Open-access Steier G. Advancing Food Integrity: GMO Regulation, Agroecology, and Urban Agriculture. New York: CRC Press Inc. Tayloy & Francis Group; 2018.

Steier, G. Advancing Food Integrity: GMO Regulation, Agroecology, and Urban Agriculture. New York: CRC Press Inc. Tayloy & Francis Group, 2018

Gabriela Steier é parceira fundadora da Food Law International, professora visitante da Universidade de Perugia (Ciência Política), na Itália e professora adjunta da Duquesne Law School, Pittsburgh, Pensilvânia, EUA. Foi editora-chefe dos livros internacionais International Food Law and Policy (Springer, 2017) e International Farm Animal, Wildlife and Wildlife Safety Food Law (Springer, 2017). Como advogada, concentra-se nas questões de segurança alimentar, política, bem-estar animal e organismos geneticamente modificados no mercado interno e na União Europeia (UE).

O livro começa com uma discussão sobre o sistema alimentar e explora se o direito privado protegeu suficientemente os alimentos ou se também é necessário o controle do direito público para salvaguardar a integridade alimentar. A seguir, mostra como a proliferação de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) cria insegurança alimentar ao negar o acesso das pessoas à comida por meio da centralização do sistema alimentar. Steier discute como a atual política agrícola industrial minimiza os perigos das monoculturas de OGM, enfraquecendo assim os sistemas de produção de alimentos.

A abordagem de Gabriela é pertinente para destacar a necessidade da sistemática das razões pelas quais o direito privado, público e internacional não estão promovendo adequadamente a integridade dos alimentos em benefício dos consumidores e do meio ambiente. No capítulo 2, a autora afirma que no direito internacional comparativo dos alimentos o debate sobre os organismos geneticamente modificados e a agroecologia é uma questão de perspectiva e explica como a mudança de perspectiva afeta a análise jurídica e política da prevalência generalizada de OGM.

Conhecidos como transgênicos, os OGM podem ser plantas, animais ou microorganismos que tiveram introduzido no seu material genético um DNA oriundo do mesmo ou de outros organismos. Os capítulos seguintes mostram como a proliferação de OGM cria insegurança alimentar, ao negar o acesso das pessoas à comida por meio da centralização do sistema alimentar e como a política agrícola industrial trivializa amplamente os perigos dessas monoculturas (“culturas biotech”), enfraquecendo os sistemas alimentares.

A técnica do DNA recombinante hoje é considerada como ciência primordial, reconhecida assim, oficialmente em 2000, tendo proporcionado a possibilidade da transformação genômica dos seres vivos e de outras espécies. O resultado é visto e administrado pela biotecnologia no objetivo de produzir ou de modificar produtos e processos visando um uso específico, como também para criar novos serviços de alto impacto para diversos segmentos1.

O International Service for the Acquisition of Agri-biotech Applications (ISAAA) divulga relatórios periódicos sobre a produção de alimentos transgênicos em todo o mundo. Em 2018, segundo o ISAAA, o Brasil plantou a segunda maior área de culturas biotecnológicas do mundo(!). As culturas biotecnológicas plantadas no país incluem soja (34,86 milhões de hectares), milho (verão e inverno) (15,38 milhões de hectares), algodão (1 milhão de hectares) e cana-de-açúcar, esta em pequena monta experimental. A área total plantada das três maiores culturas no Brasil foi de 54,88 milhões de hectares, obtendo um aumento em relação a 2017. As áreas cultivadas de soja e algodão biotecnológicos aumentaram significativamente em 2018 em comparação a 2017 devido à lucratividade, aos preços mais altos, à alta demanda do mercado nacional e internacional e às tecnologias de sementes disponíveis2.

A multiplicidade de questões e casos mencionados neste livro fazem parte do interesse da autora em esclarecer e facilitar a compreensão da vinculação existente entre geneticamente modificados (GM), agricultura urbana e agroecologia e de como tudo isso se relaciona com o argumento geral de que a proliferação de GM banaliza seus perigos. Simplificando, a autora pergunta: onde se conectam os GM, a agricultura urbana e a agroecologia? (e estabelece um mapa de como e onde). Esclarece como os links criam um efeito cascata da proliferação de GM em todo o sistema alimentar, da fazenda à mesa do consumidor e fornece contexto para a agricultura urbana e para a agroecologia.

Há aspectos críticos e atuais mencionados no interior da obra que movem o mundo dos alimentos, uma vez que abrange os temas de segurança alimentar, soberania alimentar, sustentabilidade ambiental e das alterações climáticas em relação aos GM. Apresenta uma fluência escrita para dar argumentos de sustentação jurídica ao especialista que precisará demonstrar aonde vão falhando os setores privado, público e internacional do segmento alimentar.

No avanço da integridade alimentar, Gabriela Steier analisa criticamente o desempenho de esquemas regulatórios para agricultura e sistemas alimentares e seu potencial para promover a integridade alimentar. Sua análise abrange tanto a regulamentação privada quanto a pública nas escalas nacional e internacional, e é conceitual, empírica e metodologicamente eficaz para amarrar os “incautos”.

A autora também toma partido de suas escolhas científicas, ao explicar de forma enfática que o emergente paradigma da agroecologia pode ser um novo pilar normativo-legal para os sistemas alimentares. Tal pilar poderia ser crucial para a sobrevivência a longo prazo dos seres humanos e das muitas espécies ameaçadas de extinção, conforme incentivado pelo Relatório Brundtland3.

Nas narrativas observadas pela autora, o papel da ciência é crucial para esclarecer os fatos e as evidências que comprometem a saúde e idoneidade física e moral dos consumidores e seus circunstanciados e que deve ser verdadeira, conforme apontado por Popper, além do dever de confrontar os traidores da verdade4. Mantém-se uma dicotomia de blocos econômicos a competirem por meros interesses de mercado. Os Estados Unidos (EUA) sustentam que a legislação alimentar é orientada pela ciência, enquanto a UE também diz que sua lei é apoiada por avaliações de risco da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (AESA). No entanto, a divisão entre os dois sistemas é o famoso princípio preventivo “da precaução” utilizado no direito da UE, que os EUA detestam utilizar.

O princípio da precaução tem como característica a inversão do ônus da prova. Milaré5 afirmaria que “a incerteza científica milita em favor do meio ambiente, carregando-se ao interessado o ônus de provar que as intervenções pretendidas não trarão consequências indesejadas ao meio considerado”. Implica assim, ao provável autor do dano, a necessidade de demonstrar que sua atividade não ocasionará dano ao meio ambiente, dispensando-o de implementar as medidas de precaução5.

Para a aplicação deste princípio deve ser levado em conta o custo das medidas de prevenção, devendo ser compatíveis com a capacidade econômica do país, da região ou do local que serão aplicadas. Isso não afasta o compromisso e a responsabilidade dos Estados em adotarem políticas ambientais imprescindíveis para a preservação do meio ambiente e da continuidade da espécie humana. Gabriela destaca que o princípio está incluído no Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, entretanto, os EUA não são signatários deste acordo internacional e isso também foi magistralmente explicado por Stephan6.

A perspectiva abrangente, atualizada e multidisciplinar deste livro oferece uma contribuição essencial para a compreensão científica das políticas alimentares e ele deve ser uma leitura obrigatória para estudantes de leis e políticas ambientais, estudos agrícolas e economia política e, sem dúvida, para os estudiosos mais atentos da saúde coletiva, pelo seu conteúdo crítico e mediante o comprometimento universal das causas e consequências apresentadas no seu bojo.

Cabe mencionar que para o Brasil, um dos maiores produtores de grãos do mundo que em 2018 ocupava a segunda posição (ficando apenas atrás dos Estados Unidos) no ranking global de adoção de biotecnologia agrícola, o livro traz um conteúdo e uma abordagem muito apropriada.

Referências

  • 1 Rocha DR, Marin VA. Transgênicos - Plantas Produtoras de Fármacos (PPF). Cien Saude Colet 2011; 16(7):3339-3347.
  • 2 International Service for the Acquisition of Agri-biotech Applications (ISAAA). The top five countries (USA, Brazil, Argentina, Canada, and India) planted 91% of the global biotech crop area of 191.7 million hectares (Brief 54-2018: Executive Summary) [Internet]. 2018. Disponível em http://bic.searca.org/site/isaaa-brief-54-2018-executive-summary/
    » http://bic.searca.org/site/isaaa-brief-54-2018-executive-summary
  • 3 Relatório Brundtland. World Comission on Environment and Development: our common future. New York: UN; 1987.
  • 4 Reis I. Karl Popper: contra a verdade em favor da razão. Cadernos UNDB 2009; 2:9-43.
  • 5 Milaré E. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, prática, glossário. 3ª ed. São Paulo: RT; 2004.
  • 6 Stephan HR. Cultural politics and the GMO divide: cultures of nature. Stirling: University of Stirling, New York: Palgrave Macmillan; 2015.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Dez 2020
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