aos níveis de abordagem/abstração, foi possível desenvolver três categorias básicas: descrição, análise e compreensão (Mainardes e Tello, 2016). No caso da amostra, os trabalhos foram assim classificados: nível de análise (115 artigos); nível de descrição (21 artigos); e nível de compreensão (4 artigos). Os estudos predominantemente descritivos são aqueles que apresentam um conjunto de ideias (em artigos de natureza teórica ou bibliográfica) ou dados empíricos, com pouca análise das ideias ou dos dados apresentados.
Nos estudos predominantemente analíticos, os dados ou as ideias são trabalhados, categorizados, comparados. Uma das características importantes dos estudos analíticos é mais integração entre teoria e dados. As teorias não são meramente aplicadas, pois o esforço de análise resulta na geração de conceitos, de categorias, de tipologias, de generalizações empíricas. Em virtude do uso mais sistemático de um referencial teórico e de um processo de análise mais abrangente e sistemático, as descobertas e as conclusões da pesquisa tornam-se mais universais, com maior nível de generalidade, podendo ser estendidas ou aplicadas a outros contextos.
O nível da compreensão é o nível mais elevado e avançado de abstração. Esse nível pode conter alguma descrição e um conjunto significativo de análises, os quais são subsumidos pela compreensão. São estudos que apresentam uma dupla dimensão do processo de pesquisa: explicar e compreender (o caráter interpretativo e explicativo). São estudos que buscam abordar a temática (teórica ou empírica) de modo mais totalizante, explorando de forma aprofundada as relações e as determinações envolvidas na política investigada ou na questão que está sendo discutida. De modo geral, são estudos que apresentam maior riqueza e profundidade nas análises, podendo até mesmo servir de base para outras pesquisas. Nesses estudos, pode-se observar uma articulação forte e coerente entre a perspectiva epistemológica, posicionamento epistemológico e enfoque epistemetodológico, mesmo quando a perspectiva epistemológica não é apresentada de forma explícita.
Aplicando-se os princípios da grounded theory (Glaser e Strauss, 1967), os estudos do nível de compreensão apresentam um aspecto essencial no processo de produção de conhecimento: a geração de teoria. A geração de teoria pode ser identificada por meio da elaboração de conceitos, categorias, tipologias, explicações ou, ainda, de sensitizing concepts,7 os quais, em virtude do seu nível de generalidade e coerência, representam avanços na produção do conhecimento do campo.
Outro aspecto de interesse referiu-se ao nível de abrangência das pesquisas. Dos 128 artigos que permitiram identificar a abrangência das pesquisas (teóricas ou empíricas),8 constatou-se que 6 possuíam uma abordagem internacional-global; 62, nacional; 4, regional; 26, abrangência estadual; e 30, abrangência local.
A referida pesquisa confirmou a possibilidade de identificar os componentes básicos do enfoque das epistemologias da política educacional. Pôde-se observar que há uma estreita relação entre as perspectivas teóricas, posicionamentos epistemológicos e níveis de abstração. Por exemplo, os artigos cujos autores utilizavam-se de teorização adicionada ou apresentavam a ausência de referencial teórico acabavam por expressar um posicionamento epistemológico empirista e um nível de abstração descritivo. Outro exemplo é a forte relação entre um posicionamento epistemológico crítico-analítico ou crítico-radical e o nível de abstração de compreensão.
A metapesquisa em política educacional e as classificações e categorias que vêm sendo desenvolvidas (teorização combinada e teorização adicionada; níveis de descrição, análise e compreensão; posicionamento epistemológico crítico, crítico-radical, analítico, empirista etc.) mostram-se relevantes, pelas seguintes razões:
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permitem uma compreensão mais aprofundada de como as perspectivas teórico-epistemológicas têm sido empregadas na pesquisa de política educacional e das suas implicações para o fortalecimento da pesquisa nesse campo;
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oferecem uma “linguagem de descrição” para referir-se às pesquisas do campo;
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permitem identificar, com maior clareza, as potenciais tensões e desafios da pesquisa de política educacional, bem como refletir sobre estratégias para o contínuo fortalecimento das pesquisas do campo.
A maioria dos artigos (65,8%) enquadrou-se na categoria teorização combinada, indicando uma tendência dos autores do campo em empregar ideias (ou conceitos, categorias, contribuições) de diferentes perspectivas teóricas ou de diferentes autores. Identificou-se também o emprego do materialismo histórico e dialético (7,1%), estratégias de teorização adicionada (5%) e outras perspectivas teóricas com menor incidência.
Um aspecto importante a ser destacado é a existência de artigos caracterizados pela ausência de fundamentação teórica (5,8%) e de artigos que empregam a teorização adicionada (5%). A teorização adicionada significa a utilização de autores, ideias, conceitos de diferentes perspectivas teórico-epistemológicas, os quais não configuram um quadro teórico consistente e articulado.
Tendo em vista o número significativo de artigos classificados na categoria de teorização combinada, considera-se relevante a sua análise.
TEORIZAÇÃO COMBINADA E LIMITES DO PLURALISMO TEÓRICO-METODOLÓGICO
A estratégia da teorização combinada foi identificada em 92 dos 140 artigos (65,8%). A principal característica dessa categoria é o uso de ideias ou conceitos de mais de um autor ou de mais de uma teoria, os quais configuram um quadro teórico coerente ou minimamente satisfatório.
Na maioria dos artigos da amostra, observou-se que a teorização combinada resultou em uma fundamentação consistente e coerente, oferecendo elementos teóricos para uma análise satisfatória (e.g., Adrião e Pinheiro, 2012; Augusto e Oliveira, 2011; Bruel e Bartholo, 2012; Campos, 2012; Chaves, 2010; Costa e Koslinski, 2011; Davis et al., 2011; Freitas, 2012; Morais, 2012; Santos, 2010; Souza, A. R., 2012; Susin; Peroni, 2011).
Além disso, dois aspectos mostraram-se relevantes na composição do quadro teórico: a utilização de autores clássicos e de referenciais internacionais contemporâneos. A utilização de clássicos como Weber, Bourdieu, Foucault (Amaral e Oliveira, 2011; Martins e Lotta, 2010; Souza, A. R., 2012) constituiu-se em estratégia relevante para o aprofundamento analítico e ampliação da argumentação. A utilização de referenciais estrangeiros, em alguns artigos, propiciou uma análise mais ampliada, consistente e diferenciada da temática (Augusto e Oliveira, 2011; Bruel e Bartholo, 2012; Davis et al., 2011).
Em alguns casos, a utilização apenas de autores contemporâneos ou de autores que pesquisam o mesmo tema tornou o referencial teórico da pesquisa relativamente frágil, com consequências para a análise e discussões. É importante explicitar que a interlocução com as pesquisas da área é fundamental. No entanto, tal interlocução parece mais adequada na etapa da revisão de literatura. Em alguns casos, os autores que pesquisam a mesma temática são utilizados como uma espécie de referencial teórico. Embora alguns desses trabalhos possam, de fato, servir de base para outros estudos, faz-se necessária uma análise criteriosa para identificar os trabalhos que efetivamente possuam potencial para isso. Parafraseando Ball (2006), pode-se concluir que alguns pesquisadores se contentam com o que está disponível (em teorias e dados), em vez do que seria mais significativo para uma análise efetivamente ampliada e aprofundada.
A forte presença da estratégia da teorização combinada indica que a perspectiva epistemológica pluralista tem sido bastante empregada nas pesquisas do campo da política educacional. Apesar disso, ainda são raras as publicações que apresentam discussões acerca do pluralismo teórico-metodológico na pesquisa de política educacional.9
Para Coutinho (1991), o pluralismo comporta duas dimensões básicas: o pluralismo como fenômeno social e político e o pluralismo na construção do conhecimento. O autor indica também que esta segunda dimensão é mais complexa. Para o autor, no terreno do pensamento social não existe apenas a ciência. Existe também o mundo dos valores, o conjunto de concepções de mundo. Nesse terreno, não pode existir uma verdade de tipo científico, pois torna-se objetividade aquilo que é partilhado intersubjetivamente pelos vários atores sociais (quando se obtém um consenso). Por exemplo, os pesquisadores do campo da política educacional utilizam-se de diferentes perspectivas teórico-epistemológicas.
Contudo, há valores hegemônicos que podem ser partilhados pelos pesquisadores, tais como: a defesa da democracia, da democratização real, do direito de todos à educação, da justiça social, da igualdade, da necessidade de mudanças no contexto econômico e social mais amplo (e não apenas do setor da educação), da luta em favor de uma educação não racista, não seletiva, não sexista, entre outros importantes valores. Para Coutinho, a hegemonia refere-se à “[...] formação de uma vontade coletiva, de um conjunto de valores que move um sujeito coletivo e se torna, através de sua ação, um fenômeno objetivo da realidade social” (Coutinho, 1991, p. 14). De modo geral, esses valores partilhados podem ser identificados no posicionamento epistemológico do pesquisador, algumas vezes apresentados de modo implícito e outras explicitados em pressupostos e valores que orientam as análises. É possível argumentar que alguns autores utilizam-se de um pluralismo com a hegemonia de teorias críticas ou pelo menos de teorias ou autores que defendem valores hegemônicos partilhados (democracia, democratização, igualdade, justiça social etc.).
Em relação a termos conceituais, é importante distinguir pluralismo de ecletismo. O que aqui se chama de pluralismo, como perspectiva epistemológica, é o uso consciente e reflexivo de conceitos e ideias de diferentes teorias, as quais são articuladas para compor um quadro teórico para a pesquisa. Assim, não se trata da mera justaposição de teorias, ou uma seleção aleatória e não consciente de conceitos e ideias de diferentes teorias, o que configuraria a estratégia da “teorização adicionada” (ou ecletismo). Coutinho (1991, p. 13) explica que, “[...] no terreno da ciência natural, o pluralismo não pode implicar o ecletismo ou relativismo”.10 A articulação de ideias de diferentes teorias implica justificar tais escolhas, apresentar reflexões em torno do próprio quadro teórico construído. Já o ecletismo significa a justaposição de teorias ou ideias, de forma mais ou menos aleatória, sem muito rigor e sem que haja evidências do reconhecimento das diferenças epistemológicas que estão na base de tais ideias ou teorias. De modo geral, os autores que se utilizam do ecletismo não apresentam reflexões ou justificativas das escolhas teóricas.
Um ponto de partida importante para compreender a perspectiva epistemológica pluralista é considerar o ponto de vista daqueles que a defendem, bem como daqueles que a criticam. Autores como Saunders (2007) e Ball (entrevista a Avelar, 2016), por exemplo, explicam que dificilmente uma única teoria seria capaz de oferecer todos os elementos necessários para a análise, sendo possível articular teorias diferentes.
Segundo Ball, “[...] não podemos interpretar o mundo, criar significado sobre o mundo, utilizando uma teoria ou posição epistemológica, porque o mundo é persistentemente mais complexo e difícil do que aquilo que se pode entender com o simples uso de uma posição, adotando um posicionamento” (Avelar, 2016, p. 4). Saunders (2007) explica que a dependência teórica (o reconhecimento de que toda pesquisa necessita de uma teoria) não implica determinância teórica. Em outras palavras, não há razão para sugerir que diferentes perspectivas teóricas não possam ser utilizadas em áreas comuns de conceptualização e em critérios comuns de evidência empírica (Saunders, 2007).
Nas discussões sobre o pluralismo, evidencia-se que é possível identificar nas teorias pontos de aproximação, e não apenas aspectos de incompatibilidade (Mainardes e Marcondes, 2009). Apesar disso, deve-se ter clareza de que a combinação de perspectivas epistemológicas, teorias, conceitos, ideias é complexa e demanda alto nível de reflexividade, alguma justificativa das combinações realizadas, consciência da perspectiva epistemológica que está na base das teorias, ideias ou conceitos que estão sendo combinados. Não se trata, portanto, da escolha aleatória e pouco consciente de tais teorias, ideias ou conceitos. A composição teórica necessita, acima de tudo, “fazer sentido” como fundamentação teórica para a análise e desenvolvimento de conclusões.
McLennan (1995), Tonet (s.d.) e Mészáros (2004) apresentam críticas ao pluralismo. Para McLennan (1995), o pluralismo possui diferentes facetas, tais como: pluralismo metodológico, pluralismo sociocultural, pluralismo político. Para o autor, o pluralismo indica, entre outras coisas:
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um acabrunhamento conveniente e aceitação relativista de que há um conjunto de valores culturais;
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oposição às formas de imperialismo cultural;
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reconhecimento de que a diversidade metodológica é frutífera;
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considera que há diferentes formas de conhecer e de ser;
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criatividade e abertura à teoria;
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envolvimento em um conjunto de interesses sociais e grupos de interesse no moderno cenário político;
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a afirmação da democracia como um fim em si mesma;
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atenção às complexidades de lealdade política;
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senso de que identidades sociais e políticas são escolhidas em vez de herdadas; e
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consagração do princípio de “igual mas diferente”.
McLennan (1995) também indica a existência de pluralismo teórico radical ou moderado, bem como pluralismo de “direita”, de “esquerda”. Para esse autor, um pesquisador pode ser pluralista no que diz respeito a ontologia, epistemologia, metodologia, teoria social, moralidade, política, cultura, ou pluralista apenas em um ou dois desses domínios. McLennan (1995) aponta as seguintes críticas ao pluralismo:
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o pluralismo pode ser visto como um conceito-chave nas ciências sociais. Como um conceito modal, o pluralismo é uma referência indispensável nos debates científicos e sociais. No entanto, por ele mesmo, não produz soluções claras e duradouras às antigas questões e preocupações analíticas e políticas;
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como uma atitude de vida e de visão política, pode ser compreendido como demasiado tolerante, pseudotolerante, ostensivamente humanista e um tipo de pessoa intelectualmente eclética, um tipo de pessoa que não tem opiniões claras sobre qualquer coisa e que não questiona ou não deseja mudanças na sociedade; hesitante quando necessita empregar o conhecimento sociológico ou a ciência política em seu completo potencial crítico.
Mészáros (2004) critica o pluralismo, considerando-o legitimador da ideologia dominante. Critica também o discurso reformista que tenta desviar a atenção das determinações sistêmicas para discussões mais ou menos aleatórias sobre efeitos específicos (Mészáros, 2005). Para Tonet (s.d.), o pluralismo metodológico, embora seja antidogmático, não deixa de ser uma forma de relativismo e de ecletismo, uma vez que seu fundamento está na subjetividade e não na objetividade. Segundo o autor, “[...] na sua forma concreta atual, representa uma solução inteiramente equivocada e anticientífica” (Tonet, s.d., p. 14).
CONCLUSÕES
Neste trabalho, foram apresentadas as perspectivas teóricas identificadas nos artigos da amostra, com especial referência à estratégia da teorização combinada. Argumentou-se que tal estratégia configura o emprego de uma epistemologia pluralista na análise de políticas. Indicou-se que uma perspectiva epistemológica pluralista não é a mera justaposição de teorias, conceitos ou da contribuição de autores. O pluralismo envolve a escolha consciente e reflexiva de ideias de diferentes autores, teorias ou perspectivas epistemológicas, bem como a apresentação de reflexões e justificativas acerca do referencial construído valendo-se de diferentes perspectivas epistemológicas. O aspecto fundamental do pluralismo teórico-metodológico é que o quadro teórico construído necessita fazer sentido para a política ou tema investigado e resultar em uma formulação consistente e coerente.
Com base na análise dos artigos da amostra, apresentam-se as seguintes conclusões:
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Tendo em vista a forte tendência em empregar a estratégia da teorização combinada, faz-se necessário aprofundar as discussões em torno do pluralismo (metodológico e epistemológico) e das possibilidades e limites dessa estratégia como fundamento para a pesquisa do campo da política educacional. Diante da crescente complexidade da realidade atual (política, econômica, social, cultural), pode-se questionar: A teorização combinada pode ser considerada uma estratégia que permite a criação de modelos analíticos mais abrangentes e mais flexíveis para a análise de políticas? Ou se constitui em uma perspectiva relativista para a análise de políticas? Quais são suas possibilidades e limites? Qual a relevância de distinguir entre o emprego de perspectivas teórico-epistemológicas e o mundo dos valores e do conjunto de concepções de mundo - que podem ser formados por valores partilhados (democracia, democratização, direito à educação, justiça social, igualdade etc.)?
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Tendo em vista que teorização combinada mostrou-se bastante empregada nos artigos da amostra, é importante destacar que há níveis distintos de teorização combinada, sendo algumas mais apropriadas e coerentes do que outras. Essa estratégia demanda uma análise rigorosa dos conceitos (categorias, ideias, contribuições) que estão sendo combinadas, as quais demandam justificativas e explanações sobre o próprio quadro teórico construído.11
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O aprofundamento do estudo da epistemologia e das teorias que têm sido usadas na pesquisa emerge como uma tarefa altamente necessária e relevante no contexto atual tanto na prática da pesquisa quanto no processo de formação de pesquisadores.
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As pesquisas e discussões sobre referenciais teórico-epistemológicos e os estudos epistemológicos de política educacional contribuem para o fortalecimento da política educacional como campo teórico e campo acadêmico.
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Uma questão que persiste está relacionada ao papel e à importância da explicitação da perspectiva epistemológica ou da perspectiva teórica que fundamenta a pesquisa. Pode-se argumentar que a explicitação dos referenciais teórico-epistemológicos pode elevar o nível de rigor na pesquisa. No caso de autores que articulam ideias de diferentes autores e teorias, considera-se que é essencial evidenciar o papel de cada um na fundamentação teórica da pesquisa.
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Os conceitos de reflexividade e vigilância epistemológica (Bachelard, 1977; Bourdieu, Chamboredon e Passeron, 2007) emergem como conceitos fundamentais tanto para o trabalho de cada pesquisador quanto na metapesquisa em política educacional.
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» http://www.ivotonet.xpg.com.br/arquivos/pluralismo_metodologico.pdf - Torgerson, C. Systematic reviews London: Continuum, 2003.
NOTAS
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1
Para a definição dos periódicos a serem incluídos na amostra, utilizou-se como critérios: a) a inclusão de periódicos considerados específicos do campo da política educacional (EPD; Ensaio: avaliação e políticas públicas em educação; JPE e RBPAE) e b) periódicos altamente qualificados e reconhecidos na área de educação (Cadernos de Pesquisa; Educação & Sociedade e RBE). Reconhece-se que essa seleção apresenta limitações, no entanto a intenção da pesquisa era considerar um conjunto de pesquisas de política educacional que abordassem o campo de forma mais ampla, evitando reunir artigos que tratassem temas muito específicos, como financiamento da educação ou outras temáticas, as quais podem ser objeto de análise epistemológica específica, em futuras pesquisas.
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2
A respeito da constituição da política educacional como campo acadêmico, ver Mainardes (2013), Stremel (2016) and Stremel and Mainardes (2016).
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3
Thiry-Cherques (2006, p. 29) explica que “Embora herdeiro da filosofia das ciências, Bourdieu se recusa a aplicar sistemas classificatórios aos objetos que investiga (Bourdieu, 1992a, p. 184). Ele entende que toda tipologia cristaliza uma situação, isto é, que tende a ser arbitrária, na medida em que descarta os tipos que não se enquadram e os casos que se encontram na fronteira, os casos que não se distinguem claramente. Ele deve a Bachelard (1984) a ideia de que o pensamento opera como um movimento de pinça, que descobre, integra e supera as limitações das teorias em uma composição conceitual cada vez mais abrangente”.
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4
Lopes (2007) explica que o conceito de vigilância epistemológica baseia-se na noção de vigilância intelectual de Bachelard. “A vigilância intelectual, propriamente epistemológica, contrapõe-se à vigilância intelectual simples. A vigilância intelectual simples é a que espera um fato definido, a localização de um fato caracterizado. É a consciência que um sujeito tem do objeto: consciência tão clara que sujeito e objeto se esclarecem ao mesmo tempo. Nesse sentido, é a atitude de um sujeito cognoscente empirista. A vigilância epistemológica, ou vigilância intelectual, ou ainda vigilância da vigilância, é o ato de vigiar não apenas a aplicação do método, mas o próprio método. Exige que se ponha o método à prova, mas também que se arrisque, na experiência, as certezas racionais. Exige, também, a análise dos obstáculos que impedem o desenvolvimento do conhecimento científico e mascaram as rupturas do saber. Com isso, é uma vigilância que visa a destruir o absoluto do método, da razão e dos fatos” Bachelard, 1977apudLopes, 2007). É também um conceito empregado por Bourdieu (Bourdieu, Chamboredon and Passeron, 2007).
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5
Não há um consenso sobre a validade e a importância da explicitação perspectiva epistemológica pelo pesquisador. Bracken (2010) defende a importância de o pesquisador ter consciência da ontologia e da epistemologia que fundamentam a sua pesquisa, bem como a necessidade de o pesquisador assegurar-se de que as suas próprias percepções ontológicas, instâncias epistemológicas e métodos de coleta e de interpretação de dados estão estreitamente alinhados. Anastas (2004) e Marshall and Rossman (2006) defendem a importância da explicitação da fundamentação teórica-epistemológica das pesquisas.
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6
Esse conjunto de artigos remete à metáfora do “[...] elefante branco gigantesco, repleto de dados, mas sem ideias, sem substância, com saberes inúteis para aproximar-se da complexidade do mundo” (Cansino, 2007). Cansino (2007) apresenta ainda comentários a respeito do artigo de Giovanni Sartori (2004). Em seu artigo, Sartori, considerado um dos mais importantes cientistas políticos, diz que a ciência política perdeu seu rumo e caminha com pés de barro e, ao abraçar com rigor os métodos quantitativos e lógico-dedutivos para demonstrar hipóteses cada vez mais irrelevantes para entender o processo político, termina por alijar-se do pensamento e da reflexão.
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7
A noção de sensitizing concepts (conceitos sensibilizadores, provisórios) foi inicialmente usada pelo sociólogo americano Herbert Blumer (1954), fundador do interacionismo simbólico. Blumer criou esse conceito para contrastar com o que ele chama de “conceitos definitivos” (cultura, instituições, estrutura social, personalidade etc.). Sensitizing concepts não envolvem procedimentos fixos e específicos para identificar um conjunto de fenômenos, mas, ao contrário, oferecem um senso de referência e orientação na abordagem de instâncias empíricas. Assim, enquanto os conceitos definitivos oferecem prescrições do que ver, os sensitizing concepts somente sugerem direções para o olhar (Blumer, 1954). É um conceito relevante na grounded theory, pois “o sociólogo deveria ser teoricamente sensível o suficiente para que possa conceptualizar e formular uma teoria a partir dos dados” (Glaser e Strauss, 1967, p. 46). Exemplos de sensitizing concepts, na pesquisa de políticas educacionais, foram indicados por Mainardes e Tello (2016).
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8
Alguns artigos de natureza teórica não permitiam uma classificação com relação à abrangência.
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9
A respeito das dimensões teóricas e políticas do pluralismo, ver Coutinho (1991). A respeito do pluralismo na pesquisa de política educacional, ver Mainardes, Ferreira and Tello (2011); Mainardes and Tello (2016); Tello and Mainardes (2015a).
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10
Para Coutinho (1991, p. 14): “Pluralismo, no terreno da ciência natural ou social, não é assim sinônimo de ecletismo. É sinônimo de abertura para o diferente, de respeito à posição alheia, considerando que essa posição, ao nos advertir para os nossos erros e limites, e ao fornecer sugestões, é necessária ao próprio desenvolvimento da nossa posição e, de modo geral, da ciência”.
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11
A esse respeito, Tonet (n.d., p. 2) afirma: “[...] o que se entende por pluralismo metodológico? Às vezes ele é entendido como ecletismo, ou seja, a liberdade de tomar ideias de vários autores e articulá-las segundo a conveniência do pensador. Isto normalmente é feito sem o cuidado de verificar com rigor a compatibilidade de ideias e paradigmas diferentes, dando origem a uma colcha de retalhos, quando mais, inteligentemente tecida. É bom ressalvar que há ecletismo de baixo e de altíssimo nível”.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
2018
Histórico
-
Recebido
13 Jun 2016 -
Aceito
11 Out 2016