Open-access “El defensor de la frontera”: a trajetória de Sebastián Ramos e as disputas fronteiriças (Brasil-Bolívia, 1825-1862)

“El defensor de la frontera”: the trajectory of Sebastián Ramos and the frontier disputes (Brazil-Bolivia, 1825-1862)

Resumo:

De monarquista a cidadão boliviano, com ou sem cargos de mando, Sebastián Ramos desempenhou uma trajetória na fronteira entre a Bolívia e o Império do Brasil que nos permite perceber jogos institucionais e atitudes particulares nas margens dos dois países em construção. Por várias vezes, ele foi a pessoa mais adiantada em território boliviano a desafiar o progressivo avanço do Império antes de um tratado oficial de limites. Por outro lado, suas posições na zona fronteiriça serviram de justificativa para o Brasil tomar terras a oeste.

Palavras-chave: Fronteira; Bolívia; Império do Brasil

Abstract:

From a monarchist to a Bolivian citizen, with or without command positions, Sebastián Ramos played a trajectory on the border between Bolivia and the Empire of Brazil that allows us to perceive institutional games and private attitudes on the margins of the two countries under construction. On several occasions he was the most advanced person in Bolivian territory to challenge the progressive advance of the Empire, before an official treaty of limits. On the other hand, their positions in the border zone served as justification for Brazil to take land to the west.

Keywords: Frontier; Bolivia; Empire of Brazil

No início dos anos 1870, quando Severiano da Fonseca - um militar geógrafo, engenheiro, e com conhecimentos de linguística indígena - estava executando o serviço de demarcação da linha de fronteira entre o Império do Brasil e a Bolívia, fez notar à sua comitiva, após trilhar em linha reta a partir da lagoa de Uberaba, seguindo em direção ao norte, que deveriam “salvar” um lugar chamado San Matías (Fonseca, 1986). Ou seja, era para a marcha contorná-lo e depois seguir em nova linha reta, dessa vez em direção ao oeste, conforme rezava o primeiro tratado de limites, comércio e navegação assinado entre os dois países em 1867. Perto dali, continua o relato do demarcador, existia um sítio que antes pertencera a um “tal de Sebastião Ramos”, onde morava sua viúva, uma indígena.

Este artigo trata justamente da trajetória desse “tal de Sebastião Ramos” na região de fronteira entre a República da Bolívia e o Império do Brasil, principalmente entre as décadas de 1830 e 1860. Ramos foi uma pessoa destacada, por vezes controversa, que desenvolveu o papel de “adelantado de la frontera”,1 vivendo naquela região durante as primeiras décadas da construção dos Estados nacionais na América do Sul, quando influiu e foi influenciado pelas políticas de então entre países vizinhos.

Seu nome aparece de maneira secundária e espaçadamente em textos com objetivos diversos.2 Em um livro sobre os duzentos anos de independência em Santa Cruz de la Sierra, Tonelli (2012, p. 63), ao tratar da província de Chiquitos, assinala em breve passagem que o “coronel Sebastián Ramos” cometeu “um acto de traición à La Patria” ao anexar sua província ao Império do Brasil. De fato, quando era governador de Chiquitos - parte fronteiriça do departamento de Santa Cruz -, ante a iminente queda das forças monarquistas em sua região, Ramos solicitou (e o conseguiu momentaneamente) que Mato Grosso, província do Império do Brasil, anexasse a jurisdição que governava.

É por esse episódio, chamado por vezes de “a questão de Chiquitos”, que Sebastián Ramos é mais conhecido, sobretudo por historiadores que trataram das relações internacionais da Bolívia e do Brasil. O episódio é mencionado no texto de um dos primeiros historiadores das relações exteriores brasileiras, Calógeras (1998), e tratado mais analiticamente em teses e livros sobre a formação do Brasil e suas relações internacionais, como em Santos (2002) e Cervo e Rapoport (2015). Em um trabalho dedicado às relações entre Brasil e Bolívia, Sotomayor (2013) faz certa menção à anexação de Chiquitos e a seu então governador, enquanto não deixa de destacar os tratados oficiais, diplomatas e presidentes que os assinaram. Especificamente sobre a anexação da província chiquitana, podemos contar com o estudo de Ovando-Sanz (1986) e com o de Seckinger (1985). No entanto, mesmo sendo marcante tal evento (e por isso é tratado aqui, mesmo que brevemente), o nosso interesse principal recai sobre seu corolário: com a ameaça das forças independentistas, a desistência de Mato Grosso de ocupar Chiquitos e a reprovação de D. Pedro à invasão, Sebastián Ramos retirou-se de sua governadoria e, em uma espécie de exílio, montou um rancho em área limítrofe de jurisdições, cujas terras, em alguns anos, passaram a ser pretendidas e disputadas pelos dois países vizinhos. É principalmente a partir daí que nossa pesquisa se centra, procurando traçar a trajetória do ex-governador, a qual nos deixa perceber as formas de disputa entre países sobre determinada área.

Por que Sebastián Ramos?

Não é o caso de resgatar a heroicidade aos “grandes indivíduos” como, por vezes, o gênero biográfico foi acusado.3 Nem necessariamente redimir Sebastián Ramos do julgamento de “traidor de la Patria”, quando as lealdades às soberanias estavam sob pungentes mutações e a ideia de Estado nacional, com seus devotados cidadãos, era ainda um horizonte a ser alcançado plenamente.4 Na verdade, essa pesquisa iniciou-se da curiosidade a respeito de uma pessoa que se situava em meio à problemática região de fronteira da República da Bolívia com o Império do Brasil, antes de um acordo oficial entre ambos os países. Isso implicava várias considerações sobre esse início dos Estados nacionais, como, por exemplo, quais tinham sido os limites geográficos defendidos pelos governantes dos dois países e, principalmente, como haviam se dado, caso tivessem ocorrido, as mobilizações antes de um acordo assinado entre ambos. Daí, emergiu para a pesquisa o nome de Sebastián Ramos, o qual nos possibilitou também ver outras formas de relação entre dois países e sua zona fronteiriça.

Não é difícil depreender que as possibilidades de escrita biográfica são bastante numerosas. De toda forma, como argumenta Schmidt (2012, p. 195) após análise de várias tendências que uma biografia pode assumir, ela será proveitosa se for justificada não “por si”, mas sim por aquilo “que pode contribuir para o avanço das discussões próprias ao conhecimento histórico”. Aqui, então, nos valemos das propostas de Becker (1999, p. 109-115), para quem o estudo de uma pessoa tem a vantagem de poder mostrar as dinâmicas dos jogos em questão, assim como o processo de subjetivação às “normas institucionais”. Dessa forma, ao considerarmos a trajetória específica de Ramos, ela se justifica por complexificar a formação dos limites territoriais brasileiros e bolivianos, além dos frequentemente citados tratados oficiais.5

É uma trajetória que começa com Ramos se posicionando como defensor da monarquia bourbônica, quando governador de Chiquitos, em meio às guerras independentistas, passando a ser uma espécie de “exilado” monarquista, habitante da fronteira entre o Império do Brasil e a Bolívia, até se tornar republicano boliviano, com discursos patrióticos, agindo como o indivíduo boliviano fundamental que encarnava o entrave à expansão brasileira para oeste. Para isso, com habilidade e apoio intermitente dos governos locais e central, contou com grupos indígenas hostis aos brasileiros, amealhou desertores do Império e escravos fugidos, além de dispor de variados “camaradas” que por vezes compunham o seu estafe. Ou seja, suas ações chegaram a fazê-lo se autoproclamar o “principal defensor” das raias orientais de sua república.

Muitas de suas ações tinham em vista os anseios e as disputas dos dois países pela territorialidade nas suas margens. Como veremos, tratar desse personagem nos permite perceber que parte do traçado dos limites do Império com a Bolívia está relacionada ao seu périplo na fronteira, assim como, ao se optar por reduzir a escala de observação ao trajeto desse personagem, nos permitiu ver formas de o Império do Brasil “ganhar” territórios antes de um tratado oficial. Em suma, é uma forma de “história das relações internacionais” em que atores diversos estão na própria região em disputa, e não necessariamente nos gabinetes diplomáticos.

Considerações metodológicas e fontes

As reflexões de Bourdieu (2009) sobre a escrita de biografia remeteram, e ainda remetem, a uma série de debates sobre a “escrita da vida”. A sua ideia de “trajetória” é pertinente a esta pesquisa como termo a ser empregado ante a impossibilidade de se apreender a totalidade da existência de uma pessoa. No entanto, a ideia central, de o gênero biográfico ser uma “ilusão”, pois não consideraria as mudanças pelas quais o biografado passaria, tendo seu “nome” como identificador que pretensamente fixaria o indivíduo em todas as situações ao longo de sua vida, não corresponde ao que vamos tratar aqui. Nesse sentido, diferentemente de considerar uma “ilusão”, Oliveira (2018) mostra que a pesquisa sobre uma pessoa e o seu resultado em uma narrativa viabilizam-se justamente pela “identidade pessoal”. Ou seja, pode-se atribuir um conjunto de ações ao mesmo sujeito. Isso não desconsideraria as mudanças por que passaria o biografado. Tais considerações corroboram as ideias de Ginzburg (1991, p. 174-175) sobre ser especificamente o “nome” o que distingue um indivíduo de outro nas sociedades passadas. Investigar um “nome” serve, portanto, como “guia” para compor uma “espécie de malha fina” que pode fornecer uma outra imagem do que se pretende conhecer, no caso aqui a região de fronteira e as relações entre dois países que se margeiam.

De todo modo, a proposta de “trajetória” nos é pertinente na medida em que assinala um “percurso” limitado, sem pretender abarcar a totalidade, com sentido linear único. Ao mesmo tempo, considera-se que o percurso individual perpassa campos simultâneos e/ou sucessivos, formando conjuntos de relações com “outros agentes envolvidos”, conflitantes ou não (Bourdieu, 2009, p. 190).

Além da não linearidade de vida, Levi (2009, p. 79-82), por sua vez, propõe que se procure os graus de “liberdade” de ação (logo, também de seus limites) que o indivíduo conseguiria exercer dentro de um campo normativo de dada sociedade. O historiador italiano indica que, além de podermos imaginar “uma racionalidade seletiva”, poderíamos procurar evitar “reduzir as individualidades à coerência de grupo”, levando em conta a “explicação das condutas coletivas como sistemas de relação”. Da mesma maneira, o biografado não se limitaria a um contexto rígido, quadros fixos de relações, podendo ser agente de suas modificações.

Dessa forma, portanto, as considerações anteriores nos direcionam para dois pontos. Primeiro, um indivíduo e sua trajetória singular não se conformariam a um grupo social específico, no caso de Ramos a de estancieiro criollo, monarquista, militar, ou mesmo, em dado momento, de exilado, que lhe confeririam sentido e forma. Nesse sentido, tal como sugere Loriga (2008, p.16), temos de considerar que um indivíduo (no caso, Sebastián Ramos) participa de “redes de relações sobrepostas”, ou seja, de “contextos dinâmicos”, aos quais seria difícil fornecer coerência pela suposta lógica de determinada categoria. Segundo, é principalmente pela procura do “nome” e de “como” um indivíduo agiu que as tramas aparecem, sem que necessariamente o percebamos como detentor de uma “identidade” imobilizadora. Ao contrário, reduzir a escala de análise ao périplo de uma pessoa, seguindo sua designação pessoal, ou seja, seu nome, não exclui suas mudanças individuais e posicionamentos diversos. Assim, Ginzburg (1991, p.177-178), de maneira conclusiva para nossos propósitos, mostra que perseguir justamente o nome de determinado indivíduo e como ele agiu, em diversas fontes, nos permite “visualizar casos impensáveis de outra maneira”, ao mesmo tempo que “indaga estruturas dentro das quais aquele vivido se articula”.

Considerando que o nome Sebastián Ramos está presente principalmente em trabalhos sobre relações internacionais, os quais se baseiam especialmente em arquivos consulares de capitais, procuramos por sua designação no fundo relativo ao Ministerio de las Relaciones Exteriores, depositados no Archivo y Biblioteca Nacionales de Bolivia (ABNB), em Sucre, onde há, sobretudo, considerável troca de correspondências entre representantes do Império e da Bolívia, na pasta relativa ao Brasil.6 No entanto, como seu percurso demonstrava não se restringir à esfera diplomática oficial, também procuramos no mesmo arquivo, nas pastas referentes ao Ministerio del Interior (divididas em tomos e anos) e ao Ministerio de la Guerra, os quais tratam tanto da política chamada “interna” como da preparação da defesa (ou ataque) do país. Complementarmente, buscando entender a dinâmica na e da própria fronteira, também investigamos nos chamados “arquivos locais”, quais sejam, o do Museo y Archivo Histórico de Santa Cruz de la Sierra (MAHSC), em Santa Cruz, e o Arquivo Público do Estado de Mato Grosso (APMT), em Cuiabá. No primeiro, encontramos documentações no fundo “Prefectural”, do qual fazem parte todos os aqui citados desse lugar. Nele não há uma divisão por assuntos específicos no catálogo de fontes, embora haja frequentemente funcionários solícitos e com bastante conhecimento do arquivo. No Arquivo Público do Estado de Mato Grosso (APMT), em Cuiabá, que também conta com profissionais capacitados, há uma série de cartas trocadas entre autoridades locais e governos centrais, além de ofícios remetidos a diplomatas no exterior. As fontes de ambas as localidades,7 ao nos permitirem perceber perspectivas das áreas fronteiriças por atores locais, do departamento de Santa Cruz de la Sierra e da província de Mato Grosso, remetem também às das capitais de seus respectivos países. Foram nesses documentos que por vezes Sebastián Ramos foi inscrito por autoridades locais ou nacionais, e outras vezes ele mesmo se inscreveu, por ter sido também um dos que receberam cargos governamentais visando à construção da fronteira boliviana com o Império.

Sebastián Ramos e sua saída de Chiquitos: o início das contendas nas margens nacionais

Uma das principais características dos Estados nacionais que surgiam no século XIX era o estabelecimento de “fronteiras nacionais” (Foucher, 1986), notadamente os que passaram por processos de lutas por independência. Era um momento em que procuravam conferir aos novos países fronteiras lineares, ou seja, com limites separando-os. A nova soberania deixaria de existir no corpo do rei, passando para o “povo”, e assim o território onde a população residiria se configuraria na materialização da união das pessoas em torno da moderna nação. Ou, em outros termos, como sugerem Pamplona e Doyle (2009, p. 22-23), se forjaria uma identidade geográfica aglutinadora, ao lado de outras formas de aglutinação simbólicas, como língua, tradições e histórias em comum.8

No chamado Antigo Regime existiam muitos corpos políticos sob uma única monarquia, ocupando variados e descontínuos espaços, às vezes justapondo-se, o que se refletia no “caos” das identidades políticas, sociais e culturais na América (ver Herzog, 2011). Ou seja, dentro de uma gama de categorias entre os polos “estrangeiro” e “natural”, padres missioneiros, colonos, agentes governamentais, entre outros, tinham suas identidades políticas (ativadas quando provocadas a ser enunciadas) ligadas mais às lealdades dinásticas do que com o lugar de nascimento. Da mesma maneira, grupos indígenas nas fronteiras podiam mudar constantemente suas “lealdades”, de acordo com as situações, contingências e possibilidades de suas comunidades em relação a outros grupos indígenas ou a “espanhóis” e “portugueses” (ver Herzog, 2018; Carvalho, 2014). Com o advento dos Estados nacionais, o “território nacional” passou a ser, gradativamente, a metáfora que integraria e identificaria os diferentes componentes populacionais, numa perspectiva de se forjar certa “homogeneização” cultural (Quijada, 2000), em dado e circunscrito espaço geográfico, onde se construiriam os novos países. A nova concepção de territorialidade, como mostra outra publicação de Foucher (2009, p. 25), deveria “ter limites bem estabelecidos e bem guardados”, onde a “identidade nacional” poderia se desenvolver para abarcar as diversas pessoas de grupamentos diferentes em determinado território. Assim, seria preconizada a “inviolabilidade das fronteiras” (p. 26) desse solo nacional, nesse caso do território em construção.

Ao nosso ver, nada estava assegurado sobre como seriam as bordas territoriais quando se deram as independências na América. O que não impedia que a zona fronteiriça internacional fosse considerada a parte exposta aos vizinhos e tangível dessa nova soberania, expressa no próprio território (Foucher, 2009, p.25). Como veremos, essa prerrogativa de proteção da fronteira era um dos principais motes da trajetória de Ramos, que se deu principalmente nas décadas após a criação da Bolívia até pouco antes da delimitação oficial de sua borda oriental.

A Bolívia foi criada ante a disputa de dois polos regionais, Buenos Aires e Lima, que pretendiam ter como território a antiga Audiência de Charcas.9 Os principais generais de Bolívar, como Sucre, precavendo-se contra a possibilidade de um desses centros políticos e econômicos tornar-se hegemônico em relação a outras regiões da América do Sul, resolveram criar um novo país, a República da Bolívia (1825), ocupando o centro do subcontinente, ainda com uma província litorânea no Pacífico.10

A institucionalização da nova república se dá logo em seguida às derradeiras batalhas na região. Um dos últimos redutos realistas a cair foi Santa Cruz de la Sierra, com sua governadoria Chiquitos, lindeira com o Império do Brasil. De acordo com Seckinger (1985, p. 9), o governador de Chiquitos, na ocasião D. Sebastián Ramos, “podia optar entre continuar a resistência ou aceitar o inevitável triunfo dos insurgentes”. Com a queda de Santa Cruz, teve de tomar a decisão que, como vimos, fez com que sua instância administrativa se tornasse posse brasileira.

Conforme continua Seckinger, a intenção de Ramos era tornar a desanexar Chiquitos quando a Santa Aliança, uma orquestração pró-dinástica europeia, finalmente operasse na América e restituísse à monarquia espanhola suas terras. O que não aconteceu. Logo se deu o abandono forçado da tropa brasileira em Chiquitos, corroborando para isso a insurreição de pueblos que se viram invadidos. Tal intrusão também quase provocou uma guerra de grandes proporções entre os independentistas hispano-americanos e o Império do Brasil. Com a retirada, D. Sebastián Ramos seguiu a tropa brasileira, deixando as vilas chiquitanas para morar na zona fronteiriça entre os dois novos países. Quando saiu da governadoria, que veio a ser parte da Bolívia, levou consigo gado e os tesouros das igrejas, sendo acompanhado por indígenas, camaradas e funcionários (Seckinger, 1985, p. 9-12; Santos, 2002, p. 22-26). Então montou um rancho, na área concedida pelos brasileiros a um ex-governador já considerado traidor pelo novo país vizinho. O lugar de concessão era na área da grande Salinas, perto da margem direita do rio Jauru.

As coisas mudaram acentuadamente após 1834,11 quando Sebastián Ramos foi perdoado pela Bolívia e declarado cidadão daquela república. Passou a ser considerado, então, espécie de “abjurador” pelas autoridades brasileiras. No entanto, a questão que começa a se desenrolar a partir daí não era tanto devido a Ramos ter sido acolhido pela monarquia brasileira para depois se bandear aos republicanos. O problema principal que surgia com isso era a própria localização de seu estabelecimento rural - e o que fazia nele e por ele.

A posição do rancho e as relações internacionais nas margens

Parte da historiografia das relações internacionais do Império com a Bolívia, como já apontamos, trata analiticamente o episódio de Chiquitos. Por outro lado, há uma vertente que tende a ver as relações internacionais do Brasil, entre tratados, viagens de consulares, “situação interna” do país, dentro da perspectiva da “tradição do pacifismo” com o exterior. Assim, entre a anexação de Chiquitos, passando pela chegada do primeiro cônsul boliviano ao Rio de Janeiro em 1834 (onde permaneceu por breve período) e o tratado de 1867, em final de parágrafo Soares (1973, p. 197) faz breve referência à região de fronteira, “teatro de incidentes”, quando houve “penetração de bandidos irregulares, procedentes de ambos os lados, no território da outra parte”.12 No entanto, mesmo não especificando esses “incidentes”, o autor procura realçar ao longo do livro o caráter pacífico da diplomacia do Brasil em substituição às armas.13 Essa tendência da história diplomática ganhou terreno, e a prerrogativa da “tradição do pacifismo”,14 ao nosso ver, acabou por fornecer a interpretação dessas ocorrências a casos aleatórios de foras da lei. Como veremos com maior detalhe, é justamente por focarmos na trajetória de um indivíduo que, ao contrário de “bandidos irregulares”, ou qualquer qualificador que apareça nas documentações referidas nesse texto, tratava-se, sim, de pessoas que tinham o apoio de seu governo (mesmo que não perene e substancial) para tentar expandir ou defender o que consideravam o “território nacional” - o que não deixava de provocar descontentamento (com contragolpes práticos) e reclamações escritas de autoridades dos dois lados. Ou seja, não raro os habitantes da fronteira faziam parte de uma política com o país vizinho. Foram essas movimentações que, em determinado momento, levaram os dois países à beira de um conflito aberto. O adensamento dessa trama, após a anexação de Chiquitos, se inicia exatamente com a reconsideração da localização do rancho de Sebastián Ramos.

O estabelecimento do ex-governador, chamado de Onças, perto do rio Jauru, lhe possibilitaria usufruir de um curso d’água perenemente navegável que desaguava no principal rio da região, o Paraguai, este com corrente para o sul, cruzando a república guarani e desembocando no rio Paraná, já em território pretendido pela então Confederação Argentina.15 Daí chegar ao rio da Prata e ao Atlântico configuraria o sonho de navegação tanto do Império como da Bolívia.16

De toda forma, devido a Ramos utilizar aquela via fluvial, autoridades brasileiras arrogaram que a “navegação do rio Jauru” fosse reservada “exclusivamente ao governo brasileiro”, recorrendo para isso ao que foi estabelecido no Tratado de Santo Ildefonso, de 1777, entre Espanha e Portugal. Assim, para as autoridades imperiais, em uma interpretação um tanto enviesada, como consequência dessa exclusividade cabia ao Império que “fique na posse também exclusiva das duas margens do mesmo rio, e por consequência [dos] terrenos adjacentes”.17 A se considerar esse tratado, os “terrenos adjacentes” incluiriam, então, o rancho de Ramos.18

Outro aspecto a destacar sobre a localização da rancharia era o fato de estar muito próxima da fazenda nacional de Caiçara, que possuía criação de gado, e ainda de outros estabelecimentos rurais também com pecuária e outros produtos, que utilizavam mão de obra negra escravizada. Ramos então passou a ser acusado de roubar animais daquela fazenda, e de outras adjacentes, e de traficá-los justamente utilizando-se do rio Jauru.19

Ramos tinha recebido aquelas terras na época em que era contrário à república boliviana, como uma maneira de ajudar a colonizar as áreas na zona de fronteira que interessavam ao Brasil. Ao tornar-se cidadão boliviano, esse mesmo estabelecimento em área limítrofe passaria a ser considerado “boliviano” pelos bolivianos, com base no tratado de 1777, o qual reservaria para a Espanha o lado direito do rio Jauru. Ramos, então, apresentou título da terra fornecido pelo governo da província de Chiquitos,20 assim como outras pessoas, inclusive brasileiras, que estavam na vasta área fronteiriça das Salinas do Jauru. Isso demonstraria que aquelas terras eram herdadas do tempo colonial pela Bolívia. As autoridades de Mato Grosso contestaram tais posses. Com receio de maiores problemas, a governadoria de Chiquitos acabou por concordar com a não validação dos títulos fornecidos, mas fez ouvidos moucos em relação à posição de Sebastián Ramos nas Salinas do Jauru.21

Não sabemos ao certo o motivo de Ramos ter se tornado “republicano” e “cidadão boliviano”, corroborando a ideia da plasticidade de identidades (não só em áreas de fronteira), como Revel (1998), entre outros, nos mostra em relação aos variados grupamentos humanos. Não caberia aqui um aprofundamento sobre as metamorfoses e maleabilidades identitárias em diversos contextos, mas se Ramos não explicitou o motivo de ter se tornado “boliviano” naquele momento,22 podemos depreender que, com o “perdão” da República, outras possibilidades seriam abertas -como voltar a ter cargos, notadamente militares, fato não negligenciável em sociedades hispano-americanas, além de poder se afazendar em outras terras, perspectiva não menos atraente, para nos restringirmos apenas a dois relevantes aspectos que provavelmente seriam inviáveis se Ramos permanecesse na banda brasileira. Por outro lado, ao perdurar na zona fronteiriça, ele se tornaria um dos principais alvos de governantes de Mato Grosso, aliados aos proprietários de escravos e fazendas da província vizinha.

É importante notar que por mais que recorressem a compromissos dos tempos coloniais, as autoridades locais, de Santa Cruz e de Mato Grosso, muitas vezes deixavam transparecer que somente um acordo de limites oficial, feito pelos representantes das capitais dos novos países, poderia estipular definitivamente como seriam suas bordas,23 caso não fosse determinado pelo resultado final de um conflito bélico.24 Essa consideração das bordas diferia do período colonial, quando não raro os reis percebiam as zonas fronteiriças na América como algo “congelado” por tratados anteriores, e na prática eles eram quase completamente alheios ou desinteressados pelo que se passava nelas (Herzog, 2018, p. 202). Já no século XIX, os ajustes de limites eram uma característica dos novos Estados nacionais que surgiam nas Américas. Sem um acordo entre governantes ibero-americanos, com vastos territórios a administrar, escassos recursos e populações variadas, poderia estourar o que Centeno e Ferraro (2013, p. 7-8) chamam de “lutas geopolíticas semidarwinianas”, as quais tinham marcado a “construção inicial do Estado na Europa”. Não obstante, no centro da América do Sul, enquanto um acordo não se efetivava, representantes dos dois países promoviam movimentações nada amistosas na zona fronteiriça.

Sebastián Ramos, além de roubar gado, também era acusado de acoitar desertores, criminosos (como o assassino de um importante político de Cuiabá) e, o que causava mais indignação aos senhores de Mato Grosso, escravos fugidos do lado do Império,25 num momento em que a instituição franca da escravidão no Brasil ia se mostrando cada vez mais como o calcanhar de Aquiles nas relações internacionais do Brasil (ver Santos, 2004, p. 62),26 ao mesmo tempo em que fortalecia a união das elites políticas no Império.

A situação tornara-se mais grave com a descoberta de que Ramos estaria abrindo uma estrada de “Mato Grosso” (como viam a localização do seu rancho) até as vilas de Chiquitos. Para as autoridades brasileiras isso era bastante temerário, haja vista que ele poderia traficar com mais facilidade ainda, pois seu rancho distava apenas de “800 a 1.000 passos do leito do rio Jauru”. Também teria a seu favor o fato de seu estabelecimento situar-se somente a “3 léguas dos currais de gado” da fazenda Caiçara.27 Dessa maneira, Ramos poderia viabilizar melhor ainda o roubo de animais e a fuga de escravos, desertores e criminosos.

Valendo-se de missão diplomática brasileira em Sucre, o presidente de província de Mato Grosso, Pimenta Bueno,28 escrevia diretamente para o representante imperial solicitando a saída imediata de Sebastián Ramos do rancho das Onças, requerendo sua “interiorização” no território boliviano. Para dar força aos argumentos, as autoridades brasileiras condicionavam as “boas relações” entre o Império e a Bolívia à sua saída da região. Inclusive, para desqualificá-lo, não era difícil lembrar o episódio da anexação da província chiquitana, quando “a conduta nobre e generosa do governo Imperial do Brasil” reprovou “energicamente a incorporação de Chiquitos ao Império, efetuada por trama de Sebastião Ramos”.29

Ramos, por seu turno, além de mostrar documento de posse recebido pelo governo de Chiquitos, apresentava comprovante da anuência do anterior presidente de Mato Grosso, Antônio Pedro de Alencastro. Mas Pimenta Bueno continuava a argumentar serem nulas as doações de terras feitas naquela área fronteiriça. O título de Ramos não passava de “um formal esbulho e usurpação da posse Brasileira atual e efetiva”, praticada por “mau cálculo pelo seu antecessor” e pelo governador de Chiquitos. Tais procedimentos teriam sido feitos “ou por ignorância, ou por má-fé”.30

Na verdade, o que Alencastro fez talvez fosse o que muitos consideravam em seu tempo de governo. O território do Império do Brasil iria até o marco do Jauru, um pequeno obelisco colocado nas imediações do rio de mesmo nome, como decorrência do tratado de 1777. Assim, o então presidente reclamava ao prefeito de Santa Cruz, na Bolívia, que ele teria concedido uma outra “posse para lá do marco”,31 ou seja, a leste, na margem esquerda do rio. Já com o presidente de província Pimenta Bueno, a ideia era tomar o território de toda a grande área das Salinas, de maneira que pudesse ter controle inabalável sobre a navegação do rio Jauru, como também restringir os acessos ao rio Paraguai pela Bolívia. Daí o investimento do Império para que Ramos saísse de onde estava.

Nesse sentido, o presidente de Mato Grosso, em linguagem diplomática para o prefeito de Santa Cruz (mas que não deixava de ser ameaçadora), dizia que apesar das infrações fiscais e da acusação de roubo, somente em condições extremadas iria recorrer ao uso da força contra Sebastián Ramos.32 Assim, ainda em 1837, como resultado das queixas e pressões, as autoridades brasileiras acabaram por receber “com especial prazer” a notícia de que o “dito Ramos” desocupara as Onças e havia se mudado para outro lugar, chamado Recreio do Tremedal, “na distância de 20 léguas do Marco do Jauru”, mas ainda na região da grande área das Salinas perto do rio. O que, de toda maneira, fazia Pimenta Bueno esperar que cessassem os “comprometimentos” de Ramos na região,33 tal como tinham sido a abertura de estradas e o acoitamento de fugitivos.

Retomada e perda das Salinas do Jauru

A saída de Ramos não queria dizer que ele teria se interiorizado definitivamente pelo território boliviano. Ao contrário, permaneceu por considerável tempo como homem destacado da Bolívia na zona fronteiriça, enquanto não eram traçados os limites oficiais entre os dois países. Ali desenvolveu formas de lidar com diversas situações e grupos que interessavam ao seu país. Como afirma Foucher (2009, p. 26), a ideia de limite territorial entre países possibilita o desenvolvimento de “estratégia cotidiana dos residentes das margens”.

Era justamente nas margens que os novos países apresentavam considerável precariedade no controle de fluxos de pessoas, de trocas regulares de mercadorias e de remessas e recebimentos de bens variados. Portanto, os governos centrais procuravam suprir as deficiências de maneira institucional (como a criação de destacamentos especiais). Ao mesmo tempo, também tentavam casar as intenções político-militares dos longínquos governos com as iniciativas de indivíduos passíveis de desenvolver estratégias nas margens e dispostos a permanecer nela. Melhor seria se essas pessoas conseguissem fixar colônias nas fronteiras, como tentaram Manoel de Oliden e Maurice Bach, que ganharam direito a terras na borda oriental boliviana, dispondo inclusive de mão de obra indígena, enquanto procuravam rios que pudessem desaguar na bacia do Prata. Não obtiveram, contudo, o sucesso esperado (Fifer, 1972; Sena, 2013)

Para Guazzelli (2014, p.175), os comportamentos dos homens de fronteira, “ao que parece”, demonstram “pouca adesão à legalidade institucional”, apresentando “formas não convencionais no trato” com estrangeiros e nas “relações sociais” estabelecidas nesses espaços, fazendo recair dúvidas quanto às “suas lealdades”.34 Isso acontecia principalmente devido ao escasso controle dos Estados nas fronteiras sulinas. Sebastián Ramos, em outra zona fronteiriça, de certa maneira se aproximava dessa ideia de um homem de fronteira,35 mas que justamente por dispor de certa autonomia tornou-se adequado para as pretensões do Estado nacional que se formava nas margens.

Assim, com o propósito de ligar mais efetivamente Ramos ao governo central boliviano, contando com sua experiência em montar ranchos e a possibilidade de estabelecer colônias na zona fronteiriça, foi-lhe concedido o inédito título de Comandante General de la Línea Oriental del Paraguai, junto à patente de tenente-coronel de Cavalaria, com o respectivo soldo.36 Isso demandaria, no mínimo, sua lealdade nas disputas territoriais, haja vista que, não raro, os corpos armados eram vistos como a “Pátria en armas”.37 Dessa maneira, ao ganhar posto nas armas pelo presidente general Ballivián (1841-1847), tal qual acontecia em boa parte da América hispânica, como mostra Loveman (2001, p.258-263), eram fundidas a administração civil com as prerrogativas militares. Ao mesmo tempo, procurava-se criar uma jurisdição oficial que, na ausência de mais ocupações e pessoas, poderia, de alguma maneira, fazer frente ao Império do Brasil.

Assim, com essas honrarias Sebastián Ramos retornou ao lugar no qual antes tinha montado rancho, na grande área das Salinas. Agora militar com cargo de prestígio em sua região,38 procurou desenvolver uma trajetória visando assegurar que as terras à margem direita do rio Jauru e do rio Paraguai fossem reconsideradas como parte do território boliviano. A tensão não demorou a reaparecer.

Diante de movimentações na fronteira, Ramos escreveu para o presidente de província de Mato Grosso, com cópia e observações para o Ministério da Guerra da Bolívia, reclamando “sobre los hechos que [os brasileiros] han practicado en esta Frontera de mi mando”. Eles estavam ultrapassando “los limites de esta Republica”. Também reclamava às altas autoridades bolivianas que nunca obtivera resposta às cartas que escrevera para os comandantes das guarnições fronteiriças do Império, na ocasião, enviadas havia quatro meses. Não deixou de ser diplomático nas palavras, como o cargo exigia, e esperava que os “súbditos39 governados pelo presidente da província mantivessem “la buena harmonia, y relaciones amigables”.40 Entre “los hechos”, segundo o tenente-coronel, estava a intenção do comandante da fazenda Caiçara de construir currais naquele “lado del Marco [do Jauru]”, na “frontera de mi Residencia”.41 Ou seja, o limite de sua antiga estância fazia as vezes de limite nacional.

Por outro lado, o presidente de província Silva Guimarães, em carta para o encarregado de Negócios do Brasil em Sucre, afirmava que o administrador da “Fazenda da Nação” Caiçara acusava Ramos de ter ido para o antigo lugar que ocupava nas Salinas “com cinquenta homens armados”, e que a república boliviana estaria se preparando para a guerra. No entanto, ressalvava que não tinha “toda a certeza destes acontecimentos”, embora houvesse indagado minuciosamente bolivianos que iam para aquele lado.42

Seja como for, os indícios são de que no departamento de Santa Cruz, e mais particularmente na governadoria de Chiquitos, a qual estava subordinada à jurisdição de Ramos, havia muito pouco armamento. O que por si não impediria o ex-governador de ir à parte das Salinas que antes ocupara, como forma de desafiar o Império. Mas permanecer lá, de onde antes havia saído sob pressão dos brasileiros, parecia desde o início um difícil empreendimento, e acabou sendo situação que se configurou.

Sem explicitar sua atenção a Ramos na fronteira, o comandante-geral de Santa Cruz solicitou ao governo central seis carabinas e munições para o comandante militar da província de Chiquitos. Ele justificava tais encomendas alegando que eram necessárias para enfrentar os “índios bárbaros” que atacavam seguidamente os “naturales de la Provincia”, em “las salinas”, privando-os de fazerem uso “de ellas”. O militar considerava “imposible conseguir este armamento” no próprio departamento de Santa Cruz.43 Quando o governo central enviou sete “fuziles” (um a mais do que fora pedido, além de serem fuzis, no lugar de carabinas), foi recomendado que um deles em particular, de maior calibre, fosse entregue ao comandante da Linha Ocidental do Paraguai, Sebastián Ramos. No entanto, o prefeito de Santa Cruz notava que esse carregamento de nada adiantaria, pois não havia “uno solo cartucho” de munição, e que não tinha sequer “un grano” de pólvora na cidade de Santa Cruz para enviar à fronteira.44 Ou seja, tudo indica que a Bolívia não tinha força armada suficiente nessa borda oriental, sendo bastante duvidoso possuir “50 homens armados” para retomar as Salinas e menos ainda para fazer guerra ao Brasil.45 Isso fica mais claro ainda à medida que o governo brasileiro, em episódios diferentes, investe para tomar mais terras a oeste no período aqui abordado e a República se mostra reticente em relação a armar-se nessa área para fazer frente ao Brasil.

Nesse mesmo ano, 1843, o vice-presidente em exercício, Manoel Alves Ribeiro, reclamava ao prefeito do departamento de Santa Cruz que “dois escravos” haviam fugido, “levando consigo quatro cavalos” e indo, em seguida, “procurar guarida na Estância de Sebastião Ramos, súdito Boliviano”, onde possuía “outros escravos pertencentes a brasileiros, e que recusa entregar a seus proprietários”.46 O lugar no qual ele estava foi então considerado “território brasileiro”, de onde ele deveria ser retirado, pois “perturba[va] e inquieta[va] com suas depredações”. Ribeiro chamava atenção que “Ramos tem-se tornado célebre pelo imoral procedimento com que tem prejudicado a Brasileiros no sagrado direito de sua propriedade”, e que ele procurava comprometer a “boa inteligência e amizade que felizmente reina entre as duas nações limítrofes”. Dessa maneira, ele deveria ir “para o interior desse Departamento”, e isso era “uma das primeiras necessidades” para que a relação continuasse na paz e harmonia “duradoura”.47

Alves Ribeiro também escreveu para o representante diplomático brasileiro em Sucre, que estava lá para negociar os ajustes de limites, reclamando que o lugar de Ramos era definitivamente “brasileiro”. Além disso, o novo boliviano, de maneira “formal”, recusava a entrega de “escravos de propriedade de súditos de S. M. o imperador do Brasil”. Asseverava que, para isso, ele tinha “ordem do seu Governo para dar municiamento e passagem aos escravos Brasileiros que quiserem fugir para essa República a fim de conseguirem a liberdade”.48 Era necessário que o representante do Império na capital boliviana agisse efetivamente, pelos meios diplomáticos, para que se concretizasse a saída do ex-governador de Chiquitos da área das Salinas.

O governante, então, mandou tropas para pontos na fronteira, o que dessa vez levou os moradores da Bolívia a pensarem que o Império estava se preparando para uma guerra contra eles. Coube ao presidente de província seguinte, Zeferino Pimentel, justificar as “correrias” como atitudes que teriam unicamente o intuito de evitar fugas de escravos, sem a intenção de um conflito armado.49

De fato, não estourou nenhuma guerra, mas os governantes de Mato Grosso continuaram a pressionar para a saída de Ramos da zona fronteiriça, pessoa que personificava o incentivo à evasão de escravizados e de outros procurados pela justiça do Império, além de ser “usurpador” de suposto território brasileiro. Assim, em 1844, o presidente de província Pimentel lamentou ao constatar que o estancieiro boliviano ainda estava na “margem ocidental do [rio] Paraguai”, ou seja, na grande área das Salinas, perto do marco do Jauru. Dessa maneira, usando palavras que passaram a demonstrar uma suposta antiguidade brasileira em toda a região, mostrava que poderia tomar atitudes contundentes contra Ramos, tanto pelas terras que ocupava como por outras atitudes na zona fronteiriça, o que incluía a apropriação ou retenção de “propriedade privada” de brasileiros:

A reclamação das Salinas como território que nos pertence há muito é objeto que não devemos perder de vista, foi uma escandalosa usurpação praticada pelo Governo Boliviano, e eu acompanhando a V.S. em sustentar os nossos direitos, estou disposto a repelir (no caso de ser obrigado) a qualquer violência praticada pelo turbulento Sebastião Ramos.50

Debaixo de pressão, Ramos acabou por fazer nova retirada da área de fronteira. Dizia o então presidente de província, Ricardo Gomes Jardim, em correspondência com o representante brasileiro na Bolívia, que “[f]elizmente ele retirou-se a meses para o interior” da República. Tinha levado “os escravos e desertores que consigo tinha”, mas deixado no lugar em que se estabelecera “alguns índios e camaradas” para “manterem ocupação”.51

Nesse lugar, alguns anos depois, já existia um destacamento brasileiro, que além de procurar assegurar a nova ocupação do terreno para o Império, servia como ponto de recepção de desertores bolivianos que quisessem ser “acolhidos” pela “nação brasileira”.52 Tais movimentos fronteiriços estavam de acordo com uma nova política exterior do Império, segundo Santos (2002, p. 65), mais ativa tanto em relação ao Prata como às repúblicas do Pacífico na América do Sul. No que se referia à Bolívia, os representantes diplomáticos continuavam sem definir um acordo, o que não impedia que se movessem e traçassem estratégias na fronteira.

Colonização nas margens: criação de San Matías

Com a perda do rancho das Onças nas Salinas, a Bolívia logo reagiu. Nesse mesmo ano de 1847, autorizou a criação de uma colônia em Tremedal, onde dez anos antes Sebastián Ramos tinha permanecido temporariamente, após deixar pela primeira vez aquele estabelecimento rural. A colônia ficava na beira do rio Tremedal, ou Corixo, e segundo Ramos teria sido erguida por ordem sua.53

Até então Tremedal não tinha sido contestada como área boliviana. Mas, com a criação da colônia, o lugar passou a ser apontado pelas autoridades do Império como esconderijo de escravos fugidos. Assim, em outubro de 1848, o lugar sofreu “violenta ocupación” por tropas brasileiras. As habitações foram incendiadas, as pessoas expulsas, e desde então soldados do Império permaneciam lá instalados.

É interessante notar que essa ocupação foi precedida de uma certa tentativa de “desmonte” da mesma colônia, instigada por algumas das próprias autoridades bolivianas em Santa Cruz. Ainda em 1847, a prefeitura cruzenha solicitava ao governo central a transferência da colônia “del Tremedal” para outro lugar, pois onde estava, “em médio del bosque y com um pantano à retaguardia”, encontrava-se suscetível de em um só “golpe de mano del lado de los brasileros” tomarem um “terreno que [naquele momento] domina[va] perfectamente” a população local. O lugar também tinha a desvantagem “sobre todo” de “falta de ventilación [e de ter as] moléstias de los mosquitos”.54 Segundo o prefeito, isso teria sido solicitado justamente pelo tenente-coronel Sebastián Ramos.

No entanto, em 1852, Sebastián Ramos reclamava que quando a colônia “sentia los mejores progresos, y sus colonos [estavam] acomodados”, em fins de 1848 “fue extinguida”, de uma hora para outra, malogrando muitos sacrifícios e inclusive desembolsos do Tesouro Nacional. Mesmo assim, ainda havia colonos “al cuidado de sus intereses, cuando una fuerza brasilera se posicionó y los desalojó” de maneira bastante temerária.55

De toda forma, tudo indica que a tomada de Tremedal se deu quando lá ainda havia bolivianos. Assim, o prefeito de Santa Cruz, ainda em 1851, chegou a ameaçar conflito aberto caso o Império não devolvesse a área da ex-colônia.56 Ou seja, pode-se dizer que o interesse das principais autoridades bolivianas por essas terras era pendular.57 Contribuía muito para isso as muitas dissensões internas bolivianas, além do reduzido número de pessoas dispostas a habitar essa fronteira.

Nesse início da década de 1850, além da continuação dos questionamentos sobre a tomada da colônia, o que também tornava a situação bastante tensa era que, a partir de Tremedal, soldados brasileiros chegaram até as cercanias de Santa Ana e San Rafael - pueblos chiquitanos, territórios incontestes bolivianos, formados no período colonial por jesuítas e vários povos indígenas (entre outros, ver Moreira da Costa, 2008). Inclusive, em determinado momento, os militares do Império estavam bem perto da nova estância de Ramos. Essa informação tinha sido passada pelos índios bororos ao “Juzgado Territorial de las Salinas”.58 Esse juizado foi criado especificamente para tentar defender os interesses bolivianos na fronteira e era sediado em um lugar chamado San Matías. Juizados que tratavam de questões territoriais locais, ou seja, sem o tratado entre países, existiram na Península Ibérica antes do século XIX, quando ajuizavam sobre questões de pastoreio e demais direitos de usufruto que não envolvessem necessariamente um “anacrônico” conflito internacional entre os impérios (Herzog, 2018, p. 227-273). No entanto, a criação dessa instância, que pretendia ajuizar sobre assuntos de fronteira, era uma maneira de o governo boliviano procurar assegurar terras para o próprio Estado, quando na prática vinha perdendo espaço diante da investida de brasileiros.

É interessante considerar nessa trama da fronteira que os bororos, que alertaram o juizado sobre o posicionamento de soldados imperiais, pertenciam a uma etnia que possuía outros grupos no Brasil e também faziam da área de San Matías o seu território. Aqui, na realidade, a zona fronteiriça era lugar para onde confluíam interesses e perspectivas não apenas dos governantes, colonos, comerciantes, “súditos” e “cidadãos” ligados aos novos países, mas também de variados grupos indígenas e escravizados em fuga. As negociações com indígenas, fundamentais desde a longínqua “Conquista” e o período colonial, traziam para os próprios moradores da fronteira as contendas e soluções sobre os limites e o uso de suas áreas (ver Herzog, 2018, p. 201-203). No caso dos grupos indígenas, Boccara (2005) considera as zonas fronteiriças como territorializações justapostas de comunidades diversas, nas quais agentes governamentais procuravam se inserir e os indígenas, por sua vez, buscavam se adaptar às novas situações, para manter suas territorialidades ou, ao menos, a própria sobrevivência.

Foi na terra dos bororos, depois da desistência de Tremedal, que Ramos procurou fundar uma outra colônia, a de San Matías, com os restos da primeira, sem mencionar em seu relato que naquele lugar viviam esses indígenas. E será sua relação com esse grupo que lhe proporcionará a principal segurança na recém-criada colônia.

De toda forma, San Matías era próxima de seu novo sítio, citado por Severiano da Fonseca, no início deste artigo. O povoado que começou a se configurar, importante notar, ficava a pouca distância de um destacamento brasileiro chamado Corixa.59 Um pequeno riacho fazia papel de limite daquele lugar, para os dois países, cortando uma estrada entre a Bolívia e o Império, frequentada por viajantes diversos e vigiada pelos dois governos. A nova colonização se dava ainda dentro da genérica área da grande Salinas do Jauru, sobre a qual autoridades brasileiras urdiam para tomá-la completamente, ou quase, procurando ter o controle de qualquer possível acesso ao rio Paraguai. Assim o demonstravam as movimentações na fronteira, como também os discursos sobre qual seria o “verdadeiro limite” entre os dois países.

Tanto presidentes de província como autoridades diplomáticas imperiais passaram a desqualificar qualquer tratado da época colonial, a partir sobretudo da década de 1840. O argumento dominante era que com a guerra entre Espanha e Portugal em 1801, todos os acordos anteriores teriam sido suspensos. Depois do conflito não houve novo tratado de limites entre as metrópoles. Por outro lado, os bolivianos passaram a defender primordialmente o Tratado de Santo Ildefonso, de 1777, que asseguraria tanto a margem do rio Paraguai como a área a oeste do marco do Jauru. Contra essa ideia, os brasileiros acrescentavam que esse acordo nunca valeu, pois para sua ratificação as duas metrópoles deveriam ter demarcado a fronteira conjuntamente, com expedições in loco, conforme rezava o acordo, o que não aconteceu.60

De fato, não ocorreu uma demarcação a contento na época colonial, quando a importância de limites era diferente do que se tornaria no período pós-independência. Mas demarcar determinadas fronteiras, percorrendo-as inteiras, com comissões dos dois interessados, era algo extremamente difícil de ser cumprido, para não dizer impossível, como afirma Prescott (2015), mesmo no século XX. Isso acontecia também em colônias da África e na própria Europa, além da América do Sul. De toda forma, notadamente depois da Segunda Guerra Mundial, a própria cartografia (mesmo que sujeita a erros) substituiu as viagens demarcatórias localmente (Prescott, 2015, p. 70-77).

Para Sebastián Ramos e demais autoridades bolivianas, em meados do XIX o limite fronteiriçoera claro: permaneceria o que estipulara o acordo de Santo Ildefonso.61 Então, à medida que o Império conseguia cada vez mais controle sobre áreas a oeste do rio Jauru e à margem direita do Paraguai, mais tentava-se compensar investindo (ainda que precariamente) para assegurar San Matías, que ficou como o ponto mais avançado naquela zona fronteiriça.

Como assinalamos, o sucesso de San Matías dependeu em grande medida das relações de Ramos com os índios bororos que habitavam a região. Em sua linguagem, dizia tê-los “conquistado”. Mas, nas entrelinhas, podemos ver que houve uma certa conciliação de interesses.62 Os bororos enfrentavam conflitos crescentes com os brasileiros, principalmente a partir da década de 1840. Seus territórios eram alvo de governantes, fazendeiros e colonos, que começavam a ocupar mais a parte sul e central da província. Foram vários embates, em especial quando as autoridades provinciais procuravam construir uma estrada que ligasse Cuiabá a São Paulo, em substituição à antiga, que passava por Goiás (Sena, 2009, p. 226-255; Vangelista, 2015, p. 430).63

Um ramo dos bororos habitava parte dessa zona fronteiriça e, obviamente, sua territorialidade desconsiderava as “fronteiras nacionais” projetadas por Bolívia e Brasil. Também possuíam relações conflituosas com alguns pueblos bolivianos de Chiquitos, desde o período colonial. Em trabalho recente, Martínez (2018) mostra que as missões chiquitanas foram formadas também com a “escravização” de índios da região pelos já aldeados. Os chiquitanos realizavam a prática de excursionar para apresar novos índios em sua localidade e então contraíam matrimônio com os locais. Entre os reduzidos estavam os bororos. Na época de Ramos, segundo o próprio chefe da colônia, esses indígenas eram conhecidos pelo costume de promover ondas de ataques justamente contra pueblos das antigas missões, destruindo plantações e matando colonos (na maior parte, chiquitanos, vistos como “sedentários”, cultivadores da terra, logo, propícios a ser, “além de índios”, também “bolivianos”, notadamente em situações de contendas de fronteira). Mas essa situação de conflito teria mudado completamente com a instalação da colônia em San Matías,64 onde, segundo seu chefe, conviviam os dois grupos, com funções diferentes.

A nova colonização funcionava como colônia agrícola e também como lugar de cumprimento de pena para condenados pela justiça boliviana. Esses presos eram enviados de diversos lugares da Bolívia. Não era raro mandarem “malhechores” (malfeitores) para ficarem à “disposición” de Sebastián Ramos na fronteira.65 No mesmo lugar foram viver colonos indígenas oriundos dos pueblos de Chiquitos e estancieiros que também utilizavam mão de obra, sobretudo, de índios chiquitanos. Normalmente, também havia soldados recrutados na capital cruzenha. Como já assinalado, os bororos também eram parte da população do posto avançado, San Matías. Sebastían Ramos foi o chefe desse complexo desde seu início, recebendo para tanto o título de coronel.

Uma das principais reclamações de Sebastián Ramos para as autoridades bolivianas era sobre a “qualidade” dos soldados enviados para San Matías. Não era raro desertarem para o Brasil, aproveitando a pouca distância do destacamento do Corixa. Segundo o ex-governador, por várias vezes, “seduciendo a algunos condenados”, empreenderam fuga em vez de serem “guardiones de los confinados”.66 Houve casos em que saquearam os “indígenas colonos” e ainda levaram consigo as “mujeres” dos agricultores, deixando seus filhos “huérfanos”. Para Ramos, eram enviados para o lugar as piores pessoas das “calles”, que só serviam para “desmoralizar” o lugar, causando “graves prejuícios”.67

O que acontecia do outro lado da fronteira, no Brasil, não era muito diferente. Soldados de Mato Grosso também desertavam para a Bolívia, promovendo roubos e pavor entre parte da população. Por vezes também se juntavam a procurados pela justiça, de criminosos comuns a escravos evadidos, para fugir dos agentes da lei ou mesmo para ganhar a vida, como os que se uniram a quilombolas de Mato Grosso (Santos, 2012, p. 218-227).

Em San Matías, Ramos dizia dar conta dos presos, e da colônia como um todo, graças à cooperação dos bororos. Faziam “todo servicio público”. Mas os indígenas gostavam mesmo era de “conducir” ou “perseguir los confinados” que empreendiam fuga. O chefe da colônia dizia que não contava com mais força do “que la dos bororos” naquele ponto avançado da fronteira.68 Em 1859, considerava ter contido por muitos anos “repetidos avances” dos brasileiros, por sua conta, graças ao apoio de seus próprios “servientes” e dos “bárbaros Bororos”. Tinha esses indígenas como “los mejores” e mais “fieles servidores” do governo. Dizia que, sem nenhuma dúvida, eram muito mais valiosos que “los soldados destinados” àquele destacamento.69

Interessante notar que Ramos não solicitava urgência nem fazia planos para que os bororos fossem reduzidos por clérigos, como acontecia na “fronteira interna” da Bolívia em relação a outros povos, como faziam os franciscanos em relação aos guaraios (ver García Jordán, 2001). Inclusive, Mato Grosso, desde a década de 1840, quando se tem uma política nacional para os indígenas, não era raro requererem padres para trabalhar junto a variados grupos para os reduzir, principalmente perto da fronteira com a República do Paraguai.70 Na verdade, havia uma série de práticas e discursos relacionados aos indígenas no século XIX, enunciados nas demandas da formação nacional. Por outro lado, os próprios indígenas faziam suas demandas e estratégias diante das políticas aglutinadoras, assimilacionistas ou de segregação, que variavam com o tempo.71 De toda forma, de alguma maneira os bororos perceberam vantajosa sua relação com o chefe da colônia, e era a forma como esses indígenas viviam que interessava a Ramos. Sem vislumbrar nenhum controle maior ou modificação do modo de viverem, esperava neutralizar os avanços dos brasileiros e os problemas de policiamento em sua colônia. De outra maneira, poderia ser tão inconveniente aos bororos quanto os brasileiros.

Foi nesse mesmo ano que Ramos começou a enfrentar um contundente inimigo interno. Era o novo chefe político72 de Santa Cruz, Corsino Balza, enviado pelo presidente José María Linares, que havia subido ao poder em 1857. A administração do “odioso Ramos”73 - conforme ele mesmo reproduzia as palavras que lhe haviam sido dirigidas - passou a ser desqualificada, e a colônia de San Matías a ser ameaçada de extinção. Então, entre 1859 e 1861, o coronel endereçou várias cartas para o Ministério da Guerra, por ser militar na fronteira, e para o Ministério do Interior, por ser chefe de colônia. Nelas fazia uma autorrepresentação e uma descrição de parte de sua vida na fronteira. Infelizmente, não encontramos a “normativa” de Balza que tanto afligiu Ramos. Contudo, por suas respostas, podemos perceber as acusações que procurava rebater: queriam extinguir a colônia e, consequentemente, a sua chefia nos limites da República.

Sebastián Ramos relatou suas atividades do passado e daquele momento, ressaltando seus feitos, traçando uma linearidade na sua trajetória. Assinalou que o sentido primordial de suas ações era defender a fronteira e o território bolivianos. Do seu relato, excluiu a parte em que fora monarquista e sua resistência à implantação da República, principalmente por ocasião da invasão de Chiquitos por tropa brasileira, em 1825. Para se diferenciar de seu litigante, naquele momento, dizia ser natural de Santa Cruz, portanto vivia em sua pátria, e que Balza era forastero.74 Nessa época, o termo “pátria” ainda podia ter o significado de lugar de nascimento, derivado de “paisagem” e “país”, mas já poderia ser aplicado com o viés das novas nacionalidades. Balza poderia ser um forasteiro somente em relação a Santa Cruz. De toda forma, com certa afirmação do Estado nacional, notadamente ao longo do século XIX, “pátria” e “país” tendiam a tentar apagar suas heterogeneidades regionais e culturais, procurando dar lugar a um único território do Estado-nação, envolvendo regiões e pessoas diferentes em um mesmo espaço geográfico e político (ver Quijada, 2003, p. 299-306).

Ramos salientava os relevantes serviços prestados ao novo país e as qualidades da região que administrava. Assim, já deveria ser conhecido como o “descobridor” do marco do Jauru - o citado monumento colocado nos pantanais como a pedra divisória de Espanha e Portugal, por ocasião do tratado de 1777, mas que no tempo nacional seus coevos demonstravam não ter conhecimento de seu lugar preciso. Naquele momento, para as autoridades bolivianas, o pequeno obelisco deveria ser a baliza entre o território da Bolívia e o Império do Brasil. Apesar de os brasileiros terem ocupado “una buena parte de terreno”, precisamente ultrapassando aquele marco, a região ocupada por San Matías, ainda assim, fazia dela um dos melhores pueblos da província de Chiquitos.75 Ramos, então, procurava destacar a sua pátria chica, para que a pátria mayor, a pátria nacional em construção, reconhecesse o valor e as possibilidades daquela área, cujas fronteiras vinham sendo lesadas paulatinamente.

Segundo o coronel, para desenvolver a região ele percorreu centenas de léguas, o que lhe possibilitou abrir estradas conectando vários pueblos, sem custo algum para o Estado. Havia deixado seus afazeres em sua instância para se concentrar na condução de San Matías. Da mesma maneira, impediu várias vezes os avanços dos brasileiros e, nos últimos tempos, isso era possível graças ao sucesso de seu relacionamento particular com os bororos. Assim, o destino da colônia, a defesa do território boliviano e a sua própria razão de viver naquelas paragens demonstravam ser umbilicalmente unidos. Daí, reforçava que lá era, sim, uma “importante frontera”, e não poderia ser abandonada,76 procurando contrabalançar a política do governo central, que normalmente envidava mais esforços nas fronteiras ocidentais.

Na verdade, os sucessivos governos centrais bolivianos tinham como principais limites os que se avizinhavam ao Chile e Peru. A região andina era muito mais povoada do que a parte baixa da Bolívia. O departamento de Santa Cruz de la Sierra tinha cerca de 79 mil habitantes, enquanto uma população calculada de aproximadamente 1,4 milhão, em 1849 (Dalence, 2013, p. 229), vivia majoritariamente nas zonas de montanha e do lado ocidental do país. Dessa maneira, as preocupações exteriores eram acentuadamente direcionadas aos países limítrofes andinos e banhados pelo Pacífico, enquanto as terras baixas, naquele momento, se mostravam muito pouco compensadoras para os parcos investimentos nacionais.

Finalmente, naquele ano de 1861, Ramos dizia querer deixar suas atribuições na zona fronteiriça e retirar-se para cuidar de sua saúde e zelar pelos próprios negócios. É a última carta que encontramos de seu próprio punho. Mostrava que pesou bastante para essa decisão o desentendimento entre os bororos e colonos chiquitanos. Os primeiros teriam, de uma hora para outra, passado a atacar os segundos, tal como faziam no passado. O chefe da colônia não conseguia restabelecer o convívio entre esses grupos em San Matías. Como observa Almeida (2017), desde o início da colonização do Brasil (mas também no restante da América) os indígenas, no lugar de meros passivos ante os europeus e à sociedade envolvente, impuseram limites e possibilidades aos que procuravam avançar em suas terras e utilizar-se de sua mão de obra. Ramos, então, sem o apoio dos bororos, demonstrava não ter mais forças para continuar ocupando o cargo. Entretanto, pedia que fosse mandado para o seu lugar alguém com qualificações para o difícil posto.77

San Matías não foi extinta. Continuou sendo um povoado bem pequeno até o século XX, quando recebeu migração tanto de outras partes da Bolívia como da Europa (Cuéllar, Yavarí, 2008, p.73). Mesmo diminuta, perdurou o suficiente para, no primeiro acordo sobre limites entre Brasil e Bolívia, em 1867, ser a parte mais avançada de uma linha horizontal quase reta que “entra” onde antes seria território “espanhol”, para tornar-se parte do território brasileiro. O vilarejo era um ponto a leste, quando antigos lugares reivindicados como bolivianos - como foi El Tremedal, a área oeste das salinas do Jauru, e mesmo grande parte da ribeira direita do rio Paraguai - ficaram como integrantes do Império do Brasil.

Considerações finais

A trajetória singular de Sebastián Ramos é uma amostra privilegiada para se compreender parte do jogo entre países ao traçarem suas bordas territoriais na zona de fronteira, como decorrência da formação dos novos Estados nacionais. Antes de um decisivo acordo oficial, indivíduos e grupos (governamentais ou não) se relacionaram, posicionando-se geograficamente para explorar as possibilidades de trânsito ou de permanência, além de se conflitarem, em uma área remota aos governos centrais.

Aqui procurou-se perceber a fronteira da maneira que, ao menos em boa parte, era vislumbrada pelo próprio Ramos e por seus coevos: uma área para onde confluíam diversos grupos e indivíduos e onde os Estados nacionais pretendiam estabelecer seus limites, como decorrência da própria reconsideração do solo onde pisavam, agora, “território nacional”. Não é o caso de retomarmos as teses turnerianas de frontier e mostrar sua inaplicabilidade ao restante da América ou mesmo para o lugar onde foram projetadas; nem de “desfazer” a “confusão” tida como usual entre “limites” e “fronteira”, ou frontier e boundary.78 A fronteira que começa a emergir para Ramos, e a outros de sua época, notadamente a partir de meados da década de 1830 - quando o ex-governador se transformou em “boliviano” -, era a que existia em uma área entre os novos países, onde, mais cedo ou mais tarde, deveria existir uma linha limítrofe, traçada oficialmente, separando, ainda que apenas simbolicamente, as duas nacionalidades vizinhas. Isso tornou-se uma prerrogativa dos novos Estados que surgiam: ter seu território delimitado, pois nele residiria também a soberania da nova nação.

A trajetória de Ramos nessa área estava longe de se desenrolar em um quadro fixo, como se estivesse à espera de um tratado oficial. Tratava-se de uma fronteira em movimento, com a percepção de suas bordas variando entre os representantes dos países, em poucas décadas, antes do tratado oficial. O próprio Sebastián Ramos, desenvolvendo atitudes e ideias não perfeitamente lineares, era um elemento integrante desse quadro dinâmico que, no seu conjunto, acabou por ser considerado (para os dois lados da fronteira) um dos maiores obstáculos à expansão brasileira a oeste, antes do acordo de limites. Ou seja, Ramos, com seus deslocamentos,antes de ser enquadrado por uma “janela da história”,79 também deslocava e reformulava as percepções de como se encontrava a zona fronteiriça.

Muito da possibilidade de trânsito e fixação de Sebastián Ramos deveu-se à sua maleabilidade em transitar por esferas culturais distintas, atuando como governador de província, como afazendado exilado, militar e chefe de colônias agrícola e presidiária. Ter se casado com uma índia80 também é um indício de sua habilidade em tratar com grupos distintos, o que várias vezes lhe permitiu fazer frente aos brasileiros que procuravam literalmente ganhar terreno pelas armas (o que inclui ameaças) e não pela diplomacia.

Se a trajetória de Ramos é marcada também pela inconstância dos governos em apoiá-lo na zona de fronteira, ele não deixa de estar ligado ao Estado justamente por sua possibilidade de levantar arranchamentos e mantê-los com certa autonomia, em uma região disputada por dois novos países. Isso lhe permitia acoitar desertores e escravizados fugidos do Império, tratar com diferentes povos indígenas, comandar soldados, abrir trilhas, dirigir e participar de complexos fronteiriços, como foram suas colônias. Por outro lado, sua “autonomia” de transitar e se estabelecer em lugares de difícil acesso também era “restringida”, no sentido de certa limitação, devido a deveres e honrarias específicas, ligados aos títulos que recebeu, à carreira militar em que foi promovido, além de seus soldos e concessões de terras fornecidas pela República.

Estudos recentes mostram que na época colonial, na zona de fronteira entre os impérios ibéricos na América, bulas papais e tratados oficiais eram desconsiderados pelos que viviam ali. Eram os próprios moradores que praticamente definiam os limites de jurisdições ou ações locais. As “violações” cotidianas de territórios nessa parte do mundo pouco ou nada importariam efetivamente aos governantes máximos das coroas ibéricas, como apontou Herzog (2018). No caso aqui tratado, durante as primeiras décadas de formação dos Estados nacionais, época de mudança quanto à ideia de limites de territórios, Sebastián Ramos não prescindia do reconhecimento do governo central para os seus vários posicionamentos geográficos. Seus títulos e posses eram advindos do governo central, justamente para que continuasse na sua peleja fronteiriça. Se as autoridades em certas ocasiões elencavam (mesmo que por vezes contraditoriamente) tratados antigos, da época colonial, nada estava garantido sobre como seriam as bordas durante boa parte do século XIX. Daí toda a movimentação de ambos os lados. A tomada, o recuo e a fixação de pessoas ligadas aos governos em áreas da zona fronteiriça, se não delimitavam oficialmente a linde entre os dois países, mostravam o respaldo governamental ou a ciência dos posicionamentos na margem pelas autoridades, o que por vezes beirava a fagulha no estopim de uma guerra aberta, nos confins dos dois países.

Entre idas e vindas na região fronteiriça, a trajetória de Ramos culminou com a fundação da colônia de San Matías. Aí passou a ver como decisiva a aliança com os bororos, então perseguidos no Brasil, para procurar assegurar a inviolabilidade do território nacional projetado. Quando esses índios retomaram práticas antigas de ataque aos colonos chiquitanos, o chefe da colônia demonstrou o limite de seu entendimento com os indígenas e também de sua disposição física, ambos necessários para a colônia funcionar sob seu comando. Mesmo assim, sua compreensão sobre esses indígenas não o fez aventar a hipótese (ou ao menos iniciar esforços significativos) de reduzi-los ao cristianismo e à República, comum em outras áreas também carentes de pessoas para povoar áreas de fronteira.

Poucos anos depois, quando se dá o primeiro tratado que estabelecia os limites entre os dois países, em 1867, San Matías permaneceu como o ponto mais a leste de uma linha demarcatória que “entra” a oeste. No entanto, essa divisão colocava “dentro” do Império do Brasil lugares por onde antes Ramos passou e os quais defendeu.

Em geral, depois de se tornar boliviano, em todos os pontos na fronteira em que permaneceu Ramos sabia como poderia enfraquecer (ou ao menos admoestar) o oponente, por exemplo, abrigando quem fosse perseguido pelas autoridades do Brasil. Por outro lado, em contrapartida, o Império, agindo localmente, foi muito além dessa prática de receber fugitivos da Bolívia: os posicionamentos geográficos de Ramos na fronteira acabaram por servir de pretexto para que, depois de pressionado a sair de onde se arranchara, brasileiros ocupassem esses mesmos lugares, além de outros próximos. E foi isso que terminou por caracterizar os embates territoriais entre Ramos e os governantes brasileiros.

O tratado de 1867 garantiria definitivamente os terrenos que o Império passou a controlar, em prejuízo das pretensões bolivianas; por outro lado, liberaria à República a navegação pelas bacias platina e amazônica. No entanto, aqui não foi o caso de tratar o acordo oficial em si, mas sim mostrar a dinâmica da zona fronteiriça pelos calços e percalços de um indivíduo. Reduzir o foco de análise à trajetória de uma pessoa pode corroborar para uma visão mais diversificada e (por que não?) mais rica do que a simples sequência de tratados oficiais (entre metrópoles e, depois, entre Estados nacionais), assinados por representantes de suas respectivas capitais, perspectiva que acaba conferindo às movimentações extraoficiais na fronteira a designação de meras “penetrações de bandidos irregulares”.

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  • 1
    Termo legado pelo período das “conquistas”; ver Loveman (2001).
  • 2
    Por exemplo, em documento destacado sobre a “presença indígena” em Vila Maria, atual Cáceres. Ver Almeida, M. A. (2011).
  • 3
    Vale notar, no exíguo espaço, que Avelar (2018) observa que, tomando-se os títulos mais conhecidos, como O desafio biográfico, “A biografia como problema” etc., os estudos de trajetórias se caracterizam por incessante afirmação de suas virtudes e importância.
  • 4
    Entre outros, ver Chiaramonte (2004).
  • 5
    Como os sempre recordados Tordesilhas (1494), Madri (1750), Ildefonso (1777) e, especificamente para a Bolívia e o Brasil, o de Ayacucho de La Paz (1867).
  • 6
    Até aproximadamente 2013, esses documentos ficavam na “Caja 8” desse arquivo.
  • 7
    Incluindo publicações sobre suas regiões.
  • 8
    François-Xavier Guerra (2009) localiza essa tentativa de “nacionalidade” na Espanha na segunda metade do século XVIII, embora ganhe realmente força com a formação dos Estados nacionais no XIX.
  • 9
    Desde a criação do Vice-Reinado do Prata havia uma disputa econômica e política entre Buenos Aires e a capital do antigo Vice-Reinado do Peru, quando o Alto Peru (Charcas) passou a ser território platino. Durante as guerras de independência, essa rivalidade foi acirrada. Ver Lobos (2015, p. 445-455).
  • 10
    Essa província foi perdida após a Guerra do Pacífico (1879-1883). Até hoje governantes bolivianos procuram reavê-la por ações em cortes internacionais.
  • 11
    Tal ano, 1834, foi assinalado em 1837 pelo então presidente de Mato Grosso. Arquivo Público do Estado de Mato Grosso (daqui para a frente, APMT), Registro de Correspondência com as Províncias e a Bolívia (daqui para a frente, RCPPB), “Pimenta Bueno para Ministério das Relações Exteriores da Bolívia”, Cuiabá, 3 jun. 1837.
  • 12
    Infelizmente, as fontes não são citadas. Grifo nosso.
  • 13
    Entre outros, pode-se observar o “caráter pacífico” em um compilado de textos “clássicos”, produzidos em épocas distintas, em Corrêa (2016).
  • 14
    A ideia de tradição pacífica tem efeitos práticos para considerações de políticas contemporâneas, o que não significaria, necessariamente, um “erro”. Ver, por exemplo, Brigagão e Fernandes (2012). Isso, claro, antes da atual tentativa de degeneração dos vetores diplomáticos.
  • 15
    Em meados da década de 1830, a expressão Províncias Unidas do Prata deixou de ser usada, alterando-se para Confederação Argentina, quando Juan Manoel Rosas passava a despontar política e militarmente. Ver Salvatore (2005, p. 365-375).
  • 16
    Seria necessário navegar pelas principais veias da bacia do Prata, o que significava, nesse tempo, estar acordado com Paraguai, Buenos Aires, parte do interior da Argentina e com blancos e/ou colorados que controlavam trechos fluviais do Uruguai. Somente depois da Guerra do Paraguai (1864-1870) é que tal possibilidade se tornaria mais frequentemente viável. Ver Doratioto (2002, p. 23-59; p. 461-463).
  • 17
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Marcelino de La Penha”, Cuiabá, 5 set. 1836.
  • 18
    Não cabe aqui discutir ou mesmo referendar “qual” seria o parâmetro jurídico “verdadeiro”, válido para essa e outras épocas, o qual poderia discernir indubitavelmente a “linha” que separaria tanto o império espanhol do português como a Bolívia do Brasil, embora tratemos dos debates e considerações e, sobretudo, das posições geográficas do período aqui analisado, o de Ramos na fronteira.
  • 19
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Marcelino de La Penha”, Cuiabá, 5 set. 1836.
  • 20
    “Província” era uma unidade governamental menor do que “departamento”. A província possuía seu governador, enquanto o departamento era governado por seu “prefeito”. Um departamento, portanto, abrangia várias províncias, com seus governadores subordinados ao prefeito. Em termos comparativos, o departamento era próximo ao que seria a província no Império do Brasil.
  • 21
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Duarte da Ponte Ribeiro, Encarregado dos Negócios do Brasil em Chuquisaca”, Cuiabá, 11 maio 1838.
  • 22
    Mais de uma década depois, o patriotismo tanto em relação a Santa Cruz como à República da Bolívia faria parte de suas cartas.
  • 23
    Ver, por exemplo: Archivo y Biblioteca Nacionales de Bolivia (daqui para a frente, ABNB), Ministerio de las Relaciones Exteriores (daqui para a frente, MRREE), Caja 8, “Crispiniano Soares para Fermin Rivero”, Cuiabá, 29 abr. 1847.
  • 24
    Na própria região chaquenha da Bolívia, já no século XX a Guerra do Chaco (1932-1935) definiria as fronteiras entre a república boliviana e o Paraguai. Este, por sinal, foi um dos principais participantes do maior conflito armado na América do Sul, a Guerra do Paraguai ou da Tríplice Aliança, que também redundou na definição de limites.
  • 25
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para o Ministro das Relações Exteriores de Bolívia”, Cuiabá, 3 jun. 1837.
  • 26
    Sobre a fuga de escravos do Império para a Bolívia, e a continuação da escravidão negra após a independência boliviana, ver Sena (2018) e Revilla Orías (2014).
  • 27
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Duarte da Ponte Ribeiro”, Cuiabá, 10 jun. 1837.
  • 28
    Futuro marquês de São Vicente e diplomata ativo do Império, em seu início de carreira funcional.
  • 29
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Duarte da Ponte Ribeiro”, Cuiabá, 10 jun. 1837.
  • 30
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Duarte da Ponte Ribeiro”, Cuiabá, 10 jun. 1837.
  • 31
    APMT, RCPPB, “A. Alencastro para M. de la Peña”, Cuiabá, 19 dez. 1835.
  • 32
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para M. de la Peña”, Cuiabá, 19 jul. 1837.
  • 33
    APMT, RCPPB, “J. Antônio Pimenta Bueno para Coronel D. Pedro J. Urtuby, Governador e Chefe da Província de Chiquitos”, Cuiabá, 7 nov. 1837.
  • 34
    Ao genérico “homens”, podemos acrescentar que mulheres também faziam suas estratégias relacionadas à fronteira, como a escravizada Benedita Luiza (ver Sena, 2018).
  • 35
    No caso, em vez de tratos “não convencionais” com estrangeiros, Ramos desenvolveu com o grupo indígena bororo uma relação bastante diferente daquela de governantes e soldados, sobretudo brasileiros. Veremos adiante.
  • 36
    ABNB, MG, 1843, “Ejercito Boliviano - Pressupuesto […] el haver que los corresponde a Jefes y Oficiales en el mes. Miguel García”, Santa Cruz, 9 mayo 1843.
  • 37
    Ver Thibaud (2003, p. 371-378). A Cavalaria em especial, imitando as formas aristocráticas, não raro proporcionou alianças com antigos patrões e grandes terratenentes.
  • 38
    Por exemplo, foi nomeado Nicolas Ramos para o cargo de “Economo del Pueblo de San Ignácio” pela prefeitura, que além de possuir “capacidad y honrades”, reunia “la calidad de ser hijo del Coronel Sebastián Ramos que actualmente sirve a la Nación de Comandante de la línea occidental del Paraguay”. Museo y Archivo Histórico de Santa Cruz (Daqui para a frente, MAHSC), Fondo Prefectural, 1/29-27, / legajo 28, “José Matías Carrasco para Ministro del Interior”, Santa Cruz, 3 feb. 1844 (grifos nossos).
  • 39
    Não seria o caso aqui de tratar das discussões, disputas e propagandas sobre os regimes mais apropriados aos países que se “libertavam” de sua metrópole. Mas o termo ‘súditos’, ao se referir aos brasileiros, ao menos marcava a suposta vantagem dos ‘cidadãos’ que surgiam em grande parte da América.
  • 40
    ABNB, MRREE, Caja 1843-1847, “Comandante General de la Línea Occidental del Rio Paraguay para Presidente de la Provincia de Mato Grosso”, Salinas, 28 oct. 1843.
  • 41
    ABNB, Ministerio de la Guerra (Daqui para a frente, MG.), 1843, n. 30.
  • 42
    APMT, RCPPB, “J. S. Guimarães para J. C. Rego Monteiro, Encarregado de Negócios do Brasil”, Cuiabá, 15 jul. 1843.
  • 43
    ABNB, MG, 1843, “Comandante General de Santa Cruz al Ministro de la Guerra”, Santa Cruz, 27 abr. 1843.
  • 44
    ABNB, MG, 1843, “Comandante General de Santa Cruz al Ministro de la Guerra”, Santa Cruz, 26 sep. 1843.
  • 45
    O maior investimento de armas e soldados era nas áreas do altiplano, onde parte fazia fronteira com Peru e Chile.
  • 46
    APMT, RCPPB, “A. Ribeiro para Prefeito do Departamento de Santa Cruz de la Sierra”, Cuiabá, 1º set. 1843.
  • 47
    APMT, RCPPB, “A. Ribeiro para Prefeito do Departamento de Santa Cruz de la Sierra”, Cuiabá, 1º set. 1843.
  • 48
    APMT, RCPPB, “A. Ribeiro para J. C. Rego Monteiro, Encarregado do Negócios do Império do Brasil junto à República da Bolívia”, Cuiabá, 2 set. 1843.
  • 49
    APMT, RCPPB, “P. Moreira Freire para Prefeito do Departamento de Santa Cruz”, Cuiabá, 12 mar. 1844.
  • 50
    APMT, RCPPB, “Z. P. Moreira Freire para J. C. Rego Monteiro”, Cuiabá, 17 jun. 1844. (Grifos nossos)
  • 51
    APMT, RCPPB, “G. Jardim para J. C. Rego Monteiro”, Cuiabá, 5 maio 1845.
  • 52
    ABNB, MRREE, Caja 8, 1847, “Quartel do destacamento militar das Onças. Tenente-Coronel Antônio José da Silva Negrão para Tenente-Coronel S. D’Ávila”, Comando Militar da Fronteira das Salinas, 6 jan. 1847.
  • 53
    ABNB, MG, 1858, n. 6, “Coronel i Jefe Militar de la Colonia de San Matias al Ministro de la Guerra”, San Matías, 6 ago. 1852.
  • 54
    MAHSC, Fondo Prefectural, “Notas y circulares dirigidas a provincias, prefecturas, ministerios y demás autoridades”, La Paz, 20 ago. 1847.
  • 55
    ABNB, MG, 1852, “S. Ramos para Secretaria de la Guerra”, Colonia de San Matias, 6 ago. 1852.
  • 56
    ABNB, MRREE, 1843-1889, “Prefectura del Departamento al Presidente de Mato Grosso”, Santa Cruz, 5 feb. 1851.
  • 57
    Foi no período de Ballivián (1841-1847) que houve mais esforços governamentais em relação à colonização, no século XIX. No entanto, visava muito mais à “frontera interna” boliviana do que à externa. Ver García Jordán (2001).
  • 58
    ABNB, MRREE, Prefec. SC, 1843-1889, “Juzgado Territorial de las Salinas al Administrador de Sagrado Corazón”, San Matías, 29 dic. 1850.
  • 59
    Corixa é um nome derivado do termo “corixo”, muito usado nessa região fronteiriça para designar um braço de rio, ou riacho, sujeito às cheias e vazantes dos pantanais. Como substantivo próprio, como notamos, além de rio havia também lugar com esse nome.
  • 60
    ABNB, MRREE, Caja 8, “Crispiniano Soares para Fermin Rivero”, Cuiabá, 29 abr. 1847; APMT, RCPPB, “Pimenta Bueno para o Ministro das Relações Exteriores de Bolívia”, Cuiabá, 3 jun. 1837.
  • 61
    ABNB, Ministerio del Interior (Daqui para a frente, MI), Tomo 166, “Jefe de la Colonia de San Matías al Ministro del Interior”, San Matías, 29 sep. 1859.
  • 62
    Almeida, M. R. C. (2011) chama atenção para a renovação da historiografia sobre índios, mostrando que apesar dos grandes reveses, como a total desestruturação de alguns povos durante o século XIX, muitas comunidades indígenas participavam das disputas entre estados e regiões, apoiando de um lado ou de outro, em determinado momento, de acordo com “interesses específicos vinculados às suas trajetórias”.
  • 63
    Sobre as várias designações e áreas ocupadas pelos bororos, ver Rocha (2016, p. 19-41).
  • 64
    ABNB, MI, T. 174, “S. Ramos para despacho de Governo” San Matías, 6 ago. 1861.
  • 65
    MAHSC, Fondo Prefectural. 2/61-17, “Nicolas Cuellar para Gobernador de la provincia de Chiquitos”, Santa Cruz de la Sierra, 13 sep. 1856.
  • 66
    ABNB, MG, 1860, “Jefe de la Colonia San Matías a el Señor Secretario de la Guerra”, San Matías, 21 nov. 1859.
  • 67
    ABNB, MI, T. 170, “Chefe da Colônia de San Matías para Ministro do Interior”, San Matías, 30 mar. 1860.
  • 68
    ABNB, MI, 166. “S. Ramos al Ministro del Interior”, San Matías, 1º mar. 1859.
  • 69
    ABNB, MG, 1859, “S. Ramos al Ministro de la Guerra”, Colónia de San Matías, 21 nov. 1859.
  • 70
    Sobre a política indígena do Império, inclusive em suas fronteiras, a apropriação da mão de obra indígena, além de suas terras, e a luta pela identidade indígena, inclusive nos dias de hoje, conferir Almeida (2012).
  • 71
    Para o período anterior ao decreto imperial de 1845, que rezava sobre a “Catequese e civilização dos índios”, ver Sposito (2012).
  • 72
    “Chefe político” era basicamente uma mudança de nomenclatura, em substituição naquele momento a prefeito de departamento.
  • 73
    ABNB, MG, 1859, “S. Ramos al Ministro da la Guerra”, Colónia de San Matías, 6 ago. 1861.
  • 74
    ABNB, MG, 1859, “S. Ramos al Secretario de la Guerra”, San Matías, 21 nov. 1859.
  • 75
    ABNB, MI, T. 174, “S. Ramos al Ministro del Interior”, San Matías, 6 ago. 1861.
  • 76
    ABNB, MI, T. 174, “S. Ramos al Ministro del Interior”, San Matías, 6 ago. 1861.
  • 77
    ABNB, MI, T. 174, “S. Ramos al Ministro del Interior”, San Matías, 6 ago. 1861.
  • 78
    Nesses sentidos, ver, entre outros, Ratto (2005) e Machado (2000).
  • 79
    Como Priore (2018) sugere que a biografia seria para a história.
  • 80
    Para os propósitos deste artigo, não caberia aqui discutir sobre processos de miscigenação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    25 Set 2018
  • Aceito
    13 Ago 2019
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