RESUMO
À luz das rápidas e fortes transformações sociais e econômicas que têm caracterizado as economias de muitos países, vem-se observando o aumento da busca pela preferência dos consumidores na maioria dos mercados mundiais. Um dos elementos necessários à adaptação a esse cenário é o conhecimento acerca dos clientes e de suas percepções em relação ao negócio, especialmente no que tange à recomendação a terceiros. O presente estudo visou adaptar, ao contexto de lanchonetes do tipo fast food, modelo originalmente proposto à análise dos antecedentes da intenção de recomendação de restaurantes noturnos. Foi realizada pesquisa de campo tendo como objeto de estudo uma rede de lanchonetes localizada no estado do Rio de Janeiro e sendo levados em consideração três construtos: qualidade do serviço, satisfação e bem-estar social, este último composto de afeições positivas e negativas. Foram lançadas seis hipóteses, sendo três relativas ao construto do bem-estar social (que ele influi na satisfação, na qualidade do serviço e na intenção de recomendação), duas relativas à qualidade do serviço (que ela influi na intenção de recomendação e na satisfação), e uma relativa à influência da satisfação na intenção de recomendação. Nenhuma foi rejeitada, indicando que o esforço de simplificação e de adaptação de modelo consolidado apresenta aderência e ajuste. A aplicação empírica bem sucedida destaca a principal contribuição do trabalho: a simplificação de um modelo a partir de sua aplicação em contexto similar, mas diferente em sua finalidade.
Palavras-chave:
Recomendação boca a boca; Afeição; Bem-estar social; Qualidade; Satisfação
ABSTRACT
The fast and strong social and economic transformations in the economies of many countries has raised the competition for consumers. One of the elements required to adapt to such scenario is knowing customers and their perceptions about products or services, mainly regarding word of mouth recommendations. This study adapts, to the fast food business, a model originally designed to analyze the antecedents of the intent to recommend by clients of formal restaurants. Three constructs were considered: service quality, satisfaction, and social well-being, the latter comprised of positive and negative affections. Six hypotheses were considered, three of which relating to social well-being (that it influences satisfaction, service quality, and the intent to recommend), two relating to service quality (that it influences the intent to recommend and satisfaction), and one relating to the influence of satisfaction on the intent to recommend. None was rejected, indicating adherence and adjustment of the simplification and adaptation of the consolidated model. Through a successful empirical application, the main contribution made by this research is the simplification of a model through its application in a similar context, but with a different scope.
Key words:
Word-of-mouth recommendation; Affection; Social well-being; Quality; Satisfaction
RESUMEN
Teniendo en cuenta las rápidas y grandes transformaciones sociales y económicas que caracterizan la economía de muchos países, se ha observado un aumento en la búsqueda de la preferencia de los consumidores en la mayoría de los mercados mundiales. Uno de los elementos necesarios para adaptarse a este escenario es conocer a los clientes y sus propias percepciones sobre el negocio, especialmente en lo que concierne a la recomendación a terceros. Este estudio buscó adaptar el contexto de restaurante de comida rápida (modelo originalmente propuesto) y someterlo al análisis de los antecedentes de intención de recomendación de restaurantes nocturnos. Se realizó un trabajo de campo considerando como objeto de estudio una red de restaurantes de comida rápida ubicada en el Estado de Rio de Janeiro, teniendo en cuenta tres constructos: la calidad del servicio, la satisfacción y el bienestar social, este último se compone de impresiones positivas y negativas. Se plantearon seis hipótesis, tres relativas al bienestar social (que influye en la satisfacción, en la calidad del servicio y en la intención de recomendación) dos relativas a la calidad del servicio (que influye en la intención de recomendación y en la satisfacción) y una relativa a la influencia de la satisfacción en la intención de recomendación. Todas fueron aceptadas, resaltando que el esfuerzo de simplificación y de adaptación del modelo consolidado presenta adherencia y ajuste. El éxito de la aplicación empírica destaca la principal contribución de este trabajo: la simplificación de un modelo a partir de su aplicación en un contexto similar, pero con una finalidad diferente.
Palabras clave:
Recomendación boca a boca; Impresión; Bienestar social; Calidad; Satisfacción
1 INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, as organizações brasileiras vêm passando por significativas transformações em seus modelos de gestão, de qualidade e de produtividade, de modo a se manterem ou mesmo a adquirirem maior grau de competitividade, bem como melhores resultados, que lhes garantam sustentabilidade. Assim, a capacidade de adaptação em um cenário de grandes modificações tornou-se uma necessidade básica para as organizações, à medida que a crescente competitividade ascendente as obriga a constantemente avaliarem seu posicionamento no mercado e a trabalharem arduamente em seus diferenciais competitivos.
Por esse motivo, a influência pessoal tem sido um campo relevante de pesquisa, dentre outras, nas áreas de Antropologia, de Etnografia, de Marketing e de Psicologia Social. Estudos sobre esse tema mostram a importância da comunicação interpessoal nas escolhas dos indivíduos em diversos contextos, incluindo o de consumo (KATZ; LAZARSFELD, 1955KATZ, D.; LAZARFELD, P. Personal influence. New York: Free Press of Glencoe, 1955.). Na disciplina de comportamento do consumidor, esse efeito das comunicações interpessoais também é investigado, principalmente quando o consumidor se encontra na etapa de busca de informações para a aquisição de um bem de alto envolvimento (BLACKWELL; MINIARD; ENGEL, 2005BLACKWELL, R. D.; MINIARD, P. W.; ENGEL, J. F. Comportamento do consumidor. 9. ed. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.).
De acordo com Zeithaml, Bitner e Gremler (2011ZEITHAML, V. A.; BITNER, M. J.; GREMLER, D. Marketing de serviços. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2011.), como os serviços são bens intangíveis, eles não podem ser testados antes da compra propriamente dita. Ademais, alguns ambientes de serviços são considerados complexos por apresentarem quantidade e formas variadas de elementos que estão relacionadas a suas características físicas. Isso implica que, no caso específico de compra de um serviço, não raro o consumidor tende a buscar outras referências, como preço, evidências físicas ambientais e a própria imagem da empresa, além de se basear nas indicações de pessoas próximas, como amigos e parentes ( as chamadas comunicações boca a boca (ZEITHAML; PARASURAMAN; BERRY, 1990ZEITHAML, V. A.; PARASURAMAN, A.; BERRY, L. L. Delivering quality service: balancing customer perceptions and expectations. New York: The Free Press, 1990; ZEITHAML, BERRY; PARASURAMAN, 1993ZEITHAML, V. A.; BERRY, L. L.; PARASURAMAN, A. The nature and determinants of customer expectations of service. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 21, n. 1, p. 1-12, Jan. 1993.).
Assim, esse estudo visou adaptar o estudo de Babin et al. (2005BABIN, B. J. et al. Modeling consumer satisfaction and word-of-mouth: Restaurant Patronage in Korea. The Journal of Services Marketing,Bradford, v. 19, n. 3, p. 133-140, 2005.), referente à análise dos antecedentes da intenção de recomendação de restaurantes noturnos, ao contexto de lanchonetes do tipo fast food, foco de observação escolhido em razão da elevada complexidade de serviço oferecida pelo segmento de alimentação (ZEITHAML; BITNER; GREMLER, 2011ZEITHAML, V. A.; BITNER, M. J.; GREMLER, D. Marketing de serviços. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2011.). Para atingir esse objetivo, foi realizada pesquisa de campo tendo como objeto de estudo uma rede de lanchonetes localizada no estado do Rio de Janeiro - cujo nome foi mantido em sigilo -, tendo sido levados em consideração quatro construtos: qualidade do serviço, satisfação e afeições positiva e negativa.
Dessa maneira, a principal contribuição deste trabalho reside na aplicação de um modelo em um contexto similar, contudo diferente em sua finalidade. Como consequência dessa adaptação, tem-se a simplificação de um modelo, com aplicação empírica que afere sua eficácia.
O artigo encontra-se dividido em cinco partes: referencial teórico, concentrado em conceitos referentes a qualidade, satisfação do consumidor, afeições positiva e negativa e indicação boca a boca; aspectos metodológicos; breve histórico a respeito da lanchonete fast food utilizada como sujeito desta pesquisa; resultados da pesquisa; e conclusões e recomendações.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Neste tópico pretende-se desenvolver, na forma de recortes da pesquisa, os conceitos que compõem os construtos empregados na modelagem adotada.
2.1 Qualidade
Como definido por Grönroos (2004GRÖNROOS, C. Marketing: gerenciamento e serviços. 4. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 482 p.), o nível de qualidade percebido por um cliente com relação a um serviço é determinado pela diferença entre a qualidade esperada antes de receber o serviço e a qualidade experimentada durante e após a prestação do serviço. Quando o serviço prestado não atinge o nível de expectativa do cliente, há um problema de qualidade ou uma falha na prestação do serviço.
A literatura de Marketing enfatiza que a avaliação do consumidor acerca da qualidade de um produto pode ser mais facilmente realizada do que a avaliação de um serviço, uma vez que esta não é baseada em um resultado final, mas sim em um processo (PARASURAMAN; ZEITHAML; BERRY, 1985PARASURAMAN, A.; ZEITHAML, V. A.; BERRY, L. L. A conceptual model of service quality: its implications for future research. Journal of Marketing, Chicago, v. 28, n. 2, p. 41-50, June 1985. ). Ou seja, a qualidade percebida de bens físicos ou tangíveis pode ser medida por meio de indicadores precisos, como números de defeitos, ao passo que a qualidade percebida em serviços é baseada em experiências vivenciadas pelo cliente. Isso ocorre porque o serviço consiste em uma experiência interativa, que acaba por envolver o cliente em diferentes níveis de intensidade e que está relacionada a um desempenho intangível, não oriundo apenas dos fatores de produção (LOVELOCK; WRIGHT, 2001LOVELOCK, C.; WRIGTH, L. Serviços: marketing e gestão. São Paulo: Saraiva, 2001.; ZEITHAML; BITNER; GREMLER, 2011ZEITHAML, V. A.; BITNER, M. J.; GREMLER, D. Marketing de serviços. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2011.).
Alguns autores (OLIVER, 1980OLIVER, R. L. A Cognitive Model of the Antecedents and Consequences of Satisfaction Decisions. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 17, n. 3, p. 460-69, Nov. 1980. ; PARASURAMAN; ZEITHAML; BERRY, 1985PARASURAMAN, A.; ZEITHAML, V. A.; BERRY, L. L. A conceptual model of service quality: its implications for future research. Journal of Marketing, Chicago, v. 28, n. 2, p. 41-50, June 1985. ; GRÖNROOS, 2004GRÖNROOS, C. Marketing: gerenciamento e serviços. 4. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 482 p.) consideram que a qualidade percebida de um serviço está relacionada a seu desempenho ou à contraposição da percepção do cliente entre o serviço efetivamente recebido e o serviço que esperava receber. Ou seja, a qualidade percebida seria a diferença entre as expectativas e as percepções dos clientes. Ainda de acordo com Grönroos (2004GRÖNROOS, C. Marketing: gerenciamento e serviços. 4. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 482 p.), as expectativas dos clientes, que são determinantes para a qualidade esperada, constituem-se a partir de suas necessidades, de seus desejos e de seus valores, da imagem da empresa e de sua oferta, do preço praticado, das ações de comunicação e, até mesmo, na propaganda boca a boca. Ele também adiciona que o serviço vivenciado pode ser analisado sob duas dimensões: a técnica e a funcional (ver Figura 1). A dimensão técnica refere-se àquilo que o cliente recebe em sua interação com a empresa, ou seja, o resultado do serviço; já a dimensão funcional diz respeito ao modo como o cliente vivencia o contato com a organização e à qualidade do processo de prestação do serviço em si (GRÖNROOS, 2004GRÖNROOS, C. Marketing: gerenciamento e serviços. 4. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 482 p.).
De modo mais amplo, Zeithaml (1988ZEITHAML, V. A. Consumer perceptions of price, quality, and value: a means-end model and synthesis of evidence. Journal of Marketing, Chicago, v. 52, n. 1, p. 2-22, July, 1988. ) aborda qualidade como superioridade ou excelência em relação à oferta de concorrentes. Adiante, Zeithaml, Bitner e Gremler (2011ZEITHAML, V. A.; BITNER, M. J.; GREMLER, D. Marketing de serviços. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2011.) esclarecem que a qualidade percebida pelo cliente está relacionada à intenção de compra, podendo, assim, influenciar na decisão de aquisição de algum produto e ou serviço. Considera-se, ainda, que a qualidade pode ser observada por meio do nível da satisfação do cliente em relação aos atributos do produto ou do serviço experimentado (ANDERSON; FORNELL; LEHMANN, 1994ANDERSON, E. W.; FORNELL, C.; LEHMANN, D. R. Customer satisfaction, market share, and profitability: findings from Sweden. Journal of Marketing, Chicago, v. 58, n. 3, p.53-66, July 2004. ; OLIVER, 1980OLIVER, R. L. A Cognitive Model of the Antecedents and Consequences of Satisfaction Decisions. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 17, n. 3, p. 460-69, Nov. 1980. ).
2.2 Satisfação do consumidor
Desde a década de 1980, o conceito de satisfação do consumidor tem sido objeto de estudo de diversos autores (Oliver, 1980OLIVER, R. L. A Cognitive Model of the Antecedents and Consequences of Satisfaction Decisions. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 17, n. 3, p. 460-69, Nov. 1980. ; 1996OLIVER, R. L. Satisfaction: a behavioral perspective on the consumer. New York: McGraw- Hill, 1996. ; Westbrook, Oliver, 1991WESTBROOK, R. A.; OLIVER, R. L . The dimensionality of consumption emotion patterns and consumer satisfaction. Journal of Consumer Research, Chicago, v. 18, n. 1, p. 84-91, June 1991. ; Solomon, 2002SOLOMON, M. R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2002.; Samara, Barros, 2002SAMARA, B. S.; BARROS, J. C. Pesquisa de marketing: conceitos e metodologia. 3. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2002.; além de outros). Segundo Oliver (1980OLIVER, R. L. A Cognitive Model of the Antecedents and Consequences of Satisfaction Decisions. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 17, n. 3, p. 460-69, Nov. 1980. ), a satisfação é definida como uma função do desempenho do produto em relação às expectativas. Assim, o constructo satisfação do consumidor é interpretado pela perspectiva da desconfirmação de expectativas, segundo a qual os consumidores são tidos como satisfeitos quando os resultados superam as expectativas, ou insatisfeitos se os resultados obtidos são inferiores às expectativas. A partir da Teoria da Desconfirmação das Expectativas (ver Figura 2), conclui-se que a desconfirmação positiva implica clientes muito satisfeitos, que a desconfirmação negativa implica clientes insatisfeitos e que a confirmação implica clientes apenas satisfeitos (Oliver, 1980OLIVER, R. L. A Cognitive Model of the Antecedents and Consequences of Satisfaction Decisions. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 17, n. 3, p. 460-69, Nov. 1980. ).
Em outra abordagem, considera-se que a satisfação não seja somente cognitiva, mas possua também um componente afetivo (WESTBROOK; OLIVER, 1991WESTBROOK, R. A.; OLIVER, R. L . The dimensionality of consumption emotion patterns and consumer satisfaction. Journal of Consumer Research, Chicago, v. 18, n. 1, p. 84-91, June 1991. ). Nessa linha, defende-se que as emoções sentidas durante o processo de consumo deixam traços afetivos na memória, e que estas são integradas posteriormente às avaliações de satisfação. Solomon (2002SOLOMON, M. R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2002.) entende, a propósito, que a satisfação do consumidor é determinada pelo sentimento global da pessoa em relação ao produto depois da compra, refletindo os julgamentos comparativos de uma pessoa sobre o desempenho - ou sobre o resultado percebido ( de um produto em relação a suas expectativas.
Samara e Barros (2002SAMARA, B. S.; BARROS, J. C. Pesquisa de marketing: conceitos e metodologia. 3. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2002.), por seu turno, tipificam a satisfação em três tipos: funcional, referindo-se a atributos tangíveis de um produto ou serviço; emocional, voltada para os benefícios intangíveis, como status, prestígio e segurança; e de benefício de uso, relacionada ao valor ganho pela propriedade e ao uso de um bem ou serviço.
No Marketing de Serviços, em especial, a satisfação está, em grande parte, concentrada em fatores humanos, ou seja, depende tanto daquele que fornece o serviço quanto da qualidade percebida do fornecimento em si. Em outras palavras, o cliente julga os serviços não apenas pelos aspectos técnicos, mas também por aspectos funcionais ( por exemplo, a empatia mostrada pelos empregados e a confiança que eles inspiram (VERRUCK ET AL., 2009VERRUCK, F. et al. Dimensions of quality in services and the customer's satisfaction: a study applied in an urban transportation company. In: RAJAT GERA (Org.). Advances in Technology and Innovation in Marketing. New Delhi: Macmillan Publishers, 2009. p. 224-238.). Desta forma, em mercados em que concorrentes oferecem serviços similares, a qualidade percebida pelos clientes pode ser a maneira de a empresa obter sucesso (HOFFMAN, BATESON, 2001HOFFMAN, K. D.; BATESON, J. E. G. Marketing de serviços. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.) - o que implica que a qualidade se torna uma importante alternativa de diferenciação, com forte impacto sobre os lucros e sobre os outros resultados econômico-financeiros da empresa (PARASURAMAN, ZEITHAML, BERRY, 1985PARASURAMAN, A.; ZEITHAML, V. A.; BERRY, L. L. A conceptual model of service quality: its implications for future research. Journal of Marketing, Chicago, v. 28, n. 2, p. 41-50, June 1985. ).
Já no que diz respeito à relação entre satisfação e lealdade, muitos são os trabalhos acadêmicos desenvolvidos, como os de Ganesh, Arnold e Reynolds (2000GANESH, M. J.; ARNOLD M.; REYNOLDS, K. E. Understanding the customer base of service providers: an examination of the differences between switchers and stayers. Journal of Marketing, Chicago, v. 64, n. 3, p. 65-87, Jul. 2000.) e de Garbarino e Johnson (1999GARBARINO, E.; JOHNSON, M.S. The different roles of satisfaction, trust, and commitment in customer relationships. Journal of Marketing, Chicago, v. 63, n. 2, p. 70-87, Apr. 1999. ). Esses últimos demonstraram que a satisfação é mediadora entre confiança e lealdade em situações de vínculo transacional, ao passo que os primeiros optaram por avaliar os construtos satisfação, envolvimento e lealdade daqueles consumidores que mudaram de prestador de serviços por motivo de insatisfação anterior. No caso, é importante observar que, quando os resultados percebidos pelos clientes situavam-se abaixo de um nível comparativo com prestadores de serviço alternativos, eles se motivavam a trocar de fornecedor, seu número de alternativas diminuiu e o nível comparativo foi revisado para baixo, aumentando-lhes a tolerância (GANESH, ARNOLD, REYNOLDS, 2000GANESH, M. J.; ARNOLD M.; REYNOLDS, K. E. Understanding the customer base of service providers: an examination of the differences between switchers and stayers. Journal of Marketing, Chicago, v. 64, n. 3, p. 65-87, Jul. 2000.).
2.3 Afeição positiva e afeição negativa
Mowen e Minor (2003MOWEN, J. C.; MINOR, M. S. Comportamento do consumidor. São Paulo: Prentice Hall, 2003. 403 p.) alegam que o termo afeição, ou afeto, refere-se aos sentimentos, às emoções e ao estado de espírito que os consumidores podem vivenciar ( ressaltando que o estado de espírito está ligado aos sentimentos transitórios, ou seja, àqueles vivenciados em situações específicas. Eles também defendem que o estado de espírito não é uma variável de personalidade, por ser de caráter temporário, ao passo que a personalidade apresenta caráter duradouro. Como contraponto, Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007HAWKINS, D.; MOTHERSBAUGH, D.; BEST, R. Comportamento do consumidor: construindo a estratégia de Marketing. Rio de Janeiro: Campus, 2007.) defendem que a emoção é utilizada ao se fazer referência ao sentimento específico identificável; por outro lado, o afeto se refere ao aspecto de gostar ou de desgostar, relacionado ao sentimento específico.
Assim, ao estudar o tema afeto, é comum o pesquisador deparar com o conceito da emoção (SOLOMON, 2002SOLOMON, M. R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2002.; SHIFFMAN; KANUK, 2000SCHIFFMAN, L.; KANUK, L. Comportamento do consumidor. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000. 475 p.; HAWKINS; MOTHERSBAUGH; BEST, 2007HAWKINS, D.; MOTHERSBAUGH, D.; BEST, R. Comportamento do consumidor: construindo a estratégia de Marketing. Rio de Janeiro: Campus, 2007.). Para Sheth, Mittal e Newman (2001SHETH, J. N.; MITTAL, B.; NEWMAN, B. I. Comportamento do cliente: indo além do comportamento do consumidor. São Paulo: Atlas, 2001., p. 26), “as emoções são a consciência da ocorrência de alguma excitação fisiológica seguida por uma resposta comportamental, juntamente com a avaliação do significado de ambas”. Tal definição aponta para três componentes ligados à emoção: o fisiológico, o comportamental e o cognitivo. O componente fisiológico, também denominado excitação autônoma, está ligado aos reflexos corpóreos oriundos de algum estímulo. Em seguida, ocorre o componente cognitivo, que atua como uma interpretação ou como uma análise do significado de tal estímulo. Já o componente comportamental pode ser entendido como uma resposta fisiológica à interpretação cognitiva (SHETH, MITTAL E NEWMAN, 2001SHETH, J. N.; MITTAL, B.; NEWMAN, B. I. Comportamento do cliente: indo além do comportamento do consumidor. São Paulo: Atlas, 2001.). A esse respeito, Grönroos (2004GRÖNROOS, C. Marketing: gerenciamento e serviços. 4. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2004. 482 p.) explica que entende-se que as emoções afetam, de alguma forma, a percepção cognitiva dos processos de serviço, e que é importante levar em conta as funções afetivas no gerenciamento da qualidade em serviços.
Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007HAWKINS, D.; MOTHERSBAUGH, D.; BEST, R. Comportamento do consumidor: construindo a estratégia de Marketing. Rio de Janeiro: Campus, 2007.) argumentam que algumas pessoas são mais emotivas do que outras, e definem esse traço do consumidor como a intensidade do afeto. Eles ainda propõem que as pessoas com alto nível de afeto vivenciam emoções mais fortes e são mais influenciadas por apelos emocionais.
Já para Albuquerque e Tróccoli (2004ALBUQUERQUE, A. S.; TRÓCOLLI, B. T. Desenvolvimento de uma escala de bem-estar subjetivo. Psicologia: teoria e pesquisa, Brasília, v. 20, n. 2, p. 153-64, maio/ago. 2004.), o afeto positivo é um contentamento hedônico experimentado em determinado momento na forma de um estado de alerta, de entusiasmo e de atividade. Caracteriza-se por sentimento transitório de prazer ativo, mais evidenciado pela descrição de um estado emocional do que por um julgamento cognitivo. Já o afeto negativo se apresenta como um estado de distração e de engajamento desprezível, também de caráter transitório, mas que engloba estados emocionais tidos como desagradáveis, como a ansiedade, a depressão, o aborrecimento e o pessimismo, além de outros sintomas psicológicos aflitivos e angustiantes. Esses mesmos autores alegam que os afetos tanto positivo quanto negativo, os humores positivos e negativos e o comprometimento afetivo positivo e negativo fazem parte do chamado bem-estar subjetivo, estudo que busca compreender a avaliação que as pessoas fazem de suas vidas.
2.4 Recomendação boca a boca
Uma definição para a recomendação boca a boca muito recorrente nos textos acadêmicos de marketing é a de Arndt (1967ARNDT, J. The role of product related conversations in the diffusion of a new product. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 4, n. 3, p. 291-295, Aug. 1967., p. 295), que diz que é a "[...] comunicação oral, pessoa a pessoa, entre o receptor e um comunicador, na qual o receptor não percebe uma relação comercial quanto a uma marca, produto ou serviço". Já para Harrison-Walker (2001HARRISON-WALKER, L. J. The measurement of word-of-mouth communication and an investigation of service quality and customer commitment as potential antecedents. Journal of Service Research, Thousand Oaks, v. 4, n. 1, p. 60-75, Aug. 2001. , p. 63), boca a boca é "[...] uma comunicação pessoal e informal entre um comunicador percebido como não comercial e um dado receptor, relacionada a uma marca, a um produto, a uma organização, ou a um serviço".
O boca a boca constitui um dos comportamentos mais relevantes em marketing, embora para Soares e Costa (2008SOARES, A. A. C.; COSTA, F. J. A influência do valor percebido e da satisfação do cliente sobre o comportamento de boca a boca: uma análise em academias de ginástica. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, São Paulo, v. 10, n. 28, p. 295-312, jul./set. 2008.) ainda demande menor atenção de pesquisadores, se comparado a outros construtos, como lealdade e reclamação. Em muitas situações, no entanto, essa é a maior fonte de informações que os clientes utilizam em suas decisões de compra. Isso ocorre, por exemplo, nos setores de cosméticos, de higiene pessoal e de perfumaria, assim como no de produtos que envolvem risco de grandes perdas, como os de veículos e os de cursos superiores. Da mesma forma, é praticado no segmento de serviços: de cabeleireiro, de advogados, de dentistas, de lanchonetes (BROWN, REIGEN, 1987BROWN, J. J.; REIGEN, P. H. Social ties and word-of-mouth referral behavior. Journal of Consumer Research, Chicago, v. 14, n. 4, p. 350-62, Dec. 1987. ).
Alguns estudos vêm buscando um maior entendimento acerca dos elementos que influenciam na intenção de se recomendar determinado produto ou serviço, sendo que diversos autores apresentam diversificados antecedentes em diferentes contextos. Por exemplo, Heitmann, Lehmann e Herrmann (2007HEITMANN, M.; LEHMANN, D. R.; HERRMANN, A. Choice Goal Attainment and Decision and Consumption Satisfaction. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 44, n. 2, p. 234- 49, May 2007.), em estudo com clientes de produtos eletrônicos, definem elementos impactando diretamente na satisfação e, por conseguinte, na lealdade e nas intenções de recomendação, como o senso de justiça, a confiança, o pesar antecipado, a avaliação de custos e o efeito final negativo. Já Harrison-Walker (2001HARRISON-WALKER, L. J. The measurement of word-of-mouth communication and an investigation of service quality and customer commitment as potential antecedents. Journal of Service Research, Thousand Oaks, v. 4, n. 1, p. 60-75, Aug. 2001. ) visualiza, em sua pesquisa, o compromisso afetivo do consumidor e a qualidade em serviços como potenciais antecedentes da comunicação boca a boca positiva.
Mckee, Simmers e Licata (2006MCKEE, D.; SIMMERS, C. S.; LICATA, J. Customer self-efficacy and response to service. Journal of Service Research, Thousand Oaks, v. 8, n. 2, p. 207-220, Feb. 2006. ), por sua vez, seguem raciocínio específico em sua análise a respeito do tema, agora enfocando o segmento de serviços. Remetendo à autoeficácia nos serviços, eles partem das crenças dos clientes sobre sua capacidade em participar de serviços. No caso, o estudo demonstrou que a participação do cliente na prestação do serviço afeta positivamente sua percepção de valor e, em seguida, as intenções de recomendação do serviço.
Como o presente trabalho centra-se nos elementos que levam algum agente a recomendar um serviço ( neste caso, uma lanchonete fast food -, isso significa que seu foco se situa apenas na comunicação boca a boca positiva, descartando-se as recomendações negativas, que são normalmente originadas pela insatisfação. No caso, remeteu-se a Hawkins, Mothersbaugh e Best (2007HAWKINS, D.; MOTHERSBAUGH, D.; BEST, R. Comportamento do consumidor: construindo a estratégia de Marketing. Rio de Janeiro: Campus, 2007.) e a Maddox (1981MADDOX, R. N. Two-factor Theory and consumer satisfaction: replication and extension. Journal of Consumer Research, Chicago, v. 8, n. 1, p. 97-103, June 1981.), expondo os primeiros uma relação direta entre a comunicação boca a boca positiva e a satisfação, sendo satisfação um dos antecedentes principais da recomendação. Já o estudo de Maddox (1981MADDOX, R. N. Two-factor Theory and consumer satisfaction: replication and extension. Journal of Consumer Research, Chicago, v. 8, n. 1, p. 97-103, June 1981.) enfocou o mercado de determinados produtos físicos de consumo e, utilizando o método do incidente crítico, apontou a satisfação e a insatisfação como construtos distintos e não relacionados. Essa conclusão foi posteriormente enriquecida por Mittal e Lassar (1998MITTAL, B.; LASSAR, W. M. Why do customers switch? The dynamics of satisfaction versus loyalty. Journal of Services Marketing, Bradford, v. 12, n. 3, p. 177-195, 1998. ), que demonstraram que as relações entre satisfação e lealdade são desconexas e que a satisfação e a insatisfação não se ligam em um continuum, sendo a insatisfação uma variável dominante. Eles também mencionam que a insatisfação é quase uma garantia de troca de fornecedores, ao passo que a satisfação, por sua vez, não assegura lealdade.
3 ASPECTOS METODOLÓGICOS
Com o objetivo de atender ao objetivo proposto, a pesquisa valeu-se de abordagem quantitativa baseada na adaptação do modelo desenvolvido por Babin et al. (2005BABIN, B. J. et al. Modeling consumer satisfaction and word-of-mouth: Restaurant Patronage in Korea. The Journal of Services Marketing,Bradford, v. 19, n. 3, p. 133-140, 2005.), na intenção de recomendação de restaurantes noturnos coreanos. Aqui se teve a pretensão de adaptar esse modelo a uma aplicação empírica em uma lanchonete do tipo fast food. Apesar de o modelo original empregar modelagem de equações estruturais baseada na estrutura de covariância (usada em softwares como Amos e Lisrel), optou-se pelo emprega da mesma técnica mas avaliada por intermédio de mínimos quadrados parciais (PLS - Partial Least Squares) (CHIN, 1998CHIN, W. W. The partial least squares approach to structural equation modeling. In: MARCOULIDES, G. A. (Org.). Modern Methods for Business Research. New Jersey, London: Lawrence Erlbaum Associates, 1998.). Na realidade, é baseada em componentes e em regressões, além de não trabalhar simultaneamente todos os parâmetros (BIDO et al., 2010BIDO, D, de S. et al. Mensuração com indicadores formativos nas pesquisas em Administração de Empresas: como lidar com a multicolinearidade entre eles? Administração: Ensino e Pesquisa, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 245-269, abr./jun. 2010.).
Existem ao menos quatro justificativas que nortearam os autores ao uso da técnica de PLS via bootstrapping, em contraposição às técnicas baseadas na estrutura de covariâncias: (i) o fato de não haver premissas em relação à distribuição dos dados, ou seja, não se exige normalidade da distribuição (LOHMÖLLER, 1988LOHMÖLLER, J. B. The PLS program system: latent variables path analysis with partial least squares estimation. Multivariate Behavioral Research, Mahwah, v. 23, n. 1, p. 125-127, Jan. 1988.); (ii) em virtude da não exigência de normalidade multivariada dos dados, exigem-se tamanhos de amostras muito menores; (iii) a técnica maximiza o poder de predição (R2), em virtude de minimizar os resíduos (PERERA, BIDO, KIMURA, 2010PERERA, L. C. J.; BIDO, D. de S.; KIMURA, H. Consumo de luxo no Brasil: um estudo sobre a demanda. Facef Pesquisa, Franca, v.13, n. 3, p. 325-342, 2010.); (iv) o emprego do software WarpPLS 2.0 como suporte permitiu modelar uma distribuição não linear - situação comum em ciências sociais, todavia frequentemente menosprezada pela literatura (KOCK, 2011KOCK, N. WarpPLS 2.0 user manual. Laredo: ScriptWarp Systems, 2011.).
A modelagem dos dados por intermédio da técnica PLS não gera índices de ajustes globais do modelo como GFI, TLI, CFI e quiquadrado, já que não otimiza sua função global (TENENHAUS et al., 2005TENENHAUS, M. et al. PLS Path Modeling. Computational Statistics & Data Analysis, [s.l.], v. 48, n. 1, p. 159-205, Jan. 2005.). Outros indicadores de ajuste podem ser empregados, todavia, conforme será demonstrado no tópico referente às análises. O diagrama de caminho do modelo inicial, com as relações causais traduzidas em hipóteses, encontra-se na Figura 3 - sendo que estas últimas são sustentadas pelo modelo originalmente empregado (Babin et al., 2005BABIN, B. J. et al. Modeling consumer satisfaction and word-of-mouth: Restaurant Patronage in Korea. The Journal of Services Marketing,Bradford, v. 19, n. 3, p. 133-140, 2005.).
H1: O Bem-estar Social (BES) influi na Satisfação (SAT)
H2: O Bem-estar Social (BES) influi na Qualidade do Serviço (SQ)
H3: O Bem-estar Social (BES) influi na intenção de recomendação (WOM)
H4: A Qualidade do Serviço (SQ) influi na intenção de recomendação (WOM)
H5: A Qualidade do Serviço (SQ) influi na Satisfação (SAT)
H6: A Satisfação (SAT) influi na intenção de recomendação (WOM)
Em relação ao trabalho de campo, decidiu-se que o acesso às informações empíricas se daria por meio de questionário do tipo estruturado, formado por uma sequência lógica de perguntas que não podem ser modificadas nem podem conter inserções pelo entrevistador. Ou seja, as perguntas são colocadas ao respondente exatamente como estão escritas no questionário de coleta de dados (SAMARA, BARROS, 2002SAMARA, B. S.; BARROS, J. C. Pesquisa de marketing: conceitos e metodologia. 3. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2002.).
Como a lanchonete chega a atender, em períodos de alta temporada, mais de 300 clientes/dia, e dada a dificuldade de entrevistá-los no momento do consumo do serviço, optou-se pela utilização de um teste-piloto, realizado em junho de 2008, com amostra de 78 estudantes universitários do curso de Administração de Empresas de uma faculdade de Angra dos Reis. Para garantir que seriam coletados dados somente de clientes ativos da empresa, o instrumento continha uma questão-filtro, que objetivava verificar se o aluno era usuário da lanchonete. Nessa ocasião, verificou-se uma possível multicolinearidade do instrumento original, evidenciada por meio do determinante da matriz, que apresentou resultado tendendo a zero.
Após se identificarem as variáveis supostamente problemáticas, elas foram removidas, possibilitando o devido ajuste do instrumento. Com isso, o questionário final compôs-se de 14 questões, descritas no Quadro 1 e mais bem explicadas a seguir.
As seis primeiras questões visavam avaliar aspectos inerentes à Recomendação Boca a Boca (WOM), à Satisfação (SAT) e ao Valor Utilitário (UV). Para as respostas utilizou-se escala Likert de cinco pontos, indo de “Concordo totalmente” a “Discordo totalmente”. Segundo Aaker, Kumar e Day (2004AAKER, D. A.; KUMAR, V.; DAY, G. S. Pesquisa de marketing. São Paulo: Atlas, 2004. 745 p.), essa escala requer que o respondente indique seu grau de concordância ou de discordância em relação a uma série de afirmações relacionadas à atitude ou ao objeto.
As três questões seguintes visavam avaliar aspectos inerentes à Qualidade Percebida do Serviço (SQ) na prestação do serviço. Para as respostas, aqui se optou pela adoção de uma escala de diferencial semântico, que descreve o conjunto de crenças que dão base à imagem que uma pessoa faz de uma empresa ou de uma marca (AAKER, KUMAR, DAY, 2004AAKER, D. A.; KUMAR, V.; DAY, G. S. Pesquisa de marketing. São Paulo: Atlas, 2004. 745 p.). A marcação das respostas podia se dar em cinco pontos, situados em um continuum cujos extremos podiam ser de três tipos: “Péssimo ( Excelente”, “De baixíssima qualidade ( De altíssima qualidade” e “De baixo padrão - De alto padrão”.
Da 10a à 13a questão do questionário, visou-se avaliar o sentimento pessoal ou o chamado Bem-estar Social (BES) do cliente no momento da compra. Aqui também se empregou escala de diferencial semântico de cinco pontos, avaliando-se os estados emocionais ligados à irritabilidade, à felicidade, à disposição e ao entusiasmo do cliente. Tais estados foram baseados no modelo PAD (Pleasure, Arousal and Dominance) desenhado por Mehrabian e Russell (1974MEHRABIAN, A.; RUSSELL, J. An approach to environmental psychology. Cambridge: MIT Press, 1974.), que foi adaptado ao modelo base para este trabalho (BABIN et al., 2005BABIN, B. J. et al. Modeling consumer satisfaction and word-of-mouth: Restaurant Patronage in Korea. The Journal of Services Marketing,Bradford, v. 19, n. 3, p. 133-140, 2005.).
Inicialmente, optou-se por remover as variáveis do modelo original relacionadas ao valor hedônico, tendo em vista o fato de o objeto da pesquisa (lanchonete fast food) ser diferente do objeto de pesquisa original (restaurante noturno), que justifica tal decisão. Além disso, as avaliações preliminares mostraram que as variáveis relacionadas ao valor utilitário também não se ajustaram ao modelo. Assim, no processo de avaliação simplificou-se o modelo para que adotasse apenas quatro construtos, conforme será descrito no tópico referente à análise dos resultados.
As quatro últimas questões, apresentadas sob a forma de múltipla escolha, objetivavam verificar as fontes de informação usadas pelos clientes, além de gênero, idade e renda.
No mês de julho de 2008 foram aplicados 246 questionários na praça de alimentação do shopping onde se localiza uma das unidades da lanchonete, com clientes escolhidos aleatoriamente. Desse total, observaram-se 22 questionários incompletos (9% do total), desconsiderados na tabulação final da pesquisa, conforme a recomendação de Hair et al. (2005HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Bookman, 2005. 593p.). Dessa forma, contou-se com amostra total de 224 questionários válidos, equivalendo a 91% do total aplicado. Após isso, ao realizar a análise de outliers ( ou seja, dados discrepantes da amostra (, verificou-se que 19 observações apresentavam problemas, que se supôs serem fruto de questionários preenchidos com descaso. Adotando uma visão mais conservadora e parcimoniosa, optou-se pela exclusão dessas observações da amostra, o que a fez, em sua forma final, contar com 205 observações ( o equivalente a 83% do total inicial.
4 OBJETO DO ESTUDO: LANCHONETE FAST FOOD
A pesquisa foi realizada com clientes de uma rede de lanchonetes que, embora pequena, segue os mesmos moldes das grandes redes internacionais. Originada na cidade de Angra dos Reis, Rio de Janeiro, seus primeiros passos foram dados pelos sócios em um trailer, tendo posteriormente passado a ocupar uma loja no principal shopping da cidade - que, por conseguinte, é o principal centro de conveniência de Angra dos Reis.
Vale salientar que, embora não possa ser generalizado em virtude do processo de amostragem, esse estudo pretende ser útil às grandes redes de lanchonetes do tipo fast food. Tendo em vista a dificuldade de obtenção de grandes amostras, pulverizadas entre as várias marcas de cadeias de fast food existentes no mercado, e em que pese a aleatoriedade que caracteriza este estudo, sua robustez reside no fato de se ter valido de clientes em um conglomerado, que consumiam produtos exclusivamente da lanchonete pesquisada.
5 ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS DA PESQUISA
Objetivando alcançar o melhor aproveitamento das informações obtidas, optou-se por dividir a análise dos dados em duas etapas: a primeira voltou-se à demonstração de algumas evidências acerca do perfil do consumidor por meio do uso de estatísticas descritivas; a segunda ( e mais importante - voltou-se ao atendimento do objetivo central deste trabalho.
5.1 Perfil dos respondentes
Embora a estatística descritiva não apresente explicações para a variância ou para o fenômeno estudado, entendeu-se ser relevante apresentar alguns aspectos obtidos nas observações. Assim, verificou-se que, da amostra coletada, 57% eram homens e 43% mulheres. A maioria dos clientes investigados (157, ou 77% da amostra) tinham entre 18 e 29 anos, em consonância com o perfil do público que consome o serviço estudado. Cerca de 60% dos respondentes situavam-se na faixa de renda familiar entre R$ 1.245,01 e R$ 4.150,00. Por fim, uma informação que legitima a importância do estudo: cerca de 46% da amostra (95 pessoas) conheceram a lanchonete estudada por intermédio da recomendação de alguém.
5.2 Análise das premissas
Em análises multivariadas com modelagem de equações estruturais (SEM - Structural Equation Modelling), Hair et al.(2005HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Bookman, 2005. 593p.) recomendam que primeiramente sejam examinados os dados, para identificar os valores omissos (missing values) e atípicos (outliers), além de avaliar as premissas de normalidade, linearidade, homoscedasticidade e multicolinearidade. Os valores omissos e os outliers foram excluídos, conforme mencionado no tópico referente aos aspectos metodológicos. Uma das grandes vantagens em se analisar SEM por meio de PLS e, mais especificamente, pelo algoritmo do software WarpPLS 2.0 é a possibilidade da avaliação de dados com distribuição não normal e não linear. Pretendia-se adotar primeiramente, como caminho metodológico para este trabalho, a análise fatorial exploratória e, posteriormente, a análise fatorial confirmatória, por meio da estrutura de covariância. Como não se encontrou normalidade nessa base de dados, todavia, e como a relação entre construtos não apresentou linearidade - situação normal em ciências sociais, ainda que menosprezada pela literatura -, optou-se pelo uso do algoritmo do software WarpPLS 2.0 (Kock, 2011KOCK, N. WarpPLS 2.0 user manual. Laredo: ScriptWarp Systems, 2011.). Essa quebra de premissa seria um problema caso as análises tivessem sido feitas levando-se em conta a estrutura de covariância (softwares como o Amos), pois, apesar de bons índices de ajuste do modelo, ele poderia não ser confiável. Os resíduos não apresentaram padrões de dispersão, indicando serem homoscedásticos. Como forma de avaliar a multicolinearidade dos construtos, empregou-se o critério denominado VIF (Variance Inflation Factor), ou fator de inflação da variância. Em critérios mais rigorosos, Kline (1998) e Hair et al.(2005HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Bookman, 2005. 593p.) recomendam valores menores que 5; em critérios mais relaxados, menores que 10. O valor encontrado para as variáveis latentes analisadas foi de 1,179, indicando a inexistência de multicolinearidade.
5.3 Modelagem dos dados via PLS
Os dados foram modelados, partindo-se da análise de significância por meio do bootstrapping, com 500 reamostragens. Nessa técnica, o software se encarrega de gerar subamostras, coletando casos da base. Segundo Kubota e Nogueira (2007KUBOTA, L. C.; NOGUEIRA, A. R. R. O impacto da gestão nos resultados percebidos de empresas de software. ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO, 31., 2007, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: ENANPAD, 2007. p. 1-16.), o uso do bootstrapping, em contraposição ao tradicional Teste t, possibilita verificar a significância das estimativas dos parâmetros, sem a necessidade de partir da normalidade multivariada.
Ao analisar o modelo inicial verificou-se, por intermédio das cargas fatoriais não rotacionadas (combined loadings and cross-loadings) e rotacionadas (pattern loadings and cross-loadings), que a variável inerente ao Valor Utilitário (UV14) não se ajustou ao modelo. Assim, precedeu-se a sua remoção. Após a ação, os ajustes melhoraram sobremaneira. A Tabela 1 reproduz os coeficientes dos caminhos (Path coefficients), ou os betas (β).
A Tabela 2 apresenta as cargas fatoriais (Combined loadings and cross-loadings). Segundo Barclay, Higgins e Thompson (1995BARCLAY, D.; HIGGINS, C.; THOMPSON, R. The Partial Least Squares (PLS) Approach to Causal Modeling: Personal Computer Adoption and Use as an Illustration. Technology Studies, Berlin, v. 2, n. 2, p. 285-309, 1995.), essas cargas devem ser superiores a 0,7. As demais cargas (que não fazem parte do construto) devem ser significativamente inferiores aos valores encontrados em cada indicador. Nota-se que apenas BES1 possui carga inferior ( no entanto, próxima a 0,7 (, indicando bom ajuste do modelo.
A análise com o software WarpPLS 2.0 oferece três importantes índices de ajustes: (i) AVIF, que é uma média entre os VIFs (variance inflation factor); (ii) ARS, que é uma média entre os coeficientes de regressão R2; e (iii) APC, que é uma média entre as cargas dos caminhos (Kock, 2011KOCK, N. WarpPLS 2.0 user manual. Laredo: ScriptWarp Systems, 2011.). Segundo o autor, recomenda-se, em um bom ajuste, que a significância (p) dos últimos índices seja menor que 0,05 e que o indicador AVIF seja menor que 5. Os valores encontrados não violam essas prerrogativas, indicando um modelo bem ajustado (ver Tabela 3).
Outros importantes coeficientes do modelo são o CRC (composite reliability coefficients), o CAC (cronbach alpha coefficients) e o AVE (average variances extracted). O coeficiente que trata da variância média extraída (AVE) é de grande utilidade na avaliação da validade discriminante. Fornell e Larcker (1981FORNELL, C.; LARCKER, D.F. Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 18, n.1, p. 39-50, Feb. 1981.) sugerem que se compare a raiz quadrada desse coeficiente com as correlações entre os construtos. Para haver validade discriminante, é necessário que as correlações entre construtos sejam menores que a raiz quadrada da variância média extraída (AVE). A Tabela 4 apresenta as correlações entre construtos e a variância média extraída (na diagonal e em negrito), indicando existir validade discriminante no instrumento.
Já o CRC, que representa o coeficiente de confiabilidade composta, e o CAC, que representa o coeficiente de confiabilidade psicométrica Alpha de Cronbach, se encarregam de averiguar a existência de confiabilidade das medidas. Tomando-se por base um critério mais conservador de medida de confiabilidade, Fornell e Larcker (1981FORNELL, C.; LARCKER, D.F. Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research, Chicago, v. 18, n.1, p. 39-50, Feb. 1981.) e Kock (2011KOCK, N. WarpPLS 2.0 user manual. Laredo: ScriptWarp Systems, 2011.), recomendam que ambos os coeficientes se situem acima de 0,70. Há que se chamar atenção para o fato de que, embora o CAC seja usado com maior frequência, o CRC se traduz em um coeficiente mais robusto, já que avalia a confiabilidade composta. A Tabela 4 traz os resultados obtidos no modelo, respectivamente na segunda e na terceira colunas.
Verifica-se, no diagrama de caminhos do modelo ajustado (ver Figura 4), que os coeficientes de regressão são razoáveis, assim como os betas. Ainda com base na figura, pode-se notar a condição de aceitação das hipóteses propostas. Nenhuma das hipóteses é rejeitada, já que todas atendem ao critério de significância da relação. Deve-se, no entanto, chamar a atenção para a hipótese 4, que trata da influência da Qualidade do Serviço na Intenção de Recomendação: apesar de significante, apresenta um beta relativamente baixo. Isso sugere a necessidade de a Qualidade do Serviço ser mediada pela Satisfação. A Tabela 5 descreve a condição de aceitação das hipóteses do estudo.
6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
O objetivo deste trabalho foi adaptar, ao contexto de lanchonetes do tipo fast food, o estudo de Babin et al. (2005BABIN, B. J. et al. Modeling consumer satisfaction and word-of-mouth: Restaurant Patronage in Korea. The Journal of Services Marketing,Bradford, v. 19, n. 3, p. 133-140, 2005.) referente à análise dos antecedentes da intenção de recomendação de restaurantes noturnos. Acredita-se que, com o cumprimento desse objetivo, a principal contribuição do trabalho resida na aplicação de um modelo em um contexto similar, contudo diferente em sua finalidade. Como consequência dessa adaptação, tem-se a simplificação de um modelo, com aplicação empírica que afere sua eficácia.
Como forma de legitimar a proposição, uma aplicação empírica foi realizada em uma lanchonete do tipo fast food com moldes de redes internacionais, contudo de capital nacional e com atuação regional. Optou-se, por questões defendidas no trabalho, pela remoção de alguns construtos, que não faziam sentido para esse contexto, ou que não se ajustaram bem à proposta.
Nenhuma das seis hipóteses desenhadas foi rejeitada, o que indica que o modelo proposto por Babin et al. (2005BABIN, B. J. et al. Modeling consumer satisfaction and word-of-mouth: Restaurant Patronage in Korea. The Journal of Services Marketing,Bradford, v. 19, n. 3, p. 133-140, 2005.) e simplificado pelos autores apresenta aderência e ajuste. Cabe mencionar que o modelo original certamente não funcionaria para esse tipo de serviço, o que caracteriza um interessante avanço no campo. Apesar de as seis hipóteses não terem sido rejeitadas, a hipótese 4 (H4 ( A Qualidade do Serviço (SQ) influi na intenção de recomendação (WOM)) apresenta um coeficiente beta relativamente baixo. Além disso, é a hipótese que apresenta a pior significância estatística, embora ainda aceita. Acredita-se que tal situação sugira a necessidade de adoção da variável Satisfação como mediadora no processo de predição da intenção de recomendação. Em outras palavras, não basta que o cliente perceba a qualidade do serviço: é necessário que ele esteja satisfeito para que haja uma intenção de recomendação mais forte.
As hipóteses 1, 2 e 3 indicam que os estados afetivos são extremamente relevantes nesse processo, o que foi legitimado pela não rejeição dessas hipóteses. Neste estudo, empregou-se, conforme o modelo original, uma escala de diferencial semântico para avaliar o estado de espírito dos entrevistados (ou Bem-estar Social). Observou-se na prática, contudo, que a mudança de escalas em um mesmo instrumento pode implicar algumas dificuldades práticas para os respondentes. Assim, recomenda-se que o instrumento seja desenvolvido adaptado e as questões, mensuradas por meio de escalas de concordância, do tipo Likert.
O coeficiente de regressão R2 do modelo indicou poder preditivo relativamente alto e interessante, destacando, assim, sua importância. Reforça-se, conforme previsto na literatura, o poder do construto satisfação como antecedente direto da intenção de recomendação, o que reitera, na esfera empresarial, o imperativo de se buscar excelência nos processos de prestação de serviço, não apenas em termos de sua qualidade, mas também superando as expectativas dos clientes. A teorização demonstrada no referencial teórico, referente ao processo de desconfirmação de expectativas, reforça essa prerrogativa. Em função da grande concorrência existente no setor alimentício, especialmente no de fast food, verifica-se a necessidade de se ofertarem melhores serviços e de se entenderem quais atributos influem de fato no comportamento do consumidor e em sua percepção de qualidade.
O trabalho contém algumas limitações, tanto de ordem metodológica quanto de ordem conceitual. A amostra por conglomerado constitui uma limitação quando o objetivo é a generalização dos resultados (AAKER et al., 2004AAKER, D. A.; KUMAR, V.; DAY, G. S. Pesquisa de marketing. São Paulo: Atlas, 2004. 745 p.). Esse modelo de amostragem foi utilizado em razão das restrições orçamentárias do projeto e do grande número de respostas necessárias para a aplicação das técnicas de pesquisa que foram empregadas. Além disso, a amostra pode ter introduzido um viés na análise: remeteu apenas a consumidores da cidade fluminense de Angra dos Reis, localidade eminentemente turística, e o período de coleta foi restrito a uma determinada época do ano.
Recomenda-se a replicação do modelo em outras lanchonetes fast food localizadas em outras cidades e pertencentes a outras redes ( nacionais e internacionais (, bem como a aplicação em outras épocas do ano. Com isso, será possível aferir sua qualidade e eficácia no processo de investigação dos antecedentes da intenção de recomendação
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Apr-Jun 2012
Histórico
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Recebido
17 Nov 2010 -
Aceito
12 Jun 2012