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Avaliação da saúde bucal em uma coorte de idosos não institucionalizados

Oral health assessment in a cohort of non-institutionalized elderly

Resumo

Introdução

Sabe-se que os instrumentos epidemiológicos comumente utilizados para aferir as condições bucais, como o CPO-d e CPI, não são sensíveis o suficiente para discriminar idosos em relação à saúde bucal.

Objetivo

Identificar as alterações na progressão da condição de saúde bucal de idosos não institucionalizados, a partir da aplicação de um indicador multidimensional.

Método

Trata-se de um estudo longitudinal, realizado em uma coorte de 183 idosos do município de Macaíba/RN. Uma análise fatorial possibilitou que todas as variáveis coletadas, tanto as de saúde bucal quanto as socioeconômicas, demográficas e do estado geral de saúde, fossem consideradas para a produção do indicador multidimensional de saúde bucal. Ademais, foram utilizados o teste t de Student para amostras dependentes, o teste do Qui-Quadrado e o Risco Relativo (IC 95%), na busca de associações entre a saúde bucal dos idosos e as variáveis independentes.

Resultados

Observou-se que 22,2% dos idosos pioraram sua condição de saúde bucal ao longo do tempo, e que ser casado foi fator de proteção para evitar essa deterioração. Os fatores mais relacionados à mudança da condição de saúde bucal foram “cárie radicular e necessidade de extração”, e “idosos jovens com maior densidade domiciliar”.

Conclusão

O indicador proposto reforça a importância de buscar instrumentos que vão além das dimensões dentárias para discriminar a saúde bucal, facilitando o planejamento de ações em prol da saúde bucal dos idosos.

Palavras-chave:
estudos longitudinais; idoso; saúde bucal

Abstract

Background

It is known that the epidemiological instruments commonly used to assess oral conditions, such as DMFT and CPI, are not sensitive enough to discriminate elderly people in relation to oral health.

Objective

To determine changes in the oral health status of non-institutionalized elderly over time, based on the application of a multidimensional indicator.

Method

This is a longitudinal study performed in a cohort of 183 elderly in the city of Macaíba/RN. A factor analysis allowed all variables collected, both oral health and socioeconomic, demographic, and general health status, to be considered to produce oral health multidimensional indicator. In addition, Student's T-test for dependent samples, Pearson's Chi-Square test and Relative Risk (CI 95%) were used in the search for associations between oral health of the elderly and the independent variables.

Results

It was observed that 22.2% of elderly worsened their oral health condition across time and that being married was a protective factor for such worsening. Among the factors that composed the indicator, those most related to the change in the oral health status were "root caries and need for extraction" and "young older people with higher home density".

Conclusion

The proposed indicator reinforces the importance of considering instruments that further study the dental dimensions to assess oral health, facilitating the planning of actions for the older people oral health.

Keywords:
longitudinal studies; elderly; oral health

INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional é um fenômeno mundial e sua evolução varia de acordo com o grau de desenvolvimento dos diferentes países11 Pontes ÉS, Amaral AK, Rêgo FL, Azevedo EH, Silva PO. Quality of life in swallowing of the elderly patients affected by stroke. Arq Gastroenterol. 2017;54(1):27-32. http://dx.doi.org/10.1590/s0004-2803.2017v54n1-05. PMid:28079235.
http://dx.doi.org/10.1590/s0004-2803.201...
. No Brasil, as modificações na estrutura etária da população ocorrem de forma acelerada. A velocidade em que ocorre o processo de transição demográfica e epidemiológica no país traz uma série de questionamentos para os gestores e pesquisadores da saúde, principalmente devido às desigualdades sociais e econômicas que têm acompanhado esse processo nas últimas décadas22 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Indicadores sociodemográficos: prospectivas para o brasil 1991-2030 [Internet]. Rio de Janeiro: ARBEIT; 2006 [citado em 2017 mar 14]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/projecao_da_populacao/publicacao_unfpa.pdf
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...

3 Alves DSB, Barbosa MTS, Caffarena ER, Silva AS. Caracterização do envelhecimento populacional no município do rio de janeiro: contribuições para políticas públicas sustentáveis. Cad Saude Colet. 2016;24(1):63-9. http://dx.doi.org/10.1590/1414-462X201600010272.
http://dx.doi.org/10.1590/1414-462X20160...

4 Sandes LFF, Freitas DA, Souza MFNS. Oral health of elderly people living in a rural community of slave descendants in Brazil. Cad Saude Colet. 2018;26(4):425-31. http://dx.doi.org/10.1590/1414-462x201800040415.
http://dx.doi.org/10.1590/1414-462x20180...
-55 Marin MJS, Panes VCB. Envelhecimento da população e as políticas públicas de saúde. Rev Inst Polít Públicas. 2015;1(1):26-34. http://dx.doi.org/10.33027/2447-780X.2015.v1.n1.03.p26.
http://dx.doi.org/10.33027/2447-780X.201...
.

No que concerne aos serviços de saúde, estes precisam se adaptar ao aumento das demandas em relação às doenças crônicas e incapacidades comuns aos idosos, sobretudo no Brasil66 Boggio ESB, Santos FC, Souza CM, Silva MF, Rosa PV, Rosa LHT. Análise dos fatores que interferem na capacidade funcional de idosos residentes em uma comunidade de Porto Alegre. Estud Interdiscipl Envelhec. 2015;20(1):189-203. http://dx.doi.org/10.22456/2316-2171.46966.
http://dx.doi.org/10.22456/2316-2171.469...

7 Schenker M, Costa DH. Avanços e desafios da atenção à saúde da população idosa com doenças crônicas na Atenção Primária à Saúde. Cien Saude Colet. 2019;24(4):1369-80. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018244.01222019. PMid:31066839.
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320182...
-88 Santos MIPO, Griep RH. Capacidade funcional de idosos atendidos em um programa do SUS em Belém (PA). Cien Saude Colet. 2013;18(3):753-61. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232013000300021. PMid:23546202.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232013...
. Dados do último levantamento epidemiológico em saúde bucal da população brasileira mostraram que 53,7% dos indivíduos na faixa etária dos 65 a 74 anos são edêntulos. O sangramento gengival, a presença de cálculo e de bolsa periodontal estiveram presentes em 18,1%, 28,3% e 17,2% desses indivíduos, respectivamente99 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa nacional de saúde bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.. Situações semelhantes foram observadas ao se investigar os idosos longevos em diferentes regiões do país, mostrando que as piores condições bucais se encontram no Norte e Nordeste, devido ao modelo assistencial curativo mutilador que foi oferecido a essa população ao longo dos anos1010 Austregésilo SC, Leal MCC, Marques APO, Vieira JCM, Alencar DL. Acessibilidade a serviços de saúde bucal por pessoas idosas: uma revisão integrativa. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(1):189-99. http://dx.doi.org/10.1590/1809-9823.2015.13179.
http://dx.doi.org/10.1590/1809-9823.2015...

11 Colussi CF, Freitas SFT. Aspectos epidemiológicos da saúde bucal do idoso no Brasil. Cad Saude Publica. 2002 out;18(5):1313-20. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2002000500024. PMid:12244364.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2002...
-1212 César JA, Oliveira-Filho JA, Bess G, Cegielka R, Machado J, Gonçalves TS, et al. Perfil dos idosos residentes em dois municípios pobres das regiões Norte e Nordeste do Brasil: resultado de estudo transversal de base populacional. Cad Saude Publica. 2008;24(8):1835-45. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2008000800012. PMid:18709224.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2008...
.

Sabe-se, no entanto, que diversos fatores podem estar associados à saúde bucal da pessoa idosa, como condições socioeconômicas e demográficas, comprometimento físico e de saúde, fatores estes que podem limitar o acesso ao serviço odontológico1010 Austregésilo SC, Leal MCC, Marques APO, Vieira JCM, Alencar DL. Acessibilidade a serviços de saúde bucal por pessoas idosas: uma revisão integrativa. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(1):189-99. http://dx.doi.org/10.1590/1809-9823.2015.13179.
http://dx.doi.org/10.1590/1809-9823.2015...
,1313 Teixeira DSC, Frazão P, Alencar GP, Baquero OS, Narvai PC, Lebrão ML, et al. Estudo prospectivo da perda dentária em uma coorte de idosos dentados. Cad Saude Publica. 2016;32(8):e00017215. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00017215. PMid:27509546.
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. Com isso, no que diz respeito ao idoso, existem necessidades específicas que demandam um olhar ampliado e multidimensional, tanto para a pessoa idosa quanto para o contexto em que vivem1414 de Oliveira TC, da Silva DA, Leite de Freitas YN, da Silva RL, Pegado CP, de Lima KC. Socio-demographic factors and oral health conditions in the elderly: a population-based study. Arch Gerontol Geriatr. 2013;57(3):389-97. http://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2013.05.004. PMid:23773366.
http://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2013...
.

Diante desse cenário, percebe-se que, no âmbito odontológico, os instrumentos epidemiológicos comumente utilizados para aferir as condições bucais, como o CPO-d (Dentes permanentes Cariados, Perdidos e Obturados) e o CPI (Índice Comunitário Periodontal), não são sensíveis o suficiente para discriminar idosos em relação à saúde bucal. Isto ocorre devido ao fato desses indivíduos apresentarem características semelhantes na distribuição dos agravos classicamente avaliados e, portanto, tais indicadores não são capazes de categorizar esses indivíduos por meio da condição de saúde bucal aferida1414 de Oliveira TC, da Silva DA, Leite de Freitas YN, da Silva RL, Pegado CP, de Lima KC. Socio-demographic factors and oral health conditions in the elderly: a population-based study. Arch Gerontol Geriatr. 2013;57(3):389-97. http://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2013.05.004. PMid:23773366.
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,1515 Roncalli AGA. Epidemiologia: um olhar coletivo sobre a saúde bucal. In: Ferreira MA, Roncalli AG, Lima KC. Saúde Bucal Coletiva: conhecer para atuar. Natal, RN: Editora UFRN; 2004. Cap. 3, p. 39-62..

Logo, é válido considerar o uso de um indicador capaz de refletir a história cumulativa das necessidades de saúde bucal. Para tanto, alguns estudos utilizam o edentulismo, o edentulismo funcional, pares de dentes em oclusão, ou simplesmente o número de dentes perdidos, como uma forma de refletir a condição de saúde bucal dos idosos1616 Barros PMF, Amorim AA, Oliveira MRM, Caldas KU, Júnior AF. O impacto do edentulismo na qualidade de vida de idosos. Rev Cienc Méd. 2005;14(3):229-38.,1717 Pinheiro NCG, et al. Funcionalidade dentária: construção e validação de um indicador de saúde bucal para idosos institucionalizados da cidade do Natal, RN. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2018;21(4):401-8. http://dx.doi.org/10.1590/1981-22562018021.170153.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-225620180...
. Entretanto, tais instrumentos continuam reduzindo a saúde bucal ao elemento dentário, o que não resolve a dificuldade de categorização desses indivíduos devido a homogeneidade relativa à perda dentária.

Nesse sentido, o presente estudo buscou identificar alterações na condição de saúde bucal em uma coorte de idosos, a partir da aplicação de um indicador multidimensional capaz de avaliar a saúde bucal desses indivíduos por meio de dimensões dentárias e não dentárias.

METODOLOGIA

O estudo caracteriza-se por ser do tipo individuado, observacional e longitudinal, visto que os idosos foram investigados em dois momentos1818 Rouquayrol MZ, Silva MGC. Epidemiologia e Saúde. 7. ed. Rio de Janeiro: Medbook; 2013.. A primeira onda de observação ocorreu em 2010/2011, e a segunda onda em 2015/2016.

A coleta de dados foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), com o parecer 340/2009 para a primeira onda em 2010/2011, e documento de número 1.085.946 para a segunda onda em 2015/2016.

O cenário de estudo foi o município de Macaíba-RN, localizado na região metropolitana de Natal, a 21 km da capital. Segundo estimativas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o ano de 2020, a população total desse município era de 81.821 habitantes, sendo que destes, 40.478 (49,47%) eram do sexo masculino e 41.343 (50,53%), do sexo feminino. No que se refere à população de idosos, contabilizou-se um total de 8.614 indivíduos com 60 anos ou mais, o que correspondeu a 10,53% do total da população para aquele ano1919 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Departamento de Informática do SUS. 2020 – Estimativas preliminares elaboradas pelo Ministério da Saúde/SVS/CGIAE [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2020 [citado em 2020 nov 2]. Disponível em: https://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2020/estimativa_dou_2020.pdf.
https://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_P...
.

Para o cálculo do tamanho amostral do estudo base (2010/2011) foram utilizados a prevalência de edentulismo em idosos de 65 a 74 anos, de acordo com o SB Brasil 2003 (60,8%)20 e o20 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Projeto SBBrasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2004. tamanho estimado da população idosa do município de Macaíba-RN (5.801 idosos), conforme as estimativas populacionais do IBGE para o ano de 20092121 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Departamento de Informática do SUS. 2009 – Estimativas preliminares elaboradas pelo Ministério da Saúde/SVS/CGIAE [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2009 [citado em 2009 dez 20]. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6579#resultado.
https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6579#re...
. Além desses dados, foi considerada uma margem de erro de 10%, com nível de confiança de 95%, efeito de desenho de 1,5, além de 20% de taxa de não resposta.

Assim, após os ajustes necessários, obteve-se o tamanho amostral de 441 indivíduos, que foram recrutados por meio de um inquérito domiciliar no estudo base1414 de Oliveira TC, da Silva DA, Leite de Freitas YN, da Silva RL, Pegado CP, de Lima KC. Socio-demographic factors and oral health conditions in the elderly: a population-based study. Arch Gerontol Geriatr. 2013;57(3):389-97. http://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2013.05.004. PMid:23773366.
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. Porém, na segunda onda, ao visitar novamente os mesmos domicílios do estudo base, foram investigados 183 indivíduos, que passaram a compor a coorte em questão. Portanto, durante a segunda onda foram observados 80 óbitos e 178 perdas (mudança de endereço e recusa), que correspondem a 18,1% e 40,4% da amostra inicial.

As variáveis foram coletadas a partir de questionários socioeconômico-demográfico e do estado geral de saúde, além de uma ficha para exame epidemiológico das condições de saúde bucal, que foram observadas com auxílio de espelhos bucais e sondas periodontais do tipo OMS (Organização Mundial da Saúde), previamente esterilizados. Para medir o grau de ataque de cárie foi utilizado o índice CPO-d. A condição periodontal foi avaliada através do CPI e pela Perda de Inserção Periodontal (PIP), considerando-se o indivíduo. Também foram verificados o uso e a necessidade de próteses dentárias, bem como a presença de alterações em tecidos moles, através do exame epidemiológico intraoral.

Visando assegurar a confiabilidade dos dados a partir de uma adequada reprodutibilidade dos mesmos, foi realizado o treinamento e calibração dos 4 (quatro) examinadores participantes do estudo. Desta forma, observou-se que houve uma boa reprodutibilidade dos dados de saúde bucal, considerando aceitáveis os valores de coeficiente de concordância de Kappa a partir de 0,60 (variando de 0,755 a 0,908, com p-valor de 0,020 até 0,033).

A condição de saúde bucal dos idosos ao longo da coorte foi avaliada a partir de um indicador multidimensional produzido por meio de uma análise fatorial por componentes principais. Para tanto, foram incluídas nessa análise tanto as variáveis dependentes, relacionadas à saúde bucal dos idosos da coorte, quanto as variáveis independentes, relacionadas às condições socioeconômicas, demográficas e do estado geral de saúde desses indivíduos.

Os fatores comuns gerados a partir da análise fatorial passaram a representar as variáveis do estudo, de forma que as variáveis estudadas foram resumidas em dimensões comuns. Como cada indivíduo da amostra passou a ter um escore referente à cada uma das quatro dimensões geradas, esses escores foram somados. Esta soma representa o indicador multidimensional gerado. A fim de facilitar a interpretação do mesmo, a soma dos escores foi dicotomizada, categorizando a saúde bucal dos indivíduos em favorável e desfavorável.

Ademais, foi utilizado o teste t de Student para amostras dependentes com o intuito de investigar separadamente o comportamento dos fatores/dimensões ao longo do tempo. Além disso, foram buscadas associações entre as variáveis independentes e o indicador multidimensional de saúde bucal, categorizado por meio do teste do Qui-Quadrado de Pearson, com nível de significância de 5% e risco relativo bruto (IC 95%). Por fim, observou-se o comportamento da condição de saúde bucal da coorte ao longo do tempo por meio do teste de McNemar, mantendo o nível de significância anterior.

RESULTADOS

Devido ao grande número de perdas observadas ao longo do estudo, se fez necessário verificar a aleatoriedade das mesmas. Portanto, as principais variáveis de saúde bucal da primeira onda foram associadas a dois grupos de indivíduos: os respondentes e os não-respondentes, ou seja, os que participaram e os que não participaram da segunda onda, respectivamente.

Assim, observou-se que não houve associações significativas entre as variáveis analisadas e os idosos respondentes e não-respondentes. Logo, as perdas observadas não prejudicaram os resultados referentes aos desfechos analisados.

Nesse sentido, os resultados apresentados a seguir se referem aos 183 indivíduos que foram examinados nas duas ondas, ou seja, idosos que foram investigados tanto em 2010/2011 quanto em 2015/2016.

Quanto à caracterização socioeconômica e demográfica da coorte, observou-se na segunda onda um predomínio do sexo feminino (66,5%), com variação etária de 65 a 98 anos, onde pouco mais de 25% dos idosos tinham 80 ou mais anos de idade. Chama a atenção a baixa renda e escolaridade, constatadas tanto na primeira quanto na segunda onda (Tabela 1). Percebe-se, ainda, que as variáveis socioeconômicas e demográficas permaneceram constantes ao longo do tempo, com exceção da presença de cuidador e do estado civil, onde verificou-se que 20% dos indivíduos passaram a depender de um cuidador, justificando o aumento de indivíduos residindo com outros familiares, uma vez que parte dos cuidadores eram familiares que cuidavam desses indivíduos.

Tabela 1
Caracterização da coorte quanto às variáveis independentes. Macaíba-RN, 2019

Em relação à saúde bucal, o exame intraoral não pôde ser realizado em três indivíduos da segunda onda, visto que, no momento da coleta, dois deles se encontravam acamados em estado crítico, e um deles com um quadro avançado de herpes que impossibilitou o exame em duas tentativas. Portanto, ao se estudar esse desfecho, a coorte foi considerada como composta pelos 180 idosos examinados em ambas as ondas.

A Tabela 2 mostra que 13 idosos (7,2%) se tornaram edêntulos da primeira para a segunda onda, e que a necessidade de extração dentária diminuiu ao longo do tempo. Por outro lado, a condição periodontal dos elementos dentários ainda presentes piorou, devido ao aumento na média de sextantes com cálculo dentário e, principalmente, de sextantes com bolsa periodontal observadas durante a segunda onda. A média do índice CPO-d se manteve praticamente constante nas duas ondas e, ao decompor esse índice, a perda dentária representou 93,4% e 95,1% do mesmo na primeira e segunda onda, respectivamente. Estes resultados estão em conformidade com o esperado, justificando a alta prevalência de indivíduos em necessidade de próteses dentárias.

Tabela 2
Caracterização da coorte quanto às variáveis dependentes. Macaíba – RN, 2019

Para a produção do indicador multidimensional de saúde bucal referente aos 180 indivíduos da coorte, a princípio, 20 variáveis quantitativas coletadas nas duas ondas foram selecionadas para compor a análise em questão, 16 relacionadas à condição de saúde bucal, e 4 para aferir aspectos socioeconômico e demográficos (média de idade, anos de estudo, densidade domiciliar e renda familiar em salários mínimos). A inclusão dessas variáveis na análise fatorial depende, inicialmente, do teste de multicolinearidade, que verifica a correlação entre elas e, portanto, confirma a viabilidade da técnica estatística adotada. Assim, a partir dessa análise, identificou-se que nove variáveis deveriam ser excluídas por falta de adequação ao modelo, sendo mantidas onze variáveis que, a partir das suas correlações, foram reduzidas a quatro fatores comuns (Figura 1). Tais fatores passaram a representar dimensões relacionadas à condição de saúde bucal dos idosos da coorte.

Figura 1
Esquema representativo do resultado final da análise fatorial, assim como a composição de cada fator. Macaíba-RN, 2019

A última etapa para obtenção do indicador proposto ocorreu a partir da soma dos quatro escores fatoriais, devido ao fato de que cada fator previamente produzido gerou um escore para cada um dos indivíduos da coorte. Portanto, esses escores foram somados e a dicotomização dessa soma por meio da mediana forneceu o indicador requerido, uma vez que uma única variável (soma dos escores fatoriais) passou a representar todas as 11 variáveis relacionadas à condição de saúde bucal desses indivíduos.

A fim de melhor compreender a condição de saúde bucal dos idosos investigados, buscou-se uma análise longitudinal das dimensões que compõem o indicador multidimensional produzido. De forma que foram observadas ao longo da coorte as diferenças significativas entre as médias dos fatores 2 e 3 (Tabela 3), ou seja, as dimensões relativas aos dentes altamente comprometidos por cárie radicular, junto à incidência de idosos jovens que residiam com maior número de pessoas foram os fatores que demonstraram maior influência sobre a condição de saúde bucal desses idosos ao longo do tempo.

Tabela 3
Comportamento dos fatores ao longo da coorte, e exemplo de como o indicador foi produzido a partir dos fatores. Macaíba-RN, 2019

Além disso, a partir do indicador produzido foi possível avaliar longitudinalmente a condição de saúde bucal dos idosos. Portanto, observou-se ao longo do estudo que 40 indivíduos (22,2%) pioraram suas condições de saúde bucal da primeira para a segunda onda. Ao passo que 115 indivíduos (63,9%) mantiveram as condições de saúde bucal nesse intervalo de tempo, e 25 (13,9%) obtiveram uma melhora dessas condições (Tabela 4).

Tabela 4
Análise bivariada entre a condição de saúde bucal ao longo da coorte (aferida pelo indicador multidimensional) e as principais variáveis independentes, assim como demais análises bivariadas significativas ou no limiar de significância. Macaíba-RN, 2019

Por fim, as associações entre a condição longitudinal de saúde bucal da coorte e as variáveis independentes do estudo estão presentes na Tabela 4. As mesmas foram testadas a partir do teste do Qui-Quadrado e do cálculo do risco relativo bruto. Observou-se que nenhuma das variáveis testadas se associou significativamente à condição longitudinal de saúde bucal dos idosos.

DISCUSSÃO

As características socioeconômicas e demográficas da coorte em questão são semelhantes às encontradas em outros achados da literatura, incluindo o último inquérito nacional de saúde bucal realizado em 201099 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa nacional de saúde bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.,1414 de Oliveira TC, da Silva DA, Leite de Freitas YN, da Silva RL, Pegado CP, de Lima KC. Socio-demographic factors and oral health conditions in the elderly: a population-based study. Arch Gerontol Geriatr. 2013;57(3):389-97. http://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2013.05.004. PMid:23773366.
http://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2013...
,2222 Cardoso EM, Parente RCP, Vettore MV, Rebelo MAB. Condição de saúde bucal em idosos residentes no município de Manaus, Amazonas: estimativas por sexo. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(1):131-40. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2011000100012.
http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2011...
. A sobre-representação de mulheres constatada no presente estudo tem sido relatada na literatura enquanto um fenômeno mundial, justificado pela maior longevidade das mulheres em relação aos homens. Esse fenômeno pode ser explicado pela alta porcentagem de mortes violentas entre os homens jovens e adultos, pelo fato de as mulheres estarem menos expostas a determinados fatores de risco, como por exemplo, o consumo de álcool, tabaco e a realização de trabalhos arriscados e por fim, pelo fato de mulheres se preocuparem mais com sua saúde, quando comparada aos homens2323 Almeida AV, Tavares Mafra SC, Da Silva EP, Kanso S. A Feminização da Velhice: em foco as características socioeconômicas, pessoais e familiares das idosas e o risco social. Textos & Contextos (Porto Alegre). 2015;14(1):115-31. http://dx.doi.org/10.15448/1677-9509.2015.1.19830.
http://dx.doi.org/10.15448/1677-9509.201...
,2424 Silva PAB, Santos FC, Soares SM, Silva LB. Perfil sociodemográfico e clínico de idosos acompanhados por equipes de Saúde da Família sob a perspectiva do gênero. J Res Fundam Care online. 2018;10(1):97-105. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2018.v10i1.97-105.
http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2018...
.

O grau de escolaridade relatado pelos indivíduos da coorte ressalta os dados da literatura a respeito da baixa escolaridade da população idosa brasileira, uma vez que os idosos da coorte estudaram em média cerca de 2,3 (±2,79) anos. Destaca-se, então, o estudo de Melo et al.2525 Melo NCV, Ferreira, MAM, Teixeira KMD. Condições de vida dos idosos no Brasil: uma análise a partir da renda e nível de escolaridade. Oikos: Rev Bras Econ Doméstica 2014;25(1):4-19. que, ao discutir a condição de vida dos idosos no Brasil, revelaram que apenas 4,0% da população idosa do Norte e Nordeste apresenta o ensino superior completo, ao passo que no Sudeste essa porcentagem sobe para 8,0%. Esses dados confirmam a enorme disparidade regional e a necessidade de investimentos na área da educação, sobretudo em municípios de pequeno porte do Nordeste brasileiro, como é o caso de Macaíba.

Ademais, sabe-se que quanto maior o nível de instrução do indivíduo idoso, maior é a probabilidade de o mesmo utilizar os serviços de saúde e, desta forma, ter mais acesso aos meios preventivos que contribuem para uma melhor qualidade de vida2626 Andrade FB, Antunes JLF. Trends in socioeconomic inequalities in the prevalence of functional dentition among older people in Brazil. Cad Saude Publica. 2018;34(10):e00202017. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00202017. PMid:30329004.
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00202...

27 Souza RA, Alvarenga MRM, Amendola F, Silva TMR, Yamashita CH, Oliveira MAC. Vulnerabilidade de famílias de idosos assistidos pela Estratégia Saúde da Família. Rev Bras Enferm. 2015;68(2):218-26, 244-52. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2015680209i. PMid:26222167.
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28 Almeida AN. O acesso aos serviços de saúde pelos idosos no Brasil com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) entre 1998 e 2008. J Bras Econ Saúde. 2015;7(1):43-52.
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http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320202...
. Portanto, tais achados podem justificar a alta frequência (62,7%) de indivíduos da coorte com mais de dois anos desde sua última visita ao dentista, mesmo cobertos pela Estratégia Saúde da Família.

No que diz respeito às variáveis de saúde bucal, observou-se, por exemplo, que a prevalência de edentulismo nos indivíduos da coorte aumentou em 7,3 pontos percentuais ao longo de cinco anos, passando de 46,6% em 2010/2011 para 53,9% em 2015/2016. Esses resultados não surpreendem, uma vez que, segundo o SB Brasil, entre 2003 e 2010 a proporção de idosos edêntulos se manteve constante e próxima de 54%, onde o Nordeste se destaca, de forma negativa, apresentando a segunda maior proporção de edêntulos do país99 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa nacional de saúde bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.,2020 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Projeto SBBrasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2004..

A respeito das desigualdades regionais quanto à perda dentária, Peres et al.3030 Peres MA, Barbato PR, Reis SC, Freitas CH, Antunes JL. Perdas dentárias no Brasil: análise da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal 2010. Rev Saude Publica. 2013;47(Supl 3):78-89. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2013047004226. PMid:24626584.
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destacam que as mesmas são marcantes em relação à população idosa. De maneira geral, os residentes das capitais e interiores das regiões Norte e Nordeste apresentam maiores perdas, quando comparados aos residentes das regiões Sul e Sudeste. Esse quadro reflete a diferença socioeconômica e demográfica entre essas regiões, além de disparidades quanto à cobertura de medidas preventivas de caráter populacional, como a fluoretação de águas de abastecimento, concentrada nas regiões Sul e Sudeste do país, por exemplo.

Em relação aos dentes presentes, os resultados ora apresentados revelam que a condição periodontal desses elementos piorou ao longo do tempo, visto que a média de sextantes com bolsa periodontal aumentou em 2,7 vezes entre a primeira e a segunda investigação. Resultado semelhante ao encontrado por Prado3131 Prado, RL. Condição periodontal, perda dentária e diferenças socioeconômicas em adultos e idosos brasileiros [tese]. Araçatuba: Universidade Estadual Paulista; 2015., que, ao avaliar a condição periodontal de adultos e idosos brasileiros, observou que 59,9% (n=5.859) desses indivíduos apresentaram sangramento pós-sondagem e/ou cálculo dentário. O autor também observou que as variáveis socioeconômicas e demográficas se associaram fortemente às condições periodontais dos idosos investigados.

Os resultados desse estudo reforçam a dificuldade em se utilizar os índices de saúde bucal preconizados para avaliar a condição de saúde bucal desses indivíduos. Isoladamente, esses instrumentos nos fornecem diversos dados que, no fim, acabam dificultando a categorização da condição de saúde bucal de uma população idosa como um todo, bem como a discriminação dos indivíduos que mais necessitam de ações de proteção e recuperação em saúde3232 Freitas, YNL. Produção e validação de um indicador de saúde bucal para idosos a partir de dados secundários do SB Brasil 2010 [dissertação]. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2014.,3333 Saintrain MVDL, Vieira APGF. Application of the Community Oral Health Indicator by Non-Dental Personnel and Its Contribution to Oral Healthcare. Plos One 2012;7(7):e39733. http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0039733.
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0...
.

Nesse contexto, Freitas3232 Freitas, YNL. Produção e validação de um indicador de saúde bucal para idosos a partir de dados secundários do SB Brasil 2010 [dissertação]. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2014., Gomes e Abegg3434 Gomes AS, Abegg CO. impacto odontológico no desempenho diário dos trabalhadores do Departamento Municipal de Limpeza Urbana de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saude Publica. 2007;23(7):1707-14. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007000700023. PMid:17572821.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007...
, Bittencourt et al.3535 Bittencourt V, Abegg C, Fontanive VN. O impacto da saúde bucal nas atividades diárias de indivíduos de 50 a 74 anos em três distritos sanitários de Porto Alegre/RS. RFO UPF. 2013;18(1):37-43. http://dx.doi.org/10.5335/rfo.v18i1.2858.
http://dx.doi.org/10.5335/rfo.v18i1.2858...
e Vieira et al.3636 Vieira TTP, Santana GMS, Moura BM. Condição Periodontal do Idoso. Perionews. 2015;9(4):365-9. ressaltam a importância dos indicadores sociodentais, sócio-odontológicos ou indicadores de qualidade de vida relacionados à saúde bucal em levantamentos epidemiológicos. Esses autores reforçam a ideia de que os indicadores que incluem variáveis não clínicas, relacionadas de alguma forma com a saúde dos indivíduos, contribuem para o estabelecimento de diagnósticos mais amplos em relação às reais necessidades da população. Ademais, avaliações de necessidades em saúde baseadas exclusivamente em critérios clínicos refletem somente um aspecto da condição de saúde bucal, podendo ter pouca relação com os impactos sociais provocados pela situação de saúde dos indivíduos. Logo, a inclusão das variáveis socioeconômicas e demográficas na composição do instrumento proposto fez dele um indicador mais completo, favorecendo um diagnóstico mais adequado das condições de saúde bucal dos idosos na coorte.

Quanto à análise longitudinal dos fatores de saúde bucal que compõem o indicador proposto, observou-se que as médias dos fatores 2 e 3 variaram significativamente (p<0,001) da primeira para a segunda onda. Compreende-se, portanto, que o número de raízes cariadas e a necessidade de extração dentária diminuíram ao longo do estudo, que os idosos foram ficando mais velhos e a densidade domiciliar reduziu. Esses achados são compatíveis com a literatura que, em geral, aponta a maior longevidade como fator de risco para a perda dentária, consequentemente diminuindo as chances de acometimento por cárie radicular, resultando em menor necessidade de extrações dentárias1111 Colussi CF, Freitas SFT. Aspectos epidemiológicos da saúde bucal do idoso no Brasil. Cad Saude Publica. 2002 out;18(5):1313-20. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2002000500024. PMid:12244364.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2002...
,3030 Peres MA, Barbato PR, Reis SC, Freitas CH, Antunes JL. Perdas dentárias no Brasil: análise da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal 2010. Rev Saude Publica. 2013;47(Supl 3):78-89. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2013047004226. PMid:24626584.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.201...
,3737 Campostrini EP, Ferreira EF, Rocha FL. Condições da saúde bucal do idoso brasileiro. Arq Odontol. 2007;43(2):48-56..

Ao verificar a influência que as variáveis independentes exerceram sobre cada um dos quatro fatores que compõem o indicador gerado, observou-se que o estado civil estava significativamente associado ao fator 2, referente ao número de elementos dentários com cárie radicular e à necessidade de extração ao longo da coorte. Portanto, os achados mostraram que viver em união estável foi fator de proteção (RR: 0,54; IC: 0,32 – 0,91) para a cárie radicular e para a necessidade de extração dentária, indicando que indivíduos que possuem companheiro(a) cuidaram melhor de seus dentes ou procuraram mais os serviços odontológicos para um tratamento, geralmente, mutilador. De acordo com Feliciano et al.3838 Feliciano AD, Moraes AS, Freitas ICM. O perfil do idoso de baixa renda no Município de São Carlos, São Paulo, Brasil: um estudo epidemiológico. Cad Saúde Pública 2004;20(6):1575-85. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2004000600015.
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, depois dos filhos, o(a) companheiro(a) afigura-se como o(a) principal cuidador(a) do idoso, contribuindo para uma melhora na qualidade de vida desses indivíduos.

É importante destacar que, apesar de o indicador proposto ter possibilitado uma categorização mais adequada da coorte quanto à condição de saúde bucal, nenhuma variável independente foi associada ao desfecho. Embora o caráter multidimensional do indicador aqui apresentado melhore a categorização dos indivíduos por meio da condição de saúde bucal, acredita-se que a distribuição de algumas variáveis independentes também tenha contribuído para a ausência dessas associações.

Portanto, se faz necessária a aplicação do referido indicador em outros contextos, a fim de possibilitar a validação do mesmo a partir de populações menos homogêneas em relação às variáveis coletadas. Ou ainda, a realização de estudos comparados buscando associações entre populações idosas inseridas em contextos sociais diferentes.

Apesar de não terem sido observadas associações relevantes entre as variáveis independentes e o desfecho estudado, entende-se que a produção do indicador multidimensional aqui proposto representa um instrumento extremamente útil para fomentar reflexões quanto à saúde bucal desses indivíduos, facilitando a tomada de decisão quanto às ações de saúde bucal voltadas a esse grupo etário.

AGREDECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, por possibilitar a realização dessa pesquisa através da bolsa de estudos de doutorado (protocolo 1386149 – CAPES/DS).

  • Como citar: Freitas YNL, Pinheiro NCG, Lima KC. Avaliação da saúde bucal em uma coorte de idosos não institucionalizados. Cad Saúde Colet, 2022; Ahead of Print. https://doi.org/10.1590/1414-462X202230040126
  • Trabalho realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) – Natal (RN), Brasil.
  • Fonte de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    08 Abr 2020
  • Aceito
    14 Dez 2020
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