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Possibilidades e desafios para o empoderamento feminino: perspectivas de mulheres em vulnerabilidade social

Posibilidades y desafíos para el empoderamiento de las mujeres: perspectivas de mujeres en vulnerabilidad social

Resumo

Objetivo

investigar as possibilidades e desafios para o empoderamento de mulheres em vulnerabilidade social, residentes na periferia de um município localizado na região sul - Brasil.

Método

pesquisa qualitativa, do tipo ação participante, realizada por meio do Itinerário de Paulo Freire. Foi operacionalizada em seis Círculos de Cultura, com a participação de doze mulheres entre 18 e 79 anos, em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) de um município do Sul do Brasil, nos meses de maio a julho de 2019.

Resultados

na primeira etapa identificaram-se 45 temas geradores, os quais foram codificados, descodificados e desvelados, mediante ação dialógica. Três temas foram selecionados pelas participantes para a discussão no estudo: Enfrentamento do problema; Jeito de Ser; Cuidado com o outro.

Considerações finais e implicações para a prática

a necessidade das mulheres ressignificarem suas vidas foi fortalecida por atitudes proativas de mudança para o enfrentamento das adversidades do dia a dia. Este estudo, embasado nos pressupostos de Paulo Freire, fortaleceu o empoderamento e a autonomia dessas mulheres, gerando possibilidades de transformações em suas vidas e nos espaços em que convivem.

Palavras-chave:
Saúde da Mulher; Promoção da Saúde; Autonomia Pessoal; Vulnerabilidade Social; Empoderamento

Resumen

Objetivo

investigar las posibilidades y desafíos para el empoderamiento de mujeres en vulnerabilidad social, residentes en las afueras de un municipio ubicado en el sur-Brasil.

Método

investigación cualitativa, del tipo acción participante articulada al Itinerario de Paulo Freire, que recorrió tres momentos: investigación temática; codificación y descodificación; y desvelo crítico. Se operó en seis Círculos Culturales, con la participación de doce mujeres entre 18 y 79 años, en una Unidad Básica de Salud (UBS) en un municipio del sur de Brasil, de mayo a julio de 2019.

Resultados

en la primera etapa se identificaron 45 temas generadores, que fueron codificados, decodificados y desvelados, a través de la acción dialógica. Los participantes seleccionaron tres temas para debatir en el estudio: Enfrentando el problema; Manera de Ser; Cuidado con el otro.

Consideraciones finales e implicaciones para la práctica

la necesidad de las mujeres de resonar sus vidas fue fortalecida por actitudes proactivas de cambio para el enfrentamiento de las adversidades del día a día. Este estudio, basado en los presupuestos de Paulo Freire, fortaleció el empoderamiento y la autonomía de estas mujeres, generando posibilidades de transformaciones en sus vidas y en los espacios en que conviven.

Palabras clave:
Salud de la Mujer; Promoción de la Salud; Autonomía Personal; Vulnerabilidad Social; Empoderamiento

Abstract

Objective

to investigate the possibilities and challenges for the empowerment of socially vulnerable women living in the outskirts of a municipality located in the southern region of Brazil.

Method

a qualitative research, of participant action type, carried out through the Itinerary of Paulo Freire. It was operationalized in six Culture Circles, with the participation of twelve women between 18 and 79 years old, in a Basic Health Unit (BHU) of a municipality in southern Brazil, in the months of May to July 2019.

Results

In the first stage, 45 generating themes were identified, which were codified, decoded, and unveiled through dialogical action. Three themes were selected by the participants for discussion in the study: Facing the problem; Way of being; Caring for others.

Final considerations and implications for practice

the need for women to re-signify their lives was strengthened by proactive attitudes of change to face the adversities of everyday life. This study, based on Paulo Freire's assumptions, strengthened the empowerment and autonomy of these women, generating possibilities of transformations in their lives and in the spaces where they live.

Keywords:
Women's Health; Health Promotion; Personal Autonomy; Social Vulnerability; Empowerment

INTRODUÇÃO

A população feminina, ao longo da história, revela vítimas de violência, expostas a situações de vulnerabilidade social. Seus direitos foram fortalecidos com a criação da ONU Mulheres, pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2010, a fim de empoderar e promover a equidade de gênero em todas as atividades sociais, melhorar a qualidade de vida, fortalecer o desenvolvimento sustentável e os direitos humanos. Conta com estratégias principais: liderança e participação política, empoderamento, combate a violência contra as mulheres, paz, segurança, emergências humanitárias, governança, planejamento e normas globais e regionais11 Organização Nacional das Nações Unidas. Sobre a ONU Mulheres [Internet]. 2020 [citado 2020 set 25]. Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/onu-mulheres/sobre-a-onu-mulheres/
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O direito das mulheres veio tardiamente e originou gerações inferiorizadas, suscetíveis a riscos e situações de vulnerabilidade, cujo resultado causa o padrão de dominação masculina, criando barreiras para a autonomia pessoal e propiciando a desigualdade. Neste cenário, considera-se o conceito de vulnerabilidade como necessidades básicas insatisfeitas, pobreza multidimensional e desenvolvimento humano22 Costa MA, Santos MPG, Marguti B, Pirani N, Pinto CVS, Curi RLC et al. Vulnerabilidade social no Brasil: conceitos, métodos e primeiros resultados para municípios e regiões metropolitanas brasileiras [Internet]. Rio de Janeiro: IPEA, 2018 [citado 2020 set 30]. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/td_2364b.pdf
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Neste contexto, a vivência da insegurança com relação ao gênero se enquadra no que se refere à vulnerabilidade social estar relacionada a um conceito não linear. A pessoa que vivencia essa condição nem sempre tem a percepção da situação de vulnerabilidade, podendo ter limitado o seu acesso a bens e serviços como educação, saúde, segurança e estratégias promotoras de saúde. Além disso, pode-se considerar a fragilização de vínculos afetivos, como também das discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências33 Schmitt ARV, Marques ESJT, Spessatto MB. A educação como ferramenta de inclusão social de mulheres em vulnerabilidade social. Espacios Transnacionales [Internet]. 2020; [citado 2020 jul 6];7(14):140-53. Disponível em: http://espaciostransnacionales.org/wp-content/uploads/2020/09/ET_14_Marques.pdf
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No Brasil, o Ministério da Educação instituiu o Programa Mulheres Mil, em parceria com o governo canadense, entre 2007 e 2011, a fim de atender às mulheres em situação de vulnerabilidade social, promovendo educação profissional e tecnológica, proporcionando melhora da qualidade de vida de todos os envolvidos no processo de empoderamento das mulheres atendidas. Trata-se de uma iniciativa importante para sensibilizar a comunidade sobre essa temática, no entanto a mesma não se faz suficiente44 Ministério da Saúde (BR). Programa Nacional Mulheres Mil [Internet]. 2020 [citado 2020 out 6]. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/programa-mulheres-mil
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Há eminente necessidade de inserir debates sobre vulnerabilidade social relacionados ao gênero na pauta das políticas públicas, associados a um processo educacional igualitário, não patriarcal, que discuta padrões de gênero, ampliando assim os espaços de discussão com direito de fala para o público em questão, para que possam se sentir seguras e empoderadas55 Souza KN. O empoderamento para a mulher em vulnerabilidade social. RG&PP. 2019;9(1):141-61. http://dx.doi.org/10.11606/rgpp.v9i1.175917.
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Durante várias décadas, as mulheres em seus espaços cotidianos tiveram as suas atribuições restritas para serem as mantenedoras da ordem, tornando-se responsáveis pela reprodução/procriação, educação dos filhos, cuidados com o lar e obediência ao marido. Esta divisão doméstica do trabalho no ambiente familiar significa dizer que há relações de poder desiguais que geram um lugar de exploração e profunda desigualdade social. As condições de inferiorização vivenciadas pelas mulheres foram transformadas em práticas rotineiras de subordinação, sendo que o seu empoderamento deve possibilitar que lutem contra a desigualdade de gênero (sexismo), contribuindo com a emersão de instrumentos de viabilização de direitos66 Silva EP, Monteiro CFB. Estratégias de enfrentamento de mulheres vítimas de violência intrafamiliar: rotas de empoderamento. Uningá Review [Internet]. 2017; [citado 2020 jul 11];29(2):110-7. Disponível em: http://34.233.57.254/index.php/uningareviews/article/view/1947
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O conceito de gênero no lugar da categoria sexo rejeita a imposição do determinismo biológico sobre o que seria “ser mulher” e “ser homem”. Ao utilizar o conceito gênero, destacam-se o caráter social e a posição da mulher em sociedade ou, mais do que isso, problematiza o “ser mulher”77 Gomes CM. Gênero como categoria de análise decolonial. Civitas: Rev Ciênc Sociais. 2018;18(1):65-82. http://dx.doi.org/10.15448/1984-7289.2018.1.28209.
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Neste, é imprescindível trabalhar a promoção da saúde como uma concepção que visa capacitar e empoderar indivíduos e comunidades para atuar na melhoria da sua qualidade de vida. Esta se revela como estratégia de promover saúde, fortalecendo a emancipação das pessoas, no âmbito político e cultural, prosperando das atividades individuais para coletivas, impulsionando mudanças nas condições de vida. Está articulada a diversos princípios: vida, saúde, solidariedade, equidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e ação conjunta88 Heidemann ITSB, Cypriano CC, Gastaldo D, Jackson S, Rocha CG, Fagundes E. A comparative study of primary care health promotion practices in Florianópolis, Santa Catarina State, Brazil, and Toronto, Ontario, Canada. Cad Saude Publica. 2018;34(4):e00214516. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00214516.
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. E está atrelada a um conjunto de ações: políticas públicas saudáveis; criação de ambientes favoráveis; reforço da ação comunitária; desenvolvimento de habilidades pessoais e reorientação dos serviços de saúde99 Santos SKZ, Da Ros MA. Ressignificando promoção de saúde em grupos para profissionais da saúde. Rev Bras Educ Med. 2016;40(2):189-96. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v40n2e02272014.
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,1010 Bezerra IMP, Sorpreso ICE. Concepts and movements in health promotion to guide educational practices. J Hum Growth Dev. 2016;26(1):11-20. http://dx.doi.org/10.7322/jhgd.113709.
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Mediante este ideário da promoção da saúde, o empoderamento possibilita às pessoas e comunidade conhecimento que os capacita a uma existência saudável nos diferentes ciclos de vida e enfrentamento dos possíveis desafios relacionados ao processo saúde e doença1111 Magagnin AB, Heidemann ITSB. Empowerment of family caregiver in front of stroke in hospital environment. Rev Bras Enferm. 2020;73(4):e20190165. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0165.
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,1212 Eskildsen NB, Joergensen CR, Thomsen TG, Ross L, Dietz SM, Groenvold M et al. Patient empowerment: a systematic review of questionnaires measuring empowerment in cancer patients. Acta Oncol. 2017;56(2):156-65. http://dx.doi.org/10.1080/0284186X.2016.1267402.
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. Ocorre por meio do desenvolvimento de prioridades e promove a tomada de decisão, pois proporciona o exercício da autonomia da população, com vistas à melhoria das condições de saúde. Por isso, demanda um total e permanente acesso à informação, às oportunidades de aprendizado, assim como apoio financeiro adequado1313 Costa DW, Parreira BDM, Borges FA, Tavares DMS, Chaves LDP, Goulart BF. Health education and user’s empowerment of the family health strategy. Rev Enferm UFPE. 2016;10(1):96-102. http://dx.doi.org/10.5205/reuol.8423-73529-1-RV1001201613.
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Como forma de promover o empoderamento das populações, a ação educativa permite estimular a consciência crítica e a autonomia que exige uma escuta atenta e uma comunicação dialógica, envolvendo a ação, reflexão e ação. A prática educativa, capacita as pessoas a enfrentarem as adversidades e a buscarem o enfrentamento das situações vívidas e estimulando-as a uma nova compreensão da realidade1414 Faria L, Quaresma MA, Patiño RA, Siqueira R, Lamego G. Teaching-service-community integration in practice scenarios of interdisciplinary Health Education: an experience of the Work Education for Health Program (PET-Health) in Southern Bahia. Interface. 2018;22(67):1257-66. http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622017.0226.
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Neste contexto, emergiu o seguinte questionamento: quais as possibilidades e desafios para o empoderamento de mulheres em vulnerabilidade social? O fato é que valorizar o saber e sensibilizar as pessoas para modificação do seu cotidiano, capacitando-as para uma participação crítica na atenção em saúde, e também a sua evolução enquanto ser humano, são competências do enfermeiro e demais profissionais1515 Pinheiro DGM, Scabar TG, Maeda ST, Fracolli LA, Pelicioni MCF, Chiesa AM. Health promotion competencies: challenges of formation. Saude Soc. 2015;24(1):180-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902015000100014.
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. Haja vista o que se precede se delineou como objetivo investigar as possibilidades e desafios para o empoderamento de mulheres em vulnerabilidade social, residentes na periferia de um município localizado no sul de Santa Catarina/Brasil.

MÉTODO

Estudo de abordagem qualitativa, do tipo pesquisa ação participante, pautado no referencial teórico da Promoção da Saúde e com apoio do Itinerário de Pesquisa de Paulo Freire, desenvolvido em três momentos: Investigação Temática, Codificação e Descodificação, e Desvelamento Crítico.

O estudo foi desenvolvido em uma Unidade Básica de Saúde (UBS), com Estratégia de Saúde da Família (ESF), de um município do litoral catarinense, Brasil, nos meses de maio a julho de 2019. Teve como participantes doze mulheres que, convidadas no momento da consulta de Enfermagem, aceitaram participar dos Círculos de Cultura. No transcorrer dos três meses, desenvolveram-se as etapas do Itinerário Freireano, abordados em seis Círculos de Cultura e realizados no auditório da UBS. Os Círculos, agendados previamente, aconteceram com um intervalo de 15 dias, com duração média de duas horas cada. Como critérios de inclusão foram convidadas mulheres em vulnerabilidade social que buscavam a UBS para consulta de enfermagem. Consideraram-se como critérios de exclusão: idade inferior a dezoito anos e não pertencer à área adstrita da UBS.

O ambiente do Círculo de Cultura foi disposto de forma a favorecer o diálogo entre as participantes e mediadores da pesquisa. Os encontros foram realizados sob mediação de uma enfermeira, pesquisadora, com experiência na condução desse tipo de abordagem metodológica.

Para iniciar o Círculo de Cultura, fez-se uma dinâmica de apresentação entre as participantes, mencionando um adjetivo, em que cada uma se identificasse e disparando o diálogo no grupo, oportunizando as mediadoras a apresentação do estudo, assim como a investigação dos temas geradores. Estes termos são palavras extraídas do universo vocabular dos participantes, de acordo com seu cotidiano e a partir das situações limite, ou seja, dos obstáculos que se interpõem frente a uma crise1616 Freire P. Pedagogia do oprimido. 64. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2017..

Na etapa da Investigação Temática, por meio do diálogo, promoveu-se uma dinâmica de grupo para apresentação, descontração e aproximação das participantes. Dessa forma, deu-se o “start” dialógico e proporcionou aos pesquisadores a apresentação da proposta de pesquisa, assim como a investigação inicial dos Temas Geradores vinculados à realidade do grupo.

Nesta etapa, foram levantados 45 Temas, os quais foram dialogados e concomitantemente, desvelados. Utilizaram-se tarjetas com a descrição dos Temas Geradores para serem visualizados por todas as participantes do Círculo de Cultura. Dos 45 Temas refletidos, posteriormente, reduziram-se para 23, conforme interesse do grupo. Estas temáticas foram dialogadas e concomitantemente, desveladas nos Círculos de Cultura. No processo de codificação e descodificação, dos 23 Temas Geradores resultaram em três temáticas principais de interesse do grupo: Enfrentamento do problema; Jeito de Ser; Cuidado com o outro.

Em seguida, adentrou-se na fase da Codificação e Descodificação do Itinerário de Pesquisa. A Codificação é fundamental, visto que organiza os temas evidenciados na investigação, expressando os significados no momento que modifica a olhar ingênuo por uma visão crítica da realidade. Esta ação permite visualizar as temáticas elencadas e possibilita aos participantes dialogar sobre a realidade e revelar suas contradições. A partir deste novo olhar sobre a realidade, amplia-se e exalta-se a reflexão do cotidiano, capacitando-os para enfrentar as situações limites88 Heidemann ITSB, Cypriano CC, Gastaldo D, Jackson S, Rocha CG, Fagundes E. A comparative study of primary care health promotion practices in Florianópolis, Santa Catarina State, Brazil, and Toronto, Ontario, Canada. Cad Saude Publica. 2018;34(4):e00214516. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00214516.
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,1616 Freire P. Pedagogia do oprimido. 64. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2017..

A mediadora apresentou os temas geradores investigados, solicitando as participantes que codificassem e descodificassem as temáticas principais a serem trabalhadas nos próximos Círculos de Cultura. Frente à iminência de momentos dialógicos e embasados na proposta pedagógica de Paulo Freire1313 Costa DW, Parreira BDM, Borges FA, Tavares DMS, Chaves LDP, Goulart BF. Health education and user’s empowerment of the family health strategy. Rev Enferm UFPE. 2016;10(1):96-102. http://dx.doi.org/10.5205/reuol.8423-73529-1-RV1001201613.
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, todos os encontros se realizaram de forma participativa, horizontal, humanizada e respeitosa, buscando no vivenciar a possibilidade de rompimento com certos processos de domesticação e alienação cotidiana. Assim, à medida que os Temas Geradores emergiram, foram sendo descodificados e desvelados de acordo com o interesse das mulheres envolvidas.

É a partir da situação existencial, do pensar sobre o cotidiano, que se enfrenta a realidade. Dessa forma, na fase do Desvelamento Crítico ocorre a conscientização sobre os Temas Geradores investigados, por meio do diálogo, e torna mais concreto um movimento de transformação da realidade vivida88 Heidemann ITSB, Cypriano CC, Gastaldo D, Jackson S, Rocha CG, Fagundes E. A comparative study of primary care health promotion practices in Florianópolis, Santa Catarina State, Brazil, and Toronto, Ontario, Canada. Cad Saude Publica. 2018;34(4):e00214516. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00214516.
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,1616 Freire P. Pedagogia do oprimido. 64. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2017.. Esse desvelar aconteceu nos dois últimos Círculos de Cultura, e contribuíram para o processo de ação e reflexão dos Temas Geradores.

Cada participante recebeu uma flor e estas eram de diferentes cores, representando suas especificidades, potencialidades e diferentes qualidades, o que permitiu o desvelar da autonomia da mulher em todos os espaços de seu dia a dia, reforçando o empoderamento feminino como possibilidade de enfrentamento dos constantes papéis de vulnerabilidade social perpetuados nos diversos contextos em que a mulher transita.

A etapa do Desvelamento Crítico foi ancorada nas concepções da promoção da saúde atrelada aos preceitos de Paulo Freire, possibilitando uma percepção crítica da realidade, com reforço aos princípios da convivência, do respeito com o outro, da responsabilidade/ compromisso consigo, assim como da generosidade e solidariedade com o outro. Esses valores estruturais comungam com as concepções defendidas por Freire, os quais embasam a Promoção da Saúde. É nesta fase que se estimula a reflexão (e ação) dos participantes, buscando a problematização e a passagem da consciência ingênua para a consciência crítica1616 Freire P. Pedagogia do oprimido. 64. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2017..

O Desvelamento dos Temas ocorreu concomitantemente com a Investigação Temática com todas as participantes envolvidas no estudo, como sugere a abordagem freireana, ao prever a análise temática77 Gomes CM. Gênero como categoria de análise decolonial. Civitas: Rev Ciênc Sociais. 2018;18(1):65-82. http://dx.doi.org/10.15448/1984-7289.2018.1.28209.
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. Este momento, tradicionalmente conhecida como análise dos dados, no Itinerário de Paulo Freire, é um processo constante de ação-reflexão-ação durante os Círculos de Cultura, por meio da leitura cautelosa, reflexão e análise dos temas relevantes.

Para registrar as temáticas utilizaram-se caderno de campo e gravador de áudio durante Círculo de Cultura, que foram permitidos pelas participantes.

A pesquisa seguiu os preceitos éticos da Resolução 466 de 2012 e o termo de consentimento livre e esclarecido foi assinado pelas mulheres. Para preservar o anonimato, as participantes foram identificadas com codinomes que representam palavras-chave extraídas da obra Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire1717 Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 60. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2019.. O estudo iniciou somente após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, sob parecer número 2.878.505 e CAAE 95490518.8.0000.0121.

RESULTADOS

Participaram dos Círculos de Cultura doze mulheres, entre casadas e solteiras, com faixa etária de 18 a 79 anos, baixa escolaridade, com ocupações como do lar, estudantes, cabeleireira, vendedora, cuidadora e aposentadas, moradoras de um bairro periférico de um município de Santa Catarina. As temáticas geradas e que constituíram os principais interesses do grupo para serem debatidos foram: Enfrentamento do problema; Jeito de Ser; Cuidado com o outro.

Ressalta-se que os Temas gerados representam a realidade das mulheres que participam deste estudo e trazem à tona algumas carências e concepções do seu dia a dia e, assim, possibilitam novas reflexões frente às suas histórias de vida. A questão de pesquisa foi norteando para discussões nos Círculos de Cultura, de modo que as participantes expressassem as práticas de empoderamento.

Ao codificar e descodificar o primeiro Tema Gerador, “Enfrentamento do problema“, perceberam-se, no desencadear dos depoimentos, questões voltadas ao cotidiano, que se repetiam em momentos diversos, permitindo a verbalização de sofrimentos individuais. Neste momento foram enfatizadas as necessidades levantadas pelo grupo e identificaram-se uma fortaleza relacionada à coragem das mulheres para enfrentar os momentos difíceis, a tentativa constante de manter o controle das situações mais complexas do seu cotidiano, bem como a sua capacidade de superação.

Esse ato de confrontar necessita a capacidade de agir apropriadamente com coragem:

[...] esses dias eu estava em um ônibus e entrou um senhor e logo disse: Da licença que eu quero sentar. Aí eu peguei a muleta e fui levantar porque ele foi super grosso, aí o cobrador lá de trás gritou: Não, você vai ficar aí ...– Senhor, tem um banco aqui atrás. Ela está no direito dela, está no banco dela. Ele falou: Eu não vi que ela era aleijada. – Você sim é aleijado da cabeça, por você não ter educação e falar uma coisa dessas. Ele ficou quieto lá.... É muita discriminação, as pessoas me olham torto, eu fico ouvindo [...] (Criticidade)

As mulheres demonstraram capacidade de enfrentar seus problemas e situações de estresse:

Meu marido era analfabeto, eu, de onze em onze meses, eu ganhava um filho, eu lavava para fora. Eu iria o quê? Chorar? Pedir esmola? Pedir uma coisa pro vizinho? (Curiosidade)

Também se desvelou como forma de enfrentar os problemas cotidianos relacionados às questões financeiras, ao relacionamento conjugal e familiar:

Eu comecei a trabalhar quando me separei, fui obrigada a começar a trabalhar. (Curiosidade)

Destacaram, também, como agem frente a situações de saúde e doença:

Eu não me entrego. Pensa que eu vou me entregar porque eu estou com dor no joelho? Eu não! Tem uma pomadinha, vou tomar um banho, massagear. (Comprometimento)

Durante os diálogos, procurou-se refletir juntamente com as participantes a importância da mulher se empoderar em seu cotidiano, valorizando suas fortalezas e potencialidades como ferramenta de superação das fragilidades.

Ao codificar e descodificar o Tema Gerador, “jeito de ser”, foi dialogado sobre as características pessoais atribuídas pelas mulheres, que são perceptíveis formas de autocuidado em busca de saúde e qualidade de vida:

Eu acho que a gente tem que se amar e se gostar. (Sensibilidade)

As participantes do estudo apontaram que enfrentam a sua rotina diária com amor, carinho e paciência:

Meu trabalho eu faço com amor, com carinho, tenho paciência. (Comprometimento).

Além dos relatos sobre sentimentos como carência, baixa autoestima e depressão, as mulheres conseguem ser felizes no seu cotidiano. É possível observar esse aspecto no seguinte depoimento:

Estou sempre alegre. Porque se eu me abater, se eu fosse me entregar, hoje eu estava com depressão, eu estava no fundo de uma cama. Feliz, é eu mesma que faço a felicidade.... Eu não tenho tristeza. (Comprometimento)

Este tema foi vivenciado pela maioria do grupo e para trabalhá-lo, as participantes revelaram depoimentos voltados para a atenção das suas atividades diárias, interligando o cuidado de si ao desvelamento das fragilidades e enfrentamento do cotidiano. Ao cuidarem de si, dialogaram sobre as suas deficiências relacionadas a situações econômicas, sociais e familiares que podem promover a sua qualidade de vida.

O terceiro Tema Gerador, “Cuidado com o outro”, se demonstrou relevante nos discursos das participantes, mediante a codificação e a descodificação. Destacam, principalmente, a função de cuidadora que a mulher assume, seja em seu domicílio e nos diferentes espaços em que se relaciona e vivencia e a importância do papel social de ser mãe, esposa, amiga, irmã, vizinha, entre outros.

Os relatos demonstraram o lado maternal das participantes:

Eu gosto muito de cuidar dos idosos e das crianças. Então, lá na minha rua, todo mundo me procura, quando está doente, está na cadeira de rodas, eu vou lá trocar fraldas, eu dou a medicação. (Escuta)

Ou ainda quando reforça:

[...] ela é minha única filha, eu fazia tudo que eu podia, tentei tirar das drogas, procurei juizado de menor, porque não é tu só ir atrás de filho, tem que ver os direitos dele. (Escuta)

A partir disso, as participantes passaram a vincular tais reflexões às suas realidades de vida, conforme sugere a fala a seguir:

[...] é eu mesma que faço a felicidade.... Quando eu tenho um filho e está numa má situação, eu reúno e a gente já tira aquela dificuldade dele. (Comprometimento)

Durante os diálogos, evidenciou-se o empoderamento das participantes o qual, quando fortalecido, propicia o cuidado de si e o cuidado do outro:

Pessoal, quando vocês tiverem problemas, vocês botem os pés no chão, botem pra pensar, mas nunca deixem se levar para baixo. Sempre pra cima! (Sensibilidade).

Os círculos de cultura possibilitaram reflexões nas participantes, contribuindo para o cuidado de si e do outro. Por meio desta metodologia se estimulou as mulheres a repensar a sua vida cotidiana e as encorajou para o enfrentamento crítico da sua realidade de vida.

DISCUSSÃO

Para identificar e compreender as situações de vida das mulheres e estimular o empoderamento é premente a escuta atenta, com valorização no cuidado em saúde, em busca de estabelecer vínculo com os enfermeiros e demais profissionais da saúde1818 Winters JRF, Heidemann ITSB, Maia ARCR, Durand MK. Empowerment of women in situations of social vulnerability. Rev Enf Ref. 2018;serIV(18):83-91. http://dx.doi.org/10.12707/RIV18018.
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Neste espaço, quando os profissionais da saúde escutam e conversam, compartilham saberes e compreendem o contexto de vida das mulheres, considerando seus direitos e com incentivo a enfrentarem seus problemas com determinação e coragem. Muitas vezes, orientam suas ações para que as mulheres tomem consciência do problema1919 Oliveira RNG, Fonseca RMGS. Health needs: the interface between the discourse of health professionals and victimized women. Rev Lat Am Enfermagem. 2015;23(2):299-306. http://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.3455.2555.
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Nesta perspectiva, a informação e o diálogo vão além do bem-estar físico, interferindo na construção desse novo conhecimento que resulta no empoderamento das mulheres sobre suas tomadas de decisões em suas vidas e na sua saúde1919 Oliveira RNG, Fonseca RMGS. Health needs: the interface between the discourse of health professionals and victimized women. Rev Lat Am Enfermagem. 2015;23(2):299-306. http://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.3455.2555.
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. Esses valores estruturais comungam com as concepções defendidas por Freire, os quais embasam a Promoção da Saúde. É nesta fase que se estimula a reflexão (e ação) dos participantes, buscando a problematização e a passagem da consciência ingênua para a consciência crítica1616 Freire P. Pedagogia do oprimido. 64. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2017..

Para isso existem caminhos para aumentar o empoderamento de pessoas. Um meio não muito divulgado é a transformação pessoal, interna, das crenças e pensamentos. O empoderamento, nesse sentido, implica conquista da liberdade, avanço e superação do estado de subordinação2020 Roso A, Romanini M. Empoderamento individual, empoderamento comunitário e conscientização: um ensaio teórico. Psicologia e Saber Social. 2014;3(1):83-95. http://dx.doi.org/10.12957/psi.saber.soc.2014.12203.
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Dessa forma, a atenção em saúde deve ser transformada para além do cuidado do corpo, resultando na emancipação e autonomia das mulheres acerca de sua vida. A autonomia se refere à mulher como protagonista de suas ações e práxis, estimulando o seu encorajamento, sendo necessária a inserção das questões de gênero nas políticas públicas e no processo de trabalho dos profissionais de saúde1818 Winters JRF, Heidemann ITSB, Maia ARCR, Durand MK. Empowerment of women in situations of social vulnerability. Rev Enf Ref. 2018;serIV(18):83-91. http://dx.doi.org/10.12707/RIV18018.
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Os desafios apresentados pela vida estimulam o ser humano a buscar novamente diferentes formas de como pensar. Ao mudar o modo como se vê o mundo e a sua relação com os outros, torna-se possível melhorar as habilidades de enfrentamento, o que contribui para o cuidado de si. Entretanto, diante aos desafios, algumas pessoas experimentam a possibilidade de ir além de si, fomentando novos campos de experiência e empoderamento2121 Prestes CRS, Paiva VSF. Psychosocial approach and health of black women: vulnerabilities, rights and resilience. Saude Soc. 2016;25(3):673-88. http://dx.doi.org/10.1590/s0104-129020162901.
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O empoderamento da mulher por meio da informação tem papel fundamental no processo de autotransformação da pessoa, objetiva o fortalecimento do cuidado de si e enfrentamento da realidade permitindo a criação de estratégias de autocuidado e parcerias que contribuam para sua autonomia e emancipação com transformação da realidade social1818 Winters JRF, Heidemann ITSB, Maia ARCR, Durand MK. Empowerment of women in situations of social vulnerability. Rev Enf Ref. 2018;serIV(18):83-91. http://dx.doi.org/10.12707/RIV18018.
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,2020 Roso A, Romanini M. Empoderamento individual, empoderamento comunitário e conscientização: um ensaio teórico. Psicologia e Saber Social. 2014;3(1):83-95. http://dx.doi.org/10.12957/psi.saber.soc.2014.12203.
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As participantes percebem que a espiritualidade pode apoiá-las na superação das adversidades do processo saúde e doença, emergindo a força para viver, fortalecendo os laços interpessoais, o sentido da vida e o enfrentamento da morte. A espiritualidade por meio da fé, ajuda na compreensão da enfermidade, ao permitir conforto, aceitação, e força para seguir o percurso do nascer, viver e morrer2222 Oliveira ADF, Vieira MCA, Silva SPC, Mistura C, Jacobi CS, Lira MOSC. Effects of HIV in daily life of women living with AIDS. J. Res. Fundam. Care. 2015;7(1):1975-86. http://dx.doi.org/10.9789/2175-5361.2015.v7i1.1975-1986.
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Resultados de estudo realizado com mulheres na faixa etária de 20 a 59 anos, apontou que há prevalência de casos depressivos em mulheres que estão em situação de vulnerabilidade social2323 Gonçalves AMC, Teixeira MTB, Gama JRA, Lopes CS, Silva GA, Gamarra CJ et al. Prevalência de depressão e fatores associados em mulheres atendidas pela Estratégia de Saúde da Família. J Bras Psiquiatr. 2018;67(2):101-9. http://dx.doi.org/10.1590/0047-2085000000192.
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. Sendo assim, é fundamental atenção à saúde da mulher ao proporcionar o cuidar de si mesma para que não haja sobrecarga de trabalho do cuidador, fazendo com que adoeça.

As participantes deste estudo enfatizaram que é inerente na sua realidade o cuidar do outro, demonstrando cuidado com a família, revelando que mulheres não se desconectam do ser-com e do seu a-gente, visto que o “outro’ pertence ao ser delas. Os outros pertencem ao mundo circundante, de maneira tal que, em essência, ela é sempre ser-com2424 Silva LF, Amorim TV, Souza IEO, Batista DCS, Padoin SMS, Melo MCSC. Historiografia e historicidade de mulheres portadoras de cardiopatia: revelações na consulta de enfermagem que contribuem para a integralidade da atenção em saúde. Atas do 4º Congresso Ibero-Americano em Investigação Qualitativa (ATAS CIAIQ) [Internet]; 2015 ago. 5-7; Aracaju (SE), Brasil. Portugal: Ludomedia; 2015. p. 221-3. (vol. 1) [citado 2020 jul 6]. Disponível em: https://proceedings.ciaiq.org/index.php/ciaiq2015/issue/view/1
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Nesta perspectiva, desvela-se que cuidar é sinônimo de atitude, de responsabilidade, de cuidado e afeto com o próximo. A prática do cuidado permeia o viver humano desde o nascer e acompanha os ciclos vitais. As mulheres se reconhecem culturalmente como cuidadoras, sendo intrínseco enquanto o ser mulher, mesmo economicamente mantenedoras do lar, permanece como cuidadora1818 Winters JRF, Heidemann ITSB, Maia ARCR, Durand MK. Empowerment of women in situations of social vulnerability. Rev Enf Ref. 2018;serIV(18):83-91. http://dx.doi.org/10.12707/RIV18018.
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,2525 Boff L. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes; 2017..

Com isso, as mulheres compreendem o “ser mulher” é sinônimo de diversas formas de cuidado. Destarte, para se tornar um “ser do cuidado”, precisam primeiro ter experienciado esse cuidado e empoderar-se para desenvolver a capacidade de cuidar2626 Puggiana AC, Ienne A, Biondo CA, Savieto R, Barbosa IA, Silva MJP. Maquiagem como comunicação não verbal: influência na percepção de pacientes mulheres em relação ao cuidar. Rev Enfermagem Atual Derme [Internet]. 2015; [citado 2020 jul 6];74(12):13-20. Disponível em: http://revistaenfermagematual.com/arquivos/12/revista.pdf
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CONSIDERAÇÕES FINAIS E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA

As mulheres em vulnerabilidade social, que participaram da pesquisa, necessitam ressignificar suas vidas com o intuito de desenvolver práticas de empoderamento. Uma possibilidade é enfrentar os seus problemas, sendo fortalecidas por atitudes proativas em busca do seu bem-estar, considerando o seu jeito de ser, com desenvolvimento do cuidado de si e do outro.

As participantes desenvolvem a capacidade de enfrentamento, com consciência crítica do seu jeito de agir e do seu papel na sociedade, cuidando de si e do outro. Nesse contexto, os Círculos de Cultura realizados possibilitaram o diálogo e o empoderamento, fortalecendo o enfrentamento e a superação das diferentes formas de exclusão da mulher na sociedade, questionando-se a respeito das hierarquias estabelecidas entre homens e mulheres e que definem posições no meio social. Os pressupostos de Paulo Freire fortaleceram o empoderamento e a autonomia das mulheres ao gerar transformações na realidade vívida. Assim, as concepções Freireana permitiram o desvelamento crítico das condições de vida com um novo olhar aos desafios no seu cotidiano.

Cabe salientar que a realização dos Círculos de Cultura viabilizou espaços de compartilhamento de experiências, em que as mulheres em situação de vulnerabilidade social se sentiram acolhidas e tiveram voz para expressar e refletir acerca das suas vivências. Portanto, recomenda-se a realização de Círculos de Cultura para além da pesquisa em Enfermagem e Saúde, a fim de que populações vulneráveis, que carecem de espaços para serem ouvidas, tenham na prática da atenção primária à saúde a oportunidade de desenvolver o seu empoderamento com autonomia, em busca do “ser mais”, tão defendido por Paulo Freire.

Como limitação do estudo, cita-se o fato de não ter sido questionado sobre as possibilidades do setor saúde instigar o empoderamento nas percepções das mulheres em vulnerabilidade social, o que poderia trazer novas oportunidades de ações práticas. Recomenda-se a continuidade de pesquisas que retratem a relevância destes em prol do aprimoramento das políticas públicas no setor e da sensibilização dos profissionais da saúde. O empoderamento da mulher não deve ser visto como corriqueiro e banalizado. Urge atitudes e construções coletivas de enfrentamento com criticidade, reforçando perspectivas históricas do feminismo e da vulnerabilidade social a qual está atrelado.

  • FINANCIAMENTO

    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq pela concessão de auxilio pesquisa para a autora e coordenadora Ivonete Teresinha Schulter Buss Heidemann, MCTI/CNPQ/Nº 28/2018 – Universal/Faixa B426445/2018 - A interface da promoção da Saúde com os Determinantes Sociais nas Redes de Atenção à Saúde.

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EDITOR ASSOCIADO

EDITOR CIENTÍFICO

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2020
  • Aceito
    03 Jul 2021
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