Open-access Reforma Psiquiátrica no Rio de Janeiro: situação atual e perspectivas futuras

Resumo

O artigo analisa a rede de saúde mental do município do Rio de Janeiro, objetivando efetuar um balanço sobre a atual situação da implementação da Reforma Psiquiátrica e apontar avanços, limites e desafios. Foi realizada pesquisa documental através de documentos oficiais, portarias, bancos de dados do SUS e informações disponíveis na Superintendência de Saúde Mental do Município do Rio de Janeiro, e revisão de literatura especializada em artigos científicos nacionais e internacionais. Os resultados apontam para importantes avanços na desinstitucionalização da assistência, com substantiva redução de leitos psiquiátricos e aumento dos dispositivos comunitários. Entretanto, permanecem ainda como desafios importantes: o aumento de cobertura dos centros de atenção psicossocial, a implantação de leitos psiquiátricos em hospitais gerais, a integração da saúde mental com a atenção primária, a desinstitucionalização de pessoas em situação de longa permanência hospitalar, a ampliação do quantitativo de dispositivos residenciais e o aumento da provisão dos serviços específicos para pessoas em uso prejudicial de álcool e outras drogas.

Desinstitucionalização; Saúde mental; Reforma psiquiátrica; Brasil

Abstract

This article analyzes the mental health network in the city of Rio de Janeiro. It provides a report on the current status of the implementation of psychiatric reform and identifies progress, limitations and challenges in this area. Documentary research was carried out by examining official documents, ordinances, SUS databases, information that was available at the Superintendency of Mental Health of the city of Rio de Janeiro, and a literature review of Brazilian and international scientific articles. The results point to important advances in the de-institutionalization of care, with a substantial reduction in the numbers of psychiatric beds, and increased community facilities. However, the following significant challenges remain: the need for increased coverage by psychosocial care centers; the implementation of psychiatric beds in general hospitals; the integration of mental health with primary health care; the de-institutionalization of people who remain in hospitals for long periods; the expansion of the number of residential facilities; and an increase in the provision of specific services for people using alcohol and other drugs.

De-institutionalization; Mental health; Psychiatric reform; Brazil

Introdução

A reforma psiquiátrica brasileira surge nos últimos anos da década de 1980, em tempos de reconstrução democrática da sociedade com o fim da ditadura militar, em um contexto de reforma do setor saúde. A I Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em 1987, pode ser considerada o momento inaugural da Reforma. Seus antecedentes se encontram no final dos anos 70, quando diversos segmentos da sociedade ligados a luta contra o regime militar organizaram o Movimento Nacional de Luta Antimanicomial, voltado para buscar radicais transformações no campo assistencial público, em uma saúde mental que superava o modelo asilar em um sistema de saúde que garantia uma atenção universal1.

Dado o começo tardio do processo brasileiro, já se conheciam as dificuldades e acertos dos processos de reforma psiquiátrica que o antecederam, a complexidade de um processo assistencial que cria novos sujeitos, antes ocultos atrás dos muros dos manicômios, novas demandas e novos direitos. A necessidade de uma rede sociossanitária ampla e de uma organização que devia atender não só as pessoas desospitalizadas, mas também os novos perfis de cronicidade e de sofrimento psíquico2.

O processo de desinstitucionalização ganhou intensidade na década de 1990, com a incorporação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) na estrutura de serviços do Sistema Único de Saúde, estando em curso no Brasil, um processo de Reforma Psiquiátrica voltado a superar a supremacia do modelo assistencial centrado no hospital psiquiátrico, com seu efeito de exclusão dos portadores de transtornos mentais do seio da sociedade. Esta transformação foi chancelada pela promulgação da Lei nº 10.216 de 06/04/20013, que redireciona o modelo assistencial em saúde mental na direção da atenção comunitária, da integração social e a produção da autonomia das pessoas, sendo também balizada pelas diretrizes políticas da III Conferência de Saúde Mental, realizada no mesmo ano1.

Como resultado desta política, os leitos em hospitais psiquiátricos do SUS foram reduzidos dos 85.000 existentes, ao final da década de 1980, para menos de 26.000, em 2014, com a implantação concomitante de mais de 2.200 centros de atenção psicossocial e de quase 700 residências terapêuticas para pacientes que se encontravam em situação de longa permanência4.

Seguindo as diretrizes da política nacional, a política de saúde mental do Rio de Janeiro tem apontado para um desmonte paulatino do importante conjunto de leitos em hospitais psiquiátricos constituído na cidade. Esta estrutura hospitalar foi em parte herdada do governo federal (três unidades municipalizadas, a partir de 1996) e em parte fruto da intensa política de privatização das décadas de 1960 e 1970.

A saúde mental consolidou-se como política municipal efetiva a partir de 1996, no contexto da realização de um censo dos pacientes internados nos hospitais psiquiátricos da cidade, que apontava para um significativo número de pacientes em situação de longa permanência e uma concentração da assistência nos equipamentos hospitalares5,caracterizando um quadro de atenção custoso e inadequado. A constatação da necessidade de mudança no modelo teve como efeito a implantação dos primeiros Centros de Atenção Psicossocial (o primeiro em 1996), seguida de outros dispositivos de base comunitária.

O objetivo deste artigo é efetuar um balanço sobre a implementação da Reforma Psiquiátrica no município do Rio de Janeiro, apontando seus avanços, limites e desafios. Em termos metodológicos, foi realizada pesquisa documental através de documentos oficiais, portarias, bancos de dados do SUS e informações disponíveis na Superintendência de Saúde Mental da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro, e seus resultados discutidos à luz deliteratura científica sobre o tema.

A cidade do Rio de Janeiro e a rede de saúde

A população estimada para 2015 é de 6.476.631 habitantes, em uma área territorial de 1.197.463 km2 e uma densidade demográfica de 5.265,8 habitantes/km2. Seu Índice de Desenvolvimento Humano, em 2011, foi de 0,799 e equivale ao 45° do país e ao 9º dentre as capitais. De acordo com o censo de 2010, a cidade apresentou um crescimento demográfico de 7.9 % em 10 anos, esperança de vida ao nascer de 75,7 anos e 14,9% de idosos na população. A pirâmide etária evidencia um processo de transição demográfica e o envelhecimento da população6.

A Cidade é bastante heterogênea, apresentando diferentes graus de desenvolvimento e desigualdade na distribuição e utilização dos recursos de saúde. No plano administrativo, os 160 bairros estão distribuídos em dez Áreas de Planejamento. As doenças crônicas não transmissíveis correspondem a 33,7% do total de internações pagas pelo SUS. As internações psiquiátricas, que representavam o terceiro maior gasto com internações há vinte anos, hoje se encontram no sexto lugar. Cerca de 90 % da rede de saúde do SUS do Rio de Janeiro está sob administração pública e, nesse grupo, 84,53% ligada à administração municipal. A participação privada no SUS da cidade é de 11,49%. A rede municipal de saúde conta com 29 unidades hospitalares próprias, dentre elas três hospitais psiquiátricos próprios e três enfermarias psiquiátricas em hospitais gerais. A Cidade ainda conta com um hospital psiquiátrico universitário (o Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro), um estadual (o Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro) e dois contratados ao SUS (Hospital Pedro de Alcântara e Sanatório Rio de Janeiro). A rede de urgência e emergência tem 14 Unidades de Pronto Atendimento e 5 Centros Regionais de Emergência7.

No que tange a atenção primária, a cidade viveu nos últimos anos um considerável aumento da cobertura nos moldes da Estratégia de Saúde da Família, modelo adotado pelo Ministério da Saúde. Até 2009, 83% do orçamento municipal era gasto com despesas hospitalares e o Rio de Janeiro tinha alguns dos piores indicadores de saúde das capitais brasileiras. A cobertura da Atenção Primária em Saúde (APS) passou de 3.3% para 47,16 % da população entre 2009 e 2014, e durante esse período ocorreu um expressivo investimento na expansão e qualificação da atenção primária em paralelo com uma considerável descentralização administrativa e financeira8.

Como outras grandes cidades brasileiras, a cidade tem uma importante cobertura de planos de saúde privados equivalente a cerca de 3.400.561 pessoas, o que corresponde 52,5 % da população9.

Os Centros de Atenção Psicossocial na cidade do Rio de Janeiro

Como no restante do país, os CAPS são serviços estratégicos para a organização da rede de atenção à saúde mental para a consolidação da Reforma Psiquiátrica Brasileira.Seu funcionamento segue as diretrizes emanadas do Ministério da Saúde, que diferenciam os serviços de acordo com a densidade populacional do território ou do município, horário de funcionamento, população atendida, capacidade de acolhimento à crise, além dos profissionais que compõem a equipe.

Os CAPS apresentam configuração organizacional de CAPS I, CAPS II e CAPS III em função da complexidade dos serviços e da responsabilidade populacional. O CAPS I teria capacidade operacional para atendimento em municípios com população acima de 20.000 pessoas, e CAPS II, para o atendimento de municípios com população acima de 70.000 pessoas. Os CAPS III e o CAPS III AD (álcool e drogas) teriam capacidade para atender municípios cujas populações estejam acima de 200.000 habitantes, com a diferença em relação aos anteriores de constituir-se em serviço de atenção contínua, durante 24h, incluindo feriados e finais de semana, e de contar com leitos integrados ao serviço para o acolhimento noturno. Além das três modalidades, existem serviços territoriais para clientelas específicas na área de álcool e drogas (CAPS AD), para municípios com população acima de 70.000 pessoas, e para a infância e adolescência (CAPS i) para municípios com população acima de 150.000 pessoas10,11.

Até outubro de 2015, existiam 29 CAPS na cidade do Rio de Janeiro, com maior destaque para os CAPS tipo II (37,9%). Em seguida os CAPSi (27,6%), CAPSad III (13,8%), CAPSad II (10,3%) e CAPS III (também com 10,3%) (Tabela 1). A maioria dos CAPS está sob gestão da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro, com exceção de 1CAPSi vinculado ao governo federal e 1 CAPS II e um CAPSad II sob responsabilidade da gestão estadual.

Tabela 1
Centros de atenção psicossocial existentes no Município do Rio de Janeiro - outubro de 2015.

O Município do Rio de Janeiro apresenta um índice de cobertura de CAPS de 0,50 por 100.000 habitantes considerada boa pelos parâmetros do Ministério da Saúde, que considera a cobertura muito boa acima de 0,70, boa entre 0,50 e 0,69 e regular/baixa entre 0,35 a 0,49, sempre para 100.000 habitantes. Abaixo destes patamares, a cobertura seria baixa, insuficiente ou crítica. Observar que para este indicador, utiliza-se o cálculo de cobertura ponderada por porte do CAPS. Assim, os CAPS I têm território de abrangência e cobertura de 50.000 habitantes; os CAPS III e AD III, de 150.000 habitantes; os demais CAPS (II, Ad e i), cobertura de 100.000 habitantes12.

Em relação a modalidade dos CAPS, convém observar que quase um quarto dos dispositivos são do tipo III (24,1 %). Esta é uma tendência instaurada a partir de 2010 quando foi inaugurado o primeiro CAPS III da cidade. Pelo seu porte (leitos, funcionamento noturno e final de semana), os CAPS III demandam exigências de custeio mais elevadas. Analisando a implantação dos CAPS tipo III nos grandes municípios brasileiros, Costa et al. constaram que, em 2010, apenas 17 % dos municípios com mais de 200.000 habitantes possuíam CAPS III em sua rede de serviços13. A ampliação do porte dos CAPS é vital para o enfrentamento qualificado do cuidado às crises mais graves.

A ampliação da cobertura dos Centros de Atenção Psicossocial é indispensável e consiste em um dos principais desafios para a gestão municipal. Uma meta tangível para os próximos dois anos poderia ser um aumento de cobertura para 0,64 por 100.00 habitantes com a implantação de sete novos serviços (quatro na modalidade III e três nas modalidades CAPS II, Ad ou i).

O cuidado, no âmbito dos CAPS, é desenvolvido por intermédio de Projeto Terapêutico Individual, envolvendo em sua construção a equipe, o usuário e sua família, garantindo o acompanhamento longitudinal do caso11. O processo de cuidado está organizado de forma a oferecer oficinas terapêuticas, atividades comunitárias e artísticas, orientação e acompanhamento do uso de medicação, atendimento domiciliar aos usuários e seus familiares, psicoterapia individual ou em grupo e apoio matricial às equipes da atenção primária. Além disso, espera-se que realize a articulação intersetorial no território de abrangência, coordene o processo de desinstitucionalização dos usuários em situação de longa permanência hospitalar e propicie apoio técnico aos programas de residências terapêuticas.

O desempenho adequado do conjunto de atribuições destinadas aos CAPS no âmbito das Redes de Atenção Psicossocial (RAPS) não é tarefa trivial. Analisando os resultados de uma pesquisa realizada em três centros de atenção psicossocial do município do Rio de Janeiro, Cavalcanti et al. apontam para o acúmulo de funções das equipes e consideram que, em um grande centro urbano como o Rio de Janeiro, pode ser inviável que o profissional vinculado ao CAPS seja responsável, de forma satisfatória, tanto pelo atendimento no serviço quanto na comunidade14. Uma consequência possível desta dificuldade pode ser o predomínio das atividades desenvolvidas com usuários dentro dos CAPS e a pouca integração com outros equipamentos sociais e de saúde.

Estudo realizado sobre as condições de acessibilidade dos CAPS do Estado do Rio de Janeiro apontou para o pequeno número de altas. Os autores consideraram que uma possível explicação para o fenômeno era o próprio perfil de uma parte da clientela, composta por usuários com transtornos mentais severos e persistentes, que poderiam demandar cuidado de longo curso para prevenir recaídas e minimizar a perda da autonomia e das habilidades para a vida diária15. Explicações adicionais poderiam estar relacionadas com a escassez de ambulatórios especializados na rede ou a institucionalização de usuários que acabam por se tornar demasiadamente vinculados aos serviços, em uma situação de limitação de interesses e de vínculos sociais16.

No que tange aos ambulatórios especializados pode-se dizer que esta é uma limitação da rede da cidade do Rio de Janeiro e um desafio para as Políticas Públicas de Saúde Mental no Brasil, tendo em vista que esses dispositivos não são reconhecidos como integrantes da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)11. O resultado foi uma redução dos recursos especializados de nível secundário para acesso à população.

Nesta direção, Nascimento e Galvanese17, analisando os CAPS do município de São Paulo, assinalam a dependência dos centros de atenção psicossocial à capacidade do sistema municipal de saúde de propiciar outros serviços de referência. Caso isto não ocorra, muitas vezes, alguns CAPS se organizam como equipamentos síntese, nos quais os usuários sempre seriam assistidos independentemente do nível de atenção requerido.

Outra questão de relevo para os CAPS e para atenção ambulatorial é a escassez de psiquiatras na rede pública. A baixa adesão de psiquiatras está evidentemente relacionada a questões de mercado, mas o modo como sua formação é conduzida acaba por ocasionar uma baixa atratividade para o exercício profissional nos dispositivos de atenção psicossocial.

Oito CAPS são infanto-juvenis e acompanham regularmente mais de 2.000 crianças com transtornos mentais graves incluindo o autismo. Espera-se a ampliação da capacidade de seu manejo nas situações de crise, de forma a antecipar situações, redirecionando o trabalho das equipes nas urgências/emergências e tendo como primeira opção o acolhimento noturno no próprio CAPSi. Em 2014 foram realizadas 45 internações psiquiátricas de crianças e adolescentes18.

No que tange a sua estrutura física, os Centros de Atenção Psicossociais não contaram, na maioria das vezes, ao contrário das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), com um projeto arquitetônico especialmente destinado à sua finalidade. Ao longo dos anos, foram implantados em imóveis ou espaços públicos disponíveis, buscando adaptar a sua rotina de trabalho à estrutura física existente. Como resultado, algumas unidades têm estruturas inadequadas para o melhor desempenho de seus projetos assistenciais.

A busca por maior agilidade nos processos de aquisição de materiais e insumos, a necessidade de flexibilizar a seleção e contratação de pessoal, bem como a adoção de modelos de gestão voltados para os resultados, teve como resposta a opção pela contratualização com Organizações Sociais de Saúde em um processo de gestão compartilhada, acompanhado periodicamente por uma comissão de avaliação que analisa e controla o desenvolvimento do contrato.

As consequências da adoção deste modelo ainda estão por ser avaliadas ao longo do tempo. Como apontam Barbosa e Elias19, em um estudo do processo de implementação das organizações sociais de saúde (OSS), no Estado de São Paulo, muitas vezes a administração direta é ancorada em regras incompatíveis com a velocidade das respostas que o setor público deve promover, tendo em vista as demandas e necessidades da população. Não existem estudos disponíveis que avaliem as peculiaridades da saúde mental no contexto do modelo OS. Como é sabido, trata-se de um expediente polêmico que tem como um dos pontos de dificuldade a contestação política de segmentos de atores que militam no campo das políticas públicas e se constitui em um campo de conflitos e embates.

Ações de saúde mental inseridas na atenção primária de saúde

O Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil considera a atenção primária como o eixo organizador de toda a atenção em saúde. A coordenação entre as equipes da atenção básica e de saúde mental é essencial para uma atenção integral no território20.

A notável expansão da Atenção Primária na cidade do Rio de Janeiro com investimentos em renovação organizacional e administrativa, tecnologia, gestão do conhecimento, governança clínica e, sobretudo, na expansão do acesso, criou possibilidades significativas de ampliação do campo de intervenção da saúde mental.

Na Itália, cujo modelo é frequentemente considerado como referência para a reforma psiquiátrica brasileira, a completa integração entre os centros comunitários de saúde mental e a atenção primária era considerada por Berardi et al.21 como um objetivo a ser alcançado. Entre as barreiras para a integração detectadas, encontravam-se a falta de treinamento dos médicos generalistas em relação aos transtornos mentais que ocorrem, concomitantemente com a dificuldade de os profissionais de saúde mental apreenderem como o sofrimento mental se expressa nos settings de atenção primária. Na Espanha, a atenção de saúde mental se situa no nível secundário, com o resto das especialidades médicas, com programas de articulação com a atenção primária que constituem a porta de entrada do sistema de saúde. A integração entre a atenção primária e as equipes de saúde mental junto com o trabalho em rede territorializada é considerada um dos pontos fortes da reforma psiquiátrica espanhola22.

Para o Rio de Janeiro, espera-se que as ações de saúde mental na atenção primária adotem o modelo de redes de base territorial e atuação transversal com outras políticas específicas e que busquem o estabelecimento de vínculos e de acolhimento. O território de responsabilidade dos CAPS deve seguir o estabelecido pelo Território Integrado de Atenção à Saúde (TEIAS) da Área de Planejamento em Saúde (AP) onde ele está inserido, seus limites geográficos e população, assim como o rol de ações e serviços devem ser pactuados entre os serviços da rede de saúde local de modo a evitar barreiras ao acesso. É necessário desconstruir a lógica do encaminhamento, entendida como um movimento de desresponsabilização no cuidado ao sofrimento psíquico e estabelecer dispositivos ao alcance da APS para compartilhar o manejo dos casos.

O manejo da depressão e a ansiedade é uma importante questão de saúde pública que frequentemente envolve a atenção primária. Em diversos países observa-se o uso crescente de medicação antidepressiva23. Onde o consumo de antidepressivos é muito baixo,deve ser avaliada a existência de necessidades não atendidas. Entretanto, em outros locais, onde o consumo é particularmente alto, é fundamental avaliar os padrões de diagnóstico e prescrição, definir protocolos clínicos e avaliar a possibilidade de abordagens alternativas para a depressão. Para alguns autores, existem robustas evidências de que o diagnóstico de depressão está superdimensionado e que a utilização da medicação antidepressiva apresenta significativas limitações24. Tal situação reforça a importância de uma efetiva integração da saúde mental e da atenção primária visando também o uso adequado de medicação

No caso do Rio de Janeiro, propõe-se a constituição de equipes de referência para famílias de determinado território e suas respectivas equipes da APS, não se dividindo por recortes etários ou subespecialidades, ou ainda, por diagnósticos, mas por usuários das respectivas áreas de abrangência, em uma contraposição à ideia de equipe de especialistas. Trata-se de uma estratégica para horizontalizar o campo da Saúde Mental e colocá-lo ao alcance das equipes de saúde da Atenção Primária e seus usuários, permeando todo o trabalho de acompanhamento com sofrimento psíquico mais grave ou mais agudo, e oferecendo alternativa à tendência de medicalização do sofrimento.

A atenção à crise e os hospitais psiquiátricos

Estudos internacionais consideram que não existe evidência de que um sistema de saúde mental possa prescindir de leitos para atenção à crise. Entretanto, essa necessidade deve ser equacionada por vagas em hospitais gerais ou em serviços comunitários. A quantidade de leitos em hospital geral necessária é altamente condicionada pela quantidade de outros serviços existentes no território e depende das características sociais, econômicas e culturais de cada local25.

O Município do Rio de Janeiro promoveu uma extensiva redução de leitos psiquiátricos nos últimos quinze anos (cerca de 2400 leitos). Como resultado, as internações foram reduzidas de 42.762, em 2002, para 20.404, em 201226. Entretanto, as internações ainda são massivamente realizadas em hospitais psiquiátricos evidenciandoa frágil implantação dos dispositivos de base comunitária com acolhimento noturno e de leitos localizados em hospitais gerais.

Pode-se observar na Tabela 2, a situação dos dispositivos de acolhimento às crises mais graves com grande predominância dos leitos localizados em hospitais psiquiátricos em setembro de 201527. Do total de leitos do SUS ainda registrados no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), 1.174 permaneciam ativos,de acordo com a supervisão contínua realizada pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro18.

Tabela 2
Leitos psiquiátricos hospitalares e em Centros de Atenção Psicossocial tipo III – Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro – setembro de 2015.

O eixo principal das ações de desinstitucionalização vem sendo encerrar o ciclo de compra de serviços hospitalares em instituições privadas,descredenciando 2.700 leitos em 8 diferentes hospitais, em um período de cerca de 30 anos. Em relação aos leitos atualmente existentes, o cenário desejável para os próximos anos seria o descredenciamento global dos leitos contratados e o fechamento progressivo dos leitos públicos localizados nos Institutos Philippe Pinel, Nise da Silveira e Juliano Moreira.

Esta decisão implica na construção de uma rede de atenção às crises mais graves em dispositivos localizados em hospitais gerais e em serviços comunitários com leitos (CAPS modalidade III). Em outubro de 2015, a rede da cidade contava com sete CAPS tipo III com leitos de acolhimento com funcionamento nas 24 horas diárias, sendo 4 voltados para os transtornos relacionados ao álcool e outras drogas e 3 para portadores de outros transtornos mentais. Essas Unidades dispõem de 6 a 9 camas de acolhimento noturno para a atenção à crise, em um total de 19 (Tabela 2).

A integração da saúde mental com a saúde geral pode ser considerada um dos principais desafios a serem superados. O papel ainda relevante na assistência exercido pelos Institutos (estruturas herdadas pela municipalidade do governo federal) pode ser considerado um importante fator obstaculizante. Retrata esta observação, a existência de duas emergências localizadas em hospitais psiquiátricos que ainda não foram incorporadas ao sistema de urgência/emergência da cidade. As futuras reduções de leitos em hospitais psiquiátricos estarão, assim, limitadas pela superação deste paradigma.

Por outro lado, entre os leitos ocupados existentes, encontram-se pouco mais de 300 pessoas em situação de longa permanência no Instituto Juliano Moreira, que são majoritariamente idosos, com alta dependência de cuidados. Tal fato implica em desafios de outra ordem, como se verá no seguimento.

Pessoas em situação de longa permanência e os Serviços Residenciais Terapêuticos

Em outubro de 2015, haviam 613 pacientes em longa permanência institucional (mais de um ano de internação psiquiátrica) distribuídos nos hospitais psiquiátricos públicos, contratados ao SUS e custodiais localizados no próprio município ou no interior do Estado. Destes, 282(46%) encontram-se na faixa etária entre 41 e 60 anos, e 176 (29%), acima de 71 anos.Encontram-se institucionalizados há mais de 10 anos 300 usuários,e 125 deles encontram-se internados entre 1 e 2 anos. Há um considerável predomínio de homens (61%) distribuídos em todas as faixas etárias. Deles, 38,8% não possuem nenhum benefício, 35% não recebem visitas de nenhum familiar, 86% são moradores do hospital sem lugar para ficar fora da unidade18.

O desafio da desinstitucionalização dos pacientes de longa permanência nos hospitais psiquiátricos do Rio de Janeiro envolve um grupo de pessoas que se encontravam institucionalizadas antes da implantação dos centros de atenção psicossocial enquanto política pública de saúde mental. Muitas delas são idosas e com décadas de internação. Os pacientes com este perfil são, em geral, altamente dependentes e têm muita dificuldade de deixar os hospitais. Costumam estar em enfermarias de longa permanência e apresentam um alto grau de sintomas negativos e desabilidades sociais severas. Usualmente necessitam do cuidado diário de profissionais da instituição e seus vínculos familiares foram rompidos ao longo do tempo. Costumam necessitar de respostas psicossociais de alta intensidade, como dispositivos residenciais com supervisão permanente e presença de equipe nas 24 horas do dia. Este grupo de pacientes é denominado por Desviat28, como o núcleo duro presente em todos os processos de desinstitucionalização.

Outros se encontram na condição de novos pacientes de longa permanência institucional. Em relação a esta população, em artigo sobre moradias destinadas a pessoas com transtornos mentais no Brasil, Furtado29 alerta sobre a inexistência de iniciativas sistemáticas voltadas para pessoas sem histórico de longas internações psiquiátricas, estabelecendo um gargalo no acesso e garantia de moradia para essa clientela, que inclui o crescente número de pacientes com transtornos mentais graves atendidos na ampla rede nacional de CAPS.

Cabe ainda assim assinalar que, a despeito de décadas de desinstitucionalização, em muitos países com sistemas de saúde mental consolidados, continuam a se formar contingentes de usuários que acabam permanecendo mais tempo em enfermarias de agudos e se tornando pacientes em situação de longa permanência institucional. Muitas vezes é necessária uma potente interface entre os hospitais e serviços comunitários para o seu retorno a vida em sociedade30.

A principal estratégia de desinstitucionalização dos usuários de longa permanência repousa nos serviços residenciais terapêuticos (SRTs). São moradias inseridas na comunidade, destinadas a cuidar dos portadores de transtornos mentais, egressos de internações de longa permanência em hospitais psiquiátricos ou de custódia, que não possuam suporte social e laços familiares que viabilizem sua inserção social31. Podem ser caracterizados em Tipo I e II de acordo com o grau de complexidade, dependendo da necessidade de supervisão com maior ou menor intensidade, na ênfase na construção de habilidades para a vida diária referentes ao autocuidado, alimentação, vestuário, higiene, formas de comunicação e aumento das condições para estabelecimento de vínculos afetivos32.

A velocidade das políticas públicas, as restrições orçamentárias e a necessidade da expansão da rede de atenção psicossocial acabaram por se constituírem como entraves para a desinstitucionalização da população internada. A rede de saúde da cidade do Rio de Janeiro conta com 62 serviços residenciais terapêuticos (SRT) distribuídos pela Cidade. Atualmente são acompanhados 330 usuários egressos de longa internação, sendo que 126 (38 %) têm idade entre 61 e 80 anos, e 22 (6,67%), acima de 81 anos. Observe-se ainda que 20 deles estão inseridos nos SRT há mais de 11 anos. Na atual situação, o número médio de moradores é de 5,3 por módulo18. Para avaliar-se a magnitude do desafio, seria necessário em torno de 75 novas residências terapêuticas para abrigarmos aproximadamente 600 pessoas em situação de longa permanência nos hospitais (considerando um número de 8 moradores por casa).

O processo de cuidado envolve o acompanhamento por equipes que visam garantir a continuidade de cuidados, ajudando a promover sua inserção nos recursos existentes no território onde habitam.

Para o ingresso dos usuários nos SRTs é necessário que os mesmos estejam vinculados aos CAPS, que proporcionam a atenção em saúde mental. O processo de cuidado das residências terapêuticas pode ser incluído dentro da tipologia proposta por Nelson et al.33 de supportive housing, onde ocorre o entrelaçamento entre moradia e a reabilitação psicossocial. Um componente do trabalho de reabilitação é desenvolvido no interior das residências, muitas vezes a cargo de cuidadores, que permanecem nas casas em tempo variável, dependendo da intensidade do cuidado.

Um dos mecanismos potentes para viabilizar o processo de desinstitucionalização e a reinserção social é o aporte de recursos para a garantia de renda oferecida diretamente aos egressos de longa internação. Esse aporte de recursos pode ser operado por meio de bolsas com pagamento mensal vitalício, podendo ser municipais (Lei Municipal nº 3.400 de 17/05/2002) ou federais (Lei Federal nº 10.708 de 31 de julho de 2003). Além disso, podem ser beneficiados com o benefício de prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social.

Atenção aos usuários com problemas decorrentes de álcool e outras drogas

No Rio de Janeiro, a rede de atenção psicossocial voltada para o atendimento às pessoas com problemas decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas está composta por três CAPSad II, quatro CAPSad III, duas Unidades de acolhimento de adultos e sete equipes de Consultório na Rua. Unidades de acolhimento têm como objetivo oferecer acolhimento voluntário e cuidados contínuos para pessoas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, em situação de vulnerabilidade social e familiar e que demandem acompanhamento terapêutico e protetivo34.

Para a dimensão do território da Cidade, essa rede ainda é insuficiente, mantendo grandes áreas sem cobertura de serviços, em especial a região do Centro da Cidade que mantém algumas cenas de uso acompanhadas por duas equipes de Consultório na Rua, mas sem retaguarda de serviços. Outro aspecto significativo é que os CAPSad não estão localizados necessariamente nas regiões onde há cena de uso de crack, embora todos esses serviços se desloquem para essas cenas, certamente há perda do protagonismo do serviço na abordagem e no cuidado dos usuários de crack. Essa rede realiza em média de 8.000 atendimentos por mês18.

Há uma grande dificuldade de chegada e adesão aos serviços, o que expressa as peculiaridades deste tipo de clientela e que impõe a necessidade de flexibilização das práticas instituídas. Assim, a estratégia dos Consultórios na Rua e as chamadas Equipes de Abordagem são os atores de relevo em ações integradas com os CAPS, uma vez que estabelecem estratégias de construção de vínculo, essenciais para o início do trabalho e se oferecem como dispositivos de baixa exigência. Os casos graves estão chegando em grande proporção em todos os CAPSad III, muitos com comorbidades clínicas tais como tuberculose pulmonar e sífilis, fazendo com que os leitos de acolhimento a crise trabalhem sempre com ocupação em torno de 90 a 100%. O mesmo ocorre com as Unidades de Acolhimento de adultos que também apresentam um percentual de ocupação próximo a 100%.

No entanto, a coexistência de uma vasta rede de instituições organizadas segundo a premissa da longa estadia em programas centrados na abstinência, mantidas por contribuições individuais ou subvenções estaduais ou federais exerce um forte apelo junto à opinião pública e aos familiares dos usuários de drogas. Trata-se de um modelo concorrente que, embora não apresente seus resultados de forma evidente, sustenta uma considerável clientela que gravita em torno dessas instituições constituindo-se em outro segmento de resolving door.

Em artigo recente, Ribeiro et al. avaliam que as comunidades terapêuticas no Rio de Janeiro se desenvolvem por fora dos sistemas públicos de saúde e de assistência social e possuem baixa transparência em termos de práticas clínicas e abordagens terapêuticas, não sendo nítidas as suas habilitações jurídicas ao menos para os tratamentos que informam praticar. Além disso, a rede apresentada possui baixa visibilidade, expressa por apenas 20,1% dos serviços informados estarem registrados no CNES26.

A rede pública não tem mapeada, com precisão, qual é capacidade instalada desse segmento das chamadas comunidades terapêuticas. No entanto, a SMS Rio refere a existência de 45 comunidades terapêuticas na cidade18. Há uma permanente demanda por mais subsídios governamentais e uma luta política que contamina a discussão da descriminalização do uso de drogas psicoativas e a torna tributária de uma agenda moralizadora.

Considerações finais

A análise do comportamento da rede de atenção psicossocial na Cidade do Rio de Janeiro aponta avanços na desinstitucionalização da assistência, com progressiva redução de leitos em hospitais psiquiátricos e aumento do protagonismo dos dispositivos comunitários. A análise da situação atual aponta para um conjunto de desafios futuros que forma sumarizados no Quadro 1.

Quadro 1
Reforma Psiquiátrica no Rio de Janeiro – Questões cruciais.

Na atividade dos CAPS do Rio de Janeiro, e de boa parte do país, podemos observar que, apesar de uma eficiente atenção longitudinal a pacientes com transtornos graves e persistentes (principalmente transtornos psicóticos), existem mais dificuldades em relação a atenção à crise. Como pontua Campos, os serviços substitutivos convivem, em maior ou menor grau, com o evento internação psiquiátrica e que, muitas vezes, a internação provoca quebras na vinculação com os CAPS, redundando em exposição ao risco de novas internações35.

No caso do Rio de Janeiro, em que pese a redução das internações psiquiátricas nos últimos anos, se observa um número elevado de pessoas que procuram os serviços de urgência/emergência psiquiátrica, o que aponta para uma fragilidade na resposta da rede de atenção psicossocial no acompanhamento dos casos e acarreta um volume de atendimentos pontuais, de baixa resolutividade e desconectados dos projetos terapêuticos individualizados.

Além disso, a permanência de serviços de urgência/emergência como porta de entrada de serviços psiquiátricos confere uma reduzida capacidade de intervenção em casos de maior complexidade clínica que demandem a disposição de recursos para diagnóstico e tratamento. A implantação de três serviços hospitalares de referência em hospitais gerais foi um significativo avanço na integração com o setor saúde como um todo e vem corroborando com a progressiva redução da dependência da rede de saúde de leitos em hospitais especializados. O planejamento futuro da política de saúde mental municipal já aponta para a possibilidade do fechamento dos hospitais psiquiátricos nos próximos anos.

A existência de um percentual elevado de pessoas com planos de saúde privados (52,5 % da população), que têm um modelo de assistência centrado em consultas individuais por psiquiatras e psicólogos e nas internações psiquiátricas com uma limitação de dispositivos comunitários assinala uma certa fragilidade da assistência pública, que não soube chegar ao conjunto da população com serviços mais próximos e eficientes.Ao mesmo tempo, evidencia um descompasso com o processo de desinstitucionalização e a política da reforma psiquiátrica36.

Em relação à atenção às pessoas com problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas, pode-se considerar que a entrada mais incisiva das denominadas “comunidades terapêuticas”na arena setorial constitui um obstáculo à consolidação das diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde e provocam a fragilização dos stakeholders da reforma psiquiátrica no controle da agenda para o tema do crack, gerando demandas sociais por soluções institucionais e involuntárias. Entretanto, a baixa provisão dos serviços específicos para usuários de álcool e outras drogas, como os CAPS AD III e as unidades de acolhimento, impossibilita ainda uma avaliação mais conclusiva da efetividade do atual formato da política do SUS para a questão37.

Apesar de esforços realizados nos últimos anos, a rede de saúde mental do Rio de Janeiro permanece com um gap informacional em relação a indicadores básicos de acompanhamento, como a situação do acesso e o perfil da clientela. Por outro lado, permanece a lacuna entre o aparelho formador e os serviços públicos,sendo necessárias novas ações que possam garantir a formação continuada dos profissionais de saúde da rede, como mestrados profissionais e novos cursos de pós-graduação lato sensu. O Internato Médico integrado da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que passou a ser desenvolvido em parceria com Instituto de Psiquiatria da UFRJ, pode ser considerado uma iniciativa útil na direção da formação de médicos de família e psiquiatras com esse olhar mais integrado dos sujeitos.

Existe ainda escassez de estudos avaliativos, que permitam aferir com mais precisão a qualidade e eficácia do cuidado em todas suas dimensões, fazendo-se necessário promover novas iniciativas de parceria com as Instituições de pesquisa para o fomento de investigações que tenham em conta a especificidade da saúde mental. A despeito dos importantes avanços no conhecimento, tanto na assistência quanto na formação e na pesquisa, permanece um desafio para todos os processos de reforma psiquiátrica, inclusive aqueles considerados mais exitosos, que ainda não foi suficientemente desenvolvido um modelo teórico, clínico e assistencial que vá muito além do enunciado biopsicossocial22.

As lições apontadas pelo acompanhamento da rede de atenção psicossocial da cidade do Rio de Janeiro servem como elementos analisadores para outras experiências municipais de grandes conglomerados urbanos que dispõem de uma rede manicomial de considerável importância e buscam alternativas para transformação de seu modelo assistencial.

Apesar de novos e antigos desafios, é emblemático considerar a consolidação da mudança de paradigma na assistência psiquiátrica da cidade que pode ser observada, por exemplo no cotidiano dos usuários desinstitucionalizados, a maioria após anos de internação psiquiátrica: em lugar dos muros e pavilhões asilares, as ruas, a cidade, a vida cotidiana ao lado de outros cidadãos.

Referências

  • 1 Pitta AMF. Um balanço da Reforma Psiquiátrica Brasileira: Instituições, Atores e Políticas. Cien Saude Colet 2011;16(12):4635-4642.
  • 2 Desviat M. La salud mental participativa: nuevos actores, nuevos sujetos de derecho (Prólogo). En: Amarante P, organizador. Salud mental y atención psicosocial Madrid: Editora Fiocruz, Grupo 5; 2015.p. 11-18.
  • 3 Brasil. Presidência da República. Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Diário Oficial da União 2001; 9 abr.
  • 4 Fundação Oswaldo Cruz, Fundação Calouste Gulbenkian. Inovações e Desafios em Desinstitucionalização e Atenção Comunitária no Brasil. In: Seminário Internacional de Saúde Mental: Documento Técnico Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Fundação Calouste Gulbenkian, Organização Mundial de Saúde (OMS), Ministério da Saúde (MS); 2015.
  • 5 Fagundes Júnior HM, Gomes MPC, Silva JPL, Libério MMA, Reis VLM, Carvalho AL, Chaves C, Zappa M. O Censo da população de internos nos hospitais psiquiátricos da cidade do Rio de Janeiro. J Bras Psiquiatr 1996; 45(9):519-521.
  • 6 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). [acessado 2015 out 19]. Disponível em: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun= 330455&search=||infogr%E1ficos:-informa%E7%F5es -completas
    » http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun= 330455&search=||infogr%E1ficos:-informa%E7%F5es -completas
  • 7 Rio de Janeiro. Secretaria Municipal de Saúde. Relatório de Gestão 2014. [acessado 2015 out 23]. Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/web/sms/conselho-municipal-de-saude
    » http://www.rio.rj.gov.br/web/sms/conselho-municipal-de-saude
  • 8 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. [acessado 2015 out 23]. Disponível em: http://dab.saude.gov.br/portaldab/historico_cobertura_sf.php
    » http://dab.saude.gov.br/portaldab/historico_cobertura_sf.php
  • 9 Agência Nacional de Saúde Suplementar. ANS TABNET. [acessado 2015 out 19]. Disponível em: http://www.ans.gov.br/anstabnet/cgi-bin/dh?dados/tabnet_02.def
    » http://www.ans.gov.br/anstabnet/cgi-bin/dh?dados/tabnet_02.def
  • 10 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria GM nº 336, de 19 de fevereiro de 2002. Estabelece CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPS i II e CAPS ad II. Diário Oficial da União 2002; 20 fev.
  • 11 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria GM nº 3088, de 23 de Dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União 2011; 26 dez.
  • 12 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. Saúde Mental em Dados Brasília: MS; 2012. (Ano VII, número 10).
  • 13 Costa NR, Siqueira SV, Uhr D, Silva, PRF, Molinaro AA. Reforma psiquiátrica, federalismo e descentralização da saúde pública no Brasil. Cien Saude Colet 2011; 16(12):4603-4614.
  • 14 Cavalcanti MT, Dahl CM, Carvalho MCA, Valencia E. Critérios de admissão e continuidade de cuidados em centros de atenção psicossocial. Rev Saude Publica 2009; 43(Supl. 1):23-28.
  • 15 Costa NR, Corrêa, SGP, Silva. PRF. Considerações sobre a acessibilidade nos Centros de Atenção Psicossocial no Brasil. Cien Saude Colet 2015; 20(10):3139-3450.
  • 16 Pande MNR, Amarante PDC. Desafios para os Centros de Atenção Psicossocial como serviços substitutivos: a nova cronicidade em questão. Cien Saude Colet 2011; 16(4):2067-2076.
  • 17 Nascimento AF, Galvanese ATC. Avaliação da Estrutura dos Centros de Atenção Psicossocial do Município de São Paulo, SP. Rev Saude Publica 2009; 43(Supl. 1):8-15.
  • 18 Rio de Janeiro. Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Informações disponíveis na Superintendência de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro Rio de Janeiro: SMS; 2014.
  • 19 Barbosa NB, Elias PEM. As organizações sociais de saúde como forma de gestão público/privado. Cien Saude Colet 2010; 15(5):2483-2495.
  • 20 Paulon SM, Neves R, organizadores. Saúde mental na Atenção Básica: a territorialização do cuidado Porto Alegre: Editora Meridional; 2013.
  • 21 Berardi D, Ferrannini L, Menchetti, M, VaggiM. Primary Care Psychiatry in Italy. J Nerv Ment Dis 2014; 202(6):460-463.
  • 22 Desviat M. La reforma psiquiátrica tras 25 años de la Ley General de Sanidad. Rev Esp de Salud Pública 2011; 85(5):427-436.
  • 23 The Organization for Economic Co-operation and Development (OECD). Health at a Glance 2015: OECD Indicators, OECD Publishing, Paris. [acessado 2015 nov 13]. Disponível em: http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/social-issues-migration-health/health-at-a-glance-2015_health_glance-2015-en#page186
    » http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/social-issues-migration-health/health-at-a-glance-2015_health_glance-2015-en#page186
  • 24 Moncrieff J. Hablando claro. Una introducción a los fármacos psiquiátricos Barcelona: Herder; 2013.
  • 25 Thornicroft G, Tansella M. The balanced care model for global mental health. Psychological Medicine 2013; 43(4):849-863.
  • 26 Ribeiro JM, Moreira MR, Bastos FIPM, Fernandes, FMB, Inglez-Dias A. Políticas de saúde mental, álcool, crack e outras drogas: o caso do município do Rio de Janeiro. Cien Saude Colet 2016;21(1):71-81.
  • 27 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde. [acessado 2015 set 29]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index. php?area=0204
    » http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index. php?area=0204
  • 28 Desviat M. A reforma psiquiátrica Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 1999.
  • 29 Furtado JP. Subsídios para a diversificação de moradias destinadas a pessoas com transtorno mental grave no Brasil: uma revisão. Interface (Botucatu) 2013; 17(46):635-647.
  • 30 Holloway F, Sederer LI. Inpatient Treatment. In: Thornicroft G, Szmukler G, Mueser KT, editors. Oxford Textbook of Community Mental Health Oxford: Oxford University Press; 2011. p. 167-177.
  • 31 Brasil. Ministério da Saúde (MS). 2000. Portaria nº 106, de 11 de fevereiro de 2000. Altera a Portaria nº 106/GM/MS, de 11 de fevereiro de 2000, e dispõe, no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial, sobre o repasse de recursos de incentivo de custeio e custeio mensal para implantação e/ou implementação e funcionamento dos Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT). Diário Oficial da União 2000; 14 fev.
  • 32 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria nº 3090, de 23/12/2011. Estabelece que os Serviços Residenciais Terapêuticos sejam definidos em tipo I e II. Diário Oficial da União 2011; 24 dez.
  • 33 Nelson G, Aubry T, Hutchison J. Housing and Mental Health. In: Center for International Rehabilitation Research Information and Exchange, University at Buffalo, The State University of New York. International Encyclopedia of Rehabilitation Buffalo: University at Buffalo; 2010.
  • 34 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria GM nº 121, de 25 de janeiro de 2012. Institui a Unidade de Acolhimento para pessoas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no componente de atenção residencial de caráter transitório da Rede de Atenção Psicossocial. Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União 2012; 26 jan.
  • 35 Campos RO. Clínica: a palavra negada – sobre as práticas clínicas nos serviços substitutivos de Saúde Mental. Saúde em Debate 2001; 25(58):98-111.
  • 36 Silva PF, Costa NR. Saúde Mental e os Planos de Saúde no Brasil. Cien Saude Colet 2011; 16(12):4653-4664.
  • 37 Alves DSN, Silva PRF, Costa NR. Êxitos e desafios da reforma psiquiátrica no Brasil, 22 anos após a declaração de Caracas. Medwave 2012; 12(10):e5545.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Maio 2016

Histórico

  • Recebido
    30 Nov 2015
  • Revisado
    01 Fev 2016
  • Aceito
    03 Fev 2016
location_on
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Av. Brasil, 4036 - sala 700 Manguinhos, 21040-361 Rio de Janeiro RJ - Brazil, Tel.: +55 21 3882-9153 / 3882-9151 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cienciasaudecoletiva@fiocruz.br
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Acessibilidade / Reportar erro