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Iniciativas de acesso aberto no combate à pandemia dados abertos e propriedade intelectual na disseminação da informação e conhecimento

RESUMO

Introdução:

Com a pandemia, o número de pesquisas sobre COVID-19 cresceu em um ritmo acelerado, obrigando o sistema de comunicação científica a aperfeiçoar-se diante das exigências de velocidade e eficiência na disseminação dos resultados científicos tornando a Ciência Aberta um ponto chave para alcançarmos o fim desta crise mundial.

Objetivo:

O presente estudo tem como objetivo analisar as iniciativas Transparência Covid-19 e Open Covid Pledge, trazendo à luz a discussão sobre dados abertos e propriedade intelectual no avanço da ciência, da colaboração científica e da socialização do conhecimento.

Método:

Trata-se de uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa, realizada por meio de revisão bibliográfica (2010 a 2021) e pesquisa documental, a fim de proporcionar uma análise crítica sobre dados abertos e propriedade intelectual.

Resultados:

A luta contra a pandemia destaca a importância de iniciativas, que buscam avaliar a qualidade da transparência de dados abertos disponibilizados pelos órgãos públicos, como também promover a participação social, fiscalizando e estimulando ações governamentais contribuindo na elaboração e condução de políticas públicas. O compartilhamento da PI tem um papel fundamental quando se coloca como instrumento de incentivo e não de barreira ao acesso a informações e dados para inovação tecnológica e avanço da ciência.

Conclusão:

Concluímos, que a discussão sobre dados abertos e PI, através de um olhar pela Ciência Aberta, nos mostra a importância destes no enfrentamento à pandemia sobre suas barreiras e usos para a área da Saúde e para sociedade no sentido de socialização e compartilhamento do conhecimento.

PALAVRAS-CHAVE:
Acesso aberto; Dados abertos; Propriedade intelectual; Transparência Covid-19; Open Covid Pledge

ABSTRACT

Introduction:

With the pandemic, the number of research on COVID-19 has grown at a rapid pace, forcing the scientific communication system to improve in the face of the demands of speed and efficiency in the dissemination of scientific results, making Open Science a key point to achieve the end of this global crisis.

Objective:

This study aims to analyze initiatives Transparência Covid-19 and Open Covid Pledge, bringing to light the discussion of open data and intellectual property in the advancement of science, scientific collaboration, and the socialization of knowledge.

Method:

Methodologically, this is a descriptive research with a qualitative approach, carried out through a bibliographic review (from 2010 to 2021) and documentary research, in order to provide a critical analysis of open data and intellectual property.

Results:

The fight against the pandemic highlights the importance of initiatives, which seek to assess the quality of transparency of open data made available by public agencies, as well as to promote social participation, monitoring and encouraging government actions contributing to the development and conduct of public policies. The sharing of PI has a fundamental role when it is placed as an incentive instrument and not as a barrier to access to information and data for technological innovation and scientific advancement.

Conclusion:

We conclude, that the discussion about open data and PI, through a look by Open Science, shows us the importance of these in confronting the pandemic about its barriers and uses for the Health area and for society in the sense of socialization and sharing of knowledge.

KEYWORDS:
Open Access; Open data; Intellectual Property; Covid-19 Transparency; Open Covid Pledge

1 INTRODUÇÃO

Desde março de 2020 vive-se em meio a uma pandemia causada por um novo tipo de coronavírus (da família Coronaviridae), identificado como SARS-CoV-2 ou Novo Coronavírus, que assim como outros gêneros de coronavírus ocasiona como sua principal complicação à Síndrome Respiratória Aguda Grave. Posteriormente a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais precisamente no ano de 2020 estabeleceu como nomenclatura oficial para se referir a esta nova doença o termo Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) (ZENG; HONG; CLUNIS; HE; COLADANGELO, 2020ZENG, Marcia Lei et al. Implications of Knowledge Organization Systems for Health Information Exchange and Communication during the COVID-19 Pandemic. Data And Information Management, Warsaw, v. 4, n. 3, p. 148-170, jun. 2020. Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/global-literature-on-novel-coronavirus-2019-ncov/resource/pt/covidwho-828345. Acesso em: 13 maio 2021.
https://pesquisa.bvsalud.org/global-lite...
). Praticamente todas as esferas da sociedade em um âmbito mundial foram atingidas, gerando uma crise sem precedentes, de difícil controle para os sistemas nacionais de saúde pública.

Dentre suas consequências, além das várias vidas já perdidas, uma nova percepção de mundo e formas de agir se tornaram essenciais para o enfrentamento deste contexto pandêmico, repercutindo nas áreas biomédicas e epidemiológicas e também ocasionando impactos sociais, econômicos, políticos, culturais, históricos e principalmente do fazer e comunicar ciência. Este último na busca de obter e identificar resultados relevantes de pesquisa em um intervalo curto de tempo para a tomada de decisões socioeconômicas e principalmente de saúde pública.

No presente trabalho parte-se desta consequência que ecoa na comunicação cientifica de todos os campos de estudos, como na Ciência da Informação (CI), ponto que na realidade não é novo, tendo em vista que já se discutia desde a década de setenta novas formas de comunicação entre cientistas. Discussão esta que originou-se no Movimento de Acesso Aberto com o propósito de proporcionar o acesso à informação livre de custos e de qualquer outro tipo de restrição que impossibilitasse seu acesso e retorno a sociedade.

No decorrer dos anos com o desenvolvimento da Internet e expansão do acesso à informação novas práticas de comunicação científica foram sendo discutidas (dados abertos, ciência cidadã, código aberto, redes sociais cientificas, entre outras) gerando a Ciência Aberta, que vai além das publicações e dados acessíveis, tornando-se um guarda-chuva englobando todas estas práticas com o objetivo de fomentar, projetar, realizar e comunicar os resultados e dados de pesquisa. Ela relaciona os princípios da abertura e colaboração nos diversos processos científicos de produção do conhecimento (organização, compartilhamento e reutilização) (SILVA; SILVEIRA, 2019SILVA, F. C. C. da; SILVEIRA, L. da. O ecossistema da Ciência Aberta. Transinformação, v. 31, 2019. DOI: 10.1590/2318-0889201931e190001. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tinf/a/dJ89vRg94Qxtf6Y7M49Hztr/?lang=pt. Acesso em: 13 jun. 2021.
https://www.scielo.br/j/tinf/a/dJ89vRg94...
). Tem-se, com isso, a socialização da ciência tornando-a mais colaborativa, transparente e sustentável.

Desta forma, a Ciência Aberta permite que as informações científicas, dados e resultados sejam mais amplamente acessíveis e possibilite sua reutilização e redistribuição por toda a sociedade, ou seja, esteja conectada às necessidades da população. Isso proporciona por sua vez a disseminação do promover e aprender com a Ciência incentivando cientistas, formuladores de políticas e cidadãos a trabalharem em conjunto para o avanço tecnológico e de inovação entre e dentro dos países trazendo como ponto chave o retorno de resultados e dados científicos para a sociedade, garantindo o direito à informação e a ciência (UNESCO, 2021).

Com a pandemia, o número de pesquisas sobre a COVID-19 cresceu em um ritmo acelerado, uma corrida científica sem precedentes, tornando-se fundamental estarem acessíveis a todos para o avanço ao combate à doença. Isso obrigou o sistema de comunicação científica a aperfeiçoar-se, mesmo que de forma abrupta, diante das exigências de velocidade e eficiência na disseminação dos resultados científicos (LARIVIÈRE; SHU; SUGIMOTO, 2020LARIVIÈRE, Vincent; SHU, Fei; SUGIMOTO, Cassidy. The Coronavirus (COVID-19) outbreak highlights serious deficiencies in scholarly communication. LSE Impact Blog, mar. 2020. Disponível em: https://blogs.lse.ac.uk/impactofsocialsciences/2020/03/05/the- coronavirus-covid-19-outbreak-highlights-serious-deficiencies-in-scholarly-communication/. Acesso em: 13 jun. 2021.
https://blogs.lse.ac.uk/impactofsocialsc...
).

Juntamente a comunidade científica tem reforçado seu apelo as editoras e financiadores para aplicação de políticas de acesso aberto, para a disponibilização dos resultados e dados das pesquisas, especialmente aqueles relacionados ao COVID-19 (BERMÚDEZ-RODRÍGUEZ; MURAROA; SPATTIA; MONACO, 2020BERMÚDEZ-RODRÍGUEZ, Tatiana et al. O impacto do acesso aberto na produção e difusão do conhecimento sobre a Covid-19. Liinc em Revista, Rio de Janeiro, v. 16, n. 2, dez. 2020. DOI: 10.18617/liinc.v16i2.5296. Disponível em: http://revista.ibict.br/liinc/article/view/5296. Acesso em: 13 jun. 2021.
http://revista.ibict.br/liinc/article/vi...
). Nesse contexto tornou-se ainda mais evidente e importante o debate sobre a Ciência Aberta, principalmente nesse contexto pandêmico.

Com isso, para o acompanhamento da evolução da epidemia e desenvolvimento de medidas no combate ao COVID-19, tanto seus efeitos clínicos como sociais, a OMS deu o ponto de partida por meio da iniciativa Global research on coronavirus disease COVID-19, que visa reunir cientistas, acadêmicos e profissionais de saúde de todo o mundo para acelerar o processo de pesquisa sobre a COVID-19 buscando assim impulsionar a importância da Ciência Aberta no contexto pandêmico.

Várias outras iniciativas abertas desde então foram criadas, envolvendo uma multidisciplinaridade para a obtenção e disseminação de informações e dados relacionadas ao COVID-19. Isso para facilitar o acesso da sociedade e proporcionar a formação de uma rede de colaboração global do fazer e comunicar ciência, possibilitando estudos em todas as áreas acadêmicas, principalmente na área da saúde.

Com este contexto pandêmico e essencialidade da Ciência Aberta para inovar com rapidez e difundir os resultados das pesquisas, o presente artigo tem como objetivo analisar duas iniciativas abertas, a Transparência COVID-19 e a Open Covid Pledge, a fim de trazer à luz discussões da importância dos dados abertos e da propriedade intelectual (PI) no avanço da ciência, da colaboração científica e da socialização do conhecimento, principalmente no contexto da pandemia.

Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa descritiva com abordagem qualitativa que visa por meio de revisão bibliográfica (sobre dados abertos, COVID-19 e Propriedade Intelectual) com recorte temporal de 2010 a 2021, e pesquisa documental (junto ao site de cada iniciativa) realizar uma análise crítica sobre dados abertos e PI relacionando as iniciativas analisadas e consequentemente a colaboração entre pesquisadores, difusão e acesso à informação e ao conhecimento tendo como contexto a pandemia. Estruturalmente o trabalho se constitui de seções que abordam as iniciativas analisadas discorrendo sobre suas características e relações com a Ciência Aberta. Na sequência são discutidos de forma crítica a relação entre as duas iniciativas e como elas podem ser complementares trazendo a luz a discussão sobre dados abertos e PI proporcionando a intersecção entre Ciência Aberta e Comunicação Científica. Por fim, na última seção apresenta-se uma síntese dos elementos presentes na pesquisa e conclusões sobre o tema.

2 INICIATIVAS DE ACESSO ABERTO NO COMBATE À PANDEMIA

Tem-se atualmente um mar de informações e dados sendo gerados, com vistas a tentar responder às incógnitas da pandemia e a necessidade de disseminar rapidamente informações epidemiológicas e biológicas sobre a COVID-19. Neste processo, como já destacado, a reação da comunidade científica e da sociedade reafirmou a importância da Ciência Aberta, afetando diretamente todos os campos de estudo. Com isso, é essencial a transmissão efetiva dos resultados das pesquisas, a fim de que sejam avaliadas, revisadas, ampliadas e disponibilizadas e diante do contexto pandêmico temos um avanço acelerado na propagação da doença e na disponibilização de dados e informações científicas sobre ela que devem ser consistentes e acessíveis a todos (SILVA; D'ANDREA, 2020SILVA, F. C. C. da; D'ANDREA, G. S. Podcasts e webinars sobre Covid-19 na área de Ciência da Informação. Atoz: novas práticas em informação e conhecimento, Curitiba, v. 2, n. 9, p. 139-147, nov. 2020. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/atoz/article/view/75860/42110. Acesso em: 11 jul. 2021.
https://revistas.ufpr.br/atoz/article/vi...
)

Desta forma, é perceptível a importância da organização e representação da informação e do conhecimento no progresso cientifico para torna-los acessíveis, ou seja, a urgência no compartilhamento rápido de informações. Com isso, nessa aceleração de publicações a cooperação científica surgiu de forma espontânea numa imensa rede colaborativa que enlaça um número elevado de iniciativas abertas de órgãos públicos, organizações não governamentais, empresas, universidades e laboratórios com foco na luta contra a pandemia visando trazer informações, recursos e dados “de” e “para” pesquisa.

Para exemplificar apresenta-se como exemplo o hub de informações e recursos com mais de 30 iniciativas organizado pela Agência USP de Gestão de Informação Acadêmica (2021), ligada a Universidade de São Paulo, a qual tem o objetivo de promover a Ciência Aberta, através da produção e uso da informação para o desenvolvimento da sociedade. Para obter-se um panorama geral, organizaram-se estas informações e recursos no Quadro 1 com alguns exemplos de iniciativas. É importante destacar-se que está lista não contempla todas as fontes de informação de acesso aberto no combate há pandemia, mas é uma das poucas instituições que proporciona tal observação:

Quadro 1
Lista de fontes de informação em Acesso Aberto

A cada dia novos itens são adicionados a esta lista. Tendo em vista o desenvolvimento adequado da pesquisa, o presente artigo pretende aprofundar sua discussão através da seleção de duas iniciativas: a Transparência COVID-19 e a Open Covid Pledge.

A escolha por estas iniciativas se deve ao fato de que a Transparência COVID-19 se coloca como protagonista na análise da qualidade dos dados disponibilizados pelos estados e governo brasileiros, ou seja, abarca a produção de dados e informações no âmbito público disponibilizando-os para pesquisa. Já a iniciativa Open Covid Pledge torna-se importante dado que tem como propósito a cooperação internacional para estimular pesquisadores, cientistas, acadêmicos a disponibilizarem toda a PI sob seu controle tendo para isso o apoio de grandes empresas e associações do âmbito público e privado disponibilizando para a sociedade, sobre determinadas licenças, dados e informações de pesquisa e para pesquisa. Com a análise das duas iniciativas objetivou-se englobar os espectros nacional e internacional, público e privado no combate a pandemia.

2.1 Transparência COVID-19

Como primeira iniciativa aberta a ser analisada, observa-se aquela que atua nacionalmente, a Transparência COVID-19. Tal iniciativa teve seu início no dia 3 de abril de 2020, por intermédio da Open Knowledge Brasil (OKBR), uma Organização da Sociedade Civil sem fins lucrativos ligada a Open Knowledge Foundation, colocando-se como sua seção dentro do Brasil.

A OKBR, chamada também de Rede pelo Conhecimento Livre, foi oficializada em 2014, conforme seu Estatuto, e se coloca como pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, político-partidários ou religiosos. Tendo como propósito inicial no Brasil, enfrentar as questões relacionadas a abertura de informações. Ela atua com a missão de utilizar e desenvolver ferramentas cívicas, projetos, análises de políticas públicas e jornalismo de dados para promover o conhecimento livre em vista a alcançar todos os campos da sociedade, funcionando como uma plataforma para lançar projetos proporcionando as iniciativas orientação, recursos e planejamento para obter financiamento e parcerias (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2019; 2020a).

Com a premissa do conhecimento livre a todos a OKBR tem três objetivos principais, conforme destacado em seu Estatuto (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2019, p. 1):

  • a) Promover a liberdade de acesso, uso, criação, recombinação, estudo e disseminação de conhecimento;

  • b) Promover e facilitar o usufruto dessas liberdades;

  • c) Opor-se fundamentadamente a quaisquer tipos de restrições (legais, técnicas, públicas, privadas) a essas liberdades, observando o equilíbrio entre direitos individuais.

Tais objetivos são refletidos pelos seus eixos de atuação: Advocacy e Pesquisa; Inovação Cívica; e Escola de Dados. Os quais refletem em suas atuações que tem o propósito de estimular o engajamento da sociedade na busca pelo conhecimento e informação abertos. Promovendo e utilizando plataformas e códigos abertos, fortalecendo o suporte jurídico, de pesquisa e de ensino (ciência cidadã) para a sociedade no combate à corrupção e defendendo os direitos digitais, transparência e governança democrática (monitoramento de políticas públicas) (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2020a).

Com isso os dados abertos se colocam como basilar na estrutura da OKBR, tendo como definição:

Dados abertos são dados que podem ser livremente usados, reutilizados e redistribuídos por qualquer pessoa - sujeitos, no máximo, à exigência de atribuição da fonte e compartilhamento pelas mesmas regras (OPEN KNOWLEDGE FOUNDATION, 2021, online).

Tal definição carrega consigo pontos importantes, que são a disponibilidade e acesso, no sentido que os dados devem estar disponíveis como um todo, reutilização e redistribuição em que permitam a reutilização e a redistribuição de uma forma interoperável com outros conjuntos de dados e também a participação universal, que significa que toda a sociedade seja capaz de usar, reutilizar e redistribuir (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2019; OPEN KNOWLEDGE FOUNDATION, 2021).

Partindo desta breve descrição sobre a OKBR, direciona-se o olhar para a Transparência COVID-19. No início do mês de abril de 2020, um mês após o início da pandemia, com medidas de isolamento sendo adotadas por parte dos estados e o país computando mais de 10 mil casos da COVID-19, a OKBR lança o Índice de Transparência da Covid-19 (ITC-19), um indicador sintético que se estabelece como a primeira fase da iniciativa Transparência COVID-19. Tem como objetivo avaliar a qualidade dos dados e informações (boletins e informativos epidemiológicos, relatórios e outros tipos de divulgação de dados) disponibilizados pelos estados, capitais e governo federal em seus portais oficiais sobre a pandemia.

Com isso, a iniciativa tem como propósito:

[...] apontar caminhos viáveis para que capitais, estados e governo federal aprimorem a divulgação dos dados, por meio da publicação padronizada de informações sobre a pandemia. No contexto atual, esses dados seguem sendo determinantes não apenas para o exercício do controle social, mas para aperfeiçoar políticas que vão salvar vidas (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2021a, p. 5).

Tal propósito somado a essencialidade da transparência de dados governamentais, nota-se que o acesso a eles se torna uma ferramenta de combate a pandemia de COVID-19, ao disponibilizar evidências consistentes e atualizadas sobre a situação de saúde pública no território nacional, auxiliando no monitoramento da evolução da doença.

Na busca da concretização deste propósito o ITC-19 analisa preferencialmente seções fixas e hotsites dedicados a publicação de informações sobre o novo coronavírus (boletins e informativos epidemiológicos, bem como painéis, relatórios e outros tipos de divulgação de dados) nos portais oficiais dos estados, capitais e governo federal. O foco nos portais oficiais se dá pelo fato de serem, a porta inicial de contato com a população e que quando padronizados e organizados facilitam a busca de informações e acesso a população (ainda são a forma mais acessível e democrática de comunicação e compartilhamento de dados e informações dos órgãos públicos) (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2020a; 2020b). Claro que atualmente as redes sociais e aplicativos se colocam como uma fonte primária de grande valor de busca de informações pela população, principalmente neste contexto de sobrecarga de informações, mas essas vias de comunicação ainda carecem muitas vezes de atualização e controle, o que pode gerar ruídos em quem informa e quem deseja estar informado, além do cuidado com a proteção de dados pessoais em suas publicações.

A iniciativa, por sua vez, se coloca dentro de seu objetivo, com a intenção de proporcionar a (re)organização dos portais oficiais para torna-los mais claros e acessíveis a fim de facilitar a divulgação de informações se colocando à disposição dos órgãos públicos para ajudar no desenvolvimento de dados abertos e de proteção de dados pessoais, tanto em relação aos dados da pandemia, quanto no avanço das políticas públicas (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2021a).

Metodologicamente o ITC-19 coleta e verifica os dados abertos das últimas publicações periódicas de portais oficiais dos órgãos de saúde e de controle dos governos municipais, estaduais e federal e as analisa através de três dimensões, que por sua vez é formada por várias subdimensões que agregam um conjunto de aspectos avaliados individualmente. Conforme a Nota Metodológica 3.0, a mais recente publicada pela Open Knowledge Brasil (2021a, p. 6), estas dimensões se compõem da seguinte forma:

  • a) Conteúdo: avalia parâmetros que auxiliam na produção de análises mais profundas sobre a disseminação do vírus. Esta dimensão é constituída pelas subdimensões (peso 1 na composição do Índice): Casos (notificações, óbitos, síndrome respiratória aguda grave (SRAG) e principais agentes etiológicos); Perfil de Casos (faixa etária, sexo, doenças preexistentes, raça/cor, etnias indígenas, profissionais da saúde, população privada de liberdade); Vacinação (doses aplicadas, grupo prioritário, cobertura vacinal dos grupos prioritários, cobertura vacinal da população geral); Perfil da Vacinação (sexo, raça/cor, etnias indígenas); Infraestrutura (testes aplicados, testes disponíveis, doses distribuídas, doses recebidas e adquiridas, seringas e agulhas disponíveis, leitos clínicos e UTI operacionais/geral, leitos clínicos e UTI ocupados/geral, leitos clínicos e UTI operacionais/exclusivos para Covid-19, leitos clínicos e UTI ocupados/exclusivos para Covid-19);

  • b) Granularidade: avalia o detalhamento dos dados divulgados pelas autoridades. Esta dimensão é constituída pelas subdimensões (peso 2 na composição do Índice): Base de Dados (microdados de casos, microdados da vacinação); Localização (casos de Covid-19 por bairro/distrito, vacinação por município);

  • c) Formato: avalia como os dados foram disponibilizados, ou seja, a forma de acessar, ler e compartilhar. Esta dimensão é constituída pelas subdimensões (peso 3 na composição do Índice): Acesso (visualização/casos, Visualização/vacinação, navegação); Qualidade (formato aberto/casos, formato aberto/vacinação, metodologia).

Para representação no índice cada dimensão tem atribuída notas em uma escala de 0 a 100 (zero representa o menos transparente e cem o mais transparente), com base nas notas das suas subdimensões, para a constituição da nota final que será representada no painel da ITC- 19. Assim, cada rodada de avaliação a iniciativa busca discutir o nível de transparência dos dados dos órgãos públicos analisados a fim de provoca-los e estimula-los a melhorar o acesso e organização a esses dados principalmente na forma de disponibilização desses (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2020a).

Isso se deve ao fato que logo após seu lançamento o ITC-19 se tornou um norte para os gestores públicos devido a sua qualidade metodológica, impulsionando consideravelmente a transparência de dados e informações sobre a pandemia em todos os estados e governo federal. Atualmente, a iniciativa Transparência COVID-19 se encontra na sua terceira fase (Quadro 2), trazendo em sua constituição não só o ITC-19, mas também outras duas iniciativas, os painéis “Monitor de Leitos” e o “Monitor da Vacinação” que visam analisar os dados publicados pelo Ministério da Saúde. Essas três iniciativas somadas trazem um panorama rico de avaliações para monitorar a qualidade dos dados e informações disponibilizados sobre a pandemia pelos estados e governo federal (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2020a; 2020b; 2021a).

Quadro 2
Fases da inciativa Transparência COVID-19

A evolução entre as fases ocorreu conforme o aumento na transparência dos órgãos públicos analisados. Em sua primeira fase, após onze rodadas de avaliações (onze semanas), a pontuação média de transparência dos estados e governo federal triplicou, fazendo com que a OKBR percebesse a necessidade de “subir a régua” das análises melhorando a qualidade na coleta e transparência dos dados da pandemia. Para isso as dimensões tiveram suas subdimensões ampliadas e atualizadas, passando também a analisar e avaliar os dados das capitais brasileiras, fazendo com que a iniciativa entrasse em sua segunda fase em julho de 2020 (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2020b).

Após mais oito rodadas de avaliação, agora de forma mensal, a OKBR observou novamente a necessidade de elevar a qualidade de suas análises tendo em vista que os órgãos analisados já atingiam um nível médio de transparência com seus dados. Com isso, em abril de 2021 a iniciativa entrou em sua terceira fase, em que novamente foi realizado a revisão dos critérios das dimensões, mantendo o índice abrangente, mas ainda preciso e operacionalizável. E tendo em vista o início da vacinação foi feita a adição de um monitor de vacinação para a avaliação dos dados sobre essa nova demanda, fundamental para o término da pandemia. Deste modo, se manteve trazendo não só os boletins com resultados do ICT-19, Monitor de Leitos e Monitor da Vacinação, como também estudos com diferentes níveis e escopos de análises (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2021a).

Diante da permanência da crise sanitária no Brasil e da necessidade e essencialidade de seguir avançando na transparência das informações relativas à pandemia e ao seu enfrentamento, a OKBR continuou aperfeiçoando a qualidade de seus critérios metodológicos. Para isso, mantém e busca contato com outras iniciativas de acesso aberto para o compartilhamento de métodos de coleta e disponibilização de dados, e informações como com a Open Covid Pledge, visando o esforço coletivo na pandemia para consolidação da transparência dos dados abertos governamentais no Brasil, fundamentais para estudos, não só nas áreas da Saúde, como também para diversas outras áreas, tendo em vista os impactos da COVID-19 nos âmbitos social, político, econômico e cultural.

2.2 Open Covid Pledge

Seguindo a análise, observa-se a segunda iniciativa a ser analisada, agora em um contexto internacional, a Open Covid Pledge. Ela é liderada e administrada pelo Programa de Justiça da Informação e Propriedade Intelectual da American University Washington College of Law, programa acadêmico e de pesquisa em direito da informação reconhecido internacionalmente

Desta forma, tal iniciativa se coloca como uma coalizão internacional de cientistas, acadêmicos, pesquisadores e advogados, com o objetivo de estimular autores, organizações e instituições (públicas e privadas), e empresas a compartilharem voluntariamente a PI, patentes e direitos autorais, sob seu controle para toda sociedade. Com isso, busca acelerar e incentivar o rápido desenvolvimento e implantação de diagnósticos, vacinas, terapêuticas, equipamentos e soluções de software relacionados a área da Saúde no combate a crise de saúde pública, ocasionada pela pandemia (OPEN COVID PLEDGE, 2020a).

Para um melhor entendimento e compreensão do propósito da iniciativa, utilizou-se o conceito de PI estabelecido pela convenção da World Intellectual Property Organization (WIPO), que abarca, conforme Jungmann e Bonett (2010JUNGMANN, Diana de Mello; BONETTI, Esther Aquemi. A caminho da inovação: proteção e negócios com bens de propriedade intelectual: guia para o empresário. Brasília, DF: IEL, 2010. 125 p. Disponível em: http://w2.iffarroupilha.edu.br/site/midias/arquivos/2011229142122747guia_empresario.p df. Acesso em: 13 jun. 2021.
http://w2.iffarroupilha.edu.br/site/midi...
, p. 21):

A soma dos direitos relativos às obras literárias, artísticas e científicas, às interpretações dos artistas intérpretes e às execuções dos artistas executantes, aos fonogramas e às emissões de radiodifusão, às invenções em todos os domínios da atividade humana, às descobertas científicas, aos desenhos e modelos industriais, às marcas industriais, comerciais e de serviço, bem como às firmas comerciais e denominações comerciais, à proteção contra a concorrência desleal e todos os outros direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios industrial, científico, literário e artístico.

Com isso, esse conjunto de direitos sobre bens imateriais que resultam do intelecto humano e tem valor econômico, se estabelecem de acordo com a iniciativa de forma que o proprietário da PI ofereça uma licença Open Covid não exclusiva e isenta de royalties específica para usar, importar, reproduzir, adaptar, traduzir, distribuir, executar, exibir, modificar e criar trabalhos derivados de qualquer tecnologia relacionadas a produtos, serviços, composições de matéria, máquinas, artigos de manufatura e processos que possam auxiliar no diagnóstico, prevenção, contenção e tratamento do COVID-19, na busca pelo encerramento da pandemia (OPEN COVID PLEDGE, 2020a; 2020c).

Para implementar a licença Open Covid e disponibilizar a PI, deve-se seguir 3 etapas, conforme as orientações da Open Covid Pledge (2020c, online):

  • a) Comprometer-se publicamente: disponibilizar gratuitamente a PI relevante para COVID-19 com a publicação de uma declaração pública pela organização, evidenciando seu compromisso com a iniciativa;

  • b) Implementar o compromisso: por meio de uma das licenças disponíveis, que detalham os termos e condições sob os quais a PI é disponibilizada;

  • c) Concretização do compromisso: enviar para a Open Covid Pledge o link do compromisso e licença em seu site, com contato e logo da organização, a fim de que a PI compartilhada fique disponível e acessível a todos.

Ao direcionar o olhar para a implementação do compromisso, a iniciativa disponibiliza três tipos de licenças padrão, chamadas Licença Open Covid (OCL), desenvolvidas por uma equipe jurídica para organizações e indivíduos que desejam implementar de forma simples e imediata sua PI (OPEN COVID PLEDGE, 2020a; 2020b).

Esse conjunto de Licenças OCL (Quadro 3) são diferenciadas com base em sua versão e também com a adição das letras “PC” para referir-se a direitos de patente e copyrights, permitindo que qualquer organização ou pessoa use a PI disponibilizada.

Quadro 3
Tipos de licenças Open Covid (OCL)

Diante dos tipos de licenças padrão OCL, verifica-se que a única diferença material entre a OCL-PC v1.0 e OCL-PC v1.1 é que a OCL-PC v1.1 tem uma data limite fixa para o encerramento (o licenciante que adota a versão v1.1 sempre pode estender a licença voluntariamente). Em relação as finalidades para as quais o público pode usar, são as mesmas nas três licenças. Vale destacar que, caso se deseje só disponibilizar e licenciar os direitos autorais, a iniciativa recomenda o uso da licença internacional Creative Commons de atribuição CC BY 4.0 ou CC0 (OPEN COVID PLEDGE, 2020b). Com isso, além das licenças Open Covid desenvolvidas pela iniciativa e destacadas no Quadro 3, ela também aceita para implementação e apoio ao compromisso mais duas categorias de licenças:

  • a) Licenças compatíveis com a OCL: licenças que fornecem um conjunto de permissões que foram determinados como compatíveis com a OCL;

  • b) Licenças alternativas a OCL: licenças que não se encaixam como compatíveis, mas que ainda são consistentes com o compromisso da OCL.

Assim, pode-se verificar a amplitude de alcance que a iniciativa se propõe a atingir trazendo a possibilidade de apoiar seu objetivo não só utilizando as licenças desenvolvidas e elaboradas por ela mesma, como também o uso de licenças compatíveis e alternativas que se encaixam no seu propósito de disponibilizar a PI para o compartilhamento cientifico na pandemia.

Dentre as licenças compatíveis com OCL, apresenta-se como destaque a CC BY 4.0 e CC0 1.0 da Creative Commons. No primeiro caso é permitido compartilhar e adaptar o material para qualquer fim mesmo que comercial requerendo apenas a atribuição ao autor original, o segundo se coloca como uma licença de domínio público de forma que se possa copiar, modificar, distribuir e executar o trabalho, mesmo para fins comerciais, tudo sem pedir autorização (CREATIVE COMMONS, 2021b; 2021c). Outro exemplo de licença compatível é a Licença MIT, criada pelo Massachusetts Institute of Technology e direcionada para o uso de softwares abertos sem restrição, incluindo, sem limitação, os direitos de usar, copiar, modificar, mesclar, publicar, distribuir, sublicenciar e/ou vender cópias do software e permitir que as pessoas a quem o software é fornecido também o façam (OPEN SOURCE INICIATIVE, 2021).

Já em relação as licenças alternativas, coloca-se como destaque a CC BY-SA, que possibilita compartilhar e adaptar o material exigindo que seja distribuída as suas contribuições sob a mesma licença que o original, e a Licença GPL (General Public License) utilizada para programas de software livre do sistema GNU, que tem gerado a criação de vários programas livres e consequentemente a divulgação da filosofia do software livre (FREE SOFTWARE FOUNDATION, 2020; CREATIVE COMMONS, 2021a).

A iniciativa permite além destas três categorias de licenças a possibilidade de pesquisar e buscar as PIs já comprometidas por meio da plataforma IPscreener. Atualmente o compromisso Open Covid Pledge é assinado por grandes empresas e organizações como a Intel, Facebook, Amazon, IBM, Sandia National Laboratories, Hewlett Packard, Microsoft, Uber, Open Knowledge Foundation, Masachussetts Institute of Technology, Mozilla que disponibilizam parte de sua PI através de uma das licenças da Open Covid Pledge.

Dentre essas organizações que se alinham ao compromisso, destaca-se a Open Knowledge Foundation, que deu origem a OKBR e consequentemente a iniciativa Transparência COVID-19, observada inicialmente, que se coloca como uma das organizações que apoiam e assinam o compromisso de disponibilização de sua PI. Este é um exemplo de esforço conjunto na luta contra a pandemia, destacando a importância de se observar tais iniciativas como linhas complementares para difundir e unir informações e dados na socialização do conhecimento não só na pandemia, mas como um avanço na perspectiva do fazer e comunicar ciência.

3 DADOS ABERTOS E COMPARTILHAMENTO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL PODEM SALVAR VIDAS?

Após discorrer sobre as duas iniciativas e observar suas características relacionadas aos dados abertos e a PI no contexto da pandemia, observa-se que os temas relacionados à Saúde despertaram um maior interesse da sociedade e passaram a integrar, de forma sistemática, os conteúdos da mídia escrita e falada, juntamente o número de pesquisas cresceu em um ritmo acelerado. Esse novo contexto se potencializa pelo fato das notícias de todo o mundo serem constantemente atualizadas, revisadas e compartilhadas fornecendo aos usuários uma sobrecarga de informações novas (LARIVIÈRE; SHU; SUGIMOTO, 2020LARIVIÈRE, Vincent; SHU, Fei; SUGIMOTO, Cassidy. The Coronavirus (COVID-19) outbreak highlights serious deficiencies in scholarly communication. LSE Impact Blog, mar. 2020. Disponível em: https://blogs.lse.ac.uk/impactofsocialsciences/2020/03/05/the- coronavirus-covid-19-outbreak-highlights-serious-deficiencies-in-scholarly-communication/. Acesso em: 13 jun. 2021.
https://blogs.lse.ac.uk/impactofsocialsc...
).

Essa sobrecarga de informações pode ser traduzida segundo Fiorillo e Gorwood (2020FIORILLO, Andrea; GORWOOD, Philip The consequences of the COVID- 19 pandemic on mental health and implications for clinical practice. European Psychiatry, v. 63, n. 1, p. 1-2, 2020. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7156565/pdf/S0924933820000358a.pdf. Acesso em: 13 jun. 2021.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
) como “infodemia”, termo que denota um aumento significativo no volume de informações, sejam elas verdadeiras ou falsas. Enfrentam-se, com isso, duas crises globais: do vírus e da informação. Nessa infodemia surgem teorias da conspiração e notícias falsas até mesmo disseminadas por governos e chefes de estado em relação a origem, tratamento, sintomas e contágio da doença. Isso por sua vez gera um mar de dados e informações confusas e deturpados, que proporcionam um desserviço ao combate a pandemia tanto no âmbito social como de saúde pública (DOMINGUES, 2021DOMINGUES, Larissa. Infodemia: uma ameaça à saúde pública global durante e após a pandemia de Covid-19. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 12-17, jan./mar. 2021. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/2237. Acesso em: 15 jun. 2021.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
).

Tal contexto é potencializado, pelo fato de no Brasil ainda existir uma heterogeneidade na coleta e divulgação de dados e informações conforme destaca a Open Knowledge Brasil (2021a), gerando uma dificuldade no desenvolvimento de pesquisas, políticas públicas e acesso da sociedade como um todo. Principalmente no caso dos dados abertos governamentais, fundamentais no combate a pandemia da COVID-19. Dados governamentais abertos podem ser definidos como:

[...] uma metodologia para a publicação de dados do governo em formatos reutilizáveis, visando o aumento da transparência e maior participação política por parte do cidadão, além de gerar diversas aplicações desenvolvidas colaborativamente pela sociedade (GOVERNO FEDERAL DIGITAL, 2019, online).

Consoante a essa definição a visão de uma Administração Pública através do Governo Aberto (GA) tem como princípios (CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO, 2020, online):

  • a) Transparência: informações sobre ações e atividades do governo são abertas, acessíveis e atendem ao padrão básico de dados abertos;

  • b) Prestação de contas e responsabilização: utilização de regras e mecanismos que trazem as responsabilidades que lhes são incumbidas;

  • c) Participação cidadã: mobilização da sociedade para debater, colaborar e propor contribuições, a fim de proporcionar um governo mais efetivo e transparente;

  • d) Tecnologia e inovação: a importância das novas tecnologias no fomento à inovação provendo acesso à tecnologia e ampliando a capacidade da sociedade de utilizá-la.

No conceito de dados governamentais abertos, assim como nos princípios de um GA verifica-se o foco no cidadão. Isso ocorre conforme ressaltado por Silva (2010SILVA, Daniela Bezerra da. Transparência na Esfera Pública Interconectada. 2010. 118 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Comunicação, Programa de Mestrado em Comunicação, Faculdade Cásper Líbero, São Paulo, 2010. Disponível em: https://casperlibero.edu.br/wp- content/uploads/2014/04/Transpar%C3%AAncia-na-Esfera-P%C3%BAblica- Interconectada.pdf. Acesso em: 30 jun. 2021.
https://casperlibero.edu.br/wp- content/...
, p. 27), no propósito dos governos ao disponibilizarem seus dados e informações para “[...] que a inteligência coletiva crie melhores formas de trabalhar com elas do que os próprios governos poderiam fazer”. Desta forma, como já destacado no Brasil ainda não verifica-se uma padronização para coleta, disponibilização e acesso aos dados, que mesmo estando abertos, ainda trazem dificuldades de acesso por parte da população principalmente no que tange ao formato como os dados são disponibilizados (visualização, qualidade, compartilhamento), mesmo fazendo parte da Open Government Partnership - iniciativa internacional que pretende difundir e incentivar práticas governamentais relacionadas à transparência, acesso e participação social (VAZ; RIBEIRO; MATHEUS, 2010VAZ, José Carlos; RIBEIRO, Manuella Maia; MATHEUS, Ricardo. Dados Governamentais Abertos e seus Impactos sobre os Conceitos e Práticas de Transparência no Brasil. Cadernos Ppg-Au, Salvador, v. 9, n. 1, p. 45-62, dez. 2010. Disponível em: https://periodicos.ufba.br/index.php/ppgau/article/view/5111. Acesso em: 25 jun. 2021.
https://periodicos.ufba.br/index.php/ppg...
; SILVA; SANTOS; CHAVES; VAZ; BALANIUK, 2014SILVA, Clayton Ferreira da et al. Dados abertos: uma estratégia para o aumento da transparência e modernização da gestão pública. Revista do Tcu, Brasília, DF, v. 131, n. 1, p. 24-29, set./dez. 2014. Disponível em: https://revista.tcu.gov.br/ojs/index.php/RTCU/article/view/59. Acesso em: 13 jul. 2021.
https://revista.tcu.gov.br/ojs/index.php...
).

No contexto pandêmico essa falta de transparência nos dados governamentais ficou ainda mais visível ao analisar-se a iniciativa Transparência COVID-19. Principalmente devido a infodemia presente até mesmo junto a chefes de estado com a disseminação de notícias falsas. Mas ao mesmo tempo nos revelou o esforço de instituições na busca de proporcionar e estimular uma maior transparência dos dados abertos, especialmente os dados abertos governamentais.

Deste modo, a luta contra a pandemia da COVID-19 e também da infodemia destaca a importância de iniciativas como a da OKBR, que buscam não só avaliar a qualidade do nível de transparência de dados abertos disponibilizados pelos estados e governo federal brasileiro, como também promover a participação social, o empoderamento do cidadão fiscalizando e estimulando ações governamentais em todos os níveis, contribuindo na elaboração e condução de políticas públicas.

Além disso, a iniciativa da OKBR se destaca no sentido de observar os dados abertos como potencial ferramenta para salvar vidas na pandemia, pelo fato das dimensões observadas e analisadas pelo ITC-19 serem baseadas nos oito princípios dos dados abertos (Quadro 4), agregando um alto valor na contribuição da socialização e transparência de dados e informações no território nacional.

Quadro 4
Princípios dos dados abertos governamentais

Seguindo tais princípios a Transparência COVID-19 busca apontar caminhos viáveis para que capitais, estados e governo federal aprimorarem a divulgação dos dados, indo além de só avalia-los, como também auxiliando por meio de treinamentos, palestras e estudos o desenvolvimento e estimulo na publicação padronizada de informações sobre a pandemia. Tal abordagem também traz outro ponto importante no papel dos dados abertos, não só no contexto pandêmico, que é a interoperabilidade.

A interoperabilidade (permite que diferentes componentes trabalhem juntos) é fundamental para que os principais benefícios práticos da “abertura” dos dados se realizem: a capacidade ampliada de combinar diferentes conjuntos de dados e, portanto, de desenvolver mais e melhores produtos e serviços para a sociedade. Com isso, o ponto principal é possibilitar que determinado conjunto de dados seja livremente misturado com outros conjuntos de dados abertos (OPEN KNOWLEDGE FOUNDATION, 2021).

A importância da interoperabilidade pode ser exemplificada por outra iniciativa idealizada recentemente pela OKBR, o “Querido Diário”, lançado em 20 de julho de 2021. Tal iniciativa visa reunir de forma interoperável toda a informação contida nos diários oficiais municipais brasileiros em formato aberto e amigável para a livre consulta da sociedade civil em uma plataforma, utilizando para isso a inteligência artificial (OPEN KNOWLEDGE BRASIL, 2021b).

Nesse contexto verifica-se a necessidade de continuar aperfeiçoando mesmo após o fim da pandemia o compartilhamento dos dados e informações, a fim de melhorar e estimular a produção, transparência, compartilhamento e compreensão dos dados no meio acadêmico, mídia e população em geral, a fim de aquecer o debate sobre a importância das práticas da Ciência Aberta.

Seguindo as análises no escopo da pandemia, ao observar a iniciativa Open Covid Pledge, vê-se que a PI tem papel fundamental quando se coloca como instrumento de incentivo e não de barreira ao acesso a informações e dados para inovação tecnológica e avanço da ciência, tendo em vista sua capacidade de inovar com rapidez e difundir resultados.

O desenvolvimento de licenças especificas para o compartilhamento de patentes e direitos autorias para toda sociedade, se mostra como uma forma de acelerar e incentivar o rápido desenvolvimento de diagnósticos, vacinas, terapêuticas, equipamentos e softwares para o combate a pandemia. Mas também é perceptível que tal medida deve ser vista a longo prazo na perspectiva não só da área da saúde, mas também para todas a outras que estão diretamente envolvidas no desenvolvimento do bem estar da sociedade.

Com isso, os direitos relacionados PI na publicação científica devem ser repensados, principalmente em situações extraordinárias como a que vivemos, já que um grande volume de recursos públicos é alocado para apoio à pesquisa na área farmacêutica e de saúde. Desta forma, as barreiras relacionadas a disponibilização da PI, proteção para que empresas direcionem recursos técnicos e financeiros ao desenvolvimento de novas soluções, podem barrar a disseminação de tecnologias e limitar a produção e o acesso aos medicamentos e outros produtos destes segmentos (CHAMAS, 2020CHAMAS, Claudia. Inovação, propriedade intelectual e acesso a medicamentos e vacinas: o debate internacional na pandemia da Covid-19. Liinc em Revista, Rio de Janeiro, v. 16, n. 2, p. 1-17, 2020. Disponível em: http://revista.ibict.br/liinc/article/view/5338. Acesso em: 15 jul. 2021.
http://revista.ibict.br/liinc/article/vi...
; ODY, 2021ODY, Lisiane Feiten Wingert. Propriedade intelectual em tempos de pandemia. Jornal da Universidade UFRGS, jun. 2021. Disponível em: https://www.ufrgs.br/jornal/propriedade- intelectual-em-tempos-de-pandemia/. Acesso em: 27 jun. 2021.
https://www.ufrgs.br/jornal/propriedade-...
).

A iniciativa Open Covid Pledge se mostra como uma iniciativa do âmbito privado, que busca descontruir tais barreiras, mesmo que apenas no período de pandemia, ao trazer consigo características de compartilhamento e colaboração seguindo aspectos relacionados a Ciência Aberta. Fazendo com que grandes empresas como Amazon e Intel, entre outras, disponibilizem sua PI com o propósito de buscar o fim da pandemia, assim como incentivando qualquer indivíduo ou instituição (público e privado) a compartilharem suas PIs no combate a COVID- 19 em um trabalho colaborativo global (OPEN COVID PLEDGE, 2020a).

Neste ponto identifica-se, também, a importância da atuação do setor público diante dos direitos e compartilhamento da PI. Pois é o Poder Público que protege a criatividade de autores e inventores com o desenvolvimento e manutenção de normas que disciplinam a propriedade industrial e o direito autoral, assim como sua disponibilização a sociedade, sendo necessário refletir sobre novos limites aos direitos de PI, pois:

[...] se é verdade que as normas de propriedade intelectual asseguram o reconhecimento e a retribuição devidos aos criadores, também é verdade que as criações se destinam, cedo ou tarde, à coletividade, sendo interesse do Estado estimular e manter esse ciclo (ODY, 2021ODY, Lisiane Feiten Wingert. Propriedade intelectual em tempos de pandemia. Jornal da Universidade UFRGS, jun. 2021. Disponível em: https://www.ufrgs.br/jornal/propriedade- intelectual-em-tempos-de-pandemia/. Acesso em: 27 jun. 2021.
https://www.ufrgs.br/jornal/propriedade-...
, online).

Percebe-se, com isso, a necessidade do aprofundamento na harmonização entre os direitos de PI com os demais direitos fundamentais (direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade), tendo em vista a função social da PI no bem-estar social, estabelecendo equilíbrio entre a proteção e o direito de acesso, e consequentemente ao direito a informação, a ciência e ao conhecimento (SOUZA; SCHIRRU; ALVARENGA, 2020SOUZA, Allan Rocha de; SCHIRRU, Luca; ALVARENGA, Miguel Bastos. Direitos autorais e mineração de dados e textos no combate à Covid-19 no Brasil. Liinc em Revista, Rio de Janeiro, v.16, n. 2, dezembro 2020. Disponível em: http://revista.ibict.br/liinc/article/view/5536. Acesso em: 30 maio 2021.
http://revista.ibict.br/liinc/article/vi...
; JUNGMANN; BONETTI, 2010JUNGMANN, Diana de Mello; BONETTI, Esther Aquemi. A caminho da inovação: proteção e negócios com bens de propriedade intelectual: guia para o empresário. Brasília, DF: IEL, 2010. 125 p. Disponível em: http://w2.iffarroupilha.edu.br/site/midias/arquivos/2011229142122747guia_empresario.p df. Acesso em: 13 jun. 2021.
http://w2.iffarroupilha.edu.br/site/midi...
).

Outro ponto que destaca a importância no compartilhamento da PI na comunicação cientifica, mas especificamente na pesquisa de forma colaborativa, foi a Resolução WHA73.1, ratificada pelos 194 Estados-membros da OMS em 2020, em que se estabelece uma resposta à COVID-19 evidenciando a importância da solidariedade para combater a doença visando a colaboração e cooperação em todos os níveis da sociedade, principalmente no desenvolvimento de vacinas, conforme destaca Freitas e Tasca (2020FREITAS, Roberta de; TASCA, Tiago. Saúde e solidariedade na 73ª Assembleia Mundial da Saúde: pré-requisitos para o desenvolvimento. In: AITH, Fernando; SOARES, Julino; MARTINS, Débora (org.). COVID-19 Direitos Humanos & Políticas de Saúde. São Paulo: Cepedisa, Nap-Disa/Usp, 2020. p. 19-22. Disponível em: https://cepedisa.org.br/wp- content/uploads/2020/08/001-Boletim-CEPEDISA-aprova%c3%a7%c3%a3o-Final-Julino- 1.pdf. Acesso em: 15 jun. 2021.
https://cepedisa.org.br/wp- content/uplo...
, p. 21):

Um dos pontos principais da Resolução é o reconhecimento do acesso à vacinação extensiva contra a COVID-19 como um bem público global. A resolução solicita aos Estados que garantam o acesso universal a tecnologias e produtos essenciais de saúde para responder à pandemia, como uma prioridade global. Nesse sentido, a vacinação deveria, por princípio, estar disponível em escala mundial e de forma não exclusiva ou discriminatória, ou seja, seus benefícios devem se estender a todos os países.

Com isso, é perceptível a necessidade de fortalecer e cristalizar a colaboração cientifica como atividade comum em pesquisa na área da Saúde, permitindo com o compartilhamento da PI o acesso global e igualitário a futuros tratamentos, remédios e vacinas. E não somente nela, mas também em outras áreas do conhecimento tendo em vista que a pandemia causou impactos em toda a sociedade, como por exemplo na CI que deve lidar com a infodemia que acompanha a COVID-19 exigindo esforços e estudos na transmissão efetiva dos resultados das pesquisas à comunidade científica, possibilitando que sejam organizadas, avaliadas e ampliadas (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2020).

Em consonância, a resolução se expande para os desafios multifacetados de outras doenças e da promoção da saúde, como as não transmissíveis, negligenciadas, saúde mental e de nutrição (FREITAS; TASCA, 2020FREITAS, Roberta de; TASCA, Tiago. Saúde e solidariedade na 73ª Assembleia Mundial da Saúde: pré-requisitos para o desenvolvimento. In: AITH, Fernando; SOARES, Julino; MARTINS, Débora (org.). COVID-19 Direitos Humanos & Políticas de Saúde. São Paulo: Cepedisa, Nap-Disa/Usp, 2020. p. 19-22. Disponível em: https://cepedisa.org.br/wp- content/uploads/2020/08/001-Boletim-CEPEDISA-aprova%c3%a7%c3%a3o-Final-Julino- 1.pdf. Acesso em: 15 jun. 2021.
https://cepedisa.org.br/wp- content/uplo...
). Isso nos mostra que o compartilhamento da PI de forma a proteger os direitos dos criadores e também a difusão de conhecimento deve ser observada para além da pandemia para que o movimento de trabalho colaborativo não se limite ao tempo e sim ao bem comum que é o acesso a informações e dados, assim como a socialização do conhecimento.

Foi possível perceber também no desenvolvimento da pesquisa que as iniciativas de acesso aberto com foco no combate a pandemia não estão reunidas de forma a facilitar o acesso a população, mesmo com elas buscando uma interação e colaboração com outras iniciativas. Isso ocorre porque são utilizadas em sua maioria por gestores públicos, pesquisadores e acadêmicos, não alcançando a população na maioria das vezes, ponto este fundamental para que se atinja a transparência e acesso à informação e dados.

Para atingir esse alcance ainda tem-se um longo caminho pela frente com o avanço da discussão sobre Ciência Aberta, aquecida pela pandemia. Um exemplo de que trilha-se no caminho certo é a evolução da iniciativa Transparência COVID-19, que se desenvolveu e se desenvolve conforme o aumento da transparência dos dados por parte de estados e o governo federal, tendo como consequência um alcance maior na mídia e na população em geral.

Desta forma, a pandemia nos trouxe um contexto formado pelo caos social, mudanças de comportamento e disseminação de informações falsas, exigindo um novo olhar para o modo de agir e se relacionar, e não somente, mas também no fazer e comunicar ciência. Com isso, ao observar as iniciativas analisadas, tanto através dos dados abertos como do compartilhamento da PI, vê-se a essencialidade da transformação do modus operandi de fomentar, projetar, realizar e comunicar ciência, e consequentemente pesquisas. Tal caminho só se torna possível quando perseguem-se os objetivos da Ciência Aberta, dado o conjunto de práticas que abarca, visando uma natureza colaborativa na pesquisa e na democratização do acesso e uso de informação, dados e conhecimento.

Portanto, as iniciativas já criadas no contexto pandêmico, principalmente aquelas analisadas no presente artigo, são um forte indício do fortalecimento da colaboração cientifica em prol do avanço da ciência em geral, assim como da promoção de sua função social para o enfrentamento de questões que afetam o presente e futuro da humanidade, como a pandemia da COVID-19. Claro, que ainda há um grande caminho a percorrer e deve-se seguir nesse caminho para estimular a colaboração não só científica, mas também da sociedade como um todo de forma orgânica para um bem comum, só atingido quando olha-se o mundo pela ótica da Ciência Aberta.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da crise ocasionada pela pandemia de COVID-19 que se espalhou rapidamente por todo o mundo, identifica-se a importância da tomada de decisões baseadas em dados e informações, as quais por sua vez devem estar disponíveis e acessíveis a todos. Com isso, a discussão sobre dados abertos e PI, através de um olhar pela Ciência Aberta, mostra a importância destes no enfrentamento à pandemia sobre suas barreiras e usos para a área da Saúde e para sociedade no sentido de socialização e compartilhamento do conhecimento.

Com o objetivo do presente trabalho busca-se aproximar as duas perspectivas pública e privada, por meio das iniciativas abertas analisadas, a Transparência COVID-19 e Open Covid Pledge. Perspectivas estas que estão sendo potencializadas pelo atual cenário de pandemia, o que exige ainda mais das instituições públicas na disponibilização dos dados governamentais, assim como na relação conjunta com instituições privadas na disponibilização da PI. Isso para proporcionar uma atuação transparente e aberta à participação social diante da sobrecarga de informações já existente e que potencializou-se com a pandemia.

Observa-se, que enfrentamos duas crises globais: do vírus e da desinformação (infodemia). E somente com o olhar pela ótica da Ciência Aberta pode-se atingir um objetivo comum que é o combate a ambas. Verifica-se com isso, a importância de levar para a sociedade dados e informações consistentes e acessíveis, tornando a relação entre governo e sociedade mais próxima. Promovendo, a tomada de decisões com base em dados e informações baseadas em evidências, apoiada por cidadãos bem informados, dada a urgência no compartilhamento rápido das informações científicas.

Em relação ao fazer e comunicar ciência, ficou notória, a urgência que as áreas da saúde, mas não somente, devido aos impactos sociais, culturais e políticos causados pela pandemia, possuem em publicar e ter acesso aos resultados de pesquisas científicas sobre COVID-19, bem como a necessidade de transparência dos métodos utilizados. Evidenciando- se novamente a urgência em aproximar a ciência da tomada de decisões e da sociedade como um todo. No entanto, também é visível que ainda tem-se um caminho longo para a total compreensão dos significados, oportunidades e desafios da Ciência Aberta para tornar a informação e os dados amplamente disponível e interoperável conforme destaca a Unesco (2021).

Sobre os dados abertos, também evidencia-se um longo caminho para torna-los abertos e comunicáveis para a população, principalmente no nosso país, mas por meio de iniciativas como a Transparência COVID-19 obteve-se um estimulo e uma aproximação na relação entre governo aberto e Ciência Aberta, tendo em vista a melhora na transparência dos dados dos estados e governo federal no decorrer da pandemia. Observou-se, com isso, que os dados abertos permitem projeções mais confiáveis gerando um enriquecimento nos debates sobre políticas públicas, ativando o ecossistema de inovação e aumentando a confiança da população ao revelar a real noção do tamanho do problema que se está enfrentando, neste caso da pandemia de COVID-19.

Vê-se também a necessidade do aprofundamento na harmonização dos direitos de PI com os demais direitos fundamentais (função social), estabelecendo o equilíbrio entre a proteção e o direito de acesso. Ponto em que se torna importante a atuação do setor público juntamente com o privado no sentido de estimular e manter o ciclo de proteção da PI assegurando o reconhecimento daqueles que produzem bens intelectuais e que posteriormente se destinaram a coletividade.

Desta forma, a pandemia provocou e provoca mudanças em todas as áreas da sociedade percorrendo os meios científicos e sociais, estimulando, mesmo que de forma abrupta, o debate sobre a Ciência Aberta para tornar o processo científico mais transparente e inclusivo, nos fazendo refletir e repensar sobre os modos de se fazer e comunicar ciência e em nosso papel como cientistas, acadêmicos e cidadãos (SEGUNDO ENCONTRO NACIONAL DE CIÊNCIA ABERTA E GOVERNO ABERTO, 2020). Assim, graças à colaboração internacional, por meio da adoção dos princípios da Ciência Aberta foi possível gerar uma melhora constante da compreensão sobre a COVID-19, que ainda está longe de terminar.

Portanto, é indispensável a continuidade do trabalho conjunto dos setores públicos e privado no avanço da ciência, da colaboração científica e da socialização do conhecimento de forma a proporcionar a organização, preservação, acesso e divulgação de dados, principalmente dos dados abertos governamentais, e pesquisas relacionadas ao compartilhamento de PI. Principalmente nesse contexto pandêmico que a humanidade atravessa, fazendo com que o conhecimento científico seja difundido e acessível livremente sem as barreiras financeiras.

REFERÊNCIAS

  • 1
    JITA: ED. Intellectual property: author's rights, ownership, copyright, copyleft, open access.
  • RECONHECIMENTOS:

    Ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGCIN/UFRGS).
  • FINANCIAMENTO:

    Não é aplicável.
  • APROVAÇÃO ÉTICA:

    Não é aplicável.
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS E MATERIAL:

    Não é aplicável.

Disponibilidade de dados

Não é aplicável.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    09 Set 2021
  • Aceito
    02 Out 2021
  • Publicado
    06 Out 2021
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