Open-access Internações por condições sensíveis à atenção primária em crianças, Rondônia, Brasil, 2008-2019

Resumo

Objetivou-se caracterizar o perfil de internações de crianças na rede pública dos 52 municípios do estado de Rondônia, Brasil, no período de 2008 a 2019. Trata-se de um estudo de série temporal do tipo ecológico, com dados secundários do Sistema de Informações Hospitalares. A tendência anual das internações foi apresentada por faixa etária e regional de saúde. Foi realizada regressão linear aplicando a técnica de Prais-Winsten no pacote estatístico Stata, versão 11.0. As internações por doenças gastrointestinais tiveram declínio em todas as faixas etárias, assim como pelas doenças previníveis por imunizantes entre 1 a 9 anos. As internações por doenças de pele e tecido subcutâneo foram crescentes em todas as idades, as epilepsias em idades de 1 a 9 anos e pelas doenças relacionadas ao parto e puerpério foi crescente. As regiões de saúde apresentaram perfil de internações variável, com tendência estável nas regiões Cone Sul, Madeira-Mamoré, Café, Vale do Guaporé, Vale do Jamari; e em declínio nas regiões Central e Zona da Mata. As elevadas taxas de internações por condições sensíveis à atenção primária em crianças refletem a pouca efetividade das estratégias e dos investimentos na esfera da atenção primária no estado.

Palavras-chave: Saúde da criança; Hospitalização; Atenção primária à saúde

Abstract

This study aimed to define the profile of hospitalizations of children in public hospitals of 52 municipalities of the state of Rondônia, Brazil. We performed an ecological time series study using secondary data provided by the Hospital Information System. The annual trend of Hospitalizations was presented by age group and health region. Linear regression was performed using the Prais-Winsten technique of the statistical package Stata, version 11.0. Hospitalizations for gastrointestinal diseases were found to be decreasing in all age groups, just as those for vaccine-preventable diseases in children aged between 1 and 9 years. Hospitalizations for skin and subcutaneous tissue diseases were increasing in all ages, as well as those caused by epilepsies in children aged 1 to 9 and those caused by diseases related to childbirth and puerperium. Health regions showed a varied hospitalization profile. A stable trend was found in the Cone Sul, Madeira-Mamoré, Café, Vale do Guaporé, and Vale do Jamari regions, whereas a declining trend was found in the Central and Zona da Mata regions. The high rates of hospitalizations for ambulatory care-sensitive conditions in children show how inefficient strategies and investments in primary care have been in the state of Acre, Brazil.

Key words: Child health; Hospitalization; Primary health care

Introdução

As internações por condições sensíveis à atenção primária (ICSAP) são indicadores da resolução de ações na atenção primária em saúde (APS)1. No Brasil, essas ações ocorrem no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF), que por sua vez acompanham comunidades e famílias, entres essas, as crianças cadastradas e acompanhadas pelas unidades de saúde2,3.

As intervenções específicas e no momento adequado feitas pela APS podem diminuir o risco de internações nesse grupo, ao valorizar ações de prevenção, diagnóstico e tratamento precoce das doenças agudas. Ao mesmo tempo, tais ações são capazes de promover a redução dos custos no controle e acompanhamento das doenças crônicas4,5.

Estudos evidenciam que a morbidade em crianças tem relação direta com fatores socioambientais, tais como: saneamento básico, renda, acessos a serviços de saúde e especificidades nessa fase da vida, que muitas vezes podem determinar internações evitáveis. Diferentemente de pessoas adultas, as crianças têm maior frequência de doenças agudas, que podem ser evitadas nos serviços disponíveis na APS5,6.

Nesse contexto, sabe-se que as ICSAP na infância aumentam os custos socioeconômicos e psicológicos para pessoas em desenvolvimento e suas famílias, pois consomem alto volume de recursos do SUS. Além disso, as novas internações podem predispor a outros agravos e doenças, o que resulta no deslocamento de investimentos que poderiam ser aplicados na qualificação da atenção à saúde da criança na APS7.

No Brasil, estudos sobre ICSAP em crianças brasileiras tiveram mais destaque após o Ministério da Saúde implementar e adaptar a Lista Brasileira de ICSAP, que identifica e classifica diferentes condições que afetam todas as faixas etárias, ou seja, de crianças a idosos8.

Os estudos disponíveis sobre as ICSAP em crianças brasileiras revelam um perfil bastante variável nas regiões Nordeste6,7, Sudeste9, Sul10 e Norte do país11. No Norte e Nordeste prevaleceram as gastroenterites; e no Sul-Sudeste, as doenças respiratórias foram as mais prevalentes. Estes dados indicam que, além dos aspectos inerentes à idade, considera-se a influência climática no surgimento de doenças, bem como as desigualdades regionais em termos de acesso e disponibilidade de serviços essenciais de educação e saúde10,12,13.

Em Rondônia, estudo sobre as ICSAP realizado de 2012 a 2016 detectou que, das 133.958 internações, 24,8% eram por problemas evitáveis. Desse percentual, 14,8% foram de crianças de zero a quatro anos, e 9,3% de cinco a nove anos, totalizando 24,1% de todas as internações por ICSAP no estado11. Não obstante, além da ausência de estudos específicos sobre esses agravos em crianças, existem altas taxas de morte neonatal precoce evitáveis relacionadas ao pré-natal, parto e imunização14.

Isto posto, conhecer o perfil de internações de crianças auxiliará na compreensão desses fenômenos no processo saúde-doença desse grupo, a fim de direcionar ações de prevenção aos agravos em tempo oportuno para evitar internações desnecessárias15. Além disso, os resultados podem subsidiar os gestores municipais no planejamento da linha de cuidados nesse grupo dentro da Rede de Atenção à Saúde de Rondônia.

O objetivo do estudo é caracterizar o perfil de internações por condições sensíveis à atenção primária de crianças no estado de Rondônia no período de 2008 a 2019.

Métodos

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo de série temporal, ecológico, com base nos dados secundários de internações do Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS) do Departamento de Informática do SUS (www.datasus.gov.br) de 2008 a 2019.

A escolha da série temporal contemplou o período inicial da implementação da lista de ICSAP no Brasil em 2008.

População do estudo

A população do estudo foi composta por todas as internações de crianças residentes nos 52 municípios de Rondônia, notificadas de 1 de janeiro de 2008 a 31 de dezembro de 2019, por meio da Autorização de Internação Hospitalar (AIH), preenchida segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - 10ª Revisão (CID-10) da Organização Mundial de Saúde, de 1997, e correspondente à Lista de ICSAP1.

Definição de variáveis

A variável idade foi estudada por faixas etárias, conforme dados do SIH (menor de um ano, de um a 4 anos e de 5 a 9 anos).

Para delimitação de idades, adotou-se o conceito de criança da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da PNAISC no âmbito do SUS2. A definição de regiões de saúde de Rondônia seguiram a Resolução 087 da Comissão Intergestor Bipartite (CIB) de Rondônia, de 8 de maio de 2014, que dispõe sobre a regionalização dos 52 municípios, agrupados em sete regiões de saúde (Madeira Mamoré, Vale do Jamari, Central, Zona da Mata, Café, Cone Sul, Vale Guaporé)16,17.

Foram utilizados os dados censitários e as estimativas populacionais de cada região de saúde, definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), disponíveis no site do Departamento de Informática de Sistema Único de Saúde (DATASUS).

As causas de internações foram analisadas segundo os capítulos e agrupamentos da Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)1 e a Lista de Condições Sensíveis à Atenção Primária (CSAP)8, descritas no Quadro 1.

Quadro 1
Lista de grupo de condições sensíveis à atenção primária e lista do Código da Classificação Internacional de Doenças - CID 10.

Organização e análise estatística dos dados

De posse dos dados do SIH, foram elaboradas planilhas pelo programa Microsoft Excel e analisados utilizando-se o programa Stata, versão 11.0 (College Station, Texas, USA). Foram calculadas as taxas anuais de hospitalização para o período avaliado por grupo etário e regional de saúde. As taxas de morbidade proporcional por causas foram calculadas usando-se o número de hospitalizações total por tipo no ano específico, dividido pela população total de interesse, na mesma área e ano, multiplicado por 10.000.

Para a análise de tendência anual das internações, foi realizada regressão linear, aplicando-se a técnica de Prais-Winsten, após verificação de autocorrelação serial por meio do teste de Durbin e Watson. A tendência foi classificada em decrescente, estacionária e crescente.

Para a fundamentação teórica, fez-se busca nas bases Literatura Latino-Americana e do Caribe de Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Eletronic Library Online (SciELO) de artigos publicados em português que tivessem o texto na íntegra para consulta e estivessem indexados pelos descritores hospitalização, criança e causas evitáveis.

Aspectos éticos

O presente estudo está vinculado a um projeto de pesquisa matriz intitulado “Estudo sobre morbidades em Rondônia”, aprovado sob CAAE 46586315.9.0000.5300 pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), conforme diretrizes da Resolução 466/CNS/2012 do Conselho Nacional de Saúde18.

Resultados

No período de 2008 a 2019, a tendência anual de ICSAP em crianças no estado de Rondônia mostrou-se variável entre as faixas etárias e os grupos.

Na Tabela 1, observa-se que houve declínio na tendência de ICSAP por gastroenterites infecciosa e complicações nas três faixas etárias (< 1 ano: -8,62%; 1 a 4 anos: -7,25%; 5 a 9 anos: -4,95%). Por outro lado, as infecções da pele e tecido subcutâneo apresentaram tendência anual crescente em todas as idades (14,32%; 17,87%; 18,18%, respectivamente).

Tabela 1
Tendência anual de internações de crianças por condições sensíveis à atenção primária (ICSAP), Rondônia, Brasil, 2008-2019.

Nas crianças, as ICSAP provocadas por doenças respiratórias mantiveram tendência estável em todas as faixas etárias (< 1 ano: -1,24%; 1-4 anos: 0,32%; 5-9 anos: 1,75%). As ICSAP decorrentes de infecções no rim e no trato urinário também se mantiveram estável em todos os grupos de idade (-1,15%; -1,49%; 0,01%, respectivamente).

Nas taxas de ICSAP por doenças preveníveis por imunização/condições sensíveis, houve tendência estável em duas faixas etárias (< 1 ano: -2,60%; 5-9 anos: -3,76%) e em declínio em crianças de 1 a 4 anos (-8,51%). O grupo definido como “outros” também manteve tendência estável em duas faixas etárias (1-4 anos: -3,44%; 5-9 anos: -1,64%), porém crescente em menores de um ano (2,75%).

A tendência anual de ICSAP por epilepsias cresceu nas faixas etárias de 1-4 anos (12,05%) e de 5-9 anos (12,17%). Para as crianças menores de um ano, as doenças relacionadas ao pré-natal e parto também tiveram tendência anual crescente (24,20%).

Considerando as regiões do estado de Rondônia, a Tabela 2 mostra que a tendência anual de ICSAP nas três faixas etárias de crianças também se mostrou variável. As regiões com tendência estável foram: Vale do Guaporé (-3,92%), Cone Sul (-1,68%), Vale do Jamari (-0,95%), Café (2,10%) e Madeira-Mamoré (2,73%); e em declínio, as regiões Central (-5,66%) e Zona da Mata (-3,97%).

Tabela 2
Tendência anual de internações de crianças por condições sensíveis à atenção primária (ICSAP), regiões de saúde, Rondônia, Brasil, 2008-2019.

Discussão

O estudo permitiu identificar taxas elevadas de ICSAP em crianças no estado de Rondônia, com importantes variações entre as faixas etárias e grupos de condições. Os resultados desta análise corroboram outras pesquisas realizadas no Brasil19-21 e em países europeus, como a Itália, que apontaram considerável redução na taxa de ICSAP em crianças22.

Contudo, vale destacar que as características das internações oscilam e estão diretamente associadas aos diversos fatores inerentes às regiões analisadas, como condições epidemiológicas e nível de desenvolvimento socioeconômico e cultural23.

No Brasil, as condições características de uma região determinam os indicadores de saúde de uma população. O Observatório da Criança e do Adolescente e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2017) mostram que os indicadores de acesso à água e à rede de esgoto apontam desigualdades no território brasileiro, além de atestar maiores discrepâncias frequentes nas regiões Norte e Nordeste, incluindo portanto o estado de Rondônia24,25. Observa-se ainda que, nessa região, o acesso não é ampliado, sendo os municípios periféricos os principais atingidos pela falta de recursos que propiciam a promoção da saúde11.

Não obstante, a população atendida pela rede de coleta de esgoto no estado de Rondônia em 2018 representou apenas 12,2% da população total; já no ano de 2019, essa porcentagem diminuiu para 11,4%. De maneira semelhante a esse indicador, os dados referentes à rede geral de distribuição de água identificaram 49,4% da população total atendida pelo serviço em 2018, com diminuição da porcentagem para 46,9% em 2019. Esse cenário ocorre devido ao aumento populacional e à falta de planejamento urbano no estado, o que lesa a população24.

Percebe-se que o cenário epidemiológico no estado de Rondônia, onde existem e persistem problemas estruturais como a precariedade socioeconômica, nutricional e de saneamento básico, entre outros, o número elevado de ICSAP em crianças em algumas faixas etárias se assemelham às altas taxas de doenças parasitárias11.

Igualmente, como corroborado na literatura internacional, as internações por causa evitáveis em crianças estão diretamente associadas a um conjunto de elementos socioeconômicos que determinam elevadas taxas de internações em áreas de maior vulnerabilidade, a exemplo do contexto deste estudo26.

De modo semelhante, esse cenário também é observado no estado de Rondônia, visto que, segundo o IBGE, o rendimento mensal domiciliar da população residente em 2020 esteve abaixo da média nacional25. Dessa forma, o grupo de ICSAP em crianças decorrentes de infecção da pele e tecido subcutâneo representou a maior tendência anual nas faixas etárias de 1 a 4 anos e de 5 a 9 anos, e tendência crescente em todos os intervalos etários, o que pode ser justificado pelas condições socioeconômicas desfavoráveis à saúde.

Além disso, as gastroenterites infecciosas, ainda que em declínio na tendência anual em todas as faixas etárias, foram a principal causa de ICSAP em crianças de 1 a 4 anos e de 5 a 9 anos. Por outro lado, nas crianças menores de um ano, as gastroenterites infecciosas foram a segunda causa de internações, o que difere de outros estudos realizados nos estados brasileiros, onde essa ICSAP também foi predominante nos menores de um ano7.

Estudo realizado no estado do Ceará identificou que dos 388.973 registros de ICSAP em crianças menores de 5 anos no período de 2000 a 2012, as maiores taxas de internações ocorreram em menores de um ano e o componente pós-neonatal foi a principal causa de internação. Dessa maneira, as elevadas taxas de ICSAP em menores de um ano podem estar relacionadas à fase de desenvolvimento, na qual os mecanismos de defesa do organismo ainda estão em processo de formação e/ou amadurecimento27.

Neste estudo, as doenças relacionadas ao pré-natal e parto tiveram maior tendência anual em menores de um ano, além de mostrar tendência crescente, assim como as ICSAP por infecções da pele e do tecido subcutâneo e o grupo identificado como outros. As ICSAP decorrentes das doenças relacionadas ao pré-natal e parto podem ter reflexos nas tendências crescentes das ICSAP por epilepsias na faixa etária de 5 a 9 anos e parcialmente estável em crianças de 1 a 4 anos, pois em crianças essa ICSAP pode estar associada aos problemas ocorridos no pré-natal e na fase neonatal27. Essa avaliação corrobora estudos nacionais28 e internacionais29 que relacionam maior vulnerabilidade das crianças menores de 5 anos às ICSAP nessa fase da vida.

Pesquisas na região norte do Brasil, cenário do presente estudo, indicam que as doenças respiratórias, principalmente asma e pneumonia, representaram a maior taxa de ICSAP em menores de 5 anos, o que demonstra a baixa efetividade no diagnóstico precoce e tratamento efetivo de tais doenças no âmbito da atenção primária, além de refletir a escassez de buscas territoriais por fatores socioambientais que potencializam o surgimento de agravos na atualidade6,12,30.

Chama a atenção que nas crianças menores de um ano as ICSAP provocadas pelas doenças preveníveis por imunização/condições sensíveis, junto com as deficiências nutricionais e a infecção no rim e no trato urinário, mantiveram-se com tendência estável nos anos analisados. Esses achados podem ter relação com o aumento da cobertura de ações, como vacinação sistemática das crianças e intensificação de atividades educativas em saúde realizados no campo da puericultura no contexto da APS31.

No presente estudo, as ICSAP em crianças por regiões de saúde no estado de Rondônia mantiveram tendência estável nas regiões Madeira-Mamoré e Café. Segundo relatório da Secretaria de Saúde do estado17, ambas as regiões são importantes na taxa geral de ICSAP no estado, pois são municípios populosos, que concentram as principais infraestruturas hospitalares, o que corrobora estudos realizados em outros estados32. Dessa forma, a parceria entre as esferas é salutar e propicia estabilidade nas regiões populosas.

O estudo permitiu caracterizar que o perfil das ICSAP em crianças em Rondônia varia entre as faixas etárias e os grupos de condições. Como se pôde constatar, algumas das doenças evitáveis na esfera da APS, como as infecções da pele e do tecido subcutâneo, apresentam tendência de crescimento em todas as faixas etárias, o que retrata o amplo cenário de internações desnecessárias, além de refletir a negligência da gestão de saúde em todo o estado. Esse cenário aponta para graves falhas da atenção à saúde da criança no território da APS, uma vez que sinaliza sérias limitações no acolhimento e na identificação precoce de problemas de saúde que acometem sobretudo as crianças de até um ano de vida.

Esses achados reforçam a necessidade urgente de (re)planejamento de ações e estratégias das gestões municipais de saúde no que se refere aos investimentos na infraestrutura dos serviços, bem como na qualificação de profissionais de saúde, para que as crianças e suas famílias sejam atendidas em tempo adequado, a fim de evitar complicações de saúde que são plenamente possíveis de resolução na atenção primária.

O presente estudo tem algumas limitações em virtude das possíveis falhas no preenchimento das internações, como incompletudes dos campos referentes ao sexo e à residência do paciente, visto que as internações são quantificadas de maneira manual em documentos físicos e posteriormente lançadas em sistema digital, o que propicia a ocorrência de erros, uma vez que há vários personagens inseridos nesse processo. Além disso, o viés ecológico corrobora uma limitação das especificidades de cada unidade de saúde da rede pública. No entanto, tais limitações não são capazes de anular os resultados alcançados, pois a amostra analisada no período do estudo apresenta dimensão considerável.

Conclusão

Em Rondônia, de 2008 a 2019, as ICSAP em crianças estiveram associadas a fatores intrínsecos e extrínsecos às ações realizadas no âmbito da atenção primária.

A maioria das internações ocorreram por infecções da pele ou decorrentes de gastroenterites, o que sinaliza a negligência aos sintomas clínicos comuns, como diarreias e cólicas, além de revelar lacunas e graves falhas na linha de cuidado e orientação para o crescimento e desenvolvimento pleno da criança.

As tendências de ICSAP estáveis e em declínio no estado de Rondônia se assemelham à tendência nacional, porém com número de internações superiores, o que desperta a preocupação também para os determinantes sociais e de saúde que agravam e repercutem o processo de saúde-doença infantil.

É urgente que gestores de serviços de saúde e profissionais revejam as estratégias de vigilância à saúde da criança nos diferentes níveis de atenção, sobretudo pelas equipes da ESF na esfera da atenção primária em saúde de cada município, considerando as peculiaridades locais.

Agradecimentos

À Fundação Rondônia de Amparo ao Desenvolvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e à Pesquisa do Estado de Rondônia (FAPERO); ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); ao Centro de Estudo e Pesquisa em Saúde Pública (CEPESCO); à Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR); e à Secretária de Estado da Saúde de Rondônia (SESAU).

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  • Editores-chefes:
    Romeu Gomes, Antônio Augusto Moura da Silva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    Abr 2023

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2022
  • Aceito
    18 Set 2022
  • Publicado
    20 Set 2022
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