Resumos
Objetivos : verificar a incidência de alterações nas Emissões Otoacústicas por Produto de Distorção em neonatos prematuros e analisar a amplitude das respostas em função da idade gestacional nessa população.
Métodos : trata-se de um estudo transversal observacional, que contou com análise dos resultados do exame de emissões otoacústicas evocadas por produto de distorção dos neonatos pré-termos, triados em um hospital público de Belo Horizonte, no período de agosto de 2010 a fevereiro de 2011. Os neonatos avaliados foram divididos em três grupos de acordo com a idade gestacional, sendo o primeiro grupo constituído por neonatos de 28-30 semanas, o segundo de 31-33 semanas e o terceiro grupo de 34-36 semanas. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da UFG sob parecer número 0210.0.203.000-10.
Resultados : dentre as crianças avaliadas 44 (93,62%) apresentaram Emissões Otoacústicas Por Produto de Distorção (EOAPD) presentes e apenas três crianças (6,38%) apresentaram EOAPD ausentes. Com relação à análise das amplitudes das EOAs e suas comparações entre os grupos estudados, não foi encontrada diferença estatisticamente significante entre os grupos gestacionais, entretanto observou-se valores menores de p entre os grupos gestacionais nas frequências altas – 5KHz e 6KHz.
Conclusão : observou-se que a prematuridade em si não constitui um fator que influencia no resultado de EOAPD em neonatos prematuros.
Emissões Otoacústicas Espontâneas; Triagem Neonatal; Audição; Prematuro; Recém-Nascido
Purpose : to verify the incidence of changes in otoacoustic emission distortion product in premature infants and to analyze the magnitude of responses in relation to the gestational age in this population.
Methods : observational cross-sectional study, which included results analysis of distortion product otoacoustic emissions of preterm newborns, screened in a public hospital in Belo Horizonte, from August 2010 to February, 2011. The infants were divided into three groups according to the gestational ages, the first group consisting of neonates aging 28-30 weeks, the second was of 31-33 weeks and third group of 34-36 weeks. This study was approved by the Ethics Committee of UFMG number 0210.0.203.000-10.
Results : among the 44 children studied (93.62%) distortion product otoacoustic emissions (DPOAE) were present and only three children (6.38%) had absent DPOAEs. Regarding the amplitude analysis of the otoacoustic emissions and their comparisons between groups, no statistically significant difference was found between gestational groups, however we observed lower p values between gestational groups at high frequencies – 6kHz and 5KHz.
Conclusion : prematurity in itself is not a factor that influences the outcome of DPOAE in premature neonates.
Otoacoustic Emissions; Spontaneous; Neonatal Screening; Hearing; Infant; Premature; Infant; Newborn
INTRODUÇÃO
Uma das causas mais comuns de permanência em UTI neonatal é a prematuridade. Pelo fato da maioria dos neonatos prematuros necessitarem de cuidado especial em unidade de terapia intensiva, às vezes por tempo prolongado, como por exemplo, permanência em incubadora, uso de ototóxicos e permanência em ventilação mecânica, pode-se considerar que a prematuridade constitui-se em potencial um indicador de risco para alterações auditivas, especialmente para os pequenos para idade gestacional (PIG) 1 , 2 .
Além disso, os pacientes das Unidades de Terapia Intensiva Neonatais podem apresentar um maior número de patologias da orelha média, o que poderia afetar o resultado do exame de Emissões Otoacústicas Evocadas (EOA) 3 .
Atualmente, sabe-se que as emissões otoacústicas evocadas têm sido aplicadas como um método objetivo ideal de triagem. As emissões otoacústicas apresentam três importantes aplicabilidades clínicas: identificação de perda auditiva por meio de triagem auditiva; monitoramento de função coclear sob efeitos adversos (drogas, ruídos, ou processos degenerativos); diagnóstico diferencial e aplicações especiais (diagnóstico coclear/retrococlear, populações especiais). O maior objetivo das emissões otoacústicas na triagem neonatal é detectar precocemente a perda auditiva coclear em crianças, por permitir confirmar a integridade do mecanismo das células ciliadas externas da cóclea 4 - 6 .
As emissões otoacústicas podem ser diretamente influenciadas pelas condições do meato acústico externo e “propriedades de transmissão” do neonato 7 . Portanto, deve-se considerar a possível influência de fatores externos durante a utilização das EOA como primeiro teste na triagem auditiva, tais como a influência de ruído externo presente no ambiente do exame, os efeitos do vernix no conduto auditivo além dos condutos auditivos colabados durante as primeiras 24 horas de vida 8 .
No presente trabalho foram estudadas as emissões otoacústicas evocadas por produto de distorção (EOAEPD), que são geradas em resposta a dois estímulos de tom puro com intensidade moderada (55-65 dB), distintos na frequência por uma pré-determinada diferença, em Hz (f2/f1=1,22). Mais precisamente, as EOAPD ocorrem a partir da estimulação simultânea de dois tons puros de frequências diferentes (f1 e f2). Tal estimulação gera uma resposta coclear, sob a forma de um terceiro tom cuja frequência (2f1-f2) constitui um produto de distorção das frequências de estímulo 7 .
A prematuridade pode ser um fator que influencia a amplitude de resposta das EOAEPD, uma vez que a cóclea do neonato prematuro apresenta sutil imaturidade na função e o sistema auditivo pode apresentar alterações no desenvolvimento até que a maturação se complete 2 - 9 .
Em um estudo foram avaliados bebês nascidos com menores idades gestacionais (28 a 30 semanas ou menos) e estes apresentaram níveis de resposta menores que os bebês nascidos após um período gestacional maior 10 .
Outros estudos relatam que em neonatos as emissões otoacústicas por produto de distorção apresentam maior amplitude, devido à maior capacidade de amplificação coclear e menor saturação das respostas em neonatos quando comparados com adultos. Entretanto em neonatos prematuros, a saturação é maior quando comparados com neonatos a termo e adultos normoouvintes, o que pressupõe imaturidade na amplificação coclear nestas crianças 11 .
Considera-se importante o uso de emissões otoacústicas por produto de distorção, uma vez que esta abrange uma análise mais específica de frequências cocleares, o que permite verificar a possibilidade de imaturação da codificação de frequências cocleares em neonatos prematuros 2 , 11 , 12 .
A partir desta possível relação entre prematuridade e perda auditiva, o presente trabalho teve como objetivo geral: estudar as emissões otoacústicas evocadas por produto de distorção em neonatos prematuros. Foram objetivos específicos: verificar a incidência de alterações nas Emissões Otoacústicas por Produto de Distorção na população estudada, analisar a amplitude das Emissões Otoacústicas por Produto de Distorção em função da idade gestacional.
MÉTODOS
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG sob parecer número 0210.0.203.000-10.
Foi realizado um estudo transversal observacional, que contou com análise dos resultados do exame de emissões otoacústicas evocadas por produto de distorção de neonatos pré-termos avaliados em um Hospital público de Belo Horizonte, no período de agosto de 2010 a março de 2011.
Foram utilizados como critério de inclusão: neonatos prematuros submetidos à triagem auditiva neonatal e cujos pais e/ou responsáveis consentiram na inclusão dos dados de seus exames no estudo por meio de assinatura do TCLE.
Os neonatos analisados foram selecionados aleatoriamente para participarem da pesquisa e todos passaram pelo menos um dia em uma unidade de terapia intensiva neonatal.
No período destinado ao estudo foram coletados dados de 47 neonatos pré-termo cuja idade na avaliação foi delimitada até 90 dias após nascimento. Os neonatos avaliados foram divididos em três grupos de acordo com a idade gestacional, sendo o primeiro grupo constituído por neonatos de 28-30 semanas, o segundo de 31-33 semanas e o terceiro grupo de 34-36 semanas.
As informações referentes aos indicadores de risco, aos resultados das EOAPD e tempo de internação foram retiradas dos prontuários dos neonatos mediante consentimento.
Os bebês foram submetidos ao registro das EOAPD em ambiente silencioso e permaneceram em sono natural ou se encontravam acordadas sem realizarem movimentos e/ou ruídos.
O equipamento utilizado foi o analisador de emissões otoacústicas da marca Biologic®, modelo AuDX® plus, fabricado nos EUA. Como protocolo de EOAPD foram tesatadas as frequências de 2KHz, 3KHz, 4KHz, 5KHz e 6KHz, com intensidade de estimulação: L1 igual a 65dB e L2 igual a 55 dB e relação F2/F1 igual a 1.22.
Foram consideradas normais as respostas com amplitude maior ou igual a –5dB e relação sinal/ruído maior ou igual a 6dB.O critério de passa/falha utilizado foi a observação de respostas presentes em 4 das 6 frequências testadas.
A análise estatística dos dados foi realizada por meio do programa estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 17.0. Primeiramente foi realizada uma análise descritiva dos dados com medidas de tendência central e dispersão, seguido teste de igualdade de variância. Para verificar a diferença entre as médias dos grupos foi utilizado o método de análise de variância (ANOVA). Os resultados considerados significantes foram aqueles com p < 0,05.
RESULTADOS
Foram avaliados 47 neonatos com idades que variaram até 90 dias após o nascimento, sendo 24 do sexo feminino e 23 do sexo masculino. Destas crianças, 44 (93,62%) apresentaram Emissões Otoacústicas Por Produto de Distorção (EOAPD) presentes e apenas três crianças (6,38%) apresentaram EOAPD ausentes.
Em relação à idade gestacional dos neonatos avaliados, obteve-se idade gestacional mínima de 28 semanas, idade gestacional máxima de 36 semanas e média de idade gestacional de 32,26 semanas.
As Tabelas 1 e 2 apresentam a descrição da amplitude das EOAPD, por grupo gestacional, bem como da análise comparativa realizada. Não houve diferença estatisticamente significante na comparação entre as idades gestacionais.
Nas Figuras 1 e 2 estão representados os resultado da amplitude das Emissões Otoacústicas por Produto de Distorção das frequências analisadas nos diferentes grupos gestacionais estudados para ambas as orelhas.
Legenda: DP: amplitude do produto de distorção; OD: orelha direita – Amplitude das emissões otoacústicas por produto de distorção na orelha direita
– Amplitude das emissões otoacústicas por produto de distorção na orelha esquerdaLegenda: DP: amplitude do produto de distorção; OE: orelha esquerda.
DISCUSSÃO
A amostra do estudo de 47 neonatos pode ser considerada homogênea, uma vez que a quantidade de neonatos de ambos os sexos foi semelhante, sendo 24 (52%) do sexo feminino e 23 (48%) do sexo masculino.
Quanto à incidência de alterações nas Emissões Otoacústicas por Produto de Distorção na população estudada, não se observou influência da idade gestacional dos neonatos, pois os três (6,38%) neonatos que falharam nas EOAPD pertenciam a grupos gestacionais distintos. Em contrapartida, um estudo realizado com o objetivo de comparar a latência das EOAT em recém-nascidos a termo e prematuros encontrou respostas estatisticamente significantes nos valores de latência entre os grupos testados, com maiores valores para o grupo pré-termo 13 .
Em estudo recente, Melo et al. 14 avaliaram 261 neonatos entre 24 e 54 horas de vida e concluíram que o resultado do neonato que falha na Triagem auditiva neonatal independe do tempo de vida.
Dos neonatos que apresentaram EOAPD ausentes dois (66,66%) pertencem ao grupo gestacional de 31 a 33 semanas e apenas um (33,33%) pertence ao grupo gestacional de 28 a 30 semanas. A partir desta informação pode-se observar que os neonatos que não apresentaram EOAPD não pertenciam necessariamente ao grupo gestacional menor (28 a 30 semanas). No estudo de Melo et al. 1 , ao autores argumentam a capacidade da cóclea humana apresentar respostas a partir da 27ª semana de vida do neonato, o que pôde ser observado neste estudo, pois embora tenham ocorrido variações na média de amplitude entre os grupos gestacionais, nos três grupos analisados, os neonatos apresentaram respostas dentro do esperado para a normalidade, com amplitude maior ou igual a –5dB.
Em relação à diferença de amplitude de resposta entre as orelhas, observou-se que nos três grupos ambas as orelhas apresentaram concordância entre as respostas, sem grandes diferenças na variação das médias de amplitudes, o que está de acordo com os estudos de Pinto et al. 15 , Melo et al. 1 e Raineri et al. 16 .
Apesar de não ter sido encontrada diferença estatisticamente significante entre os grupos gestacionais, observou-se valores menores de p entre os grupos gestacionais nas frequências altas – 5KHz e 6KHz, o que sugere tendência a maiores amplitudes das EOAPD em frequências mais altas, correspondentes à função da base da cóclea. Tal fato corrobora os estudos de Couto et al. 7 e Smurzynski et al. 5 que descrevem o fato de haver maior concentração de emissões otoacústicas por produto de distorção em altas frequências além de haver maior tendência das emissões otoacústicas por produto de distorção se aproximarem dos valores de normalidade em frequências mais altas.
Os resultados da amplitude das EOAPD apontaram um crescimento não linear das amplitudes conforme houve aumento da idade gestacional, o que sugere amplitudes de resposta menores nos bebês com idade gestacional menor. Em estudos com neonatos a termo e pré termo, Abdala 9 , 11 , 17 sugere que a cóclea do neonato pré-termo ainda apresenta sutis imaturidades na função e que esta ainda passa por períodos de amadurecimento durante os primeiros meses de vida pós-natal, tornando-se funcionalmente madura entre três e seis meses de idade 17 .
Outros parâmetros de análise das EOAs têm sido sugeridos além da análise das amplitudes, como a latência de respostas, por exemplo, que apresentam diferenças relevantes na população de prematuros.
CONCLUSÃO
Neste estudo observou-se que a prematuridade em si não constitui um fator que influencia no resultado de EOAPD em neonatos prematuros. A maioria da amostra (93,6%) apresentou resultados normais à triagem neonatal realizada com as EOAPD.
A análise das amplitudes das Emissões Otoacústicas por Produto de Distorção em neonatos prematuros mostrou que não há diferenças relacionadas à idade gestacional, apesar de constituir uma ferramenta útil para a compreensão da maturidade coclear nestas crianças.
REFERÊNCIAS
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Mar 2014
Histórico
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Recebido
23 Ago 2012 -
Aceito
18 Dez 2012