Open-access Análise físico-química do óleo essencial de pupunha (Bactris gasipaes Kunth - Arecaceae), do município de Cruzeiro do Sul, Acre, Brasil

Physical and chemical analysis of essential oil from peach palm (Bactris gasipaes Kunth - Arecaceae), from the municipality of Cruzeiro do Sul, Acre, Brazil

RESUMO

As espécies de Arecaceae, conhecidas popularmente por palmeiras, além de se destacarem na paisagem amazônica, agregam valores econômico e social. O presente trabalho teve como objetivo analisar as características físico-químicas dos óleos extraídos de cinco variedades de frutos de pupunha (Bactris gasipaes Kunth). Para tanto, amostras de frutos de cinco matrizes provenientes de plantios foram coletadas no município de Cruzeiro do Sul, região do alto Juruá (74º0’ W a 72ºW e 7º05’ S a 9º40’ S) e foram determinados o teor de óleo, densidade, índice de refração, espectrofotometria e cromatografia em camada delgada. Os dados foram submetidos às análises de variância (ANOVA) e de regressão, cuja diferença entre as médias dos tratamentos foi testada por meio do teste de Tukey a 5% de significância, realizados com o auxílio do software RStudio Core Team, versão 3.6.3 e com pacote ExpDes.pt, car, stats e fBasics. Os resultados apontaram teores de óleo essencial de 24,29%, 24,28% para as matrizes 2 e 4 e abaixo de 8,1% para as matrizes 1,3 e 5. O índice de acidez variou de 1,26 a 5,22 mg NaOH/g de óleo, enquanto o índice de refração variou de 1,4510 a 1,4690. A análise de cromatografia em camada resultou em sete Rfs, sendo eles nas faixas 0,325; 0,45; 0,5; 0,6; 0,7; 0,8 e 1 para todos os óleos analisados, com curvas espectroscópicas apresentando diferenças significativas nas faixas de 320 a 540 nm, indicando diferentes grupos funcionais e/ou substâncias nos extrativos vegetais. De acordo com os resultados, o óleo essencial das amostras de frutos de pupunha (Bactris gasipaes) apresentou valores distintos e significativos para os cinco parâmetros físico-químicos avaliados, o que desperta a atenção para uma possível ocorrência de variabilidade genética no material estudado, mas sugerindo, ao mesmo tempo, que se amplie a investigação, com um maior tamanho amostral e se confirme uma alternativa de investimento em melhoramento genético.

Palavras-chave: Amazônia; Alto Juruá; Palmeira; Variabilidade genética

ABSTRACT

In addition to standing out in the Amazonian landscape, Arecaceae species, popularly known as palm trees, add economic and social values. The purpose of this paper was to analyze the physical and chemical characteristics of the oils extracted from five varieties of peach palm fruits (Bactris gasipaes). In order to achieve such purpose, fruit samples from five plantation matrices were collected in the municipality of Cruzeiro do Sul, in the upper Juruá region (74º0 ‘W at 72ºW and 7º05’ S at 9º40 ‘S). We determined the oil content, the density, the refractive index, the spectrophotometry, and the thin layer chromatography. The data were subjected to analyses of variance (ANOVA) and regression. The difference between the means of the treatment was tested with the Tukey test at 5% significance, performed with the aid of RStudio Core Team software, version 3.6.3 and with ExpDes.pt package, car, stats and fBasics. Our findings showed essential oil contents of 24.29%, 24.28% for matrices 2 and 4, and below 8.1% for matrices 1.3 and 5. The acidity index ranged from 1.26 to 5.22 mg NaOH / g oil, whereas the refractive index ranged from 1.4510 to 1.4690. The analysis of layer chromatography resulted in seven RFs, with the ranges 0.325; 0.45; 0.5; 0.6; 0.7; 0.8 and 1 for all oils analyzed. Spectroscopic curves showed significant differences in the ranges 320 to 540 nm, indicating different functional groups and/or substances in the extractives. According to the results, the essential oil from the samples of peach palm fruits (Bactris gasipaes) showed distinct and significant values for the five physical and chemical parameters evaluated, which calls attention to a possible occurrence of genetic variability in the material studied. The findings suggest that the investigation should be expanded with a larger sample size, and that an alternative investment in genetic improvement should be confirmed.

Keywords: Amazon; Alto Juruá; Palm; Genetic variability

1 INTRODUÇÃO

O estado do Acre, localizado no extremo ocidental do Brasil, apresenta uma ampla diversidade de produtos florestais não-madeireiros e, parte desses, com valor socioeconômico, sendo fonte de emprego e renda para a população local. A extração de óleo essencial é um exemplo de grande valor pela sua composição química, com diferentes ações e aplicações no mercado, tais como produção de combustível para utilitários, cosméticos, complemento alimentar, entre outros, constituindo uma alternativa de diversificação de produção e renda para as populações extrativistas tradicionais (FRAXE; PEREIRA; WITKOSKI, 2011; ALVES et al., 2015; BRITO; ALVES; MOREIRA, 2017; SOUZA et al., 2018).

Os óleos essenciais podem ser obtidos por meio de diferentes processos dependendo da localização e da parte do vegetal que se quer extrair o óleo, da quantidade e das características requeridas para o produto final. Os processos mais usuais são: prensagem, destilação por arraste a vapor, extração com solventes orgânicos (extração por Soxhlet) e com gás carbônico (CO²) supercrítico (ALVES et al., 2015).

Nesse sentido, destacam-se as palmeiras, plantas pertencentes à família Arecaceae, representadas na Amazônia brasileira por 32 gêneros e 148 espécies (LORENZI et al., 2010). A família, além de se distinguir facilmente na paisagem local, é de grande importância econômica, tendo em vista os vários produtos, provenientes de diferentes espécies, utilizados tanto para a alimentação humana como animal. Um deles é o óleo essencial, extraído de Astrocaryum aculeatum G. Meyer (tucumã), A. murumuru Mart. (murumuru), Mauritia flexuosa L.f. (buriti), Elaeis oleifera (Kunth) Cortés (caiaué), Oenocarpus bacaba Mart. (bacaba), entre outras, com aproveitamento nas indústrias alimentícias, de cosméticos, biocombustíveis, etc. (WALLACE; FERREIRA, 2006; COSTA; MARCHI, 2008; ALVES et al., 2015).

Para o estado do Acre são assinalados 26 gêneros e 76 espécies de palmeiras, algumas delas de amplo aproveitamento. O açaí (Euterpe precatoria Mart.) é um exemplo, palmeira nativa, de onde se aproveitam frutos, palmito, estipe, folhas e raízes, além do potencial para utilização paisagística. Sua produção e comercialização têm como principal produtor o município de Feijó que devido ao aumento na demanda tem investido em monocultivos, plantios e sistemas agroflorestais (LORENZI et al., 2010; SEBRAE, 2017).

A pupunheira (Bactris gasipaes) é outro exemplo, palmeira neotropical de origem pré-andina domesticada pelos indígenas, tendo B. dahlgreniana Govaerts como sua possível progenitora (LORENZI et al., 2010). Bactris gasipaes vem sendo estudada ao longo de décadas principalmente pela variabilidade genética apresentada nos frutos (ARKCOLL; AGUIAR, 1984; CLEMENT; AGUIAR; ARKCOLL, 1998; YUYAMA; SILVA, 2003; MOREIRA et al., 2016; entre outros), cujo cultivo tem sido praticado tanto em escala doméstica como comercial em função das diversas categorias de uso.

Pesquisas realizadas no Estado revelaram o potencial econômico da pupunheira para extração do palmito, uma vez que a planta apresenta precocidade, rusticidade e elevado perfilhamento. Mas são os frutos cozidos em água e sal sua principal forma de consumo pela população local. Esses frutos são variáveis quanto ao tamanho e a cor e de onde se obtém ração, farinha e óleo (SÁ; BERGO; BAYMA, 2004; MEDEIROS; KWIATKOWSKI; CLEMENTE, 2012).

Com relação ao teor de óleo encontrado nas pupunheiras locais há pouca informação, o que despertou o interesse de ampliar o conhecimento já atribuído as que são oriundas de outros Estados da região norte (SOUZA et al., 2018; AGUIAR; YUYAMA; SOUZA, 2019) que acrescente embasamento na defesa da qualidade dos óleos vegetais provenientes da Amazônia.

Diante de relevante necessidade, o presente trabalho se propôs a extrair, analisar e determinar experimentalmente as propriedades físico-químicas do óleo essencial de pupunha (Bactris gasipaes), proveniente de frutos de cinco matrizes do município de Cruzeiro do Sul, região do Alto Juruá, estado do Acre, visando contribuir no conhecimento do potencial da referida palmeira.

2 MATERIAL E MÉTODO

A pesquisa foi realizada no Laboratório de Química do Campus Floresta, da Universidade Federal do Acre, localizado no município de Cruzeiro do Sul, região do Alto Juruá, estado do Acre. Na referida região o clima é do tipo equatorial quente e úmido, com temperaturas variando entre 24,5°C e 32 °C e uma sazonalidade caracterizada por uma estação seca de junho a outubro e outra chuvosa de novembro a maio (ACRE, 2010).

Foram coletados cinco cachos de frutos maduros, dois deles oriundos do sítio Mourapiranga do Km 7 da rodovia AC-405 (7°35’ 3.17”S 72°46’27.38”W), numerados como sendo 1 e 2, considerados entre todos como os de maiores frutos, e os demais, adquiridos no mercado público local, numerados como 3, 4 e 5, todos provenientes do município de Cruzeiro do Sul e reconhecidos pela população como sendo pupunha (Bactris gasipaes), cultivada, com variações de cor e tamanho, conforme a Figura 1.

Os frutos maduros após a coleta foram conduzidos para o Laboratório, onde foram pesados e lavados em água corrente, depois sanitizados em 3 litros de água contendo 3,75 mL de hipoclorito a 12%, por 15 minutos, enxaguados e congelados (-15 oC) por uma semana. Em seguida, foram colocados em estufa com temperatura entre 60 - 70°C por dois dias. Após a secagem foram pesados novamente, usando balança semi-analítica e embalados em papel de filtro, devidamente identificados.

Figura 1
Imagens de polpas e cascas de cinco variedades de frutos de pupunha (Bactris gasipaes) utilizados para estudo do óleo essencial

2.1 Extração do óleo essencial

Para obtenção dos óleos, polpas e cascas, aproximadamente 95 a 150 g, foram submetidas à secagem na temperatura de 72°C por 48 h. Em seguida foram trituradas e embaladas em papéis de filtro. Posteriormente foi feita a extração do óleo pelo método extrator de Soxhlet, utilizando-se éter como solvente orgânico. Logo após, os óleos foram armazenados em tubos de ensaio em temperatura baixa (-5ºC) e sem contato com a luz.

2.2 Determinação da densidade

Adotou-se o procedimento de acordo com as normas do Instituto Adolpho Lutz (2008), utilizando-se o método da proveta. Colocou-se 3 mL de óleo numa proveta de 5ml e após 10 minutos quando atingiu a temperatura de 20oC, foi avaliada a sua densidade em uma balança semi-analítica. Os experimentos foram realizados em triplicata, com o valor de densidade média e seu respectivo desvio padrão (σ).

2.3 Determinação do índice de refração

O refratômetro ABBE de bancada foi utilizado para determinar o índice de refração das amostras de óleos. Aproximadamente, 4 gotas de cada óleo foram colocadas no porta amostra do refratômetro e, após atingir 20oC, foi avaliado o índice de refração para cada amostra. Este ensaio foi realizado em triplicata, determinando-se o desvio padrão (σ) (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008).

2.4 Determinação da Acidez

Em 2 g de óleo pesado em frasco Erlenmeyer de 125 mL foi adicionado 25 mL de solução previamente preparada de éter-álcool (2:1) neutra e duas gotas de indicador fenolftaleína. Titulou-se com solução de hidróxido de sódio, previamente preparada a 0,1 M, até o aparecimento da coloração rósea. O teste foi realizado em triplicata, com seu respectivo desvio padrão (σ) (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008). Utilizou-se, para o cálculo do índice de acidez, a Equação (1):

í n d i c e d e a c i d e z = V * f * 400 P (1)

Em que: V = volume gasto de NaOH; f = fator da solução de NaOH; P = massa da amostra. O resultado é expresso em mg de NaOH/g de óleo.

2.5 Espectrofotometria

A análise espectrofotométrica na região do ultravioleta e no visível pode fornecer informações sobre a qualidade de um óleo, seu estado de conservação e alterações causadas pelo processamento. Neste método, os óleos essenciais estudados, foram dissolvidos em solvente apropriado (exemplo em uma relação de 10/0,3 de tolueno e óleo essencial v/v) e os valores de absorbância foram determinados, usando como referência o solvente puro (Grau P.A.). Essas absorções são expressas como extinções específicas (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008).

2.6 Separação Cromatográfica

Os óleos foram submetidos à cromatografia em camada delgada. As placas de cromatofolha de 20 x 20 cm e espessura de 30 µm. Estas foram submetidas a aquecimento a 100oC por 1 hora para ativação da cromatofolha. Na placa de cromatofolha foi determinado o percurso de 10 cm e a fase móvel foi tolueno/acetato de etila (93:7). O óleo foi diluído em 10% em n-hexano. Após a ativação da placa de cromatofolha, com o uso de um conta-gotas, uma gota da amostra diluída foi aplicada na superfície inferior da placa. Em seguida a placa foi colocada em uma cuba saturada com a solução de tolueno/acetato de etila. Depois de percorrido e evaporado o solvente, a placa foi submetida a revelador vanilina sulfúrica e aquecido posteriormente a uma temperatura de 120°C durante 5 a 10 minutos (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008).

2.7 Análise Estatística

Os dados foram submetidos às análises de variância (ANOVA) e de regressão, cuja diferença entre as médias dos tratamentos foi testada por meio do teste de Tukey a 5% de significância, realizados com o auxílio do software RStudio Core Team, versão 3.6.3 e com pacote ExpDes.pt, car, stats e fBasics.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Tabela 1, observa-se uma diferença significativa para todas as variáveis estudadas. A massa seca dos frutos variou de 93,11 a 182,4 g, enquanto a massa sem óleo variou de 70,5 a 167,74 g. De acordo com a classificação feita por Mora-Urpí, Clement e Patiño (1993) as raças primitivas de Bactris gasipaes ocorrentes no Alto Juruá se enquadram no grupo microcarpa, cujo peso é até 20 g. Os valores obtidos no presente estudo ficaram bem acima da referida classificação, no entanto trata-se de pupunhas provenientes de plantios, o que sugere a necessidade de ampliar a investigação. Esses valores também ficaram distantes do que foi obtido por Moreira et al. (2016) com mesmo tamanho amostral - cinco matrizes e obtendo como valor médio 16 g em frutos frescos oriundos do município de Capitão Moço no estado do Pará; condizendo com a classificação de Mora-Urpí, Clement e Patiño (1993).

No que se refere aos teores de óleo, as amostras de pupunha 2 e 4 apresentaram valores de 24,29% e 24,28%, respectivamente, diferente dos óleos de pupunha 1, 3 e 5, cujo teor ficou abaixo de 8,1%. Comparando esses teores com os tamanhos dos frutos, verifica-se que as amostras de pupunha 2 e 4 com valores quase equivalentes, e que se sobressaíram em relação aos demais, pesaram diferentemente (Tabela 1). Em Rondônia, no município de Ariquemes, Souza et al. (2018), utilizando a mesma metodologia do presente estudo, analisaram o teor de lipídeos de pupunhas com e sem caroço e encontraram 7,9% e 2,0% respectivamente, e sugerem o aproveitamento das pupunhas com caroço para produção de energia e as sem caroço para alimentação humana.

Os valores obtidos no presente estudo se aproximam do que foi encontrado por Aguiar, Yuyama e Souza (2019), estudando variedades de pupunha procedentes da Vila do Equador, estado de Roraima, também utilizando o mesmo método de extração (Sohxlet) e se surpreenderam com os teores de óleo encontrados, onde 12 dos acessos apresentaram mais de 20% de óleo, três outros acima de 35% e dez abaixo de 10%. Mas foi o acesso 21 que chamou mais atenção desses autores, com 40,7% de óleo e 43,52 g de massa, uma vez que foge ao padrão de frutos classificados para essa localidade, no caso mesocarpa, de acordo com Mora-Urpí, Clement e Patiño (1993). A massa variou entre 19,66 e 81,88 g em todos os acessos.

Pupunheiras de origem Yurimaguas, Peru, plantadas na Estação Experimental Lemos Maia -ESMAI, município de Una, no estado da Bahia, também foram avaliadas quanto ao teor de óleo, sendo encontradas variações entre 2,86 a 35,51%, e uma média de 22,83% de óleo na polpa seca (s=10,01) (CÉO; SILVA; PINTO, 2011).

Tabela 1
Parâmetros físico-químicos dos óleos de variedades de frutos de pupunha (Bactris gasipaes)

Outros autores defendem muita variação dentro das populações, com base em dados, tanto da composição como no óleo do mesocarpo de frutos de pupunha oriundos de Benjamin Constant, Fonte Boa e Coari, no estado do Amazonas, detectando-se 10,1% ± 6,6%; 8,8% ± 6,1%; 21,0% ± 11,6% de peso seco, respectivamente; com Benjamin Constant apresentando os maiores frutos, em torno de 102 g e mais ricos em amido, cerca de 71,6%, enquanto Coari apresentou os menores, em torno de 32 g e mais ricos em óleo; ficando a soma dos ácidos graxos insaturados, variando de 20% a 80% (CLEMENT; AGUIAR; ARKCOLL, 1998).

Com relação ao percentual de umidade, os resultados revelaram variações de 39,7 a 61,4%. Essas diferenças podem ser devido a composição dos frutos e demais componentes, verificados na Figura 1. Esses valores não ficam distantes do que foi obtido por Carvalho et al. (2013) cujas variações foram entre 43,9 e 65,39% observadas em 21 matrizes de pupunheira do estado do Pará, detectando diferenças significativas entre o tamanho, massa dos frutos e caroços.

As variações de tamanho, peso, cor, textura, teor de água, óleo, dos frutos de pupunha, dentre outros caracteres, e as tentativas consistentes de explicar a domesticação da pupunha na Amazônia têm sido motivo de questionamentos por décadas, conforme aqui já mencionado, onde defendem pelo menos dois eventos; muitos deles amparados em marcadores moleculares (MORA-URPÍ; WEBER; CLEMENT, 1997; CLEMENT, 2007; CRISTO-ARAÚJO et al., 2013, etc.). Cristo-Araújo et al. (2013) apontam com base em duas sequências do genoma do cloroplasto, que foi no sudoeste da Amazônia onde teve início o processo, no entanto alegam as limitações da biologia molecular e a necessidade de novas investigações.

Os valores de índice de acidez dos óleos de pupunha apresentados na Tabela 1 mostram variações entre 1,26 a 5,22 mgNaOH/g de óleo. Os maiores índices foram registrados nas amostras 1 e 2. Comparando tais valores com o que foi encontrado em outras palmeiras estudadas na mesma localidade e usando metodologia semelhante se verifica que o tucumã (Astrocaryum aculeatum), com 1,37 mgNaOH/g e o coco (Cocos nucifera L.) com 3,09 mgNaOH/g divergem pouco; e ambos ficam acima dos valores encontrados para o açaí (Euterpe precatoria), buriti (Mauritia flexuosa), patauá (Oenocarpus bataua) e murmuru (Astrocaryum ulei Burret) (ALVES et al., 2015).

Segundo Angelucci et al. (1987), o alto teor de acidez de um óleo bruto aumenta a perda da neutralização, sendo também indicador de sementes de baixa qualidade, podendo também ser reflexo do manuseio e armazenamento impróprios ou de um processamento insatisfatório.

De acordo com a ANVISA (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2005), o índice de acidez é descrito como parâmetro referencial para determinar a qualidade da conservação de óleos e estabelece que valores de índice de acidez para óleos e manteigas vegetais acima de 4,0 mg/mL de NaOH são impróprios para consumo.

Silva et al. (2018) ao fazerem a extração a frio do óleo de pupunha pelo método de Bligh Dyer, visando comparar os teores no fruto verde, maduro e semente, encontraram 18,27%; 34,80% e 38,08%, respectivamente, enquanto para o índice de acidez constataram que todas as amostras apresentaram valores superiores a 6mg KOH / g e afirmam que o estádio de maturação está relacionado com os índices elevados de acidez.

Com relação à densidade do óleo, percebe-se que o menor índice foi verificado naquele proveniente da matriz 3, revelando 0,73± 0,01 mg/mL, enquanto o maior índice foi para o óleo de pupunha 2 de 0,87 g / mL, mostrando assim um alto índice de insaturações. Clement (2007) afirma com base na composição dos ácidos graxos no óleo do mesocarpo de pupunha que estes superam o valor encontrado no óleo de dendê [Elaeis oleifera (Kunth) Cortés], e complementa que o óleo insaturado tem valor de mercado, tanto do ponto de vista nutricional quanto industrial. De acordo com Ribeiro e Seravalli (2004), a densidade de um óleo está relacionada ao grau de ligações duplas ou triplas, assim, quanto menor for o peso molecular do óleo, maior é o grau de insaturações.

No que se refere ao índice de refração, a matriz 4 apresentou o menor valor, com 1,4510, enquanto a matriz 3 apresentou o maior - 1,4690 (Tabela 1). É possível que essas diferenças estejam relacionadas ao grau de saturação das ligações na cadeia carbônica das substâncias dos óleos e/ou associados com teores de ácidos graxos livres, degradação e tratamento térmico (PAULA, 2002; INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008). Moretto e Fett (1998) defendem que o índice de refração é um importante parâmetro, pois mede o grau de oxidação do produto, aferindo a sua qualidade nutricional.

Na Figura 2, estão apresentados os cromatogramas obtidos para os óleos de pupunha, verificando-se que a fase móvel n-hexano/acetato de etila permitiu uma boa separação dos componentes dos óleos, com manchas diferenciadas e distribuídas por toda a placa, em diferentes Rfs, que apresentaram 7 Rfs, (faixa de 0,325; 0,45; 0,5; 0,6; 0,7; 0,8 e 1).

Os perfis cromatográficos revelaram nos óleos essenciais de pupunha a presença dos compostos cariofileno e eugenol, para todos os óleos analisados, enquanto o composto anetol está presente apenas nas pupunhas 3, 4 e 5 e o mirceno nas pupunhas 1 e 2, com os mesmos valores de Rf (Figura 2). Esses mesmos compostos foram detectados em Ocimum selloi Benth (Lamiaceae) por Paula (2002), aplicando a mesma metodologia ao testar sua ação repelente contra o mosquito Anopheles brasiliensis Chagas, onde o eugenol apresentou Rf de 0,7; cariofileno com Rf de 0,6 e 1,0; mirceno, 1,0 e anetol 0,85. No campo, a autora testou uma solução de 10% (p/v em etanol) de O. selloi em seis voluntários (cada indivíduo sendo seu próprio controle) expostos a Anopheles brasiliensis por 30 minutos e verificou que naquele percentual houve uma redução de 88% (P=0,01) na frequência de picadas, revelando-se um repelente eficaz.

Figura 2
Perfis cromatográficos dos óleos das variedades de frutos de pupunha (Bactris gasipaes). Percurso de 10 cm, sobre fase móvel tolueno/acetato de etila e revelador ácido sulfúrico/vanilina, sulfúrica/água/metanol

Na Figura 3, estão apresentados os espectros da região do visível, na faixa de 320 a 780 nm dos óleos essenciais de pupunha. Observa-se que possuem bandas distintas e diferenciadas em que os óleos das amostras 1, 3 e 4 apresentam uma banda com pico na faixa de 400 a 500 nm. Entretanto, verifica-se diferença de absorção na faixa de 320 a 480 nm. Enquanto o óleo da amostra 2 possui duas bandas na faixa de 420 a 460nm e outra banda com pico entre 460 a 520 nm, diferente do óleo da amostra 5 que por sua vez apresentou um pico na faixa de 320 a 520 nm. Esses resultados sugerem diferenças na estrutura da cadeia carbônica dos óleos observados, como tipos de ligações, números de substâncias constituintes dos óleos, etc (GOEL, 1988).

Figura 3
Espectros da região do visível, na faixa de 320 a 780 nm dos óleos essenciais de pupunha (Bactris gasipaes)

4 CONCLUSÕES

De acordo com os dados obtidos, o óleo essencial das cinco variedades de frutos de pupunha (Bactris gasipaes) apresentou valores distintos e significativos com base nos testes estatísticos aplicados para os cinco parâmetros físico-químicos avaliados, o que desperta a atenção para uma possível ocorrência de variabilidade genética no material estudado. Sugere-se, do mesmo modo, que novos estudos sejam realizados em maior abrangência para confirmar a variabilidade genética da espécie.

AGRADECIMENTO

Nós agradecemos a equipe do Laboratório de Geoprocessamento Aplicado ao Meio Ambiente (LabGAMA) da Universidade Federal do Acre, Campus Floresta, por fornecer as coordenadas geográficas do local de coleta do material botânico.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2021

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2019
  • Aceito
    18 Jul 2020
  • Publicado
    15 Mar 2021
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