Open-access Fatores associados à condição de acamado em idosos brasileiros: resultado da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013

Resumo

Objetivo  Identificar os fatores associados à condição de acamado entre idosos brasileiros, analisando-se condições socioeconômicas e de saúde e utilização de serviços de saúde.

Método  Estudo transversal com dados secundários provenientes da Pesquisa Nacional de Saúde (2013). Contou com a população de indivíduos com ≥60 anos (n=11.177). A condição de acamado foi considerada variável dependente e as características sociodemográficas, condições de saúde e utilização de serviços médicos como independentes. Foram realizadas análises de regressão logística, e reportada a razão de chance bruta (RCbruta) e ajustada (RCajustada) com o intervalo de confiança de 95% (IC95%).

Resultados  Verificou-se que 4,9% dos idosos eram acamados. Essa condição mostrou-se associada ao sexo masculino (RCajustada=1,45; IC95%=1,13-1,84), analfabetismo (RCajustada=1,37; IC95%=1,11-1,70) e quantidade de doenças crônicas, sendo idoso com cinco ou mais doenças crônicas apresentava 4,96 (IC95%=2,78-8,85) mais chances do que os sem doença. As doenças associadas à condição acamado foram: episódio de acidente vascular cerebral (RCajustada=3,03; IC95%=1,29-8,43), diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica (RCajustada=1,71; IC95%=1,31-2,24), alterações nos níveis de colesterol (RCajustada=2,08; IC95%=1,37-3,17) e depressão (RCajustada=5,64; IC95%=2,42-13,14). Ainda, idosos que precisaram de atendimento relacionado à própria saúde (RCajustada=16,94; IC95%=7,15-40,16), internamento (RCajustada=8,10; IC95%=4,20-15,54) e atendimento emergencial no domicílio nos últimos 12 meses (RCajustada=1,78; IC95%=4,20-15,54) e que consideraram a condição de saúde geral ruim (RCajustada=2,68; IC95%=2,05-3,51) apresentaram mais chances de ser acamado.

Conclusão  o estudo permitiu identificar importantes fatores associados à condição acamado de idosos brasileiros com destaque para sexo e escolaridade, as variáveis clínicas de doenças crônicas, e utilização mais frequente de serviços de saúde.

Palavras-Chave: Idoso; Pessoas Acamadas; Indicadores Básicos de Saúde; Enfermagem Geriátrica

Abstract

Objective  to identify the factors associated to bedridden condition among Brazilian old people, analyzing socioeconomic and health conditions and the use of health services.

Method  cross-sectional study, with secondary data from National Health Survey (2013). It counted on the population of individuals ≥60 aged (n=11.177). The bedridden condition was considered a dependent variable and the sociodemographic characteristics, health conditions and use of medical services as independent. Crude and adjusted logistic regression analyses were performed and reported crude and Adjusted Odds Ratio (ORadjusted), with 95% confidence interval (95%CI).

Results  It was found that 4.9% of the old people were bedridden. This condition was shown to be associated to male gender (ORadjusted=1.45; 95%CI= 1.13-1.84), illiteracy (ORadjusted=1.37 95%CI= 1.11-1.70) and number of chronic diseases, old people who had five chronic diseases were 4.96 (95%CI=2.78-8.85) times more likely than those without disease. The diseases associated to bedridden condition were stroke episode (ORadjusted=3.03; 95%CI=1.29-8.43), diagnosis of systemic arterial hypertension (ORadjusted=1.71; 95%CI=1.31-2.24), changes in cholesterol levels (ORadjusted=2.08; CI95%= 1.37-3.17) and depression (ORadjusted=5.64; 95%CI=2.42-13.14). Still, old people who needed care related to their own health (OR=16.94; 95%CI=7.15-40.16), hospitalization (ORadjusted=8.10; 95%CI=4.20-15.54) and emergency home care in the last 12 months (ORadjusted=1.78; 95%CI=1.25-2.55) and who considered the condition of poor general health (ORadjusted=2.68; 95%CI=2.05-3.51) were more likely to be bedridden.

Conclusion  This study allowed the identification of important factors associated with the bedridden condition of Brazilian old people, with emphasis on gender and education, the clinical variables of chronic diseases, and the more frequent use of health services.

Keywords Aged; Bedridden Persons; Health Status Indicators; Geriatric Nursing

INTRODUÇÃO

O acelerado envelhecimento da população acarreta desafios aos sistemas de saúde, uma vez que os idosos apresentam elevada prevalência de doenças crônicas, as quais podem evoluir para declínio da capacidade funcional e cognitiva. Nessa conjuntura, espera-se o aumento de idosos na condição de acamados e com elevado grau de dependência1. De característica frequentemente progressiva e gravidade variável, o comprometimento da mobilidade no idoso tem origem multifatorial, predominando as alterações neurológicas e musculoesqueléticas2, bem como a presença de doenças e o processo de hospitalização3.

Conceitualmente, o paciente acamado caracteriza-se por estar impossibilitado de exercer o autocuidado, seja de forma parcial ou total, requerendo auxílio para realização das atividades de vida diária4. Além dos prejuízos funcionais a diversos sistemas fisiológicos, a restrição ao leito pode favorecer alterações do estado emocional, manifestada por crises de ansiedade, apatia, depressão e isolamento social4. Estima-se que 30 a 40% dos idosos internados, independentemente da causa de internação, desenvolvem algum tipo de imobilidade após a hospitalização5.

A condição acamado no idoso é um fator importante a ser avaliado e monitorado pela equipe multiprofissional de saúde. Ademais, as intervenções relacionadas à prevenção e ao cuidado são eficazes e podem reduzir significativamente a incidência de complicações oriundas dessa condição1,4. Vale destacar, que a discussão acerca da condição acamado e os fatores associados que tenha abrangência nacional é temática inédita no Brasil e configura-se um diferencial. Diante do exposto, o presente estudo objetivou identificar os fatores associados à condição de acamado entre idosos brasileiros, analisando-se condições socioeconômicas, de saúde e utilização de serviços de saúde.

MÉTODO

Trata-se de um estudo com dados secundários provenientes do último inquérito base populacional, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS-2013), realizado em todo o território brasileiro6. A PNS-2013 trata-se de um estudo transversal, quantitativo, de base populacional, realizado em nível nacional, proposto pelo Ministério da Saúde e conduzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O plano amostral utilizado pela PNS contou com uma amostragem probabilística por conglomerados em três estágios, sendo o conjunto de setores censitários as unidades primárias de amostragem, os domicílios as unidades secundárias e os moradores maiores de idade selecionados, as unidades terciárias. O tamanho da amostra foi definido considerando o nível de precisão desejado para as estimativas de alguns indicadores de interesse, resultando na investigação de 64.348 domicílios, destes foram selecionados 60.202 moradores para entrevista individual.

A coleta de dados foi realizada no interstício de agosto de 2013 a fevereiro de 2014 por pesquisadores treinados, conduzida por três questionários referentes: ao domicílio, aos moradores e ao indivíduo. Os instrumentos incluem temas relacionados à percepção do estado de saúde, fatores de risco e proteção, doenças crônicas, saúde do idoso, dentre outros. Detalhes sobre o processo de amostragem, coleta de dados e questionários estão disponíveis no site do IBGE e no relatório da PNS-20136,7. Vale destacar que o referido inquérito foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa para Seres Humanos, do Ministério da Saúde, sob o Parecer no 328.159/2013, e os dados foram disponibilizados de maneira pública e gratuita (https://www.pns.icict.fiocruz.br/).

No presente estudo foram utilizadas apenas as informações dos indivíduos com idade ≥60 anos, que responderam ao questionário do indivíduo, resultando em uma amostra final de 11.177 sujeitos. Os dados da PNS-2013 foram angariados no site supracitado. Todas as variáveis passaram por tratamento, as numéricas foram transformadas em categóricas, algumas variáveis foram recategorizadas, e outras dicotomizadas conforme o preconizado na literatura. Na sequência são expostas as variáveis, consideradas no estudo, e as categorias formadas.

A variável dependente Acamado é resultante da questão: Nas duas últimas semanas esteve acamado(a)? tendo como respostas sim e não.

As variáveis independentes referiram-se às:

  • Características sociodemográficas: sexo (feminino e masculino); idade, seguiu a categorização conforme preconizado por Morais et al.,8 em seu instrumento que avalia condição clínico funcional do idoso (60 a 74 anos, 75 a 84 anos, ≥85 anos); cor da pele (branca, preta, parda, outras); convivência com o cônjuge (sim e não); estado civil (casado, separado/divorciado, viúvo, solteiro) alfabetizado (sim e não); formação (alfabetização, fundamental, médio, graduação); e renda, sendo categorizada conforme valor de salários mínimos na época do estudo (até 680 Reais, 681>1.320 reais, 1.321>2.640 reais, mais de 2.641 reais).

  • Condição saúde: autopercepção da condição de saúde geral (positiva, negativa); doenças crônicas, sendo sua categorização classificada segundo frequência do número de doenças, agrupando-se a partir de cinco doenças apresentar um frequência mais reduzida (nenhuma, uma, duas, três, quatro, cinco ou mais); diagnóstico de: depressão; hipertensão arterial sistêmica; diabetes mellitus; artrite reumatoide; problema coluna vertebral; doença pulmonar obstrutivo crônica; lesão por esforço repetitivo; hipercolesterolemia; lesão por esforço repetitivo; câncer e episódio prévio de acidente vascular cerebral, bem como tabagismo e etilismo foram todas dicotomizadas em sim e não.

  • Utilização de serviços médicos: frequência de consulta médica no último ano (variável numérica categorizada em até três consultas e quatro ou mais consultas) essa classificação seguiu o desenvolvido no estudo de Meier et al.,9 onde cita que a categorização seguiu documento do ministério da saúde, que prevê no ano 3 consultas na atenção primária e 1 consulta na atenção secundária; internação hospitalar nos últimos 12 meses (não, sim); tempo de internamento em dias (variável numérica categorizada em até três dias; quatro ou mais dias); no último atendimento foram receitados medicamentos (não, sim); atendimento de emergência no domicílio nos últimos 12 meses (não, sim); busca nas últimas duas semanas por atendimento de saúde (não, sim). Os dados perdidos foram contabilizados nas tabelas descritivas como não informado e não fizeram parte dos testes estatísticos.

Os resultados foram analisados descritivamente por meio de frequência absoluta e relativa. Para testar a associação entre a variável dependente e as variáveis independentes, realizou-se inicialmente análise bivariada pelo teste qui-quadrado. Na sequência, realizou-se análise de regressão logística pelo método de entrada stepwise, com base no valor de verossimilhança. As variáveis que apresentaram valor de p≤0,20 na análise bivariada foram selecionadas para entrar no modelo múltiplo, permanecendo nos modelos se atingissem p<0,05 e/ou ajustassem o modelo. Na sequência realizou-se ajuste do modelo, segundo as variáveis que mostraram associação com a variável dependente: busca nas últimas duas semanas por atendimento de saúde X internação; busca nas últimas duas semanas por atendimento de saúde X acidente vascular encefálico; diagnóstico de depressão X sexo; diagnóstico de hipertensão X diagnóstico de colesterol. O modelo gerou uma capacidade explicativa de 95,1% na análise bruta e ajustada.

RESULTADOS

Verificou-se que dos 11.177 idosos que compuseram a amostra 4,9% (n=549) apresentou a condição de acamado no momento da entrevista. Prevaleceu na amostra homens, idade entre 60 a 74 anos, cor branca, não convive com cônjuge, estado civil casado, alfabetizado, baixa escolaridade e renda inferior a seiscentos e oitenta reais. Dentre as características sociodemográficas, constatou-se associação com condição de acamado: sexo, idade, convivência com o cônjuge e ser alfabetizado (p<0,05) (Tabela 1).

Tabela 1
Perfil sociodemográfico de idosos brasileiros, segundo condição de acamado (n=11177). Brasil, 2013.

Já no que tange à condição de saúde dos idosos brasileiros, esteve associada à condição de acamado: autopercepção de saúde geral, número de doenças crônicas, diagnóstico de depressão, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, artrite reumatoide, problema coluna vertebral, doença pulmonar obstrutivo crônica, hipercolesterolemia, lesão por esforço repetitivo, câncer e episódio prévio de acidente vascular cerebral (p<0,05). Ainda, o tabagismo e o etilismo mostraram-se associados à condição de acamado (p<0,05) (Tabela 2).

Tabela 2
Condição saúde de idosos brasileiros, segundo condição de acamado. (n=11177). Brasil. 2013.

Quanto à utilização de serviços de saúde, expostos na Tabela 3, todas as variáveis investigadas mostraram associação com a condição de acamado (p<0,05), denotando maior usufruto desses serviços por idosos que se apresentavam acamados.

Tabela 3
Utilização de serviços de saúde por idosos brasileiros, segundo condição de acamado. (n=11177). Brasil. 2013.

Na Tabela 4 verificou-se que idosos do sexo masculino e analfabetos apresentavam 1,45 e 1,37, respectivamente mais chances de vivenciar a condição de acamado do que mulheres e alfabetizados. O número de doença crônicas foi um quesito contribuinte para o idoso apresentar-se acamado. Idosos com uma doença crônica apresentam 2,04 mais chances de ser acamado, enquanto um idoso que apresentava cinco doenças crônicas apresentavam 4,96. Vivenciar episódio de acidente vascular encefálico (AVE), ter o diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica (HAS) e alterações nos níveis de colesterol também elevaram as chances do idoso ser acamado.

Ainda, idosos que precisaram de algum atendimento relacionado à própria saúde considerando as duas semanas antecedentes à coleta de dados apresentaram mais chances de ser acamado, assim como aqueles que estiveram internados e requereram atendimento emergencial no domicílio nos últimos 12 meses. A condição de saúde geral considerada ruim e o diagnóstico de depressão também foram fatores associados à condição de acamado junto ao idoso (Tabela 4).

Tabela 4
Modelo final bruto e ajustado da condição de acamado. (n=11177). Brasil. 2013.

DISCUSSÃO

O presente estudo, que avaliou a prevalência da condição de acamado em idosos e seus fatores associados, constatou que aproximadamente 5% dos idosos investigados encontravam-se nessa condição. E que indivíduos do sexo masculino, analfabeto, com multimorbidade, episódios de acidente vascular cerebral, diagnóstico de HAS e hipercolesterolemia demonstraram mais chances de apresentar-se acamado. Assim como aqueles que buscaram nas últimas duas semanas por atendimento de saúde, necessitaram de internação hospitalar e atendimento de emergência no domicílio nos últimos 12 meses, que dispunham de autopercepção negativa de saúde geral e depressão.

Ressalta-se que na literatura não há estudos de abrangência nacional, com idosos residentes em âmbito domiciliar, que referem a prevalência da condição de acamado para efeito de comparação dos achados do presente estudo. Contudo, estudo realizado em instituições de longa permanência para idosos encontrou uma prevalência de 24% de acamados1.

Embora a prevalência da condição de acamado, se comparado a outros agravos que acometem a população idosa, seja baixa, é uma complicação que infere em importante impacto social, econômico e familiar10. A imobilidade associada ao período prolongado em repouso no leito pode desencadear diversas complicações à saúde, além de acarretar problemas com as atividades habituais, mobilidade e autocuidado das pessoas11. Nos indivíduos idosos, essas complicações somadas as alterações do próprio processo de envelhecimento podem gerar complicações ainda maiores3.

Os sistemas cardiovascular, pulmonar, gastrointestinal, musculoesquelético e urinário são os mais atingidos, sendo que o prolongado período em repouso no leito favorece o desenvolvimento de doenças que atingiram esses sistemas, como trombose venosa profunda12, lesão por pressão13, pneumonia14 e infecção do trato urinário15. Deste modo, idosos acamados requerem cuidados em saúde de forma contínua e sistematizada, um cuidador deve estar atento a alguns sinais e sintomas que pode significar algum agravo à saúde do idoso.

Quanto aos fatores associados à condição de acamado, verificou-se que idosos homens apresentavam maiores chances de ser acamado. Esse fato pode ser resultante da menor procura por serviços de saúde pelos homens em detrimento as mulheres, assim como menor cuidados preventivos prestados a sua própria saúde e exposição maior a fatores de risco ao longo da vida16.

Contatou-se, também, que idosos analfabetos apresentavam maiores chances ser acamado, em detrimento aos alfabetizados. Estudos coadunam com os achados de estudos anteriores17,18 e demonstram que indivíduos com baixo nível de escolaridade apresentam mais chances de apresentar doenças e incapacidades, devido à limitação do acesso à informação em saúde. O analfabetismo tem uma carga cumulativa, visto que reflete, ao longo da vida, em menor autocuidado e autopercepção sobre seu estado de saúde e na compreensão acerca das doenças, inferindo, por consequência, em menor busca à serviços de saúde, diagnósticos tardios e tratamento em tempo oportuno, potencializando o agravamento das doenças e resultado em limitações de maior gravidade, como a condição de acamado19. Além disso, analfabetos apresentam determinantes sociais de saúde mais desfavoráveis, condição que igualmente fragiliza o indivíduo19 e aumenta as chances de ser acamado.

A qualidade de vida do idoso pode ser comprometida com o aparecimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), tais enfermidades podem ser responsáveis pelo o que é definido como incapacidade funcional do idoso, ou seja, afetando a funcionalidade e a independência desses indivíduos, de forma temporária ou permanente20, conforme observado no presente estudo. Ademais, quanto maior o número de doenças crônicas maior a chance de incapacidade desse indivíduo, uma vez que as DCNT podem desencadear outras complicações e, por consequência, potencializa-se a necessidade de procura por atendimento médico, hospitalizações, capacidade funcional reduzida e mortalidade18,21,22.

O aumento gradual das chances de ser acamado de acordo com o crescente número de doenças crônicas encontrado no presente estudo pode ser explicado sob dois prismas: causa e consequência. “Causa” porque, com o aumento do número de DCNT, as fragilidades no idoso também aumentam pela perda contínua das funções dos órgãos e sistema biológico; e “consequência” porque a condição de acamado debilita o funcionamento do organismo e aumenta as chances de dispor de novos agravos, sendo essas atreladas ao tempo em que o indivíduo encontra-se nessa condição23.

O AVE está entre as doenças mais comuns de mortes e incapacidade permanente24, podendo resultar na condição de acamado. Dentre as principais consequências do AVE, podem ser observadas: as alterações cognitivas, motoras, emocionais, problemas de memória, na fala atenção, linguagem e comprometimentos nas funções executivas24, fatores que comprometem a qualidade de vida do idoso e de sua família.

Estudos demonstram que a HAS e a hipercolesterolemia estão presentes na maioria da população de idosos, e acabam tornando-se uma das principais causas para o desenvolvimento de outras complicações, esteja ela associada ou não à outra doença23,2527 . A HAS e o colesterol elevado podem desencadear comprometimento cardíaco, renal, vasculares periférica e cerebral, levando a um comprometimento da qualidade de vida, acarretando no idoso uma incapacidade em realizar suas atividades devido a complicações neurológicos e motoras23,2527, condição que explica a associação encontradas entre as DCNT, HAS, hipercolesterolemia e ser acamado.

A pesquisa transversal realizada com idosos japoneses com objetivo de testar a hipótese de que um aumento na diferença da pressão arterial sistólica entre os braços estaria associado à redução da atividade física em idosos, constatou que idosos acamados apresentaram diferença da pressão arterial sistólica entre os braços em detrimento aos idosos ambulantes e cadeirantes26. Ainda, que a falta de realização de atividade física, por parte dos acamados, pode ser um fator preditivo para elevar a pressão arterial.

Condição semelhante foi observada no que tange à relação encontrada entre condição de acamado e hipercolesterolemia, um estudo que analisou amostras de sangue em jejum pacientes acamados clinicamente estáveis sob cuidados prolongados e sedentários normolipidêmicos, concluiu que a inatividade tem grande impacto na redução dos níveis séricos de HDL e elevação da concentração de lipídios28.

Ainda, outra doença crônica que se mostrou associada à mobilidade restrita ao leito foi a depressão, que pode ser ocasionada por diversos fatores, como luto, abandono, doenças incapacitantes, entre outras29. O distúrbio depressivo faz com que o idoso não realize o autocuidado, não se alimentando de forma adequada e permaneça por mais tempo no leito, potencializando seu grau de fragilidade tendo mais chances de se tornar acamado30. Porém, o contrário também acontece, uma vez que neste estudo, mostrou-se que o número de idosos acamados com depressão tem uma razão de chance de acontecer de 2,13, uma vez que a perda da capacidade funcional, o aparecimento de DCNT, o uso de medicamentos, podem fazer com que esse idoso se sinta inútil levando-o a desenvolver esses distúrbios29,30.

Verificou-se, também, no presente estudo que idosos acamados requerem maior necessidade de atendimento relacionado à saúde, seja ele por um atendimento ambulatorial, internamento, ou atendimentos de urgência e emergências em detrimento a idosos com mobilidade, uma vez que a condição de acamado, por si só denota maiores cuidados em saúde com o indivíduo, visto que sua saúde encontra-se em um maior nível de fragilidade, conforme exposto acima. E ainda acaba sendo um fator de risco para o aparecimento de complicações e agravos à saúde, tais como desenvolvimento de lesão por pressão, piora na condição respiratória, ansiedade e infecções, isolamento social, depressão, internação hospitalar, que quando se trata de idoso o período de internação pode ser ainda maior, por se tratar de um indivíduo mais frágil onde o desfecho pode ser a morte23.

Quando se fala em percepção de saúde, observa-se que ter uma percepção ruim sobre a saúde eleva a chance do idoso ser acamado. A condição que o idoso se encontra com presença de doenças crônicas, impedidos de realizar suas atividades, faz com que o idoso avalie sua saúde como condição ruim. A presença de doenças modifica a qualidade de vida o que leva a percepção negativa da saúde31. A autopercepção de acamado, acaba gerando certo tipo de insegurança, uma vez que ele necessita de cuidados e atenção sejam eles básicos ou mais complexos, o que faz com esse idoso enxergue sua vida como um peso na vida de um familiar ou cuidador32. Dessa forma, esse idoso acaba perdendo a vontade de se relacionar mantendo um isolamento social, o que faz com que ocorra ainda mais o declínio de sua saúde, aumente sua dependência e com isso aparecimento de novas complicações, como hospitalizações, depressão, e até mesmo levar a morte31.

Tem-se como limitação do estudo o uso de dados secundários de pesquisa transversal, que inviabiliza analisar causa e efeito e o tempo transcorrido da coleta desses dados. Contudo, os dados foram provenientes de uma pesquisa com grande rigor metodológico e de qualidade. Além disso, vale destacar o número restrito de estudos, na literatura nacional e internacional recente, que aborde prevalência e fatores associados à própria temática da condição de acamado, dificultando a comparação dos achados. Porém, ressalta-se a importância da realização de estudos que abordem essa condição, visto que o número de idosos encontra-se em crescimento, tanto em âmbito nacional como mundial. Os achados do presente estudo poderão subsidiar o planejamento dos cuidados gerontológicos voltados às necessidades específicas desse segmento etário, considerando um envelhecimento ativo e saudável e proporcionando melhor qualidade de vida aos idosos.

CONCLUSÃO

Conclui-se que a prevalência da condição de acamado em idosos brasileiros é baixa, se comparada com outros agravos em saúde, e que esteve associada a condições sociodemográficas, sexo masculino e analfabetismo; e ainda a condições de saúde expressas pela presença de doenças crônicas não transmissíveis, com predileção maior pelo acidente vascular encefálico, hipertensão arterial sistêmica, alterações nos níveis de colesterol, depressão e pior percepção de saúde. Já no que tange à utilização de serviços de saúde, demonstrou-se associada à busca recente de serviços de saúde, internamentos e atendimentos domiciliares emergenciais.

  • Financiamento da pesquisa: Não houve financiamento na execução deste trabalho.

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Editado por

  • Editado por: Daniel Gomes da Silva Machado

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    13 Mar 2020
  • Aceito
    08 Out 2020
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