Resumo
Objetivos:
Descrever as características da oxigenoterapia inalatória (OI) utilizada em idosos internados no setor de clínica médica de um hospital público brasileiro, bem como verificar o conhecimento dos acompanhantes sobre esta terapia.
Método:
Estudo observacional, transversal e descritivo. A amostra foi composta por 52 idosos internados no setor de clínica médica de um hospital público de Minas Gerais por dois meses. As características da aplicação da OI, os aspectos sociodemográficos e características gerais de saúde do grupo foram avaliados pela análise dos prontuários, prescrições médicas e observação in loco. O conhecimento dos acompanhantes sobre a OI foi avaliado por meio de entrevista estruturada. A análise estatística contemplou análises univariadas exploratórias, com frequências das variáveis categóricas e estatísticas descritivas das variáveis contínuas.
Resultados:
Houve predomínio do sexo feminino (53,8%); idade média 75 anos; baixa escolaridade (dois anos) e renda per capita (entre um e três salários mínimos); situação conjugal casado (42,2%); não tabagistas (48,1%); 67,3% não estavam em ventilação mecânica anterior e 61,5% estavam em tratamento fisioterapêutico. A principal evolução foi alta sem OI (53,8%). O cateter nasal foi o dispositivo mais utilizado (51,9%); 42,0% das prescrições não foram documentadas; a monitorização esteve presente em 76,9%; 81,8% dos acompanhantes não sabiam o que era o dispositivo da OI e 27,0% relataram ter alterado o dispositivo de oferta de oxigênio.
Conclusão:
Este estudo mostrou características relevantes da aplicação da OI em idosos internados em um hospital público, demonstrando a necessidade de padronização das indicações, prescrições e monitorização dos idosos em OI, com medidas para a educação da equipe de saúde e acompanhantes.
Palavras-chave:
Idoso; Oxigenoterapia; Hospitalização
Abstract
Objectives:
To describe the characteristics of oxygen inhalation therapy used on elderly patients of the medical clinical department of a Brazilian public hospital, and to evaluate the knowledge of those accompanying them about the therapy.
Method:
An observational, descriptive cross-sectional study was carried out. The sample comprised 52 elderly persons who had been hospitalized in the medical clinical department of a public hospital in Minas Gerais for two months. The characteristics of the application of the oxygen inhalation therapy, the sociodemographic aspects and the general health characteristics of the group were evaluated through the analysis of hospital records, medical prescriptions and in loco observation. The knowledge of the persons accompanying the elderly patients was evaluated through a structured interview. Statistical analysis included exploratory univariate analysis, study of the frequencies of the categorical variables and descriptive statistical analysis of the continuous variables.
Results:
There was a predominance of females (53.8%); a mean age of 75 years; a low educational level (two years) and per capita income (between one and three minimum wages); a marital status of married (42.2%); and nonsmokers (48.1%). A total of 67.3% of the elderly persons had not previously used mechanical ventilation and 61.5% were undergoing physical therapy. The most common outcome was hospital discharge without OIT (53.8%). The nasal cannula was the most commonly used device (51.9%); 42.0% of prescriptions were not documented; monitoring was present in 76.9% of cases; 81.8% of those accompanying the elderly patients did not know what the OIT device was and 27.0% reported having changed the oxygen supply device.
Conclusion:
This study identified the relevant characteristics of the application of oxygen inhalation therapy among elderly patients of a public hospital, demonstrating the need for standardization of information, prescriptions and monitoring of such individuals during oxygen inhalation therapy, with educational measures for the healthcare team and those accompanying the patients.
Key word:
Elderly; Oxygen Inhalation Therapy; Hospitalization.
INTRODUÇÃO
Dentre as alterações inerentes ao envelhecimento, a redução da elasticidade da musculatura intercostal e a redução da capacidade vital podem favorecer o desenvolvimento de infecções como a pneumonia. Os idosos são mais suscetíveis a infecções nosocomiais, principalmente respiratórias, urinárias e de pele decorrentes da redução dos mecanismos de defesa.11. Freitas EV, Py L, Editores. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011.
As causas mais frequentes de internação entre idosos no Brasil, para ambos os sexos, são a insuficiência cardíaca e coronariana e as doenças pulmonares, que se revezam como primeira e segunda causas.22. Góis ALB, Veras RP. Informações sobre a morbidade hospitalar em idosos nas internações do Sistema Único de Saúde do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2010;15(6):2859-69. As taxas de internações na faixa etária acima dos 80 anos são três vezes maiores quando comparadas com as mesmas entre indivíduos de 55 e 59 anos.33. Hardinge M, Annandale J, Bourne S, Cooper B, Evans A, Freeman D. British Thoracic Society guidelines for home oxygen use in adults. Thorax 2015;70 Suppl 1:1-43
Durante a internação, a administração de oxigênio é uma das mais importantes modalidades de terapia para pacientes com hipó xia resultante de diversas condições comuns como os eventos cardiovasculares, doenças respiratórias crônicas e infecções do trato respiratório inferior.33. Hardinge M, Annandale J, Bourne S, Cooper B, Evans A, Freeman D. British Thoracic Society guidelines for home oxygen use in adults. Thorax 2015;70 Suppl 1:1-43 A oxigenoterapia consiste no tratamento da hipóxia por meio da inalação de oxigênio a uma pressão maior que a do ar ambiente, o que facilita a troca gasosa e reduz o trabalho da respiração.44. Paredes MCL, Cruz AO, Aznar IC, Carrasco MCM, Aguero MIBG, Ruíz EP, et al. Fundamentos de La oxigenoterapia em situaciones agudas y crónicas: indicaciones, métodos, controles y seguimiento. An Pediatr 2009;71(2):161-74.
A escolha da forma de administração dependerá, principalmente, da eficiência do sistema a ser empregado.44. Paredes MCL, Cruz AO, Aznar IC, Carrasco MCM, Aguero MIBG, Ruíz EP, et al. Fundamentos de La oxigenoterapia em situaciones agudas y crónicas: indicaciones, métodos, controles y seguimiento. An Pediatr 2009;71(2):161-74. O oxigênio, como qualquer medicamento, se administrado de forma indevida, pode ser tóxico e trazer sérias consequências. A toxicidade depende de fatores como pressão absoluta de oxigênio oferecido, duração da exposição e sensibilidade individual.55. Moradkan R, Sinoway LI. Revisiting the Role of Oxygen Therapy in Cardiac Patients. Am Coll Cardiol 2010;56(13):1013-6.
Como efeitos deletérios do uso indevido de oxigênio, pode-se citar a traqueobronquite, depressão da atividade mucociliar, náuseas, anorexia e cefaléia - situações reversíveis com a suspensão da oxigenoterapia. No entanto, outras situações podem ser irreversíveis como a atelectasia por reabsorção, onde ocorre compressão alveolar, perda do surfactante com debilidade da sua função.66. Hay WW Junior, Bell EF. Oxygen Therapy, oxigen toxicity and the STOP-ROP trial. Pediatrics 2000;105(2):424-5.
A oxigenoterapia inalatória (OI) é um tipo de terapia onde o manuseio tanto dos dispositivos de oferta de oxigênio, quanto os fluxômetros que regulam a quantidade de oxigênio a ser ofertada, são de fácil acesso e manuseio para quem está acompanhando o paciente, sendo que é fato comum observar os acompanhantes retirando os dispositivos ou alterando o fluxo ofertado. Tais modificações podem trazer efeitos negativos ao tratamento do paciente, especialmente, em se tratando de idoso.
Portanto, levando em consideração as alterações naturais do envelhecimento no sistema respiratório, as altas taxas de internação entre os idosos, com a necessidade frequente de utilização da OI, faz-se relevante para a área da Geriatria e Gerontologia conhecer melhor como esta terapia está sendo utilizada entre a população idosa.
Este estudo objetivou descrever as características da oxigenoterapia inalatória (OI) utilizada em idosos internados no setor de clínica médica de um hospital público brasileiro, bem como verificar o conhecimento dos acompanhantes sobre esta terapia.
MÉTODO
Tipo de estudo e aspectos éticos
Pesquisa do tipo observacional, transversal e descritiva. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (protocolo nº 2485/2012), seguindo as condutas éticas estabelecidas para pesquisa envolvendo seres humanos. Todos os participantes receberam esclarecimentos sobre a pesquisa e após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram realizadas as coletas.
Amostra
A amostra foi composta por indivíduos admitidos no setor de clínica médica de um hospital público brasileiro do estado de Minas Gerais, durante um período de dois meses, entre agosto e setembro de 2012. Durante o período de referência, foram internados 90 idosos em todo o setor de clínica médica. Considerando a ausência de conhecimento da estimativa do desfecho de interesse, portanto, tomado por 50,0%, um nível de confiança de 90,0% e uma precisão absoluta de 11,4%, o tamanho amostral final foi de 52 entrevistas.77. Laboratório de Epidemiologia e Estatística. Tamanho de amostra para pesquisa em ciências da saúde [Internet]. São Paulo: USP; 2016 [acesso em 23 jan. 2016]. Disponível em: www.lee.dante.br/pesquisa/amostragem/calculo_amostra.html
Foram incluídos nesse estudo idosos com idade acima de 60 anos em uso de OI (após a ventilação mecânica ou de primeira escolha). Os critérios de exclusão foram estar em ventilação mecânica invasiva e/ou não invasiva e com história de uso domiciliar de oxigenoterapia.
Durante os dois meses de coleta foram internados 90 idosos no setor da clínica médica. Foram excluídos 38 (42,2%) idosos; destes, 34 por não estarem em OI, três por estarem em ventilação mecânica invasiva (VMI) e um por fazer uso de OI domiciliar. Assim, 52 idosos (57,8%) preencheram os critérios para a participação no estudo.
Para a seleção dos acompanhantes, foi estabelecido como critério de inclusão o indivíduo que, por autorreferência, permanecia por um período maior junto ao idoso e estava acima do ponto de corte do Miniexame do Estado Mental (MEEM),88. Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O mini-exame do estado mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr 1994;52(1):1-7. dado de acordo com a escolaridade.9
Variáveis mensuradas
As características sociodemográficas, características gerais de saúde dos idosos, características da OI e conhecimento dos acompanhantes sobre a OI foram avaliados.
As características sociodemográficas (idade, sexo, estado conjugal, escolaridade e renda per capita) foram avaliadas por meio do questionário Older Americans Resources and Services (OARS), validado para a população brasileira.1010. Ramos LR. Growing old in São Paulo, Brazil. Assessment of Health status and family support of the elderly of different socio-economic strata living in the community [Thesis]. London: London School of Hygiene and Tropical Medicine; 1987.
Os levantamentos das características gerais de saúde dos idosos e da aplicação da OI foram realizados por meio da observação in loco e da análise dos prontuários e das prescrições médicas. Quanto às características gerais de saúde, foram avaliadas: história de tabagismo; doenças de base; história de ventilação mecânica (VM) anterior e tempo de VM; se estavam em atendimento fisioterapêutico; tempo de internação; tempo de OI e evolução da internação. Pelas características da OI foram avaliados os tipos de dispositivos empregados, prescrição médica (sendo classificada em prescrição com dose determinada, prescrição com dose indeterminada e sem prescrição documentada, ou seja, com indicação médica, porém, sem o relato no prontuário ou folha de prescrição) e monitorização.
Para a avaliação dos conhecimentos dos acompanhantes quanto à OI utilizou-se três perguntas estruturadas compostas de respostas sim ou não. Essas perguntas passaram por um processo de avaliação por meio de estudo piloto. As perguntas foram: "O(a) senhor(a) sabe o que é este dispositivo?", "O(a) senhor(a) sabe para quê ele é utilizado?" e "O(a) senhor(a) já alterou, retirou ou colocou o dispositivo de fornecimento de oxigênio do paciente que acompanha?". Caso a última pergunta fosse afirmativa, havia uma quarta pergunta onde o cuidador respondia o porquê de ter alterado, retirado ou colocado o dispositivo. O fisioterapeuta residente, responsável pela coleta dos dados, realizou a entrevista individualmente com cada acompanhante, em ambiente separado do leito do idoso.
Análise estatística
Os dados foram armazenados em planilha eletrônica e analisados com o auxilio do software SPSS(tm) 19 (Statistical Package for Social Sciences). Foram realizadas análises univariadas exploratórias, compostas de frequências das variáveis categóricas e estatísticas descritivas (média, desvio-padrão, mediana, mínimo e máximo) das variáveis contínuas.
RESULTADOS
As características sociodemográficas do grupo foram: sexo feminino 53,8% (n=28); masculino 46,2% (n=24); idade média de 75,65 anos (±9,6); situação conjugal solteiro 11,5% (n=6), casado/mora junto 44,2% (n=23), viúvo 32,7% (n=17), outros 11,5% (n=6). Escolaridade média de dois anos (±2), renda per capita entre um e três salários mínimos (SM) 65,4% (n=34), >três a cinco SM 23,1% (n=12), >cinco SM 1,9% (n=1) e sem renda 9,6% (n=5).
Conforme tabela 1, 48,1% não eram tabagistas, 32,7% foram internados pela clínica médica, 71,1% não fizeram uso de VMI ou não invasiva e 61,7% estavam em tratamento fisioterapêutico. O tempo mediano de VM, OI e internação foram 12, 10 e 17 dias, respectivamente. Dentre as doenças mais prevalentes destacaram-se a hipertensão arterial, seguida de diabetes mellitus e em terceiro lugar as pneumonias (tabela 2).
O cateter nasal foi o dispositivo mais utilizado com 51,9% dos casos, a oxigenoterapia não recebeu a prescrição na folha diária em 42,3%, a monitorização esteve presente em 76,9% dos pacientes e a evolução foi predominantemente de alta sem oxigenoterapia (53,8%) (tabela 3).
Distribuição dos idosos (N=52) segundo as características da oxigenoterapia inalatória. Uberaba-MG, 2012.
Oito idosos estavam sem acompanhantes. Dos 44 acompanhantes avaliados, 81,8% não sabiam o que era o dispositivo, 31,8% não sabiam qual a utilização do dispositivo e 72,7% relataram nunca ter removido ou colocado o equipamento de oferta de OI e/ou alterado o fluxo de oxigênio empregado (tabela 4). A pergunta nº 4 estava relacionada aos motivos para retirar ou colocar o dispositivo. As respostas mais citadas dentre os que responderam sim à pergunta anterior (pergunta 3 n=12) foram: desconforto com o dispositivo 58,4% (n=7) das respostas, seguida de falta de ar 25,0% (n=3) e durante a alimentação com 16,6% (n=2).
DISCUSSÃO
Os resultados demonstraram que mais da metade dos idosos internados no setor de clínica médica durante o bimestre investigado estavam em OI, ressaltando a importância da atenção a esse tipo de terapia. Além disso, este estudo mostrou um grupo de idosos hospitalizados e em oxigenoterapia com maioria feminina, idade média de 75 anos, situação conjugal casado, escolaridade média de dois anos, renda per capita entre um e três salários mínimos. Outros estudos envolvendo hospitalizações de idosos em hospitais públicos demonstraram perfil semelhante.1111. Loyola Filho AI, Matos DL, Giatti L, Peixoto SV, Lima-Costa MF. Causas de internações hospitalares entre idosos brasileiros no âmbito do Sistema Único de Saúde. Epidemiol Serv Saúde 2004;13(4):229-38.,1212. Cunha BSS, Nascimento AS, Sá SPC. Perfil clínico e sociodemográfico de internação de idosos na unidade de emergência de um hospital geral. Estud Interdiscip Envelhec 2014;19(1):189-200. Esses resultados podem ser justificados pelo maior número de mulheres idosas no Brasil,11. Freitas EV, Py L, Editores. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011. além da relação existente entre baixa escolaridade, renda e a maior utilização de serviços de saúde públicos no Brasil.1313. Rodrigues NO, Neri AL. Vulnerabilidade social, individual e programática em idosos da comunidade: dados do estudo fibra, Campinas, SP, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2012;17(8):2129-39.
O tabagismo esteve presente em 32,7% da amostra, sendo que 48,1% eram não tabagistas. Em revisão proposta por Lima & Faustino,1414. Lima PVSF, Faustino AM. Aspectos gerais do tabagismo entre idosos no Brasil: revisão de literatura. Rev Eletrônica Gest Saúde 2013;4(1):1860-77. a prevalência de tabagismo nos idosos é muito variável de acordo com a amostra estudada, variando entre 0 e 59,4%. No ambiente hospitalar, onde a presente pesquisa foi desenvolvida, acredita-se que o tabagismo, presente em parte considerável da amostra, corrobore as complicações de saúde que levaram à internação. O tabagismo entre idosos recebe pouca atenção, mesmo em idade avançada pode-se obter grandes benefícios com a interrupção deste hábito, como redução do risco de adoecer, melhor controle da evolução de doença pré-existente, melhor qualidade de vida e aumento na expectativa de vida.1515. De Carvalho AA, Gomes L, Loureiro AL, Bezerra AJC. Controle do tabagismo em instituição de longa permanência para idosos: relato de experiência. Ciênc Saúde Coletiva 2013;18(4):1119-28.
A VMI anterior foi uma característica presente em 28,9% do grupo, sendo o seu tempo mediano de 12 dias. O seu tempo prolongado expõe o indivíduo a riscos como pneumonias, alterações na musculatura respiratória, além de repercussões sistêmicas como na função renal, gastroinstestinal e cardíaca.1616. Barbas CSV, Ísola AM, Farias AMC, Cavalcanti AB, Gama AMC, Duarte ACM, et al. Recomendações brasileiras de ventilação mecânica 2013. Rev Bras Ter Intensiva 2014;26(2):89-121. Este quadro pode levar a dependência de um suporte externo de oxigênio, pois o indivíduo exposto à VM e a altas concentrações de oxigênio pode apresentar condições como a depleção do surfactante, efeitos citotóxicos e alterações da fisiologia respiratória com depressão da respiração, vasodilatação pulmonar e vasocontrição sistêmica.1717. Corbellini C. Desmame da ventilação invasiva: comparação entre idosos e não idosos [Dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2008.
Na população estudada, a fisioterapia foi uma modalidade de tratamento muito utilizada, sendo, pois, o fisioterapeuta, um profissional essencial para a monitorização e evolução do idoso com esse tipo de terapia.1818. Taquary SAS, Ataíde DS, Vitorino PVO. Perfil clínico e atuação fisioterapêutica em pacientes atendidos na emergência pediátrica de um hospital público de Goiás. Fisioter Pesqui 2013;20(3):262-7.,1919. Mendes TAB, Andreoli PBA, Cavalheiro LV, Talerman C, Laselva C. Adequação do uso do oxigênio por meio da oximetria de pulso: um processo importante de segurança do paciente. Einstein 2010;8(4):449-55. O atendimento fisioterapêutico, além dos procedimentos de avaliação motora, respiratória e intervenção, envolve também o monitoramento contínuo dos sinais vitais e dos parâmetros de oxigenoterapia, além de técnicas que visam a higiene brônquica e a reexpansão pulmonar, contribuindo para uma atenção mais eficaz e integral ao paciente em oxigenoterapia.1818. Taquary SAS, Ataíde DS, Vitorino PVO. Perfil clínico e atuação fisioterapêutica em pacientes atendidos na emergência pediátrica de um hospital público de Goiás. Fisioter Pesqui 2013;20(3):262-7.
As especialidades de internações mais frequentes entre os idosos foram clínica médica, pneumologia, cardiologia, e clínica cirúrgica. Essas especialidades realizam o manejo de várias doenças comuns ao envelhecimento como as pneumonias, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), doenças do aparelho circulatório como a insuficiência cardíaca (IC) e o acidente vascular encefálico (AVE), além dos quadros de fraturas.22. Góis ALB, Veras RP. Informações sobre a morbidade hospitalar em idosos nas internações do Sistema Único de Saúde do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2010;15(6):2859-69.,1212. Cunha BSS, Nascimento AS, Sá SPC. Perfil clínico e sociodemográfico de internação de idosos na unidade de emergência de um hospital geral. Estud Interdiscip Envelhec 2014;19(1):189-200.,1313. Rodrigues NO, Neri AL. Vulnerabilidade social, individual e programática em idosos da comunidade: dados do estudo fibra, Campinas, SP, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva 2012;17(8):2129-39. Essas situações têm como recurso terapêutico frequentemente utilizado a OI, usada conforme a necessidade do paciente.44. Paredes MCL, Cruz AO, Aznar IC, Carrasco MCM, Aguero MIBG, Ruíz EP, et al. Fundamentos de La oxigenoterapia em situaciones agudas y crónicas: indicaciones, métodos, controles y seguimiento. An Pediatr 2009;71(2):161-74.,1818. Taquary SAS, Ataíde DS, Vitorino PVO. Perfil clínico e atuação fisioterapêutica em pacientes atendidos na emergência pediátrica de um hospital público de Goiás. Fisioter Pesqui 2013;20(3):262-7.,2020. Cuesy PG, Sotomayor PL, Pinã JOT. Reduction in the Incidence of Poststroke Nosocomial Pneumonia by Using the "Turn-mob" Program. J Stroke Cerebrovasc Dis 2010;19(1):22-8.
Quanto à evolução, aproximadamente 15% dos idosos internados sob OI receberam alta com esta terapia domiciliar, o que aponta para a necessidade de acompanhamento e cuidados de longo prazo, não apenas com o paciente, mas também com o ambiente em que ele vive, como as condições do domicílio e os cuidados a que o paciente possui acesso.2121. Watanabe CS, De Andrade LFC, Da Silva Neto MQ, Dos Santos SDFT, Kawata LS. Oxigenoterapia domiciliar prolongada: perfil dos usuários e custos. Rev Enferm UERJ 2015;23(1):95-101.,2222. Godoy I, Tanni SE, Hernández C. The importance of knowing the home conditions of patients receiving long-term oxygen therapy. Int J Chronic Obstr Pulm Dis 2012;7:421-5.
A mediana do tempo de internação foi de 17 dias. Rufino et al.2323. Rufino GP, Gurgel MG, Pontes TC, Freire E. Avaliação de fatores determinantes do tempo de internação em clínica médica. Rev Soc Bras Clin Méd 2012;10(4):291-7. demonstraram tempo de internação no setor de clínica médica de 20,9 dias, sendo maior para os idosos, associando o tempo prolongado de internação com menor renda, escolaridade e maior idade. O tempo de internação tão variável como o do presente estudo pode estar relacionado à diversidade de doenças, especialidade e perfis físico-funcionais dos idosos internados no setor. O tempo de OI foi de 10 dias, apesar de não serem encontrados na literatura outros estudos que analisaram o tempo de oxigenoterapia entre idosos hospitalizados.
Evidencia-se que pelas características inerentes ao envelhecimento pulmonar associado à presença de doenças cardiovasculares e respiratórias, como é o caso da presente amostra, o tempo de OI pode demandar períodos prolongados de OI. No entanto, não foram encontrados estudos com tal informação, o que impossibilitou a comparação dos tempos de utilização da OI.11. Freitas EV, Py L, Editores. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011.,33. Hardinge M, Annandale J, Bourne S, Cooper B, Evans A, Freeman D. British Thoracic Society guidelines for home oxygen use in adults. Thorax 2015;70 Suppl 1:1-43 Estudo realizado com crianças mostrou mediana de seis dias de oxigenoterapia,2424. Camargo PAB, Pinheiro AT, Hercos ACR, Ferrari GF. Oxigenoterapia inalatória em pacientes pediátricos internados em hospital universitário. Rev Paul Pediatr 2008;26(1):43-7. e tal estudo difere quanto à amostra investigada. Portanto, há de se ressaltar, a necessidade de mais pesquisas sobre o tema.
É importante ressaltar os efeitos deletérios dessa terapia por tempo prolongado e em altas concentrações. No sistema cardiovascular, altas concentrações de oxigênio podem elevar a pressão arterial e reduzir o débito cardíaco e consumo de oxigênio cardíaco. Além disso, o fluxo coronário cai em resposta à hiperóxia induzida pela vasoconstrição, o que pode levar a uma redução do fluxo cerebral e renal.5 No sistema pulmonar pode acontecer a atelectasia por reabsorção onde os mecanismos envolvem a compressão alveolar, perda do surfactante com debilidade da sua função. Altas concentrações de oxigênio podem debilitar a função imune, levando a um aumento na inflamação de vias aéreas, alterações na flora traqueal e infecções secundárias, principalmente por espécies de bactérias pseudomonas e proteus.2525. Meyhoff CS, Staehr AK, Rasmussen LS. Rational use of oxygen in medical disease and anesthesia. Curr Opin Anesthesiol 2012;25(3):363-70.
Para esse tipo de terapia, vários dispositivos podem ser utilizados, sendo a sua escolha baseada no fluxo a ser empregado. Os dispositivos mais utilizados foram os cateteres nasais, seguidos das máscaras de traqueostomia e das máscaras faciais. Tais resultados são, em parte, semelhantes a outros estudos,18,26 nos quais constatou-se predominância da utilização dos cateteres nasais, seguidos das máscaras de Venturi e faciais. No caso da máscara de Venturi, esta foi utilizada em apenas 1,9% da amostra estudada, resultado que difere dos estudos citados.1818. Taquary SAS, Ataíde DS, Vitorino PVO. Perfil clínico e atuação fisioterapêutica em pacientes atendidos na emergência pediátrica de um hospital público de Goiás. Fisioter Pesqui 2013;20(3):262-7.,2626. Neves JT, Lobão MJ, GRUPO EMO. Estudo multicêntrico de oxigenoterapia: uma auditoria nacional aos procedimentos de oxigenoterapia em enfermarias de medicina interna. Rev Port Pneumol 2012;18(2):80-5. Tal resultado pode ser atribuído aos diferentes contextos de realização das pesquisas com essa temática. Esses resultados podem ser atribuídos aos fluxos necessários para cada tipo de dispositivo, visto que em um ambiente de clínica médica os idosos já estão clinicamente estáveis, assim, sua demanda será, na grande maioria, de baixos fluxos de oxigênio ofertados pelos cateteres nasais. Para este estudo, foram avaliados os tipos de dispositivos e os fluxos ofertados, porém, as indicações não foram avaliadas devido à heterogeneidade dos diagnósticos e perfil dos idosos.
A documentação das prescrições foi analisada, 42,3% não haviam sido documentadas em prontuários e/ou folhas de prescrições, 26,9% das prescrições não determinaram a dose e 30,8% determinaram. A monitorização foi presente em 76,9%. Tal achado merece um olhar crítico quanto à relevância e aos potenciais danos desse tipo de tratamento quando utilizado sem parâmetros prescritos, de forma que toda a equipe esteja ciente. Estudo multicêntrico realizado em Portugal detectou que 6,6% dos pacientes não apresentaram prescrição documentada da OI e 17,6% das prescrições não apresentaram dose fixa, além disso, a monitorização foi ausente em 70,9% nos casos de prescrição por dose fixa.2626. Neves JT, Lobão MJ, GRUPO EMO. Estudo multicêntrico de oxigenoterapia: uma auditoria nacional aos procedimentos de oxigenoterapia em enfermarias de medicina interna. Rev Port Pneumol 2012;18(2):80-5. A importância da monitorização está no acompanhamento dos parâmetros para modificação e suspensão da OI, visto que essa terapia apresenta benefícios e malefícios quando aplicada sem acompanhamento.1919. Mendes TAB, Andreoli PBA, Cavalheiro LV, Talerman C, Laselva C. Adequação do uso do oxigênio por meio da oximetria de pulso: um processo importante de segurança do paciente. Einstein 2010;8(4):449-55.
Outros estudos internacionais que levantaram auditorias para a avaliação da oxigenoterapia também constataram que a minoria dos pacientes apresentava prescrição documentada desta terapia e, quando havia a prescrição, esta não era apropriada e com parâmetros estabelecidos.2525. Meyhoff CS, Staehr AK, Rasmussen LS. Rational use of oxygen in medical disease and anesthesia. Curr Opin Anesthesiol 2012;25(3):363-70.,2626. Neves JT, Lobão MJ, GRUPO EMO. Estudo multicêntrico de oxigenoterapia: uma auditoria nacional aos procedimentos de oxigenoterapia em enfermarias de medicina interna. Rev Port Pneumol 2012;18(2):80-5.
Além disso, foram observadas deficiências na monitorização e no controle dessa terapia, motivando a elaboração de ações educativas na área, as quais resultaram na melhoria da qualidade das prescrições e da monitorização.2525. Meyhoff CS, Staehr AK, Rasmussen LS. Rational use of oxygen in medical disease and anesthesia. Curr Opin Anesthesiol 2012;25(3):363-70.,2626. Neves JT, Lobão MJ, GRUPO EMO. Estudo multicêntrico de oxigenoterapia: uma auditoria nacional aos procedimentos de oxigenoterapia em enfermarias de medicina interna. Rev Port Pneumol 2012;18(2):80-5.
Tão importante quanto à educação da equipe de saúde é a educação dos acompanhantes. Observou-se que a maioria deles não sabia o que era aquele dispositivo, mas sabia para quê era utilizado. Parte dos acompanhantes (27,3%) relatou já ter alterado, removido ou colocado os dispositivos de oferta de oxigênio por diversos motivos, entre eles o desconforto do paciente e para realizar as refeições. Tal resultado aponta para a necessidade de ações de educação em saúde direcionada para esse público, visto a importância da correta administração de oxigênio ao paciente idoso. A presença do acompanhante durante a internação hospitalar é um direito do idoso, sendo que o acompanhante assume um papel de co-cuidador nesse ambiente, em parceria com a equipe de saúde.2727. Xavier MLF, Alvim NAT. Saberes e práticas de acompanhantes sobre complicações respiratórias pós-cirúrgicas no idoso, compartilhados com a enfermeira. Esc Anna Nery Rev Enferm 2012;16(3):553-60.,2828. Teixeira LS, Vieira MA, Andrade JMO, Mendes DC. O idoso hospitalizado: atuação do acompanhante e expectativas da equipe de enfermagem. Ciênc Cuid Saúde 2013;12(2):266-73. Assim é de extrema relevância conhecer os saberes e práticas dos acompanhantes, visto que são parceiros no cuidado com o idoso também no âmbito hospitalar.2828. Teixeira LS, Vieira MA, Andrade JMO, Mendes DC. O idoso hospitalizado: atuação do acompanhante e expectativas da equipe de enfermagem. Ciênc Cuid Saúde 2013;12(2):266-73.,2929. Brasil. Portaria n. 280, de 7 de abril de 1999. Torna obrigatórios os meios que viabilizem a permanência do acompanhante do idoso hospitalizado. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 1999.
Apesar da pequena amostra e da limitação em um único setor de um hospital público, os resultados da presente pesquisa identificaram características relevantes da aplicação da OI em idosos, bem como o conhecimento dos acompanhantes, possibilitando a formulação de estratégias em relação à OI voltadas para esse perfil.
CONCLUSÃO
O presente estudo demonstrou como características do tratamento com oxigenoterapia inalatória no grupo de idosos hospitalizados, o uso do cateter nasal, parte expressiva sem prescrição documentada. Os acompanhantes demonstraram não saber o que era o dispositivo de oferta de oxigênio e parte deles relatou já ter alterado, retirado ou colocado o dispositivo de oferta de oxigênio em uso pelo idoso.
Em uma perspectiva de cuidados ao idoso hospitalizado, o presente estudo mostrou características relevantes da aplicação da oxigenoterapia inalatória em idosos internados em um hospital público, bem como identificou a necessidade de padronização das indicações, prescrições e monitorização dos idosos em oxigenoterapia inalatória com medidas para a educação da equipe de saúde e dos acompanhantes.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Mar-Apr 2016
Histórico
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Recebido
28 Out 2014 -
Revisado
09 Out 2015 -
Aceito
09 Nov 2015