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Efeito da alimentação da fase adulta na reprodução e longevidade de espécies de Noctuidae, Crambidae, Tortricidae e Elachistidae

Effects of adult feeding on the reproduction and longevity of Noctuidae, Crambidae, Tortricidae and Elachistidae species

Resumo

This research evaluates the effect of the adult diet on the reproduction of Anticarsia gemmatalis Hübner, Heliothis virescens (Fabr.), Spodoptera frugiperda (J. E. Smith) (Noctuidae), Diatraea saccharalis (Fabr.) (Crambidae), Gymnandrosoma aurantianum Lima (Tortricidae) and Stenoma catenifer Walsingham (Elachistidae). Adults of all species were fed either water or a 10% honey solution. The egg viability for the 1st and 2nd egg masses, adult fecundity, longevity, number of mating and the ovigeny index (OI) (degree of ovarian maturation) were evaluated. Fecundity of A. gemmatalis and H. virescens was drastically reduced when females were fed only on water. Egg viability from both 1st and 2nd egg masses was variable between treatments. Females of A. gemmatalis, H. virescens and S. frugiperda, and males of some species had a reduced longevity when fed only on water. The number of matings was higher for A. gemmatalis and D. saccharalis when fed on water only. The OI was < 1.0 for all species evaluated indicating that all females may develop new oocytes as they age. Based on the OI and the reduced fecundity of A. gemmatalis and H. virescens, one observes that adult feeding is important for the reproduction of both species, and the IO is not a good parameter to indicate such condition. Spodoptera frugiperda, G. aurantianum, D. saccharalis and S. catenifer do not require any source of carbohydrates as adults to sustain their reproduction.

Lepidoptera pest species; nutrition; ovigeny index; reproductive physiology


Lepidoptera pest species; nutrition; ovigeny index; reproductive physiology

ECOLOGY, BEHAVIOR AND BIONOMICS

Efeito da alimentação da fase adulta na reprodução e longevidade de espécies de Noctuidae, Crambidae, Tortricidae e Elachistidae

Effects of adult feeding on the reproduction and longevity of Noctuidae, Crambidae, Tortricidae and Elachistidae species

Patrícia MilanoI; Evoneo Berti FilhoI; José R P ParraI; Melissa L OdaII; Fernando L CônsoliI

IDepto de Entomologia e Acarologia, ESALQ/USP, Av Pádua Dias 11, CP 9, 13418-900 Piracicaba, São Paulo, Brasil; patmilano@gmail.com; eberti@esalq.usp.br; jrpparra@esalq.usp.br; fconsoli@esalq.usp.br

IIDepto de Ciências Florestais, ESALQ/USP, Av Pádua Dias 11, CP 9, 13418-900 Piracicaba, São Paulo, Brasil; melissa.oda@gmail.com

ABSTRACT

This research evaluates the effect of the adult diet on the reproduction of Anticarsia gemmatalis Hübner, Heliothis virescens (Fabr.), Spodoptera frugiperda (J. E. Smith) (Noctuidae), Diatraea saccharalis (Fabr.) (Crambidae), Gymnandrosoma aurantianum Lima (Tortricidae) and Stenoma catenifer Walsingham (Elachistidae). Adults of all species were fed either water or a 10% honey solution. The egg viability for the 1st and 2nd egg masses, adult fecundity, longevity, number of mating and the ovigeny index (OI) (degree of ovarian maturation) were evaluated. Fecundity of A. gemmatalis and H. virescens was drastically reduced when females were fed only on water. Egg viability from both 1st and 2nd egg masses was variable between treatments. Females of A. gemmatalis, H. virescens and S. frugiperda, and males of some species had a reduced longevity when fed only on water. The number of matings was higher for A. gemmatalis and D. saccharalis when fed on water only. The OI was < 1.0 for all species evaluated indicating that all females may develop new oocytes as they age. Based on the OI and the reduced fecundity of A. gemmatalis and H. virescens, one observes that adult feeding is important for the reproduction of both species, and the IO is not a good parameter to indicate such condition. Spodoptera frugiperda, G. aurantianum, D. saccharalis and S. catenifer do not require any source of carbohydrates as adults to sustain their reproduction.

Key words: Lepidoptera pest species, nutrition, ovigeny index, reproductive physiology

Muitas são as formas de reprodução e desenvolvimento dos insetos que lhes permitiram colonizar vários ambientes. Apesar de algumas espécies apresentarem reprodução partenogenética, que, em alguns casos, pode prescindir de machos (telitoquia), a maioria dos insetos apresenta reprodução sexuada, em que o embrião resulta da fecundação do óvulo pelo espermatozóide (Chapman 1998).

Vários fatores estão envolvidos no processo de reprodução de insetos; porém, o mais importante ocorre principalmente durante a fase larval, que é a aquisição de recursos nutricionais que poderão ser destinados para sustentar o crescimento e/ou a reprodução. Esses recursos energéticos podem contribuir no processo de vitelogênese e maturação de óvulos antes da emergência do adulto. No entanto, em alguns casos, é necessário que haja aquisição de recursos nutricionais na fase adulta para que ocorra não somente a maturação do aparelho reprodutor, mas também o amadurecimento dos óvulos, como é o caso de alguns culicídeos transmissores de doenças, que concluem a maturação reprodutiva após a alimentação (Chapman 1998, Attardo et al 2005).

Em Lepidoptera, de modo geral, considerava-se que água e carboidratos, em concentrações variáveis, oferecidos aos adultos, eram suficientes para a obtenção da capacidade reprodutiva máxima de insetos em laboratório. No entanto, trabalhos mais recentes mostraram que para a obtenção de adultos mais longevos e fecundos, além da alimentação com soluções de carboidratos, devem ser adicionados à dieta diversos outros nutrientes, tais como sais, minerais, lipídeos, aminoácidos e vitaminas (Parra 2000).

A nutrição de adultos de insetos holometabólicos ainda é pouco conhecida e a alocação de recursos energéticos em várias ordens de insetos está relacionada ao tipo de estratégia reprodutiva, ou seja, ao processo de maturação de oócitos e às decisões de investimento de nutrientes adquiridos na fase imatura para desenvolvimento de tecidos somáticos ou reprodutivos (Jervis et al 2001, 2005).

Uma forma de se avaliar o tipo de estratégia reprodutiva de insetos seria a observação do índice de ovigenia (IO), que permite identificar o grau de maturação do aparelho reprodutivo da fêmea recém-emergida, avaliando o número de oócitos maduros em relação ao seu potencial reprodutivo esperado (número total de oócitos) ou observado (número de ovos depositados). O IO pode ser utilizado para quantificar a variação intra e interespecífica do grau de maturação ovariana atingido pela fêmea no momento da emergência (Jervis et al 2001). Em himenópteros parasitóides, o IO é, a despeito de certas limitações, uma medida da condição na qual a produção de ovos durante o tempo de vida da fêmea ocorre antes da emergência, observando-se um declínio intra e interespecífico do IO baseado na relação crescimento do corpo e investimento de recursos nutricionais em reprodução (Jervis & Ferns 2004). Em espécies cujo IO é próximo a 1, fêmeas emergem com a maioria dos oócitos maduros e, quando o IO é próximo a 0, ocorre maior quantidade de oócitos imaturos. Em Lepidoptera e Hymenoptera, o IO pode apresentar valores intermediários nessa escala de extremos, indicando estratégias distintas de maturação do ovário, as quais são dependentes das decisões de utilização e alocação de recursos nutricionais obtidos nas fases jovem e adulta (Jervis et al 2001, Jervis & Ferns 2004).

Na presente pesquisa foram estudadas Anticarsia gemmatalis Hübner (Noctuidae: Ophiderinae), Heliothis virescens (Fabr.) (Noctuidae: Heliothinae), Spodoptera frugiperda (J. E. Smith) (Noctuidae: Amphipyrinae), Diatraea saccharalis (Fabr.) (Crambidae: Crambinae), Gymnandrosoma aurantianum Lima (Tortricidae) e Stenoma catenifer Walsingham (Elachistidae: Stenominae), todas espécies de importância agrícola, frequentemente mantidas em laboratório. A pesquisa teve como objetivos verificar a importância da alimentação de adultos (mel a 10% utilizado atualmente em criações de laboratório) na sua reprodução e longevidade, avaliando-se a fecundidade, fertilidade, longevidade e o número de cópulas, e verificar se o IO determinado para as mesmas relaciona-se às necessidades de utilização de recursos nutricionais na fase adulta. Além desses objetivos, também foi ilustrada a morfologia geral do ovaríolo, da bolsa copuladora de fêmeas virgens e acasaladas e, dos espermatóforos para cada espécie analisada, buscando facilitar estudos futuros, dada a inexistência de ilustrações dessas estruturas na literatura.

Material e Métodos

A importância da alimentação na fase adulta de A. gemmatalis, H. virescens, S. frugiperda, D. saccharalis, G. aurantianum e S. catenifer foi observada por meio de dois tratamentos, oferecendo-se apenas água ou solução aquosa de mel a 10% aos adultos de cada espécie. Tendo em vista as diferentes composições do mel devido às diferentes plantas visitadas, optou-se pelo uso do mel puro da flor de eucalipto São Francisco® que apresenta 25% de carboidratos, 0,1% de cálcio e 1% de ferro.

Com exceção de S. catenifer, cuja fase larval foi mantida em sementes de abacate da cultivar Breda (Nava & Parra 2005), todas as demais espécies foram criadas em dieta artificial, sendo utilizada a dieta de Mihsfeldt & Parra (1999) para A. gemmatalis, H. virescens e S. frugiperda, dieta de Garcia & Parra (1999) para G. aurantianum e dieta de King & Hartley (1985) para D. saccharalis.

As pupas obtidas foram separadas por sexo e classificadas por peso para minimizar a variação causada pelo efeito do peso na reprodução. As classes de pesos para pupas de fêmeas e machos utilizadas nos bioensaios foram, respectivamente, 220-235 mg e 240-275 mg, para A. gemmatalis; 180-260 mg e 120-170 mg para D. saccharalis; para ambos os sexos 230-285 mg de H. virescens; 230-265mg, para S. frugiperda; 20-35 mg, para G. aurantianum e 50-70 mg, para S. catenifer. A variação de peso das pupas selecionadas de D. saccharalis foi maior devido à grande variação natural existente nessa espécie. A pesagem foi realizada 48h antes da emergência dos adultos baseando-se nos dados presentes na literatura quanto à duração dessa fase para as das espécies estudadas a 25 ± 2ºC, UR 60 ± 10% e fotofase 14h (Silva 1981, Nalim 1991, Souza et al 2001, Parra et al 1999, Garcia & Parra 1999, Nava & Parra 2005).

Após pesadas, as pupas foram colocadas em placas de Petri (9 cm de diâmetro e 2 cm de altura) forradas com papel de filtro umedecido e transferidas para gaiolas de emergência confeccionadas de PVC e forradas em seu interior com papel sulfite.

Após a emergência, 25 casais/tratamento foram individualizados ao acaso. Os casais de S. frugiperda, H. virescens e D. saccharalis foram mantidos em gaiolas de PVC (20 cm de altura e 10 cm de diâmetro) fechadas em sua parte superior e inferior por placas de Petri (15 cm de diâmetro), seguindo método descrito por Parra (1996).

Os adultos de A. gemmatalis foram primeiramente transferidos para gaiola cilíndrica (40 cm de altura e 30 cm de diâmetro) revestida por tecido do tipo tule para que pudessem acasalar (Magrini et al 1996). Após 48h, casais foram individualizados e transferidos para gaiolas de PVC (20 cm de altura e 10 cm de diâmetro) fechadas em sua parte inferior por placa de Petri (15 cm de diâmetro e 2 cm de diâmetro) e tecido do tipo tule em sua parte superior.

Os casais de G. aurantianum foram mantidos em gaiolas de material plástico transparente (10 cm de altura e 10 cm diâmetro), fechadas em sua parte inferior e superior por placas de Petri (15 cm de diâmetro e 2 cm de altura). As gaiolas foram revestidas em seu interior por material plástico como substrato de postura (Garcia & Parra1999).

Para S. catenifer, os casais foram mantidos em gaiolas de PVC (23 cm de altura por 15 cm de diâmetro) apoiada na parte inferior sobre um prato plástico (18 cm de diâmetro e 2 cm de altura) e fechada na parte superior por tampa plástica telada de 0,02 cm2 de malha. As gaiolas foram revestidas internamente com papel toalha dupla face com depressões (SNOB) para que as fêmeas colocassem ovos. Como estimulo à oviposição, foi colocada em cada gaiola uma semente de abacate da cultivar Breda (Nava & Parra 2005).

A água e solução de mel a 10% foram oferecidos aos adultos por capilaridade, em rolos dentais mantidos em recipiente de vidro (3 cm de altura), os quais foram trocados a cada 48h.

A fecundidade, a viabilidade da 1ª e 2ª posturas, a longevidade dos adultos e o número de cópulas (dado pelo número de espermatóforos presentes na bolsa copuladora das fêmeas após a morte) foram avaliadas em todas as espécies estudadas em ambos os tratamentos.

O índice de ovigenia (IO) foi calculado utilizando-se do potencial reprodutivo observado (número de ovos depositados) em relação ao esperado na emergência (dado pelo número de oócitos maduros = corionados). Assim, o índice expressa o potencial de maturação de novos oócitos durante a fase adulta do inseto. Para a observação dos oócitos, 25 fêmeas virgens recém-emergidas foram mortas em 70% etanol, e o número de ovaríolos e oócitos maduros determinados. O número médio de ovos depositados foi calculado após a observação de 25 fêmeas acasaladas de cada espécie e alimentadas com solução aquosa de mel a 10%.

A observação dos ovaríolos, da bolsa copuladora das fêmeas acasaladas e do(s) espermatóforo(s) presente(s) nas mesmas foi realizada em microscópio esterioscópico, sem o uso de agentes químicos específicos, diferentemente de outros autores que utilizam KOH, pois a técnica desenvolvida sem tais produtos mostrou-se mais fácil, rápida e com igual acuidade.

Os bioensaios foram realizados a 25 ± 2ºC, UR 60 ± 10% e fotofase 14h e os dados obtidos submetidos à análise exploratória para verificação de homocedasticidade e normalidade pelos testes de Bartllet (Bartlett 1937) e Shapiro-Wilk (Shapiro & Wilk 1965), respectivamente, sendo as variáveis transformadas pelo método potência ótima de Box-Cox (Box & Cox 1964). Para os dados expressos em porcentagem, utilizou-se a transformação arc sen

(Banzatto & Kronka 1995). Após esse procedimento inicial foi realizada a análise de variância (F < 0,05), sendo as médias comparadas pelo teste de Tukey (P < 0,05) utilizando-se do programa R de computação estatística (R Development Core Team 2005). Embora tenha se utilizado a estatística R, os dados foram transformados devido à grande variação observada.

Resultados

Os valores do índice de ovigenia foram variáveis, sendo alguns mais elevados, como nas espécies H. virescens (IO = 0,77) e S. catenifer (IO = 0,75). Todas as espécies de lepidópteros apresentaram valores inferiores a 1, indicando a maturação de oócitos durante a sua fase adulta (Tabela 1) e a possibilidade de os adultos necessitarem adquirir nutrientes durante essa fase para a manutenção dos recursos energéticos para a oogênese.

As espécies de lepidópteros estudadas apresentaram aparelho reprodutor composto por oito ovaríolos, quatro associados a cada um dos ovários, todos do tipo meroístico politrófico, assim como nos demais Lepidoptera (Chapman 1998), onde cada oócito é acompanhado pelo seu conjunto de células nutrizes (Fig 1). A avaliação do estágio de maturação do ovário também permitiu observações da estrutura da bolsa copuladora da fêmea e do(s) espermatóforo(s) transferido(s) pelos machos (Figs 2 e 3). Os espermatóforos possuem características morfológicas distintas para as diferentes espécies, embora todos tenham a mesma estrutura básica (bulbo e extensão tubular) (Figs 2 e 3).




A alimentação com solução aquosa de mel a 10%, apesar de ter proporcionado maior longevidade a várias das espécies estudadas, não implicou em aumento da fecundidade para todas as espécies. A alimentação na fase adulta foi necessária à reprodução de A. gemmatalis e H. virescens, no entanto, afetou negativamente a longevidade e a fecundidade de D. saccharalis (Figs 4 e 5).



A viabilidade da primeira postura não foi afetada pela alimentação dos adultos. No entanto, o efeito da nutrição do adulto na viabilidade da 2ª postura foi dependente da espécie (Fig 6). Ovos de S. frugiperda e D. saccharalis alimentadas na fase adulta foram menos viáveis do que aqueles originados de fêmeas que tiveram acesso exclusivo à água, enquanto o oposto foi encontrado para S. catenifer (Fig 6).


A alimentação na fase adulta também influenciou de forma espécie-específica a atividade de cópula do inseto (Fig 7). Assim, casais de A. gemmatalis alimentados com solução de mel a 10% tiveram capacidade de acasalamento reduzida, sem, no entanto, ocorrer qualquer redução na fecundidade. A ausência de alimento na fase adulta reduziu sua fecundidade, ficando evidente a importância de carboidratos para a reprodução dessa espécie. O mesmo não ocorreu com D. saccharalis, que apresentou redução no número de cópulas e na fecundidade quando alimentada na fase adulta (Figs 7 e 5).


Discussão

Os recursos nutricionais utilizados para a sustentação das atividades reprodutivas são bastante variáveis em Lepidoptera (Jervis & Ferns 2004), restringindo-se, em muitas espécies, aos nutrientes acumulados durante a fase imatura. Os resultados deste trabalho indicaram que várias das espécies estudadas prescindem de uma fonte de nutrientes (carboidratos) na sua fase adulta, indicando ser desnecessária a alimentação normalmente oferecida a elas em criações de laboratório (Parra 1996).

A alimentação na fase adulta resultou em efeitos benéficos, nulos ou nocivos, dependendo da espécie em questão. Os efeitos benéficos da alimentação de S. frugiperda na fase adulta refletiram em sua maior longevidade, sem ocorrer, no entanto, qualquer alteração em sua capacidade reprodutiva. Esses resultados demonstram que esse inseto não disponibiliza nutrientes adquiridos na fase adulta (carboidratos) para o desenvolvimento de seu aparelho reprodutor, indicando que sua reprodução é dependente exclusivamente dos nutrientes adquiridos na fase imatura, assim como observado para várias outras espécies (Bavaresco et al 2001, Jervis et al 2005).

A inclusão de carboidratos na dieta nem sempre acaba melhorando o desempenho reprodutivo ou a longevidade de adultos e, como o observado em D. saccharalis, pode até ser nociva. O efeito nocivo de fontes de carboidratos na longevidade de D. saccharalis já havia sido relatado anteriormente em insetos alimentados com soluções de glicose e frutose a 10% (Parra et al 1999). No entanto, não há qualquer indicação dos possíveis mecanismos de toxicidade nesse inseto.

Em outros casos, observa-se efeito positivo direto na reprodução, com aumento de até 15 vezes na capacidade reprodutiva do inseto, indicando que os nutrientes adquiridos na fase adulta participam diretamente do desenvolvimento do ovário (Benz 1991, Jervis et al 2005)

Os resultados obtidos para S. frugiperda, D. saccharalis, G. aurantianum e S. catenifer sugerem que essas espécies podem ser mantidas em laboratório apenas com o fornecimento de água na fase adulta, pois a redução na longevidade dos adultos nesse tratamento não afetou sua fecundidade. A substituição da solução de mel a 10% por água para essas espécies implicaria na redução do tempo gasto com a manutenção e alimentação dos adultos, redução de custos e, em alguns casos, eliminaria os problemas associados ao aparecimento de formigas em criações.

Os IO observados nas espécies de lepidópteros estudadas na presente pesquisa foram variáveis e não corresponderam à necessidade de alimentação na fase adulta. Para H. virescens e S. catenifer aproximaram-se a 1, não havendo relação entre o índice e a necessidade de alimentação na fase adulta, pois teoricamente, ambas as espécies não necessitariam de complemento alimentar para realizarem postura. No entanto, foi observado comportamento reprodutivo totalmente diferente entre essas espécies. Heliothis virescens (IO = 0,77), quando privada de alimentação, teve sua fecundidade reduzida, o que pode levar à hipótese de que a mesma ainda requer recursos energéticos na fase adulta para reprodução. A redução da fecundidade na ausência de alimento pode ter ocorrido devido à reabsorção de oócitos pelas fêmeas para a realização de outras atividades metabólicas dada à privação de alimentos (Boggs & Ross 1993, Rosenheim et al 2000, Torres-Vila et al 2002) ou ainda pela pressão de oviposição exercida pelo desenvolvimento do ovário (Opp & Prokopy 1986), levando à deposição apenas dos ovos já maduros. Nesse caso, fica evidente que a maturação de novos oócitos é dependente da nutrição nessa fase e que os nutrientes transferidos pelo macho junto ao fluído seminal não substituem os nutrientes adquiridos via alimentação, caso os machos dessa espécie realizem esse tipo de investimento. Apesar de a transferência de nutrientes via cópula ser relativamente comum em Lepidoptera, a produção e transferência eficiente de nutrientes junto ao ejaculado está associada a espécies altamente poliândricas (Marshall 1982, Boggs 1990, Bissoondath & Wiklund 1996).

A fecundidade inalterada de S. catenifer por sua vez, cujo IO foi igual a 0,75, pode levar à hipótese de que as reservas nutricionais acumuladas na fase larval sustentam a reprodução isoladamente ou em associação com os nutrientes transferidos pelos machos durante a cópula. Porém a maior viabilidade da 2ª postura em adultos alimentados com mel a 10% sugere que a ausência de uma fonte energética nessa fase poderia estar comprometendo a produção e transferência de espermatozóides pelo macho, já que a produção de espermatóforos em alguns Lepidoptera parece ser dependente da ingestão de fontes de carboidratos (Watanabe & Hirota 1999).

Spodoptera frugiperda, G. aurantianum e D. saccharalis também utilizam os nutrientes adquiridos na fase larval para reprodução e aqueles transferidos por machos na maturação de novos oócitos, visto os baixos índices de ovigenia, e ausência de efeito da alimentação em sua reprodução. Ainda, para S. frugiperda e D. saccharalis, fontes de carboidratos afetaram a aptidão biológica dos adultos. O efeito nocivo da alimentação do adulto foi muito mais drástico em D. saccharalis do que em S. frugiperda, sendo ainda desconhecidos os aspectos fisiológicos dessa interação nociva do alimento com o desenvolvimento e reprodução dos adultos. Porém, há relato na literatura que reconhece algumas fontes específicas de carboidratos (glicose e frutose) como deletérias a adultos de D. saccharalis (Parra et al 1999). O efeito observado em S. frugiperda e D. saccharalis permanece sem explicações e aguarda por investigações específicas.

Anticarsia gemmatalis foi a única espécie estudada a apresentar índice de ovigenia reduzido e necessitar de alimentação na fase adulta para sustentar sua reprodução. Nesse caso, a contribuição de nutrientes dada por machos também parece ser irrelevante para a espécie, visto que o maior número de cópulas observado em adultos nãoalimentados não refletiu em maior fecundidade, assim como observado para Plodia interpunctella (Lepidoptera: Pyralidae) (Cook 1999). Assim parece claro que A. gemmatalis invista os recursos energéticos adquiridos na fase imatura no crescimento de tecidos somáticos e não nos reprodutivos, utilizando as reservas energéticas acumuladas para atender ao seu comportamento reprodutivo, que exige a realização de vôos nupciais para o acasalamento com sucesso (Leppla et al 1987). A baixa fecundidade das fêmeas quando mantidas apenas com água poderia ter levado as mesmas a reabsorverem seus oócitos e a permitirem um maior número de cópulas na tentativa de suprir suas necessidades metabólicas e/ou reprodutivas. Portanto, é possível sugerir que as doações nutricionais dos machos dessa espécie, quando também privados de alimentação, possam ser utilizadas na manutenção de tecidos somáticos e não dos reprodutivos.

Das espécies estudadas, apenas A. gemmatalis e H. virescens necessitam de alimentação na fase adulta, sendo que o IO não deve ser utilizado como critério indicativo geral da necessidade de alimentação de adultos de mariposas das famílias de Lepidoptera estudadas (Noctuidae, Crambidae, Tortricidae e Elachistidae).

Agradecimento

À CAPES pela concessão da bolsa de doutorado o que permitiu a realização desta pesquisa.

Received 19/IX/08.

Accepted 29/I/10.

Edited by Madelaine Venzon - EPAMIG

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Maio 2010
  • Data do Fascículo
    Abr 2010

Histórico

  • Recebido
    19 Set 2008
  • Aceito
    29 Jan 2010
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