Resumo
A partir do conceito de “crítica viva”, cunhado por Antonio Candido em 1957, estas reflexões partem da hipótese de que a história literária espanhola tem no realismo o lugar não marcado de sua narrativa em língua castelhana. Fazendo um passeio pelos “momentos decisivos” de sua tradição romanesca, este ensaio postula que se o realismo aparece recalcado nos narradores espanhóis a partir do século XIX (quando se forma um sistema literário eminentemente liberal-conservador), deve-se ao fato de que esse debate, não travado, permanece ainda em estado de “querela”.
Palavras-chave: realismo; narrativa espanhola; sistema literário na Espanha
Resumen
A partir del concepto de “crítica viva”, acuñado por Antonio Candido en 1957, estas reflexiones parten de la hipótesis de que la historia literaria española tiene en el realismo el lugar no marcado de su narrativa en lengua castellana. Haciendo un recorrido por los “momentos decisivos” de su tradición novelística, este ensayo postula que si el realismo aparece recalcado en los narradores españoles a partir del siglo XIX (cuando se forma un sistema literario eminentemente liberal-conservador), se debe al hecho de que este debate, no trabado, permanece en estado de “querella”.
Palabras-clave: realismo; narrativa española; sistema literario en España
Abstract
Drawing on the concept of “living criticism” coined by Antonio Candido (1957), these reflections start from the hypothesis that Spanish literary history has realism as the unmarked place of its narrative in the Castilian language. By reviewing the “decisive moments” of its novelistic tradition, this essay postulates that if realism appears repressed in Spanish narrators from the 19th century onwards (when an eminently liberal-conservative literary system is formed), it is due to the fact that this debate, left unaddressed, still remains in a state of “quarrel”.
Keywords: realism; Spanish narrative; literary system in Spain
Interpretar é, em grande parte, usar a capacidade de arbítrio.
Antonio Candido
O nascimento de uma teoria
Graças a Benedict Anderson (2008), sabemos que as comunidades de leitores são imaginadas e que, a partir da modernidade, com a invenção do Estado-Nação, os modos de leitura também têm pátria.
De acordo com Ramón Menéndez Pidal, a narrativa em língua castelhana tem no Poema de Mio Cid, escrito no século XI, sua certidão de nascimento. Responsável pela descoberta, exegese e hierarquização de obras canônicas como El Conde Lucanor [ca. 1330], La leyenda de los infantes de Salas [ca. 1289] e outras, Pidal postulou a ideia de que a vocação da narrativa espanhola era “verista”, quer dizer, apegada à realidade coetânea, histórica (Menéndez Pidal, 1949, p. 100, 106 e 108). O fato de Rodrigo Díaz de Vivar ter sido um personagem histórico, e que o poema estabelecido pelo próprio Pidal, à diferença de outras obras da épica medieval, quase não apresentasse aspectos fantasiosos, era prova irrefutável da predileção do espírito hispânico pelos fatos materiais. Assim, graças aos trabalhos deste insigne filólogo, para compreender cabalmente o sentido do Poema de Mio Cid, é fundamental fazer referência à Historia Roderici [ca. 1188]. Em uma época em que a França ainda ostentava o título de República mundial das letras, em seu debate com Leo Spitzer, Menéndez Pidal afirmou que se na épica desse país primava a ficção, a espanhola tinha predileção pelo referente.
Fundador da prestigiosa Revista de Filologia Española [1914], diretor da Real Academia Espanhola durante dois períodos [1935-1939; 1947-1968] e responsável pela formação de várias gerações de filólogos, gramáticos e lexicógrafos ilustres, Menéndez Pidal foi a principal figura da teoria “tradicionalista”. Asturiano por decisão e castelhano por eleição, em seus inúmeros trabalhos se empenhou em compreender o sentido do processo de interação entre visigodos, hispano-romanos e árabes, que desembocou na cristianização cultural da Espanha.
No entanto, passava por alto que suas próprias ideias refletiam os anos de sua formação: a “Restauração” borbônica, a “ideologia do 98” e a era canônica do romance realista-naturalista burguês, que instaurou “o sério” como indício de “alta cultura” ( Moretti, 2014). Durante as primeiras décadas do século XX, na época de Joyce, Kafka e as vanguardas, ocorreu a Menéndez Pidal afirmar que a narrativa espanhola era essencialmente realista e conservadora, muito distinta da francesa, sempre aberta a mudanças. Com isso, constatava “o caráter sempre inovador e progressivo da cultura francesa [...] e o caráter tradicionalista da espanhola” ( Menéndez Pidal, 1949, p. 113). 1
Abraçando as teses de Miguel de Unamuno a propósito da essência estoica, tradicionalista e amante das coisas concretas do povo espanhol, presentes na Vida de Don Quijote y Sancho (1905), Pidal equacionou pátria, literatura e a Europa da era do romance, identificando este gênero com o realismo, o que foi uma forma de subir a Espanha no carro da modernidade literária e intelectual.
Mas sua ideia de realismo, reduzida a mimesis, não parece abrir espaço à poiesis. Resulta difícil relacioná-la com aquela que Georg Lukács postulou entre 1936 e 1945 e que, embora problemática, era complexa, na medida em que não pressupunha uma transparência entre a palavra e a coisa nomeada. Para o teórico húngaro, o realismo ocorria graças à mediação de diversos aspectos formais, como a seleção do que é relevante e sua articulação dentro de uma totalidade intensiva, a construção de personagens típicos (não como expressão de essências humanas atemporais e trágicas, mas de relações sociais profundamente históricas), a conexão narrativa entre o indivíduo e o mundo ( Lukács, 1968a, p. 13-45, passim) e o predomínio do dinâmico e vivo sobre o morto e estático ( Lukács, Georg, 1968b, p. 47-99, passim). Quando Menéndez Pidal atribuiu qualidades realistas ao Poema de Mio Cid, parecia acreditar que o realismo respondia apenas à vontade de dizer a verdade acerca das coisas reais - concepção ingênua dentre aquelas que Darío Villanueva (1992, passim) tipificou como “realismo genético”, esse em que tudo parece subordinado à existência de uma realidade unívoca, estável e anterior ao texto.
Com essas premissas se funda “a querela do realismo”, hipótese que norteará as páginas a seguir, e que consiste na afirmação (constatação?) de que a narrativa espanhola tem no realismo seu lugar não marcado, e a favor do qual, ou contra ele, teóricos, narradores e obras (deixando em segundo plano poéticas, estéticas e obras de rica imaginação e fantasia) ocuparão suas posições dentro da Biblioteca da história literária espanhola.
A partir do conceito de crítica viva de Antonio Candido (1997, p. 31), em que as intuições do crítico devem ser trituradas pela análise até se tornarem plausíveis para o leitor, farei um breve passeio pelos momentos decisivos ( Candido, 1997, p. 41) do cânone da narrativa espanhola (identificados no recorte, hierarquização e periodização que habitualmente aparece em diversas compilações, manuais e Histórias dessa literatura) 2, com a intenção de organizar um problema que, a meu ver, encontra-se recalcado, e que a crítica não considerou pertinente levantar.
Entre a “literatura” e o realismo: El lazarillo de Tormes e o Quijote
De maneira retrospectiva, a picaresca aparece como a primeira expressão do realismo na narrativa espanhola. Distanciando-se das formas anteriores, este gênero depende de “um processo narrativo de conhecimento crítico da realidade desde a perspectiva de um sujeito humilde que se detém a julgar a sociedade em cujos arrabaldes vive” ( Sobejano, 1975, p. 41). Mesmo que o enigma circunde tudo que diz respeito ao Lazarillo de Tormes [1554] ( Cabo Aseguinolaza, 2017, p. 208), assim como aos juízos e posicionamentos do seu incógnito autor diante das estruturas do poder da Espanha do seu tempo, o realismo tem sido a chave hermenêutica privilegiada em sua leitura.
O fato de aparecerem nesse livro as castas que compunham a sociedade espanhola durante a época de Carlos I de Habsburgo, que se conte o triunfo das estruturas sociais e objetivas sobre os esforços e desejos do indivíduo, que se narre “de baixo” através do uso de uma linguagem muito mais referencial do que em outras formas literárias ( Watt, 2010, p. 31), que o “Eu” que se confessa o faça da perspectiva do seu lugar concreto, surgindo a noção do tempo como vivência subjetiva e íntima do personagem do romance, próprio do “realismo dogmático” ( Blanco Aguinaga, 1957, p. 313 e 334), são elementos que consolidam esta obra como a primeira carta realista da literatura espanhola.
Mas toda origem é obra de mãos voluntariosas e inexperientes, de modo que a picaresca como gênero só existiu a partir de 1599, com a publicação do Guzmán de Alfarache, quando Mateo Alemán conseguiu dar forma, em uma poética definida, às intuições que apareceram meio século antes com o Lazarillo ( Lázaro Carreter, 2011). Somente aí temos o gênero de maneira acabada e constituída e, portanto, a caminho de sua dissolução ( Derrida, 2019), que acontecerá em meados do século XVII. Isso fez com que autores como Azorín negassem que a picaresca fosse um gênero realista, já que o realismo, entendido como pura mimesis, é reflexo exato da realidade, não reflexo caricatural, hiperbólico e deformado (Azorín, 1913 apud Ragala, 1999, p. 273).
É um lugar comum afirmar (na esteira de Hegel/Lukács) que Cervantes foi o inventor do romance moderno, esse que tem no realismo seu lugar não-marcado e contra o qual toda outra forma precisa de adjetivos para poder ser descrita com precisão ( Fehér, 1987; Magris, 2015).
Existem argumentos sólidos para atribuir isso ao Quixote, e eles têm sido dominantes - deixando nas sombras os felizes instantes de imaginação e fantasia que estão entre seus maiores méritos. Exímio conhecedor dos gêneros do seu tempo, que se dava o luxo de praticar como paródia, Cervantes não apenas retomou explicitamente o romance de cavalaria, mas também o pastoril e o bizantino ou mourisco, subordinando-os a um marco realista que vem do conhecimento do recém-nascido romance picaresco ( Frau García, 2002, p. 132).
Para além de que se trata de um realismo mimético (ontológico ou gnosiológico), formal ou até cômico (com a conseguinte intervenção dos gêneros populares), as coisas são apresentadas no Quijote sob as mesmas leis físicas que governam o mundo empírico, assim como as estruturas objetivas que transcendem a vontade dos indivíduos. Embora o protagonista seja um leitor crédulo e acrítico dos romances do seu tempo, o caráter artificioso dessas formas é denunciado ao colocar a realidade como seu parâmetro, que o protagonista é obrigado a conhecer, literalmente, “a palos” - o que incomodou profundamente Vladimir Nabokov (2016, p. 104).
O lugar comum que situa Cervantes como pai da “novela moderna” também tem seu fundamento em alguns fragmentos de teoria literária que aparecem no romance. No capítulo XLVII da primeira parte, quando o Cônego, falando ao Cura sobre os livros de cavalaria, afirma que é preciso casar “as fábulas mentirosas com o entendimento” ( Cervantes, 2004, p. 490), de tal maneira que não se fuja “da verossimilhança e da imitação, em que consiste a perfeição do que se escreve” ( Cervantes, 2004, p. 491) e coincide com o fragmento da Poética, de Aristóteles, em que se lê que “a função do poeta [o ficcionista daquela época] não é contar o que aconteceu, mas aquilo que poderia acontecer, o que é possível, de acordo com o princípio da verossimilhança e da necessidade” ( Aristóteles, Poética, 2004).
No entanto, graças aos hispanistas britânicos Edward C. Riley (2000) e Alan Deyermond (1982), descobrimos inconsistências numa teoria que parecia sem fissuras. Contrastando com a língua inglesa, eles perceberam que, em espanhol, “novela” e “romance” nomeavam formas distintas da narração. 3 Naquela época, além de “romance”, as narrações eram denominadas “livros”, “histórias” ou algum outro termo que não “novela” - gênero que fazia referência a histórias exemplares e breves. No espanhol da época, “romance” era o nome que se dava às formas que, a falta de melhor rótulo, a crítica literária posterior denominou “idealistas”. Tratava-se de histórias nas quais a imaginação corria desbocada, e era proibido enxergar a realidade através delas. De acordo com esses críticos, as histórias dos romances costumavam ocorrer em um tempo e um espaço que não precisavam se sujeitar às leis empíricas, admitindo o mítico, o fantasioso e o sobrenatural. Os enredos, que normalmente tratavam de amor ou de aventura, admitiam peripécias e reviravoltas cuja solução muitas vezes dependia de acontecimentos fortuitos e até do trapaceiro recurso do deus ex machina.
O Barroco, e sua ideia de arte docente, foi decisivo no descrédito do “romance”. Antecipando o preconceituoso “bovarismo” do século XIX, em diversas preceptivas se afirmava que essas histórias corrompiam as mulheres e os costumes e deviam ser substituídas por textos mais afinados com a doutrina cristã ( Martínez-Falero, 2011, p. 257).
Sem saber ao certo que havia inventado a “novela moderna”, Cervantes viveu durante a era do “romance”, que praticou a sério no começo e no final de sua carreira literária, de La Galatea [1585] a Los trabajos de Persiles y Sigismunda [1617], e como paródia no Quixote [1605; 1615]. Ter morrido com certo gosto de fracasso só se explica porque não teve sucesso escrevendo “romances”, a “literatura” do seu tempo - essa em que a pretensão de copiar a realidade não estava nem cogitada. Que Cervantes via essas obras com olhos menos severos o confirma o episódio do escrutínio dos livros, quando o Cura afirma que são obras de entretenimento “sem prejuízos a terceiros” ( Cervantes, 2004, p. 66), e em El colóquio de los perros [1613], quando Berganza diz que se trata de “coisas sonhadas e bem escritas para o entretenimento de ociosos, e não de verdade alguma” ( Cercas, 2004, p. 364).
Se é polêmico afirmar que Cervantes é o pai do “romance moderno” ( Martín Morán, 2007), é incontestável que, ao introduzir a atitude realista como lugar tácito da narração, inventou o leitor cervantino, não quixotesco.
O realismo clássico e suas contradanças: Galdós, Valle-Inclán e Cela
Na década de 1920, nos anos dourados da vanguarda histórica, Ramón María del Valle-Inclán escreveu em Luces de Bohemia: “agora está vacante a poltrona de dom Benito, o Grão-de-bico” ( Valle-Inclán, 1924, p. 82). Apesar do sarcasmo, a frase destacava que o cheiro dessa leguminosa, base do popular cozido madrilenho, bem poderia adereçar muitas páginas de Galdós e outros realistas espanhóis do século XIX, que em seus romances tinham como foco o povo baixo e a classe média da capital. Em uma Europa em que estava acontecendo, “a todo vapor”, a grande transformação ( Polanyi, 2000) que diluiu, junto com o passado e as tradições, a sociedade estamental e suas castas, os habitantes dessa cidade estavam ficando mais parecidos com os parisienses e londrinos do que com seus conterrâneos de uma Espanha persistentemente rural.
Publicadas depois de 1867, ano em que apareceu o primeiro volume d’ O capital, “obra fundamental do socialismo científico [assim como do] romance de Zola, Thérèse Raquin, com que se iniciava a tentativa de criar um romance científico” ( Beser, 1972, p. 101), as obras canônicas do realismo espanhol do século XIX nasceram sob a teoria do realismo-naturalismo. Para Benito Pérez Galdós, Leopoldo Alas “Clarín” e Emilia Pardo Bazán, “o pessimismo” diante da Restauração borbônica é o “afeto”, “órgão da percepção do próprio mundo, o veículo do [seu] ser-no-mundo” ( Jameson, 2018, p. 54), a partir do qual devia ser narrada a vida privada da classe média nascente. Acabado o período dos estáticos e conservadores quadros de costumes, e afinados com o grande romance europeu do momento, esses autores observavam o mundo com inteireza e sentidos firmes, como o anuncia o Manifesto comunista [1848], e o realismo-naturalismo será a forma adequada para narrar as ilusões perdidas diante desse fracasso histórico. Para eles, o século XIX, onde não cabiam mais as formas heroicas, só era narrável de maneira prosaica, sem tragédia nem epicidade.
Em “Leopoldo Alas (Clarín)” [1901], prólogo a La Regenta [1885], Galdós lamentava não apenas que os escritores da Espanha (país que segundo ele era o berço do realismo com El Lazarillo e El Quijote), tivessem perdido a vocação para observar e escrever a realidade, mas que essa tendência estética tivesse voltado deformada pelo humor inglês e o pessimismo francês (Galdós, 1901 apud Bonet, 1990, p. 198, 200, passim). Como já havia escrito em Observaciones sobre la novela contemporánea en España (1870), o principal defeito dos romancistas espanhóis era ter “utilizado elementos estranhos, convencionais, impostos pela moda, prescindindo por completo dos que a sociedade nacional e contemporânea lhes oferece com extraordinária abundância” (Galdós, 1870 apud Bonet, 1990, p. 105). Advertia, também, que o realismo não consistia no puro reflexo da realidade, mas no talento do escritor para captar o movimento do real, livre da ideia de “tese científica” própria do naturalismo.
Ao longo da história literária, o realismo de Galdós sempre foi visto como “olho” e não “cérebro” por alguns dos seus insignes intérpretes. María Zambrano disse: “O tempo com ritmo imperceptível em que transcorre o doméstico agitado ainda pelo histórico, o tempo real da vida de um povo que o seja de verdade, é o tempo do romance de Galdós” (Zambrano, 1977 apud Alfieri, 1968). Por sua parte, José Ortega y Gasset escreveu: “O realismo, convidando o artista a seguir docilmente a forma das coisas, o convida a não ter estilo. Por isso, o entusiasta Zurbarán, não sabendo o que dizer, diz que seus quadros têm ‘personalidade’, como têm personalidade e não estilo Lucas ou Sorolla, Dickens ou Galdós” (Ortega, 1920 apud Arroyo, 1966).
Em sua ideia de escrita sem tese, postulada em La sociedad presente como materia novelable (1897), seu discurso de ingresso na Real Academia, Galdós disse que mesmo que a classe média ainda não tivesse “existência positiva”, era sobre ela que havia que escrever (Galdós, 1897 apud Bonet, 1990, p. 161-162). No seu caso, esse é o Madrid galdosiano. Alheio à obsessão flaubertiana pelo mot juste e inimigo do detalhe significativo à la Roland Barthes, seu realismo não ocorre por seleção, mas por acumulação. Para um autor que se propôs cronicar o século XIX espanhol em 46 livros ( Los episodios nacionales), não havia tempo a perder buscando o fulgor adamantino de um adjetivo: “O estilo é a mentira. A verdade olha e se cala” (Galdós, 1884 apud Comellas Aguirrezábal, 2010). Abraçando uma estética que identificava romance e história, em sua obra não há espaço para personagens aleatórios: determinados pela cidade e seu tempo, são a expressão do século da Política e da História.
As 1200 páginas que compõem os quatro volumes de Fortunata y Jacinta (1887) bem poderiam ser resumidas em cinco linhas no triângulo amoroso que ambas as moças tecem com Juanito Santa Cruz e figurar, como nota de rodapé, em alguns dos relatos em que Borges traçava a sinopse de romances que não valia a pena escrever. Numa época em que ainda não havia sido inventado o National Geographic, o que hoje nos parecem descrições excessivas e estudos desnecessários, era uma forma agradecida por seus contemporâneos: recém-embarcados no trenzinho da modernidade, cujos 30 quilômetros por hora ainda lhes causavam vertigem e náuseas, precisavam compreender seu mundo em transformação.
Para Fredric Jameson, a grandeza do realismo de Galdós radica em que em sua obra, afinal de contas, todos os personagens são secundários; reféns de “uma teoria da história em que o individualismo não faz mais sentido”, renunciam ao direito de ter “um destino” ( Jameson, 2018, p. 129), o que confere ao escritor canário o mérito de ter se aprofundado na ideia do romance como “moderna epopeia burguesa”.
A literatura espanhola tem na pobreza, e na vontade de escapar dela, um dos principais motores dos seus mais célebres enredos. De Lázaro a Pijoaparte, passando pela Celestina, a picaresca inteira, Sancho Panza, Pascual Duarte e tantos outros, Fortunata explicita cabalmente o fracasso do “destino” desses sujeitos. De sua primeira aparição (convenientemente morena e voluptuosa como convinha ao orientalismo da época), sorvendo um ovo cru que oferece a Juanito Santa Cruz, Fortunata começa seu périplo de ave doméstica para concluir como um anjo caído do qual nascerá o único herdeiro da burguesia em declínio. Com isso, Galdós, o futuro deputado pela Conjunción Republicano-Socialista (CRS), constrói uma precoce crítica à ideologia que, na Espanha, verá mais tarde na classe média o motor do progresso e da emancipação nacionais.
Em Del naturalismo, publicado em 1882, Clarín vaticinou: “o romance é o gênero mais próprio do século XIX. Bem pode se afirmar que, de agora em diante, enquanto não houver mudanças que hoje não é possível prever, o romance será a forma mais ampla da literatura e o natural campo das obras escritas da fantasia” (Alas, 1882 apud Beser, 1972, p. 132). Veredito devastador para nossa época, em que ainda se escrevem romances.
No prólogo a Los cuernos de don Friolera (1921), Ramón María del Valle-Inclán escreveu: “Minha estética é uma superação da dor e do riso, como devem ser as conversações dos mortos quando contam as histórias dos vivos” ( Valle-Inclán, 1989, p. 68). Excêntrico de tempo completo, este escritor galego combinava sem conflito sua condição de “filho pródigo do 98” ( Salinas, 1949) com o modernismo, condição perfeitamente possível em um campo literário liberal-conservador - como de resto ocorria nos países hispânicos. Modernista sem modernidade, como convém a todo aristocratismo retardatário, seu “carlismo” (com “sua defesa das sociedades primitivas frente às industrializadas, a preferência da harmonia da vida natural à vida urbana, a superioridade do objeto artesanal sobre o manufaturado em série” - Alberca; González, 2002, p. 130) podia conviver muito bem com o modernismo estético. Amigo e discípulo de Rubén Darío, sua relação com figuras do Modernismo del 14 e da Generación del 27 explica a admiração do greguerista Ramón Gómez de la Serna e do vanguardista Pedro Salinas, que não resistiram à tentação de biografar este “raro” e exímio representante das estéticas que José Ortega e Gasset adscreveu à La deshumanización del arte [1925].
Se em seu Discurso sobre a poesia dramática [1758] Denis Diderot afirmou que a seriedade deveria ser a paixão dominante no teatro, o arco se completou com O naturalismo no teatro [1881] e com o decreto de Emile Zola: “nosso teatro será naturalista ou não existirá” ( Zola, 1977, p. 136). Apesar de o realismo-naturalismo apostar, com fins políticos, no reflexo artístico a partir do ângulo das classes baixas, a vanguarda questionou a proposta por obedecer a uma estética burguesa, impregnada de aspectos e categorias reificadas. De acordo com Peter Szondi, nas primeiras décadas do século XX, com autores como Piscator, Brecht, Bruckner, Pirandello e outros ( Szondi, 2001, p. 123 e ss.), questionou-se a fundo a orientação mimética do teatro realista à la Zola. Rejeitado por ele e pelos naturalistas como uma arte própria do século XVIII, o teatro devia ser reabilitado, com a consigna de mergulhar em sua especificidade.
Levando a fundo a ideia, Valle-Inclán foi a personificação da teatralidade: características eram suas barbas, seus óculos e sua vestimenta, assim como seu comportamento, excêntrico e histriônico, ostentando insolente, como um triunfo da decadência finissecular, a falta do seu braço esquerdo. Diferente do mito “do escritor gentleman, profissional que não confunde os livros com sua pessoa e rejeita o carisma [ou os avatares de sua biografia] como prolongação da obra” ( Villoro, 2001, p. 59), Valle-Inclán é um precursor das escritas contemporâneas de urgência, em que o escritor não se descola de sua obra, mas se coloca como a luz a partir da qual irradia seu sentido.
Em 1921, durante sua segunda estadia no México, Valle-Inclán se entrevistou com Álvaro Obregón e recebeu como presente do “caudillo” seu livro Oito mil quilômetros em campanha [1917], título que revela uma mania pela literalidade alheia ao projeto que Valle tinha entre mãos. Meses depois, no Diario de la Marina, de La Habana, afirmou que estava “iniciando um gênero novo”, que por enquanto chamava “gênero bizarro” (Valle-Inclán, 1921 apud Dougherty, 1983, p. 107). Três anos depois, em Luces de Bohemia [1924], nascia a estética do esperpento, com a seguinte afirmação: “Espanha é uma deformação grotesca da civilização europeia. [O] sentido trágico da vida espanhola só pode ser expresso através de uma estética sistematicamente deformada” ( Valle-Inclán, 1924, p. 225); graças aos espelhos côncavos do Beco do Gato, as imagens mais belas “são absurdas [...] Deformemos a expressão no mesmo espelho que nos deforma os rostos e toda a vida miserável da Espanha” ( Valle-Inclán, 1924, p. 224, 225, 226).
Combatendo a seriedade burguesa incrustada no realismo-naturalismo, o esperpento se alimenta do espírito e das formas vinculadas com a cultura popular, como o jocoso sainete, o disparatado astracã, o teatro de marionetes, a violência macabra, gráfica e amoral do Grand Guignol e o teatro de bugigangas. Sobre suas criações, Valle-Inclán costumava utilizar expressões híbridas como “tragicomédia”, “trágica mojiganga”, “buffa tragedia”, “fantoche trágico”, para ressaltar seu caráter misto, de objeto em estado de elaboração. Em sua busca do efeito de “estranhamento” (presente mais tarde no teatro de Bertolt Brecht e na ostranenie formulada por Viktor Chklovski), o esperpento tem muito das vanguardas. Em 1928 afirmou que havia três modos de ver um personagem (e por consequência narrar uma situação), que correspondiam a três posições: de joelhos, em pé ou levantado no ar. Se a primeira é própria da épica e a segunda corresponde ao romantismo e ao realismo, a terceira, que era a que lhe interessava, consistia em “olhar o mundo desde um plano superior e considerar os personagens da trama como seres inferiores ao autor, com um ponto de ironia” (Valle-Inclán, 1928, apud Martínez Sierra, 1928, p. 3-4).
Na contramão dos postulados do drama em bases aristotélicas, o esperpento, equilibrando tragédia e farsa, faz uma degradação dos personagens a partir de sua animalização, reificação ou coisificação, transformando-os em bonecos ou marionetes desconjuntadas. Três elementos lhe são constitutivos: a estética da crueldade própria da cultura popular espanhola ( Ovejero, 2012), o grotesco, que, ao contrário da sátira, não pretende nos conduzir ou reconduzir a uma vida boa, moralmente aceitável, mas apenas fazer-nos ver as deformidades em que nos encontramos ( Bozal, 2001, p. 33), e por fim, ao diluir os limites entre o cômico e o trágico e se aproximar do carnavalesco, pretende eliminar todo agón trágico ou heroico.
Como se fosse uma carnestolenda de dia de mortos, Tirano Banderas. Novela de tierra caliente (1926) narra os últimos dias do ditador Santos Banderas, entre 1 e 2 de novembro de um ano qualquer. Esse romance (onde aparecem todos os recursos do esperpento), está constituído por personagens desconjuntados que se expressam em um castelhano que compreende os diversos registros da Espanha e da América Latina: misturando gêneros e usando o grotesco das maneiras mais variadas, Valle-Inclán os comprime em um ambiente de opressão prestes a explodir, criando um ambiente asfixiante pela desumanização.
Escrito e publicado durante os governos autoritários de Plutarco Elías Calles, no México, e de Miguel Primo de Rivera, na Espanha, dois “pecados” comete este “romance de ditador”. O primeiro, derivado de uma “ética diante do leitor”, poupa das técnicas esperpentizadoras os personagens “bons” da trama, assim como, em um ato de compensação simbólica, dá morte violenta ao ditador. O segundo: a estrutura perfeitamente simétrica dos capítulos de cada uma das sete partes que constituem a história (1-3-3-7-3-3-1), organizadas ao redor do tirano, é de um rigor matemático, talvez relacionado com o cubismo (a favor desta hipótese, ver: Schmölzer, 1997; Chávez; Ospina, 1993), que não condiz com uma estética predominantemente expressionista ( Jeréz-Farrán, 1990), que tem na deformação seu princípio formal ( Kirkpatrick, 1975, p. 451). Essas “incongruências” recuperam a encruzilhada em que se encontra o realismo: registrar o caráter confuso da dinâmica histórica através da dimensão estética pressupõe um princípio de formalização.
Diante das poéticas dominantes de Pío Baroja, que considerava o realismo uma concepção difusa que não passava de “uma tendência na literatura [porque ele] não é a realidade absoluta”, e seus princípios nunca chegaram a ser praticados efetivamente por Flaubert e Zola ( Baroja, 1948, p. 134), e o esperpento de Valle-Inclán, encontrava-se Niebla (1914), de Miguel de Unamuno, cuja teoria da “ nivola” afirmava que todo leitor de romances devia saber que estes não são fragmentos da realidade, mas elucubrações arbitrárias de um autor, transformado em demiurgo de gabinete. Concebendo o afã de verossimilhança como uma vulgaridade, postulava que todo relato embaralha as cartas entre ficção e realidade, fazendo-as trocar de signo. O romance devia interpelar o leitor, tentando romper a “momentânea suspensão da incredulidade” que pressupõe todo pacto de leitura ( Unamuno, 1950, p. 92-93).
A era do capitalismo monopolista, própria da vanguarda histórica ( Jameson, 1997, p. 62; 2018, p. 9), é o cenário dos embates sobre fascismo, revolução e arte narrativa. Nas polémicas sobre qual seria a carta adequada para fazer frente à barbárie, o realismo trava seus melhores e mais problemáticos embates teóricos. No caso espanhol, além do “realismo existencialista” de autoras como Carmen Laforet, Carmen Martín Gaite, que publicam, respectivamente, romances como Nada (1945), Entre visillos (1957) e Primera memoria (1959) ( Varela Olea, 2021, p. 194 e ss.), esses anos registram o advento de uma das obras de maior influência: La família de Pascual Duarte (1942), de Camilo José Cela. Com este romance, representante da estética do tremendismo, o naturalismo desembarca efetivamente na Espanha com 75 anos de atraso. Num texto altamente maneirista, em que autor e protagonista são inteiramente distintos (um gentleman conservador e um miserável sobre o qual se abatem todas as desgraças da pobreza), a “literatura” aparece por todos os lados. O recurso do manuscrito apresentado por um transcritor (que exige pelo menos dois narradores: este e o autor das próprias memórias), é um empenho na busca da verossimilhança através da convergência de duas instâncias de legitimação narrativa: a) o realismo dogmático próprio da primeira pessoa que conta sua história, e b) a ruptura do pacto ficcional que consiste na figura de um transcritor, cujo gesto parece mostrar as cartas, afirmando que não há truque narrativo algum.
Escrito nos primeiros anos do franquismo, La familia de Pascual Duarte não apenas reatualiza os debates sobre o realismo-naturalismo, mas confere ao romance social tinturas existencialistas e picarescas, visíveis no começo do romance, em que a referência a El lazarillo de Tormes é explícita: “Eu, senhor, não sou mau, ainda que não me faltariam motivos para sê-lo” ( Cela, 1971, p. 21).
Revelando que o tremendismo, haja a quantidade de preconceitos de classe embutidos, é o “romance da terra” da Península Ibérica, a marginalidade é abordada a partir do “grotesco”. Javier Cercas afirmou que o livro deste escritor que militou no bando fascista durante a Guerra Civil, em sua forma literária, era “uma constatação da trágica necessidade da guerra, considerada, deste modo, como uma espécie de catarse de urgência que limpou o país dos Pascual Duarte que o assolavam” ( Cercas, 2002). Dessa forma, situações e descrições da pobreza são tratadas esteticamente como sórdidas. Além disso, a voz de Pascual Duarte, em aparente registro do popular, o torna um rústico desprezível com que o leitor é proibido de estabelecer empatia: convenientemente, no momento de sua execução por haver cometido matricídio, para o narrador, esse se comporta “da maneira mais abjeta e mais baixa que um homem pode terminar; demonstrando, a todos, seu medo à morte” ( Cela, 1971, p. 177).
Como se estivesse travando um debate com si próprio sobre o realismo, quase uma década depois o autor galego publicou La colmena (1950), obra que se caracteriza por um realismo social duro. Composto por diversos quadros em que aparecem mais de 160 personagens, o romance tem como centro da trama o café “ La Delicia”, regido pela mesquinha dona Rosa, sua proprietária. Nesse espaço se reúne uma galeria de personagens que, ao sair, trasladam o enredo a outros espaços. Na esteira de Galdós, nesse romance há uma erosão da ideia de protagonista: nem o personagem mais significativo, Martín Marco, funciona como tal. Sua estrutura revela um tipo de sociedade e de socialização de colmeia cuja tirana rainha, elidida, é a Espanha franquista da pós-Guerra dos anos 1940. Estruturado em cenas aparentemente desarticuladas, o romance sugere uma espécie de realismo em paralaxe, já que dificilmente pode ser dialético, polifônico ou coral.
Consolidando a picaresca como um dos gêneros fundacionais da arte narrativa na Espanha, a trama acompanha os personagens em sua luta por suprir as necessidades mais básicas através de artifícios e enganos, ilustrando assim “a picaresca lúgubre” da década de 1940.
O uso de recursos em que o realismo tradicional se beneficia da vanguarda se vê reforçado com a encenação do que a literatura seria nessa sociedade. Muitos dos frequentadores do café são poetas e escritores que, à diferença da boemia heroica ( Jover, 1982, p. 83), somente debatem sobre aspectos formalistas da literatura.
Nas mãos de Cela, tremendismo e romance social se tornam versões de um grotesco que, à semelhança do “brutalismo” ( Bosi, 1975, p. 18) e do “realismo feroz” ( Candido, 1989. p. 211), inauguram um tratamento estético que será aplicado em ficções que, desde uma perspectiva liberal-reacionária, se ocupam dos Pascuales Duarte ou dos “Cobradores” da sociedade.
Auge e declínio do modernismo vanguardista: Goytisolo e Vázquez Montalbán
Na década de 1950, a “Guerra Fria” contribuiu a elevar a temperatura dos debates entre realismo e vanguarda. Na figura literária de Juan Goytisolo, quiçá o narrador espanhol esteticamente mais ambicioso daquela época, convergem os pontos álgidos desse confronto. Os anos das polemicas envolvendo o “realismo crítico” e o “realismo socialista” (representados por teóricos como Georg Lukács), e a “vanguarda” (defendida por Theodor W. Adorno e outros), coincidem com as obras de juventude deste escritor catalão. Seus primeiros romances, vinculados a posições marxistas ( Escudero, 1994, p. 10 e 12), podem ser adscritos ao realismo-naturalismo na medida em que o reflexo estético parte de premissas sociológicas claras: a pobreza é a mãe de todas as desgraças.
A partir da década de 1960, sua obra se põe em sintonia com a dos autores hispano-americanos do chamado Boom da literatura que, mais do que o realismo, discutiam o caráter ontológico, antropológico e estético da arte da narração através da qual abordavam as questões sociais mais urgentes daquela quadra histórica. A chamada Trilogía de Álvaro Mendiola, composta pelos romances Señas de identidad (1966), Reivindicación del Conde Don Julián (1970) e Juan sin tierra (1975), tem muito da “virada linguística” que surgiu nas ciências sociais, na historiografia e na filosofia para debater toda forma de cognição baseada na teoria da representação. Nessas obras, singulares no que diz respeito ao uso do castelhano e à estrutura da narração, sem se limitar a episódios pontuais (o que seria próprio do romance realista), passa-se revista da formação cultural da Espanha, abordando aspectos relativos tanto à sua intra-história como a sua relação com a Europa ( Escudero, 1994, p. 25).
Construídos a partir de jogos literários e linguísticos muito próximos do “telquelismo” em voga naqueles anos, esses romances surgem de uma tese prévia: os problemas de autoritarismo, desigualdade e racismo que assolam a Espanha derivam de uma formação cultural, identitária e discursiva decorrente do “iberismo” - crítica que se realiza num livro que só convencionalmente pode ser chamado de romance. Mais do que burguesa ou eurocêntrica, a língua castelhana é tornada objeto de crítica pelo fato de ser o modo de conceitualizar a realidade, e por isso deve ser “batailleanamente” agredida. A reflexão está explicitamente carregada de um embate com o realismo cognitivo e literário: assim como a palavra que pretende nomear a coisa, “palavra-transparente, palavra-reflexo” [não passa de] “testemunho ruinoso rígido e inexpressivo” ( Goytisolo, 1973, p. 125), a linguagem do realismo literário está tão reificada como a realidade que nomeia.
A ausência de seguidores deste inconfundível estilo, que colocou seu autor como o principal expoente da renovação da narrativa espanhola durante as décadas de 1960 e 1970, revela o esgotamento do modernismo vanguardista, que postulava que uma obra escrita era “arte” na medida em que se situava numa série evolutiva em que cada superação se dava graças ao triunfo de formas mais arrojadas e complexas que tornavam antiquadas as anteriores. Sua afirmação de que seus livros não foram escritos para ser lidos, mas relidos ( Goytisolo, 1993), concedeu à “alta literatura” o reconhecimento de ser a mais elevada expressão da “vida do Espírito”. E esse ponto alto é seu limite, como o de Ícaro.
Comentando o clima literário dos narradores hispânicos a finais da década de 1960, Ricardo Piglia afirmou: “para mim, a questão central é que o gênero [policial] permitia discutir a tradição da literatura social, que estava nesse momento no centro”. A questão era “como fazer literatura que não fosse a literatura política com a qual estávamos acostumados, que muitos de nós valorizávamos muito, mas que não queríamos seguir por essa linha”. O atrativo era que o gênero policial oferecia “um plot que ajudava a que esses problemas pudessem ser bem colocados”. Num tempo de urgência política, eles descobriram “que esta literatura era, para além do que se via à primeira vista, uma grande literatura social [...] e que muitos dos escritores do gênero estavam ligados à esquerda norte-americana” ( Piglia, 2013, 12’48”-14’25”).
Essa época, que coincidia com o auge dos movimentos estudantis que tinham como combustível as pautas da “nova esquerda”, reivindicava uma arte caracterizada pelo relaxamento das tensões entre alta e baixa cultura, ambas prestes a serem dissolvidas na cultura de massas.
Na cena literária espanhola, a figura de Manuel Vázquez Montalbán representou uma mudança de paradigma no que se entendia por escritor profissional. Sem recusar veículos como as revistas Interviu ou Triunfo, publicava em mídias populares sobre temas como gastronomia, música, literatura, futebol, política e vida privada, prenunciando a figura do intelectual que não é apocalíptico nem integrado. No mundo hispânico, é quiçá o primeiro escritor a inventar um detetive e uma saga nos moldes do roman noir americano. Criados por esse militante do Partido Socialista Unificado de Cataluña, os mais de 20 romances que compõem a saga de Pepe Carvalho, de Yo maté a Kennedy (1972) a Milenio Carvalho (2004), têm como assunto a discussão sobre o final do franquismo e a restauração da democracia, que repôs na Espanha suas atávicas contradições.
Graças a sua forma definida, o policial opera mudanças significativas em duas dimensões caras ao realismo, condensadas na disjuntiva lukacsiana de narrar ou descrever. Na medida em que depende de um sistema cognitivo “indiciário” em que tudo se transforma em indícios, sinais e pistas, e “o conhecimento histórico é indireto [e] conjetural” ( Ginzburg, 1989, p. 157), a “descrição” deixa de ser detalhada e cenográfica para obedecer a rigorosos efeitos calculados, aproximando-se do “efeito de real” barthesiano. Outro tanto ocorre com a “narração”: recuperando a forma episódica do folhetim, cada segmento é uma pequena unidade de sentido com um final climático destinado a atrair a atenção do leitor. Assim, o melodrama que invade a história frustra a percepção épica do mundo representado ( Lukács, 2000, p. 55). Para uma época que afirmava descrer dos grandes relatos emancipatórios da modernidade ( Lyotard, 1998), o romance policial tornou-se um veículo privilegiado para relatar o mal contemporâneo.
Enquanto “afeto”, duas paixões inaugura Manuel Vázquez Montalbán para o gênero policial em espanhol: desencanto e cinismo. A voz narrativa que acompanha Pepe Carvalho não se surpreende das atrocidades descobertas por este, que já sabia como era o funcionamento da sociedade. Enquanto se entrega aos prazeres da cama e da mesa, toda noite, convenientemente, joga na lareira um livro de sua biblioteca com a convicção de que nada de útil para a transformação do mundo encontrará em suas páginas - o que fez com que um dos principais estudiosos de sua obra a descrevesse como uma Crónica del desencanto ( Colmeiro, 1996). Célebres foram suas invectivas contra os realistas de sua época, acusados de escrever “como se o que fazem transformasse a realidade e fosse a pedra filosofal dos movimentos de massas [...] seu realismo capta a realidade? Nem sempre. Às vezes fabula a realidade para servir a um princípio didático” ( Vázquez Montalbán, 1968). A incapacidade do realismo literário de transformar a realidade, do seu ponto de vista, derivava de duas limitações incontornáveis: o público ao qual era direcionado (“uma burguesia ilustrada já em disposição de ser progressista” - Vázquez Montalbán, 1968) e a impossibilidade de competir com as técnicas de difusão da mídia.
Completa-se, assim, o movimento que conduziu à identificação de romance e realismo, consolidando este como o lugar não marcado de toda narrativa: narra-se para contar a realidade, e qualquer outra forma romanesca precisará de adjetivos: “policial”, de “terror”, de “mistério”, de “ciência ficção” e até de “não-ficção” - a tendência que a partir desse momento entrará em voga.
“Fuga para a frente”: Cercas e Vila-Matas
Com a publicação de A sangue frio (1966), de Truman Capote, algumas prateleiras das livrarias up-to-date passaram a adotar o rótulo de “literatura de não-ficção”. Horrorizados, os guardiões das bibliotecas passaram a dar ênfase aos estudos sobre o ato de narrar enquanto máquina produtora de ficções - conectando assim com as ciências sociais, a filosofia e a historiografia, ramo do conhecimento que até então reivindicara para si o privilégio do uso transparente da língua ( White, 1992). Em 2001, Javier Cercas irrompeu na cena literária com um romance que condensava as reflexões sobre o realismo e a arte de narrar que vinha fazendo anos atrás: Soldados de salamina é a expressão daquilo que o autor batizara como “relato real”. A constelação formada pela “virada linguística”, os estudos da “Escola de Constança” sobre o fictício e o imaginário e o advento da “Era da Testemunha” explica o empenho deste autor em discutir o realismo a través da combinação de elementos de ficção e de não-ficção para explorar a natureza da verdade e da memória histórica. No romance, após anos de páginas estéreis, um Javier Cercas ficcional, frustrado na procura de sua voz autoral, empenha-se em escrever um “relato real”, mal definido como “um relato concentrado, só que com personagens e situações reais” ( Cercas, 2004, p. 21), “um relato costurado à realidade, amassado com fatos e personagens reais” ( Cercas, 2004, p. 31), “como um romance. Só que ao invés de ser tudo mentira, tudo é verdade” ( Cercas, 2004, p. 41), e, embora “não [seja] um romance, [trata-se de] uma história com fatos e personagens reais” ( Cercas, 2004, p. 102).
Enquanto “metaficção historiográfica” ( Hutcheon, 1991), a obra embaralha as cartas do romance e do testemunho. Incorporando entrevistas, documentos e ficção, mas sem incorrer nas diversas variantes do romance histórico, Soldados de Salamina aproxima ensaio e romance - abolindo a consigna flaubertiana sobre a autossuficiência das ficções. Contemporânea da era da ruptura programática das fronteiras dos gêneros, esta obra “joga com o hibridismo, com o relato real (que o mesmo Cercas inventou), com o romance histórico, com o romance hiper objetivo, sem se importar em trair, sempre que lhe convém, esses mesmos pressupostos genéricos, para deslizar-se, sem problemas, à poesia, à épica, aonde for” ( Bolaño, 2005, p. 178).
Distante das agruras sociais que alimentaram o realismo espanhol no passado, o desconforto, afeto que anima o balaço histórico que apresenta este romance-ensaio afinado com o atual liberalismo da zona do euro, tem muito da Teoria da justiça (1971), de John Rawls, e da defesa d’ A Sociedade aberta e os seus inimigos (1954), de Karl Popper. Quiçá isso explique a possibilidade, para Cercas, de separar posições estéticas e posições políticas e ser amigo e interlocutor do reacionário Mário Vargas Llosa, o que não deixa de ser uma variante curiosa da “autonomia do literário” ( Bourdieu, 1996) conquistada na modernidade artística.
Para escândalo de autores, críticos e leitores que pejorativamente reduzem o realismo às técnicas do folhetim, ainda se produzem textos sob o estilo canônico do século XIX, frequente em obras de entretenimento e aventura, assim como em aquelas que abordam temas de carácter público. Hoje não reina mais, de forma inconteste, a teoria que, nas matrizes hegeliano-lukacsianas, traçava a genealogia do romance na poesia épica e herdava dela, como nostalgia, a aspiração à totalidade, o que identificava realismo e romance. Os trabalhos de Mikhail Bakhtin vieram para trazer nuances a essa narrativa que, de acordo com o teórico russo, dá conta apenas de uma das linhas de um gênero que também tem suas raízes no popular. Quanto ao realismo, o romance só pode ser analisado como artefato, e nenhum dos seus momentos pode ser suprimido: o texto não é o real, e em sua construção intervém, além da realidade exterior, a articulação polifónica de diversas linguagens, estilos e gêneros, em uma orquestração que contempla o plurilinguismo, a carnavalização e o dialogismo ( Bajtín, 1989, p. 64 e 74, passim). Entre outras coisas, essa teoria reabilita a narrativa como espaço lúdico.
No cenário da literatura espanhola contemporânea, a obra de Enrique Vila-Matas se caracteriza pela resposta que dá ao debate sobre o realismo. Célebre é sua Tetralogia da escritura ( Pozuelo Yvancos, 2010), constituída por obras como Historia abreviada de la literatura portátil (1985), Bartleby y compañía (2000), El mal de Montano (2002) e Doctor Pasavento (2005), em que procura se distanciar da forma do enredo própria da ficção realista assim como do psicologismo que a caracteriza. Discutindo esteticamente o “realismo como forma” (e não apenas como “conjunto de técnicas” para criar a ilusão de realidade), esse escritor catalão busca uma ruptura com os limites dos gêneros, diluindo a separação entre ficção e não-ficção.
Mesmo sem rejeitar in toto o realismo, em sua opinião, “a realidade é extraordinária e ganhará sempre do escritor realista”. Sobre isto a última palavra a pronunciou Nabokov: ‘Ficção é ficção’. [...] O que eu faço é ficção” ( Vila-Matas, 2002). Portanto, prossegue, não existe
essa divisão absurda entre o romance de tradição realista e [...] vanguardista. [É preciso terminar] com essa linha divisória. Afinal de contas, com certeza os que inventaram o realismo literário (Balzac, Dickens, Flaubert…) não chegaram a acreditar nunca nele [...] assim que os imagino sabendo que o realismo não era mais do que um meio, uma convenção ( Vila-Matas, 2017).
Como se se tratasse de uma aula de teoria literária, em seus livros ocorre a problematização de aspectos como o autor, a ficção e a figuração do Eu, o gênero e seus cruzamentos, o leitor e o ato da leitura, assim como a relação entre a obra singular e o sistema literário em que se insere.
Na história da literatura espanhola, a Guerra Civil e o Franquismo vieram para intervir na intra-história de sua “Biblioteca”. Nas primeiras décadas do século XX, escritores e poetas do “Movimento Ultra”, da “ Generación de 27”, no cinema de Buñuel e nas experimentações narrativas de Valle-Inclán e Unamuno, discutia-se o caráter lúdico da literatura e de sua ampliação para além do realismo. Do ponto de vista da história literária, a obra de Enrique Vila-Matas representa uma tentativa de reconectar com o vanguardismo dos anos 1920 e 1930: se para eles Paris era uma festa ( Hemingway, 2001), para esse escritor catalão París no se acaba nunca (2002).
“A querela do realismo”: uma polêmica necessária?
O Diccionario de uso del español, de María Moliner, afirma que “querela”, em sua quarta acepção, é uma “Discordia, discusión o riña” ( Moliner, 2008), e que “debate” é a “Acción de debatir, particularmente en una asamblea. Controversia, discusión” ( Moliner, 2008). Daí podemos depreender que “querela”, assim como o debate, é uma discussão, mas sem a organização programática (com posições estabelecidas e conceitos claros e distintos dentro de um campo de forças) que o caracteriza.
A presença continuada de posicionamentos a favor ou contra o realismo, observada nos “momentos decisivos” da história da narrativa espanhola, mesmo revelando um recalque, nunca desembocou em um debate bem armado que identificasse ethos espanhol e “estética realista”. Esta hipótese, formulada por Menéndez Pidal à sombra do ideário “regeneracionista” da “ Generación de 98”, no âmbito da “Restauração” Borbônica e nos anos dourados do romance, obviamente estava viciada de mistificações.
Superada a etapa de nomear a pátria (missão que coube ao “costumbrismo” romântico de Ramón de Mesonero Romanos e outros), e chegado o tempo de criticar suas coagulações históricas (como já se observava em Mariano José de Larra), realistas e vanguardistas, além da fidelidade da cópia, debateram pelo aggiornamento da narrativa espanhola em sua relação com o cânone ocidental. Os enfrentamentos, mais do que políticos, tornaram-se estéticos. Posteriormente, as obras e teorias surgidas “após o degelo”, “a virada linguística” e “a integração desigual e combinada” na Comunidade Europeia, numa conciliação tipicamente pós-moderna, diluíram as contradições subjacentes aos embates entre realismo e vanguarda.
Transformar a querela em debate, contribuiria a questionar um campo narrativo liberal-conservador que (além de divorciar “sujeito empírico” e “subjetividade estética”) parece subordinar as exigências políticas ao estético?
Fica a pergunta, formulada deste lado do Atlântico.
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A partir deste momento, a tradução dos fragmentos em espanhol é da minha autoria, exceto quando se indique o contrário nas referências bibliográficas.
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O que pode ser constatado consultando os índices dos tomos que compõem os nove volumes que fazem parte da Historia y crítica de la literatura española, publicados entre 1979 e 2000 pela Editorial Crítica, coordenados por Francisco Rico; as Historias (inclusive “mínima”) da literatura espanhola, escritas ou dirigidas por José Carlos Mainer; a Historia social de la literatura española de Carlos Blanco Aguinaga, Iris M. Zavala e Julio Rodríguez Puértolas, entre outras obras de críticos de renome.
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Do debate histórico-filológico sobre o termo “romance”, que também diz respeito à constituição de línguas derivadas do latim vulgar, vamos nos concentrar apenas no que diz respeito à narrativa de ficção.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
22 Abr 2024 -
Data do Fascículo
Jan-Apr 2024
Histórico
-
Recebido
28 Abr 2023 -
Aceito
09 Nov 2023