Resumo
Aphids are the most important vectors of viruses infecting potato (Solanum tuberosum). We focused on the response of the aphid vector Myzus persicae (Sulzer) to five commercial potatocultivars: Ágata, Jaette Bintje, Mondial, Monalisa and Santè, by traditional antibiosis and antixenosis tests and by the EPG (Electrical Penetration Graph) technique, as a step forward to the design of effective management practices. Our aim was to identify plant factors involved in resistance of these cultivars against M. persicae, both at the surface and in deeper plant tissues. Results from the antixenosis test confirmed a strong preference of M. persicae for the Mondial cultivar. The antibiosis study indicated a lower population development of the aphid in 'Monalisa' when compared to 'Ágata' and 'Jaette Bintje'. EPG assays indicated that 'Santè' inhibited the initial feeding process of M. persicae, whereas 'Monalisa' showed a physical-type of resistance as demonstrated by a very high number of short probes. The cultivar Mondial showed average values for all EPG variables analyzed. The behavior in 'Jaette Bintje' indicated this cultivar was an ideal host for aphid feeding and reproduction. Together, the EPG data revealed the existence of pre and post-phloematics factors in the cultivars under study, which have important implications on the efficiency of transmission and spread of virus in potato by M. persicae.
Electrical penetration graph; EPG; Solanum tuberosum; host plant resistance
Electrical penetration graph; EPG; Solanum tuberosum; host plant resistance
PEST MANAGEMENT
Resistência de cultivares de batata a Myzus persicae (Sulz.)(Hemiptera: Aphididae)
Resistance of potato cultivars to Myzus persicae (Sulz.) (Hemiptera: Aphididae)
Fernando J S SalasI; João R S LopesII; Alberto FereresIII
ILab de Fitovirologia e Fisiopatologia, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Sanidade Vegetal, Instituto Biológico, CP 7119, São Paulo, SP, Brasil; salas@biologico.sp.gov.br
IIDepto de Entomologia e Acarologia, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", USP, Piracicaba, SP, Brasil; jrslopes@esalq.usp.br
IIICentro de Ciencias Medioambientales (CCMA), Instituto de Ciências Agrárias, Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC), Madrid, Espanha; afereres@ccma.csic.es
ABSTRACT
Aphids are the most important vectors of viruses infecting potato (Solanum tuberosum). We focused on the response of the aphid vector Myzus persicae (Sulzer) to five commercial potatocultivars: Ágata, Jaette Bintje, Mondial, Monalisa and Santè, by traditional antibiosis and antixenosis tests and by the EPG (Electrical Penetration Graph) technique, as a step forward to the design of effective management practices. Our aim was to identify plant factors involved in resistance of these cultivars against M. persicae, both at the surface and in deeper plant tissues. Results from the antixenosis test confirmed a strong preference of M. persicae for the Mondial cultivar. The antibiosis study indicated a lower population development of the aphid in 'Monalisa' when compared to 'Ágata' and 'Jaette Bintje'. EPG assays indicated that 'Santè' inhibited the initial feeding process of M. persicae, whereas 'Monalisa' showed a physical-type of resistance as demonstrated by a very high number of short probes. The cultivar Mondial showed average values for all EPG variables analyzed. The behavior in 'Jaette Bintje' indicated this cultivar was an ideal host for aphid feeding and reproduction. Together, the EPG data revealed the existence of pre and post-phloematics factors in the cultivars under study, which have important implications on the efficiency of transmission and spread of virus in potato by M. persicae.
Key words: Electrical penetration graph, EPG, Solanum tuberosum, host plant resistance
As doenças virais na cultura de batata geralmente são letais às plantas hospedeiras e, quando associadas às condições climáticas do Brasil, normalmente favoráveis à proliferação dos afídeos, seus principais insetos vetores, podem causar o início de uma epidemia que pode acarretar em perda de produção (Salas et al 2004). Os principais responsáveis pela degenerescência da batata-semente no país são o "vírus Y da batata" (Potato virus Y, PVY) e o "vírus do enrolamento da folha da batata" (Potato leafroll virus, PLRV) (Figueira 1995, Souza Dias 1995). As interações envolvendo afídeos e plantas são de extrema importância ao se estudar a transmissão de fitovírus, visto que a habilidade de transmitir o patógeno está intimamente relacionada à atividade estiletar e hábito alimentar do inseto vetor.
Sabe-se que alguns vírus, principalmente os de transmissão não-persistente, são adquiridos e inoculados de maneira muito rápida (segundos/minutos), como o PVY e seus isolados, não sendo necessário que o vetor ultrapasse a epiderme e o mesofilo onde os mesmos se concentram. Por outro lado, os vírus de transmissão persistente, como o PLRV, geralmente necessitam de maior período, tanto para a aquisição quanto para inoculação (várias horas), por se situarem principalmente no floema das plantas, demandando do afídeo maior fixação na planta e um longo trabalho estiletar (Nault 1997). O estudo da penetração estiletar de afídeos pela técnica de Electrical Penetration Graph (EPG) tem sido utilizado na seleção de variedades de batata resistentes a esses insetos, auxiliando na compreensão do mecanismo de transmissão de fitovírus (Powell et al 1995, Prado & Tjallingii 1994).
As principais espécies de afídeos, denominadas "residentes" (Robert et al 2000) e mais comumente associadas a áreas de produção de batata na Europa, são: Myzus persicae (Sulzer), Aulacorthum solani (Kaltenbach), Macrosiphum euphorbiae (Thomas), Rhopalosiphoninus latysphon (Davidson), Aphis nasturtii (=rhamni) (Kaltenbach) e A. frangulae (Kaltenbach). Estas transmitem os vírus de batata com eficiência variável, sendo que algumas estão envolvidas na disseminação de PVY no Brasil (Salas et al 2004). Em condições de laboratório, M. persicae possui a maior eficiência de transmissão desse vírus e seus isolados, levando em consideração algumas variações determinadas pelos clones empregados (Garzo 2002).
Entre os métodos convencionais de controle, merece destaque o emprego de variedades resistentes, sejam estas visando ao inseto-vetor ou ao vírus em questão. No entanto, algumas limitações podem ser observadas nos métodos convencionais empregados, visto que as avaliações quanto à resistência se limitam à porção externa da folha/planta, não detectando fatores que podem se situar em camadas mais internas, tais como floema e xilema.
A técnica de EPG é empregada no estudo de interações entre os insetos sugadores, suas peças bucais e plantas, convertendo-se em ferramenta utilizada no estudo do comportamento alimentar desses insetos. O processo é amplamente empregado em estudos envolvendo cigarrinhas (Chang 1978, Backus & Hunter 1989) e afídeos (Tjallingii 1978, 1990), além de tripes e cochonilhas. O método pode ser utilizado em várias frentes de pesquisa entomológica, tais como: a) estudos de metabólitos secundários (Raman et al 1979); b) ação de inseticidas (Holbrook 1977); c) transmissão de fitovírus (Fereres et al 1993, Powell et al 1995, Martín et al 1997, Fereres & Collar 2001); 4) avaliação de preferência alimentar de insetos (La Pointe & Tingey 1984); e 5) estudos de resistência varietal, onde o principal objetivo é localizar na planta mecanismos de resistência, sejam eles físicos, químicos ou estruturais, nos diferentes tecidos implicados (van Helden & Tjallingii 1993, Chen et al 1996).
Em afídeos, as fases de penetração estiletar foram caracterizadas e divididas em sete tipos principais de onda que apresentam diferentes valores de amplitude, frequência e voltagem, sendo esses sinais relacionados com o tecido da planta envolvido e a atividade desenvolvida pelo estilete do afídeo nos diferentes tecidos (Tjallingii 1978). No presente trabalho, estudou-se a biologia e o comportamento alimentar do vetor mais eficiente de três isolados de PVY, M. persicae, em cinco cultivares de batata, visando avaliar possíveis graus de resistência a afídeos, por meio de testes de antixenose e antibiose e da técnica de EPG.
Material e Métodos
Criação de insetos. Foram selecionadas fêmeas adultas ápteras de M. persicae das colônias Encín e Fuentedueña, mantidas em pimentão, sendo transferidas para plantas de batata 'Baraka' e 'Desireè', cultivares não empregadas nos experimentos. Os afídeos foram confinados em cilindros de metacrilato e posteriormente distribuídos em gaiolas plásticas de criação mantidas em câmara climatizada [temp.: 22:16ºC (dia:noite); fotofase de 16h e U.R.: 60 ± 10%].
Obtenção de plantas. As plântulas de batata utilizadas nos ensaios foram obtidas a partir de minitubérculos ('Agata', 'Monalisa', 'Jaette Bintje', 'Mondial') e tubérculos ('Santè') sadios. Para acelerar o brotamento do material, empregouse tratamento em solução de ácido giberélico e tiouréia (1 mg:10 g), seguida de lavagem em água corrente e semeadura em vasos e/ou células de germinação, contendo vermiculita e terra orgânica (2:1). As plantas foram adubadas semanalmente com fertilizante foliar solúvel (NPK - 20-20-20) na dose de 0,25 kg/l.
Ensaio de não-preferência (antixenose). Foi realizado ensaio de livre escolha com as cinco cultivares, oferecendo-se discos foliares de cada cultivar em arena circular, conforme descrito por Garzo et al (2002). O experimento foi realizado em placas de Petri plásticas de 9 cm de diâmetro por 3 cm de altura, com um orifício na tampa coberto com tela plástica (50 mesh) para permitir a ventilação e evitar a saída dos insetos. Cada placa constituiu uma arena. Discos foliares (cinco discos / arena), com diâmetro de 1,5 cm, foram obtidos perfurando-se folhas trifolioladas das cinco cultivares com um furador de rolha. Distribuiu-se um disco de cada cultivar equidistantemente do centro da placa, onde se liberaram 30 adultos ápteros de M. persicae, submetidos a 1h de jejum. Realizaram-se contagens do número de indivíduos/disco em diferentes períodos de tempo (15 e 30 min; 1, 2, 4 e 6h) após a liberação, considerando-se apenas os indivíduos que se encontravam sobre os discos de folhas no momento da avaliação. O ensaio foi conduzido em câmara climatizada [temp.: 22:16ºC (dia:noite); fotofase de 16 horas e U.R.: 60 ± 10%] até o final do experimento. Os discos de folha das cinco cultivares correspondiam aos diferentes tratamentos, sendo que depois de distribuídos nas placas, constituíram uma parcela. Cada placa ou arena correspondeu a um bloco, recebendo os cinco tratamentos.
Ensaio de desenvolvimento (antibiose). Foram escolhidas as cultivares Agata, Jaette Bintje e Monalisa por serem as mais utilizadas nas áreas de produção de batata no estado de São Paulo. Quatro plantas de cada cultivar foram infestadas com dez adultos ápteros de mesma idade e origem, previamente sincronizados. Estas eram cobertas com um cilindro de metacrilato para confinar os indivíduos, constituindo uma gaiola. Cada gaiola constituiu uma parcela. Durante o ensaio, as plantas foram mantidas em câmara climatizada (temp.: 26ºC e fotofase de 14h) (Garzo et al 2002). Oito dias após a infestação, os indivíduos adultos atingiram a fase madura e iniciaram a reprodução; assim, realizou-se a contagem de ninfas e adultos dos afídeos. Considerando-se que o ciclo de vida de M. persicae é de aproximadamente dez dias (Furiatti & Almeida 1993), obtiveram-se dados correspondentes a uma geração do inseto.
Delineamento e análise estatística dos ensaios de preferência e desenvolvimento. No ensaio de preferência adotou-se o delineamento de blocos ao acaso com cinco tratamentos e dez repetições. O ensaio foi realizado três vezes e seus dados transformados em log x+1. No experimento de desenvolvimento, adotou-se delineamento experimental inteiramente casualizado, sendo os dados obtidos transformados em √x+1 e realizadas três repetições. Os testes foram submetidos à análise de variância no programa Super-Anova (Abacus Concepts 1989), com médias comparadas pelo teste de Tukey-Kramer (ANOVA), a 5% de probabilidade.
Obtenção de registros EPG. Para cada cultivar, realizou-se o monitoramento de 15 adultos ápteros de M. persicae, com idade entre sete e nove dias, obtidos da colônia pré-estabelecida. Estes foram imobilizados com o auxílio de uma bomba de vácuo adaptada a um microscópio estereoscópico (Nikon SMZ2T, Nikon Corp. Tokyo, Japão). A conexão dos afídeos aos eletrodos de cobre (3 cm x 1 mm de diâmetro) foi feita via fio de ouro de aproximadamente 1,5-3 cm de comprimento e 20 m de diâmetro, colado ao dorso do abdome do afídeo com pintura de prata condutora (16034 Pelco Collodial Silver, Ted Pella Inc. Redding CA, EUA.).
O equipamento de EPG teve como base um Monitor DC (EPG Giga-2 DACQ, Wageningen, Holanda) conectado a um microcomputador Macintosh através de um cartão de saída analógico de aquisição de dados (ACM2-12-8, Strawberry Tree, Sunnyvale, CA) e a um registrador de papel (Konik 1202, Konik Instruments S.A., Madri) para a visualização das ondas durante a aquisição de dados. Após o jejum dos afídeos (1h), procedia-se à calibragem do amplificador gráfico, especificando número de canais e duração do registro com o software ACM2 Aquisition v1.0 (G. Febvay, INRA, Lyon, França).
As plantas de batata foram oferecidas aos insetos em vasos de 10 cm de diâmetro, onde se colocava um segundo eletrodo de cobre de 10 cm de comprimento e 0,2 cm de diâmetro (fio terra). Realizaram-se registros de onda de 6h de duração para cada um dos indivíduos avaliados.
Interpretação e análise dos registros EPG. Os registros foram analisados utilizando-se o aplicativo Macstylet v2.0 β4 (Febvay et al 1996), que permitiu a visualização de ondas obtidas nos registros, bem como realizar a marcação dos diferentes tipos de onda (Tjaliingii 1990), correspondentes às atividades dos estiletes do afídeo nos tecidos da planta.
Os parâmetros considerados foram: a) frequência de nãoprova (np); b) frequência de caminhamento estiletar (forma de onda C); c) número de eventos de penetração intracelular na epiderme ou parênquima ("picadas de prova"), evidenciadas pela forma de onda 'potential drop' (pd); d) número de eventos de salivação no floema (forma de onda E1); e) número de eventos de ingestão no floema (forma de onda E2); (vi) duração total (min) do período de não prova (np) por inseto; (vii) duração total (min) de C; f) duração total (min) das picadas de prova (pd); g) duração total da fase floemática (E total = E1 + E2); h) duração total (min) do período de E1; i) duração total (min) de E2; j) período de tempo entre início da primeira prova e início de ingestão floemática contínua (tempo para E2 > 8 min) e l) porcentagem de tempo em E2. Dados referentes à porcentagem de indivíduos (n = 15) em diferentes formas de onda, a cada 30 min, nas diferentes cultivares, também foram computados.
Análise estatística dos dados de EPG. Para cada parâmetro analisado, verificou-se a distribuição normal ou não da amostra com o teste W de Shapiro-Wilk, utilizando-se o programa Statview 4.01-Macintosh. Os dados que se enquadravam em uma curva normal foram analisados pelo teste de Fisher-MDS, a 5% de probabilidade (ANOVA), do programa Super-Anova 1.11 (Abacus Concepts 1989). Os dados que não obedeceram a distribuição normal, foram analisados pelo teste nãoparamétrico de Kruskal-Wallis.
Resultados e Discussão
Ensaio de não-preferência (antixenose). O número médio de M. persicae nas cinco cultivares variou de 1,4 a 2,8 afídeos/disco foliar. Observou-se diferença significativa na porcentagem de afídeos sobre discos foliares das cultivares em todos os tempos avaliados, com maior preferência pela cultivar Mondial (Fig 1). Não houve diferença quanto à preferência entre os demais genótipos. Esses dados corroboram informações anteriores de que o tempo ótimo para o afídeo definir a planta hospedeira seria de 30 min (Moraes & Vilela 1995). Stein (1998) observaram variações de 0,4 a 1,1 adulto/folha em duas cultivares (Itararé e Apuã) e dois clones (N 140-201 e NYL 235-4), o que demonstrou que as cultivares apresentaram resistência do tipo antixenose quando comparadas com os clones testados. As principais fontes de resistência na cultura de batata envolvem defesas químicas (glicoalcalóides) e mecânicas devido à presença de tricomas glandulares em diferentes porções da planta (Gibson 1971). Baseando-se nos resultados dos ensaios de não-preferência, as melhores cultivares a serem introduzidas em áreas de plantio seriam as que possuem menor porcentagemde assentamento de afídeos/disco, tais como 'Ágata', 'Jaette Bintje', 'Monalisa' e 'Santè'.
Ensaio de desenvolvimento (antibiose). Myzus persicae desenvolveu-se nas três cultivares avaliadas, porém com taxa menor em 'Monalisa', quando comparada a 'Jaette Bintje' (Fig 2). Confirmando dados anteriores (La Pointe & Tingey 1984, Stein 1998), seis diferentes genótipos testados não influenciaram a sobrevivência de M. persicae durante o período ninfal, pois altos valores da viabilidade se davam devido a não interferência dos tricomas glandulares na defesa da planta. Em trabalho semelhante, Lara et al (2004) observaram que a cultivar 'Bintje' foi a que mais favoreceu o desenvolvimento de M. persicae quando comparada com seis cultivares comerciais e oito clones. Diversos estímulos químicos estão relacionados às interações que envolvem inseto-planta. Tais estímulos podem ser de natureza complexa e contêm misturas de substâncias diferentes, destacando-se as provenientes do metabolismo secundário das plantas (Swain 1977). Em trabalho recente desenvolvido por Alvarez et al (2006), alguns dos fatores de resistência a M. persicae em folhas de batata comercial e de batata-selvagem foram estudados utilizando-se registros de EPG de 6h, resultando na identificação de diferentes tipos de resistência nos genótipos estudados, presentes na superfície foliar, epiderme, mesofilo e floema.
Análise dos registros EPG. As variáveis mais importantes do comportamento alimentar encontram-se descritas na Tabela 1. Os registros de dados mostraram que existem fatores pré- e pós-floemáticos envolvidos nos mecanismos de resistência para as cultivares em estudo. De maneira geral, a principal característica da cultivar Santè relacionada à resistência é impedir que o afídeo inicie a penetração estiletar na planta, visto que os pulgões passam mais da metade do tempo total de registro (6h) apenas caminhando sobre a folha (Np = 192,3 min), mesmo depois de um longo período de exposição à planta (Tabela 1, Fig 3e). Isso indica que o fator de resistência está localizado nos tecidos superficiais da planta, pois impede o assentamento inicial do pulgão e inibe as fases iniciais da alimentação, aumentando significativamente o tempo para iniciar a fase de ingestão floemática contínua (tempo para E2 > 8 min). No entanto, após a localização do floema, a duração da atividade de salivação nos vasos crivados é similar (E1 = 9,3 min) àquela observada nas demais cultivares testadas (Tabela 1).
A cultivar Monalisa foi classificada como suscetível ao PVY devido à grande quantidade de plantas infectadas nas áreas produtoras. Contudo, o comportamento de M. persicae sugere resistência ao nível de tecidos superficiais, graças aos longos períodos sem prova (128,05 min, em média) e ao elevado número de eventos em não-prova (np) realizados (n = 32,5) (Tabela 1, Fig 3). Os afídeos, nessa cultivar, apresentaram alto número de eventos de caminhamento estiletar (C = 30,5) e de penetração intracelular ("picadas de prova" - pd) na epiderme e/ou parênquima, fato que pode evidenciar dificuldades na busca dos tecidos vasculares. Deve-se destacar também o menor tempo total na fase floemática (E total= 38,7 min, em média) (Tabela 1). Esses dados complementam os resultados obtidos nos experimentos de antibiose, onde, em 'Monalisa', ocorreu menor fixação e desenvolvimento da colônia de afídeos (Fig 2). Esse fator de resistência tem efeito semelhante ao fenômeno de repelência, muito conhecido no início do emprego dos primeiros inseticidas piretróides, que induzia maior disseminação de vírus não-persistentes em campo devido a procura de planta mais palatável na área de plantio. Assim, sugere-se que a cultivar Monalisa possui resistência ao assentamento na planta (resistência de tipo superficial), mas em menor grau que a cultivar-controle Santè, assim como evidenciado pelo maior tempo gasto em atividade de não-prova (Np) em Santé (Tabela 1).
A cultivar Mondial apresentou valores intermediários para a maioria das variáveis analisadas, destacando-se o maior número de vezes que os afídeos realizaram E2 durante o período de 360 min de monitoramento (Tabela 1). A cultivar proporcionou períodos relativamente longos de fase floemática (Etotal = 65,2 min) e de ingestão de seiva do floema (E2 = 48,1 min), superados apenas por aqueles observados em 'Jaette Bintje'. Isso evidencia a suscetibilidade de 'Mondial', principalmente quando se considera a transmissão de vírus persistentes e de localização floemática, como é o caso de PLRV, devido à facilidade com que o vetor M. persicae atinge o tecido do floema. O mesmo fato foi observado no experimento de antixenose, onde se determinou o maior número médio de pulgões/disco de folha em todos os períodos avaliados (Fig 1).
A cultivar Agata proporcionou comportamento semelhante ao observado em 'Monalisa' para a maioria das variáveis analisadas, com destaque para o maior tempo gasto no caminhamento estiletar através da epiderme e parênquima foliar (C = 196,8 min), e em "picadas de prova" em células destes tecidos (pd = 12,9 min) (Fig 3). Um dado interessante é o longo período de tempo de salivação no floema (E1 = 29,9 min) e o curto período ingerindo seiva neste tecido (E2 = 10,4 min), que representou apenas 4,3% do tempo total de monitoramento (Tabela 1). O prolongado período de salivação no floema, seguido de curtos períodos de ingestão de seiva, sugerem a existência de fatores de resistência pósfloemáticos nessa cultivar.
A cultivar 'Jaette Bintje' foi definida como resistente ao vírus devido ao baixo índice de plantas infectadas por PVY em campo. A explicação talvez esteja nos curtos períodos em pd (7,7 min) e longos em ingestão floemática (E2 = 116,4 min) (Tabela 1, Fig 3) observados na cultivar. Nela também se observaram as maiores porcentagens de tempo gasto em E2 (48,5%) e o menor tempo para iniciar o processo de ingestão contínua no floema (tempo até E2 > 8 min). Esses resultados evidenciam relativa facilidade de M. persicae ao transpor as camadas mais superficiais da planta para penetração e ingestão no floema em 'Jaette Bintje' Devido a esses fatores, a cultivar constitui ótima planta hospedeira, a qual M. persicae coloniza melhor (Fig 2). Além da menor tendência de movimentação de M. persicae entre plantas, evidenciada pelo pouco tempo em não prova (Np), é notável o menor número e duração de formas de ondas do tipo pd (penetração intracelular na epiderme ou parênquima) em 'Jaette Bintje' (Tabela 1), o que pode reduzir a capacidade de disseminação de vírus não-persistentes como PVY. Assim, ao mesmo tempo em que os resultados apontam a cultivar 'Jaette Bintje' como suscetível à infestação por M. persicae, eles também dão sustentação às observações relativas ao número reduzido de plantas infectadas por PVY a campo, visto que ao se fixarem às plantas, os afídeos reduzem a sua movimentação, diminuindo a dispersão do fitovírus.
Entre as cultivares estudadas, Santè apresentou ampla resistência tanto à transmissão (Salas et al 2004) quanto ao assentamento do afídeo vetor, dificultando o início da alimentação, o que é corroborado pelos menores tempos e número de eventos para todas as variáveis estudadas (Tabela 1). Nesse caso, o fator de resistência encontra-se nas regiões mais externas do tecido vegetal; porém, se o afídeo atravessar essa barreira, poderá se alimentar no floema. Os resultados obtidos para 'Santè' corresponderam ao esperado, visto que trata-se de controle resistente, desenvolvido principalmente para PVY, e com baixa utilização no mercado brasileiro.
A cultivar Monalisa é amplamente empregada nas regiões produtoras do Sudoeste paulista. Esta, entre as cultivares analisadas por EPG, foi a que apresentou maior resistência ao assentamento de M. persicae na planta, o que pode vir a provocar maior disseminação do vírus em campo. Deve-se levar em consideração que a população de afídeos em áreas produtoras de batata inclui espécies colonizantes e nãocolonizantes (ou migratórias). As espécies não-colonizantes desempenham papel muito importante na disseminação, pois os vírus de transmissão não-persistente possuem baixa especificidade em relação aos seus insetos-vetores, isto é, podem ser transmitidos por muitas espécies de afídeos, inclusive espécies migratórias (Basky 2003). A eficiência de transmissão por certas espécies é mais baixa, porém pode ser compensada por uma alta população do vetor (Irwin & Ruesink 1986). Em trabalho relacionando a eficiência de alguns afídeos vetores, (Halbert et al 2003), oito espécies de afídeos não-colonizantes transmitiram PVY, inclusive em áreas onde o principal vetor M. persicae não foi encontrado. Basky (2003) encontrou relação significativa entre o número total de afídeos, o número de afídeos vetores de PVY e a incidência em campos de batata-semente, tendo verificado também maior incidência de PVYNTN, quando comparado aos demais isolados de PVY.
Deve-se salientar que uma variedade resistente a afídeos reduz o número desses insetos na cultura, principalmente se ocorre predominância de uma determinada espécie-alvo. Porém, se esse fato não ocorre e existem outras espécies vetoras envolvidas, a variedade resistente pode não ser eficaz na redução da epidemia. Além disso, se o fator de resistência induzir maior número de picadas de prova (pd) ou maior salivação no floema (E1), pode resultar em maiores taxas de transmissão de PVY e PLRV, respectivamente. Esses aspectos da atividade estiletar devem ser considerados em programas visando resistência de batata a afídeos vetores.
Conjuntamente com os testes de antixenose e de antibiose, os dados de EPG obtidos neste estudo evidenciaram a existência de fatores de resistência pré e pós-floemáticos nas cultivares em estudo, que têm implicações importantes sobre a eficiência de transmissão e disseminação de vírus em batata por M. persicae.
Agradecimentos
Ao CNPq pelas bolsas de doutorado-sanduíche no exterior (SWE) e de produtividade concedidas a Fernando J. S. Salas e João R. S. Lopes, respectivamente. Ao convênio bilateral CSIC-CNPq (PROCESSO Nº: 200746/01-4), que financiou o intercâmbio de Pesquisadores e ao Ministério de Educação e Ciência da Espanha, por apoiar parte deste trabalho através do projeto AGL-2003-07532-C03.
Received 03/VIII/09.
Accepted 01/VI/10.
Edited by André L Lourenção - IAC
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
17 Jan 2011 -
Data do Fascículo
Dez 2010
Histórico
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Recebido
03 Ago 2009 -
Aceito
01 Jun 2010