Resumo
Objetivo Verificar se o risco de sarcopenia em pessoas idosas diagnosticadas com covid-19 associa-se com demanda por cuidados intensivos, ventilação mecânica e óbito.
Método Estudo multicêntrico do tipo coorte, que incluiu pessoas idosas (≥65 anos) com diagnóstico laboratorial confirmado de covid-19. Foram coletados dados relacionados às características sociodemográficas, clínicas e nutricionais. O risco de sarcopenia foi avaliado pelo questionário Sarcopenia Risk Screening. As variáveis de desfecho foram: necessidade de terapia intensiva, ventilação mecânica e óbito. Foram realizadas regressões logísticas para verificar a associação dos desfechos clínicos e o risco de sarcopenia, com as seguintes variáveis de ajuste: idade, sexo, renda familiar, atividade física, hipertensão, diabetes, doença cardiovascular doença pulmonar obstrutiva crônica e índice de massa corporal.
Resultados Foram incluídas no estudo 264 pessoas idosas com covid-19, com média de idade de 71,7 (±8,2) anos. Cento e quarenta e oito pessoas idosas (56,1%) tinham risco de sarcopenia. Hipertensão, diabetes e doença cardiovascular foram as principais comorbidades identificadas nas pessoas idosas, respectivamente, 75,4%, 45,5% e 28,4%. O risco de sarcopenia nas pessoas idosas hospitalizadas com covid-19 aumentou em mais de 2 vezes as chances de internamento na UTI (OR: 2,71 [1,57;4,68], p<0,001), em cerca de 5 vezes as chances de ventilação mecânica (OR: 5,19 [2,75;9,78], p<0,001) e em mais de 3 vezes as chances de óbito (OR: 4,05 [2,05;7,98], p<0,001).
Conclusão Em pessoas idosas hospitalizadas com covid-19, a pré-existência do risco de sarcopenia foi preditor de desfechos clínicos desfavoráveis.
Palavras-Chave: SARS-CoV-2; Envelhecimento; Ventilação Mecânica; Força Muscular; Mortalidade
Abstract
Objective To investigate whether the risk of sarcopenia in older adults diagnosed with covid-19 is associated with the need for intensive care, mechanical ventilation, and mortality.
Method A multicenter cohort study was conducted, including older adults (≥65 years) with laboratory-confirmed covid-19 diagnosis. Data related to sociodemographic, clinical, and nutritional characteristics were collected. The risk of sarcopenia was assessed using the Sarcopenia Risk Screening questionnaire. Outcome variables included the need for intensive care, mechanical ventilation, and mortality. Logistic regressions were performed to assess the association between clinical outcomes and the risk of sarcopenia, adjusting for the following variables: age, gender, family income, physical activity, hypertension, diabetes, cardiovascular disease, chronic obstructive pulmonary disease, and body mass index.
Results The study included 264 older adults with covid-19, with an average age of 71.7 (±8.2) years. One hundred and forty-eight older adults (56.1%) were at risk of sarcopenia. Hypertension, diabetes, and cardiovascular disease were the most common comorbidities identified in older adults, at 75.4%, 45.5%, and 28.4%, respectively. The presence of sarcopenia risk in hospitalized older adults with covid-19 increased the odds of ICU admission by more than 2-fold (OR: 2.71 [1.57; 4.68], p<0.001), nearly 5-fold for mechanical ventilation (OR: 5.19 [2.75; 9.78], p<0.001), and over 3-fold for mortality (OR: 4.05 [2.05; 7.98], p<0.001).
Conclusion In hospitalized older adults with covid-19, pre-existing risk of sarcopenia was a predictor of unfavorable clinical outcomes.
Keywords SARS-CoV-2; Aging; Respiration; Artificial; Muscle Strength; Mortality
INTRODUÇÃO
A idade é um dos fatores de risco mais significativos para a infecção grave causada pelo SARS-CoV-2 e seus resultados adversos à saúde1. A redução da resposta imune decorrente do envelhecimento pode predispor as pessoas idosas a complicações causadas pela infecção viral. A imunossenescência se manifesta com perda de células T virgens e da funcionalidade de células efetoras, diminuição da proliferação de linfócitos e produção de citocinas desreguladas1-3. A presença de comorbidades, como hipertensão, diabetes, câncer e doenças cardiovasculares, e o estado funcional também são fatores que podem contribuir com a gravidade da doença e mortalidade na população idosa1,3.
A deterioração da massa e função muscular que ocorre em pessoas idosas contribui para o comprometimento da função respiratória em pacientes acometidos pela covid-194. A sarcopenia, definida pela baixa força muscular associada a baixa qualidade/quantidade muscular, está associada a maiores riscos de resultados adversos na faixa etária acima de 60 anos, como quedas, fraturas, deficiência física e mortalidade5.
O quadro de inflamação sistêmica presente na sarcopenia somado àquele decorrente da infecção pelo coronavírus pode provocar na pessoa idosa um quadro inflamatório de alta intensidade. Destaca-se que o próprio envelhecimento está relacionado com a senescência celular, aumentando ainda mais a secreção de citocinas inflamatórias3,6. A relação entre idade, perda de força muscular e covid-19 parece conduzir as pessoas idosas e sarcopênicos a piores desfechos clínicos, como aumento do tempo de internação hospitalar, necessidade de terapia intensiva, maior risco de infecções e aumento da mortalidade6,7.
O diagnóstico de sarcopenia requer instrumentos e métodos que são de alto custo e muitas vezes não estão disponíveis em muitos hospitais brasileiros. No entanto, para triar o risco de sarcopenia e selecionar os indivíduos para diagnóstico é recomendado o uso da triagem de risco de sarcopenia, ou Sarcopenia Risk Screening (SARC-F)5,8. Esse é um método rápido, fácil de ser aplicado, podendo ser respondido pela própria pessoa idosa, possui alta especificidade e já foi associado a desfechos negativos como maior risco de hospitalização e morte8. Alguns estudos realizados demonstraram que o risco de sarcopenia, definido pelo SARC-F, relaciona-se com o desfecho de mortalidade e maior tempo de internação hospitalar em pessoas idosas hospitalizadas com covid-199,10. No entanto, tais estudos foram realizados em centro único e avaliaram apenas o desfecho mortalidade.
Com este estudo espera-se que o risco de sarcopenia seja precocemente identificado em pessoas idosas hospitalizadas, através de instrumento simples e de baixo custo, para que profissionais possam intervir diretamente no cuidado com esses pacientes, reduzindo possíveis complicações clínicas e fortalecendo o cuidado de saúde da pessoa idosa. Desta forma, o objetivo deste estudo foi verificar se o risco de sarcopenia em pessoas idosas hospitalizadas com covid-19 se associa com desfechos clínicos como demanda por cuidados intensivos, ventilação mecânica e óbito.
MÉTODO
Estudo multicêntrico do tipo coorte, integrante de um estudo maior denominado “Aspectos clínicos, nutricionais e sociodemográficos associados à mortalidade em pacientes com covid-19: um estudo multicêntrico no nordeste brasileiro”, realizado entre julho de 2020 e março de 2021. O estudo foi realizado no Brasil, na Região Nordeste, nos estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe. A elaboração deste artigo seguiu recomendações do checklist Strengthening the Reporting of Observational studies in Epidemiology (STROBE)11.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa dos diferentes centros colaboradores, com o seguinte número do parecer de aprovação 4314132. Os princípios da ética e bioética foram respeitados em todas as etapas do estudo, de acordo com a Resolução nº 466/2012 e a Resolução nº 510/2016. Todos os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
A amostra final deste estudo seguiu o plano amostral não probabilístico de conveniência, constituída por 264 pessoas idosas inseridas no estudo principal que tiveram todas as variáveis para rastreio de sarcopenia devidamente preenchidas no SARC-F. O estudo foi realizado em 14 hospitais localizados na região nordeste do Brasil, dos quais três eram unidades de saúde temporárias (hospitais de campanha), nove da rede pública e duas unidades filantrópicas.
Os critérios de inclusão neste estudo foram pessoas idosas com idade >65 anos, de ambos os sexos, hospitalizados nos serviços de saúde participantes desta pesquisa, com diagnóstico confirmado para covid-19 por meio de exames laboratoriais do tipo Reverse transcription polymerase chain reaction (RT-PCR); Point of care testing (POCT); Reverse transcription loop-mediated isothermal amplification (RT-LAMP) ou SARS-CoV-2 Antigen Test. Foram excluídas as pessoas idosas que não responderam ou não completaram o preenchimento do instrumento de triagem para o risco de sarcopenia ou que não possuíam registro de peso e altura.
Os dados foram coletados diretamente com os indivíduos participantes, retrospectivamente ou prospectivamente, a depender do momento da confirmação do diagnóstico de covid-19 laboratorialmente. Os participantes tiveram os dados coletados por profissionais de saúde dos serviços parceiros da pesquisa e foram acompanhados até o desfecho (óbito ou alta hospitalar). Os pacientes que, por qualquer motivo, tiveram o acompanhamento nesta pesquisa interrompido (exemplo: transferência para hospitais onde o acompanhamento na pesquisa não foi possível; ou solicitação de interrupção da sua participação na pesquisa) foram considerados como perda de seguimento e excluídos do estudo.
Após a inclusão dos participantes na pesquisa foram coletados, diretamente com os mesmos, através de formulário estruturado, dados demográficos e clínicos. Variáveis referente às características de identificação, sociodemográficas e econômicas, como: idade, sexo, etnia, estado civil, escolaridade, situação profissional e renda familiar foram utilizadas no estudo. A idade foi categorizada em duas classes, foram considerados longevos as pessoas idosas com idade >80 anos e não longevos aqueles com idade <80 anos.
Informações de estilo de vida, dados clínicos, como presença de comorbidades, etilismo, tabagismo, realização de atividade física, e risco de sarcopenia também foram variáveis coletadas. Os pacientes elegíveis para a pesquisa responderam se possuíam ou não diagnóstico de comorbidades como diabetes, hipertensão, doença cardiovascular, câncer, doença pulmonar obstrutiva crônica e doença renal em tratamento conservador ou hemodiálise. Da mesma forma, foi questionado sobre a ingestão de bebida alcóolica e o uso de cigarro. Sendo considerado como etilista aqueles que afirmaram fazer uso de bebida alcoólica ainda que raramente (1 vez/mês) e tabagista aqueles que relataram tal prática independente da frequência.
Quanto a atividade física, foram considerados fisicamente ativos as pessoas idosas que autorreferiram prática de atividade aeróbia de intensidade moderada pelo menos 30min/dia durante 5 dias na semana, ou atividades intensas por pelo menos 20min/dia, três vezes por semana, seguindo critérios da American College os Sports Medicine e da American Heart Association 12. O risco de sarcopenia foi identificado de acordo com a aplicação do SARC-F aplicado diretamente com a própria pessoa idosa, considerando as informações relativas ao período anterior à admissão hospitalar. Este instrumento de triagem de sarcopenia é composto por 5 itens relacionados a força, assistência para caminhar, levantar de uma cadeira, subir escadas e ocorrência de quedas. Para cada componente da avaliação há respostas que vão de 0 a 2 pontos, o risco de sarcopenia é considerado quando a pontuação do SARC-F é >4 pontos13.
Dados de peso e altura foram autorrelatados pelos pacientes no momento da admissão no estudo, a partir deles foi realizado o cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC) obtido através da razão entre peso e o quadrado da altura14. O IMC foi interpretado segundo classificação proposta por Lipschitz15, que classifica as pessoas idosas em: baixo peso (IMC <22 kg/m²), eutróficos (IMC de 22 a 27 kg/m²) e com excesso de peso (IMC >27 kg/m²).
As variáveis de desfechos consideradas neste estudo foram, internamento na unidade de terapia intensiva (UTI), ventilação mecânica e/ou óbito, identificados nos prontuários dos pacientes durante o acompanhamento nesta pesquisa.
Foram calculadas medidas de tendência central e dispersão para variáveis contínuas e verificadas as frequências para variáveis categóricas. O comportamento das variáveis foi verificado pelo teste de normalidade de Shapiro-Wilk.
Com o objetivo de orientar a seleção de variáveis incluídas no modelo multivariado foi projetado um gráfico acíclico direcionado (DAG). O mesmo ilustra os caminhos causais entre o risco de sarcopenia e os desfechos como necessidade de terapia intensiva, ventilação mecânica e óbito (Figura 1). O DAG foi desenvolvido com o auxílio do software DAGitty. Desta forma, o conjunto mínimo de variáveis para estimar esse efeito foi proposto por dois modelos. Sendo o Modelo 1 ajustado para as seguintes variáveis: idade, sexo, tabagismo, atividade física, doença cardiovascular, diabetes, hipertensão, doença pulmonar obstrutiva crônica e IMC. Já o Modelo 2 incluiu as variáveis: idade, sexo, renda familiar, tabagismo, doença cardiovascular, diabetes, hipertensão, doença pulmonar obstrutiva crônica e IMC. Assim, foram realizadas regressões logísticas para calcular o odds ratios nos quais as variáveis dependentes escolhidas foram internamento em UTI, óbito e ventilação mecânica, enquanto o risco de sarcopenia identificado com o SARC-F era a variável independente. As variáveis de ajuste usadas foram aquelas evidenciadas acima no Modelo 1 e Modelo 2. Para todas as análises foi adotado o valor de alfa de 5%.
Gráfico acíclico direcionado mostrando os caminhos entre o risco de sarcopenia e variáveis de desfechos. Os círculos indicam as variáveis incluídas no estudo e as setas indicam a relação causal entre elas. Região Nordeste, Brasil, 2020-2021.
DISPONIBILIDADE DE DADOS
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo está disponível mediante solicitação ao autor correspondente.
RESULTADOS
Inicialmente com recorte do banco principal havia 289 pessoas idosas (>65 anos) potencialmente elegíveis, no entanto, 25 foram excluídos por perda de seguimento, totalizando uma amostra final de 264 pessoas idosas.
A média de idade foi de 71,7 (±8,28) anos, sendo a maioria do sexo masculino (n=142; 53,8%) e aproximadamente um quarto de longevos (n=52; 19,7%). A maioria apresentou renda familiar menor ou igual a 2 salários mínimos brasileiros (n=178; 67,4%), mostrados na Tabela 1.
Características sociodemográficas e estilo de vida de pessoas idosas com covid-19 (N=264). Região Nordeste, Brasil, 2020-2021.
Hipertensão, diabetes e doença cardiovascular foram as principais comorbidades identificadas e estiveram presentes em 75,4% (n=199), 45,5% (n=120) e 28,4% (n=75) desses pacientes, respectivamente. Quanto à classificação do IMC, 42,0% das pessoas idosas (n=111) foram classificadas com excesso de peso e 15,5% (n=41) apresentavam baixo peso. O risco de sarcopenia esteve presente na maior parte dessa amostra (n=148; 56,1%) (Tabela 2).
Características clínicas e nutricionais de pessoas idosas com covid-19 (N=264). Região Nordeste, Brasil, 2020-2021.
Na análise univariada foi observado que o risco de sarcopenia nas pessoas idosas com covid-19 se relacionou com todos os desfechos estudados, internamento na UTI, ventilação mecânica e óbito (Tabela 3).
Análise univariada entre o risco de sarcopenia e desfechos clínicos em pessoas idosas com covid-19 (N=264). Região Nordeste, Brasil, 2020-2021.
Na análise multivariada, o risco de sarcopenia nas pessoas idosas hospitalizadas com covid-19 aumentou em mais de 2,5 vezes as chances de internamento na UTI (p<0,001), em aproximadamente 5 vezes as chances de ventilação mecânica (p<0,001) e em mais de 3,5 vezes as chances de óbito (p<0,001), nos dois modelos analisados (Tabela 4).
Análise multivariada entre o risco de sarcopenia e desfechos clínicos em pessoas idosas com covid-19 de acordo com modelos propostos pelo DAG. Região Nordeste, Brasil, 2020-2021.
DISCUSSÃO
Neste estudo ficou evidenciado que o risco de sarcopenia aumentou as chances de desfechos clínicos desfavoráveis, como internamento na UTI, demanda por ventilação mecânica e óbito, em pessoas idosas hospitalizadas com covid-19.
A sarcopenia é considerada uma síndrome geriátrica complexa com patogênese multifatorial e limitante à capacidade funcional da pessoa idosa. Essa síndrome está intimamente relacionada a senescência imunológica e consequente comprometimento da proliferação de células mononucleares periféricas, aumento da proporção de neutrófilos para linfócitos e homeostase danificada de linfócitos natural killer, implicando em ação deficiente do sistema imunológico, aumentando os riscos de complicações clínicas em pessoas idosas hospitalizadas pela infecção por SARS-CoV-216.
Além disso, a sarcopenia é caracterizada por um estado inflamatório principalmente no tecido muscular. A progressão da idade se relaciona com os fatores de risco determinantes para o surgimento do fenótipo sarcopênico, como alterações na composição corporal com maior infiltração de gordura nos músculos, alterações hormonais e aumento do estresso oxidativo com maior produção de espécies reativas de oxigênio, que se relacionam com aumento da proteólise e redução da síntese protéica17. Da mesma forma que, a ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis como hipertensão, diabetes e doenças cardiovasculares - pode predispor a alterações musculares devido aumento nos níveis dos mediadores inflamatórios e distúrbios na função mitocondrial17,18.
Aguiar et al.19, em estudo realizado em um estado do nordeste com adultos e pessoas idosas hospitalizados com covid-19, mostraram uma maior probabilidade de sarcopenia em pessoas idosas, não praticantes de atividade física, hipertensos, diabéticos e internados em unidade de terapia intensiva.
Corroborando com o presente estudo, Ma et al.20 encontraram resultado semelhante, ao mostrar que o risco de doença grave, em pessoas idosas com risco de sarcopenia, foi quase três vezes maior do que naqueles sem risco. Alterações fisiológicas decorrentes da sarcopenia, como o aumento de marcadores inflamatórios - fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), interleucina (IL)-6, IL-1 e proteína C reativa (PCR) – somado a tempestade de citocinas provocada pelo SARS-CoV-2, auxiliam na progressão e gravidade da covid-19 e consequentemente na ocorrência de complicações clínicas e maior mortalidade por essa causa16,21.
Ademais, o estudo realizado por Ufuk et al.22 mostrou que o baixo índice muscular peitoral, medida associada a sarcopenia, avaliada por tomografia computadorizada, foi um preditor de ventilação mecânica e óbito em pacientes adultos hospitalizados por covid-19. A perda de massa muscular provocada pela sarcopenia contribui diretamente com a insuficiência respiratória decorrente da covid-19, devido redução da espessura do músculo diafragmático, músculos peitorais e intercostais, tendo como consequência a necessidade de cuidados intensivos e ventilação mecânica prolongada7,23.
Em um estudo realizado em um hospital universitário do Brasil com pacientes adultos e pessoas idosas, foi possível observar que o risco de sarcopenia, avaliado pelo SARC-F, foi maior em pacientes que morreram em comparação com aqueles que receberam alta, corroborando com resultados mostrados nesta pesquisa24. Uma resposta imune ineficiente à infecção e a presença de um maior número de comorbidades pode estar relacionada ao maior risco de óbito nesses pacientes25. A imunosenescência, fenômeno típico do envelhecimento, somado com a perda de células musculares decorrente da sarcopenia, resulta em alterações do sistema imunológico e, consequentemente, maior dificuldade de combate a patógenos como o SARS-CoV-226,27.
Com a realização desta pesquisa fica claro, portanto, que o risco de sarcopenia em pessoas idosas é um fator adicional para doença grave causada pelo coronavírus. Desta forma, é essencial identificação das pessoas idosas com risco de sarcopenia e com covid-19, para que os cuidados sejam intensificados. Ademais, destaca-se que é fundamental o cuidado preventivo da sarcopenia nessa população, antes da infecção por SARS-CoV-2 ou qualquer outra doença infecciosa, por meio de intervenções nutricionais adequadas, prática de atividade física e adoção de hábitos de vida saudáveis com o objetivo da promoção do envelhecimento ativo e a independência funcional, reduzindo assim os riscos decorrentes da perda de massa e força muscular.
Algumas limitações podem ser apresentadas para este estudo, tal qual a avaliação nutricional através do autorrelato e registro em prontuário, e a ausência do diagnóstico de sarcopenia. A não avaliação de medidas antropométricas para classificação do estado nutricional foi adotada de acordo com a recomendação de protocolos nacionais e internacionais para evitar o risco de exposição à covid-19 pelos profissionais de saúde, além disso, em vários casos, não seria possível aferir medidas antropométricas devido a limitações individuais como dificuldade de locomoção, especialmente nos pacientes em UTI e em ventilação mecânica. No entanto, o uso de medidas autorreferidas já mostrou boa concordância com dados aferidos em pessoas idosas28, tornando assim essas mensurações válidas no presente contexto. O diagnóstico da sarcopenia requer equipamentos de alto custo para medir a massa muscular e profissionais treinados para uma avaliação de força e da função física, critérios que muitas vezes não estão disponíveis na maioria dos centros de saúde do Brasil. No entanto, o SARC-F apresenta-se como um questionário de fácil e rápida aplicação e, por isso, considerado adequado para avaliar a perda de massa muscular em pessoas idosas. Estudos e metanálises comprovaram a alta especificidade dessa ferramenta de triagem, inclusive associando-a ao declínio do desempenho físico, hospitalização, qualidade de vida e morte8,29,30. Em contrapartida, o tamanho amostral e a característica de ser um estudo multicêntrico realizado em diferentes Estados da região nordeste do Brasil, são os pontos que fortalecem a discussão sobre os efeitos da sarcopenia sobre a evolução clínica de pessoas idosas com covid-19.
CONCLUSÃO
Em pessoas idosas com covid-19, a pré-existência do risco de sarcopenia foi preditor de desfechos clínicos desfavoráveis, com necessidade de cuidados intensivos, ventilação mecânica e óbito. Apesar das limitações abordadas, o presente estudo enfatiza que o rastreio e a identificação precoce da presença de sarcopenia por meio de ferramentas de triagem como o SARC-F, em pessoas idosas hospitalizadas ou até mesmo na atenção básica, poderá auxiliar no melhor cuidado desse paciente, evitando-se a ocorrência de desfechos negativos.
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Editado por
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Editado por: Maria Luiza Diniz de Sousa Lopes
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
01 Dez 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
26 Jun 2023 -
Aceito
19 Out 2023