Open-access A evolução científica e tecnológica e a ética do médico

Scientific and technological evolution and the physician's ethic

EDITORIAL

A evolução científica e tecnológica e a ética do médico

Scientific and technological evolution and the physician's ethic

Reinaldo Ayer de Oliveira

Docente da Disciplina de Bioética, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo (FM-USP), São Paulo, SP. Conselheiro, Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP), São Paulo, SP

O progresso em diversas áreas da medicina resultou dos avanços científicos e tecnológicos ocorridos nas últimas décadas. Em pouco tempo, as conquistas e possibilidades de diagnósticos mais precisos e procedimentos terapêuticos avançados chegaram às mãos dos médicos e ao desejo dos doentes portadores de doenças graves.

Na angiologia e cirurgia vascular, não foi diferente1.

Os meios de comunicação e divulgação, como a televisão e a internet, estão permitindo que a informação científica atinja rapidamente e ao mesmo tempo os médicos e os doentes. Freqüentemente, os médicos são procurados para opinarem sobre procedimentos que os doentes ficam sabendo pela mídia. Esta novidade na relação médico-paciente, aliada a certa competitividade entre médicos, tem gerado algumas inquietações no âmbito da ética.

Sem dúvida, a partir da década de 1990, os avanços nas áreas de angiologia e da cirurgia vascular não significaram apenas a introdução de uma nova linguagem de possibilidades, mas, sobretudo, que o aperfeiçoamento científico e técnico despertava uma ousadia de cirurgiões que procuravam soluções inovadoras, com o objetivo de ofertar, aos doentes, possibilidades de cura ou controle de suas doenças. Estar atualizado e realizando novos procedimentos significa, também, aumento de clientela. Há, portanto, um movimento legítimo que, de um lado, procura levar para o indivíduo, em particular, aquilo que existe de mais avançado em diagnóstico e tratamento na solução do seu problema de saúde, e que, de outro lado, busca o sucesso do médico.

Os movimentos sociais, na década de 1960, colocaram em evidência a necessidade de uma reflexão ética mais abrangente sobre os procedimentos na área da saúde. Um exemplo marcante de conflito ético aconteceu quando da criação do primeiro centro de hemodiálise nos EUA, nos anos de 1960. Como não havia equipamento suficiente para o tratamento de todos os pacientes com indicação para essa terapia, surgiu um grande problema para definir critérios de prioridades. Nesta ocasião, foram constituídos os primeiros comitês de ética médica, que definiam prioridades de tratamento e quais procedimentos deveriam ser utilizados.

Hoje, a utilização de novas tecnologias e grande parte das pesquisas de novos procedimentos são avaliadas por comitês de ética em pesquisa, especialmente em centros universitários, garantindo uma prática médica baseada em evidências científicas e éticas. A despeito deste movimento que procura dar ao médico respaldo científico, tecnológico e ético para a sua ação, e ao doente a garantia e a segurança de uma boa prática médica, ainda existem indagações éticas e legais que fragilizam o ato, individual, do médico.

Ocorre que o médico, em determinadas circunstâncias, deixa-se levar pelo "encanto" dos novos procedimentos e avanços tecnológicos, esquecendo-se de sua periculosidade (efeitos adversos); na verdade, esquecendo-se do necessário respaldo científico, técnico e ético para a sua ação, que significa: ato médico. Diante de um insucesso, a questão legal e ética transforma-se em um drama pessoal e profissional de consequencias imprevisíveis.

As sociedades de especialidades freqüentemente agem de maneira correta ao possibilitar um processo de educação continuada, com atualização por meio da edição de revistas, promoção de seminários, congressos e, sobretudo, da elaboração de diretrizes para o diagnóstico e o tratamento de diferentes doenças. Normas indicativas e baseadas em evidências científicas procuram nortear a ação do médico na direção da boa prática. Mesmo assim, surgem dilemas quando da aplicação de uma ou outra técnica, do uso de um ou outro procedimento ou medicamento, cabendo, muitas vezes, ao médico, em particular, a difícil tarefa da opção. Neste momento, a decisão deve estar respaldada na ética médica contida nos códigos normativos e no melhor da evidência científica.

Se entendermos que a participação do doente é importante, a discussão deve ser ampliada, e a decisão sobre a utilização do "novo e avançado" envolve mais pessoas: a família do doente. Esta estratégia de condução ética das questões relacionadas com uma boa prática médica pode ser estimulada pelas sociedades de especialidades, promovendo o debate em suas publicações e em seus congressos sobre a autonomia do doente e a participação dos familiares nas decisões2.

REFERÊNCIAS

1. Yoshida WB. Angiogênse, arteriogênese e vasculogênse: tratamento do futuro para isquemia crítica de membros? J Vasc Br. 2005;4(4):316-8.

2. Segre M, Cohen C. Bioética. 3ª ed. São Paulo: EDUSP; 2002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Ago 2006
  • Data do Fascículo
    Mar 2006
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