Open-access A parceria de cuidados pelo olhar dos pais de crianças com necessidades especiais de saúde

La colaboración en cuidados según la mirada de padres de niños con necesidades especiales de salud

Resumo

OBJETIVO  Compreender como foi experienciada a parceria de cuidados pelos pais de crianças com necessidades especiais de saúde.

MÉTODO  Estudo qualitativo, descritivo e exploratório, realizado no período de dezembro de 2013 a fevereiro de 2014. O método utilizado foi a narrativa. A população correspondeu aos pais de crianças internadas num serviço de medicina de um Hospital Pediátrico em Portugal. A amostra foi constituída por 10 pais. A coleta de dados contemplou a caracterização sociodemográfica e a entrevista de orientação etnobiográfica. Depois de transcritas, as entrevistas originaram 10 narrativas de experiências de parceria dos pais com a equipe de enfermagem.

RESULTADOS  Constatou-se, enquanto oportunidades de parceria, a capacitação dos pais e a tomada de decisão em parceria, estabelecidas num processo relacional dinâmico, singular e contínuo.

CONCLUSÃO  As oportunidades de parceria são pressupostos fundamentais para a prestação de cuidados com foco na criança e nos pais enquanto recursos da mesma.

Palavras-chave: Criança; Enfermagem; Doença crônica; Pais; Cuidadores

Resumen

OBJETIVO  Comprender la percepción experimentada por padres de niños con necesidades especiales de salud sobre su colaboración en los cuidados de enfermería.

MÉTODO  Estudio cualitativo, descriptivo y exploratorio, realizado entre diciembre de 2013 y febrero de 2014. El método utilizado fué la narrativa. La muestra poblacional abarcó a padres de niños internados en servicio de medicina de un hospital pediátrico de Portugal. La muestra fue constituida por 10 padres. La recolección de datos incluyó la caracterización sociodemográfica y la entrevista de orientación etnobiográfica. Después de transcritas, las entrevistas se produjeron 10 historias de experiencias de colaboración de los padres con el equipo de enfermería.

RESULTADOS  Se confirmó la existencia de oportunidades de asociación, la capacitación de los padres y la toma de decisiones en conjunto, las cualesson establecidas en un proceso relacional dinámico, único y permanente.

CONCLUSIÓN  Las oportunidades de asociación son condiciones fundamentales para la prestación de cuidados de atención en los niños, siendo los padres los medios del niño para obtenerlos.

Palabras clave: Niño; Enfermería; Enfermedad crónica; Padres; Cuidadores

Abstract

OBJECTIVE  To understand how the care partnership was experienced by parents of children with special healthcare needs.

METHOD  Qualitative, descriptive and exploratory study, carried out from December 2013 to February 2014. The method used was the narrative. The population corresponded to parents of children admitted to a medical service of a Pediatric Hospital in Portugal. The sample consisted of 10 parents. The data collection included the sociodemographic characterization and the etnobiografic orientation interview. Once transcribed, the interviews yielded 10 narratives of partnership experiences between the parents and the nursing team.

RESULTS  It was noted, as partnership opportunities, the training of parents and the collaborative decision-making, established in a dynamic, unique and ongoing relational process.

CONCLUSION  The opportunities for partnership are key assumptions for the care delivery focusing on the child and on the parents as their resources.

Keywords: Child; Nursing; Chronic disease; Parents; Caregivers

INTRODUÇÃO

Na realidade atual das organizações prestadoras de cuidados de saúde à criança e ao jovem, os pais são considerados parceiros dos profissionais de saúde. Faz parte do seu papel parental cuidarem do filho, na saúde e na doença, tão importante como alimentar, educar, distrair ou facilitar o seu desenvolvimento. O exercício do papel parental em populações que necessitam de cuidados especiais de saúde, constitui-se como um desafio para os mesmos e requer dos enfermeiros a conceção de processos de cuidados assentes em práticas baseadas na evidência, onde a investigação assume uma preponderância crescente e fundamental.

As crianças com necessidades especiais de saúde (NES) têm doenças crónicas físicas, do desenvolvimento, comportamentais ou emocionais, tais como insuficiência renal crónica, asma, malformações congénitas, doenças oncológicas, autismo ou paralisia cerebral1-2. Os pais têm que se adaptar para cuidarem da criança no domicílio, necessitando de uma ampla rede de apoio familiar, social, com o estreito envolvimento dos profissionais de saúde3. Pelo mencionado, os cuidados de enfermagem pediátrica assentes na filosofia dos cuidados centrados na família e no modelo de parceria de cuidados, são considerados ideais para ajudá-los no cumprimento do papel que irão desempenhar2.

Estudos de âmbito internacional têm demonstrado que os pais parecem valorizar as interações em que sentiram que o enfermeiro conhece, compreende e preocupa-se com a criança e a família, nomeadamente na satisfação das necessidades de cuidados e de desenvolvimento3-4. Os pais valorizam ainda a sensibilidade e a atenção demonstrada pelo enfermeiro na adaptação das circunstâncias da vida real ao potencial da criança e da sua família, quer ao nível mais superficial e concreto dos aspetos clínicos, quer na satisfação das necessidades emocionais específicas4.

Numa revisão sistemática da literatura3, foram identificadas como atitudes dos enfermeiros, o respeito, a confiança, a empatia e a advocacia. Estas atitudes encontram-se descritas na literatura como atributos do modelo de parceria. As relações estabelecidas entre os pais e os profissionais de saúde que preenchem estes requisitos, foram caraterizadas como promotoras da capacitação dos pais.

De idêntico modo, têm sido reportadas lacunas na transmissão de informação completa aos pais, sobre a situação clínica, tratamento e cuidados a prestar à criança com NES5. Estas lacunas são extensíveis à comunicação e à passagem de informação entre os diferentes profissionais das instituições que prestam cuidados de saúde às crianças com NES, interferindo com a coordenação adequada dos serviços, por forma a responder adequadamente às necessidades das crianças e respetivas famílias3.

O modelo de parceria de cuidados de enfermagem releva a centralidade da criança e da família no processo de cuidados, pela sua integração plena na tomada de decisão3. “A parceria significa mudança, negociação dos cuidados às crianças partilhada com a família, apoio, ensino e envolvimento da mesma como o resultado de uma negociação previamente estabelecida”3.

A negociação assenta no valor da igualdade entre os pais e os enfermeiros e uma vez implementada valoriza uma dinâmica colaborativa no planeamento dos cuidados6.

Apesar do exposto, a investigação contemporânea produzida em torno deste fenómeno, aponta na direção do aprofundamento na análise das experiências de parceria, estabelecida entre os pais e os enfermeiros2-3. Pelo que desenvolvemos um estudo de investigação mais amplo sobre a temática da parceria de cuidados, com a finalidade de melhor conhecer o modelo em uso num determinado contexto da prestação de cuidados, que se constituiu como uma dissertação de mestrado7. Delineou-se como questão de pesquisa: que oportunidades de parceria identificam os pais de crianças com NES? E como objetivo: compreender como foi experienciada a parceria de cuidados pelos pais de crianças com NES.

MÉTODO

Este estudo é de natureza qualitativa, descritiva e exploratória. Analisámos o material obtido através das entrevistas de orientação etnobiográfica, focalizando-nos no acontecimento experiencial8. Foi desenvolvido num Serviço de Pediatria Médica de um Hospital Pediátrico em Portugal.

A população correspondeu aos pais de crianças com NES (pai e mãe), utentes do contexto de pesquisa. Em continuidade, recorremos a uma amostra não probabilística por conveniência9, constituída por 10 pais de crianças com NES. A técnica de amostragem utilizada foi a amostra intencional.

Foram critérios de inclusão na amostra: pais de crianças/jovens cuja condição individual se enquadra no grupo de crianças com NES; diagnóstico há mais de um ano da condição de saúde da criança/jovem; pais que experienciaram internamentos anteriores, pelo conhecimento prévio e tempo de contato com a equipa de enfermagem; pais de crianças com NES identificados pelo elemento de referência da equipa de enfermagem do contexto de pesquisa, como tendo boa capacidade de comunicação.

Como critérios de exclusão: pais cujo filho se encontrava no episódio inaugural de sua condição de saúde, embora englobassem a população de crianças com NES; pais de crianças com necessidades de saúde de caráter transitório e agudo.

Foram realizadas 10 entrevistas não estruturadas a pais de crianças com NES no período de dezembro de 2013 a fevereiro de 2014, que foram transcritas após gravação em registo áudio. Após a sua leitura integral, foram construídas 10 narrativas que depois de redigidas e lidas na íntegra, foi possível obter-se a perspetiva global do seu conteúdo. Processo essencial para a apreensão dos elementos que sobressaem na história experienciada10.

Os elementos constituintes da entrevista de orientação etnobiográfica foram os seguintes: pergunta de partida (gostaria que me contasse histórias que relatem experiências em que ocorreu a oportunidade de trabalhar em conjunto com os enfermeiros, na prestação de cuidados ao seu filho, ao longo de percurso que têm vivenciado); fase final da entrevista, na qual foi efetuada o balanço dos conteúdos narrados e alocadas novas questões, relacionadas com aspetos que não foram exaustivamente explorados ou ficaram obscuros, tal como aspetos teóricos dos fatos, relacionados com os sentimentos dos entrevistados sobre as experiências relatadas10.

Na etapa seguinte recorreu-se à análise de conteúdo. Efetuámos a análise de significados, a codificação e a categorização dos dados11. Atendendo à unicidade de cada história, a análise de significados permitiu identificar os componentes globais dos conteúdos, os padrões comuns, assim como interligar todas as narrativas e perspetivar o modo como as mesmas deram resposta à questão de pesquisa10. Em continuidade, os dados obtidos foram codificados. A codificação, é um processo no qual os dados são transformados sistematicamente e agregados em unidades de análise, as quais permitem efetuar uma descrição exata das características pertinentes do conteúdo. Esta transformação ocorreu por recorte, enumeração, classificação e agregação11. Atribuímos um código aos participantes (P1, P2, P3, P4, P5, P6, P7, P8, P9, P10), que mantivemos na identificação das narrativas e unidades de registo. Na organização da codificação, utilizámos o recorte para selecionar as unidades de registo e as unidades de contexto; a enumeração, na qual definimos como regra de contagem a frequência de cada unidade de registo no texto; a classificação e a agregação dos dados através da seleção das categorias respetivas.

Sendo a categorização uma operação de classificação dos elementos constitutivos de um conjunto11, efetuámos a análise categorial, reagrupando os dados por temas, categorias, subcategorias, unidades de contexto e de registo.

Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ética para a Saúde da visada Instituição de Saúde. A aprovação foi firmada em ofício n.º 0161 com a referência CES, datado de 21 de outubro de 2013. Os participantes envolvidos no estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido na etapa prévia à colheita de dados, sendo-lhes garantidos a confidencialidade dos dados, o anonimato e o direito à livre escolha aquando da sua participação no mesmo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As condições de saúde das crianças foram relacionadas com Insuficiência Renal Crónica, da qual resultou a necessidade de efetuar Diálise Peritoneal (4) e de ter um estoma vesical (1); Doença de Hirschsprung com necessidade de ter uma gastrostomia (1); Paralisia Cerebral (1); Síndrome do Intestino Curto (2) e Doença neuromuscular com necessidade de ter uma traqueostomia (1). Estas condições englobam-nas no grupo de crianças com NES1-2.

Os participantes neste estudo foram mães de crianças com NES, com idades compreendidas entre os 20 e 49 anos, predominando a faixa etária entre os 30 e 39 anos, cujo grau de instrução variou entre o ensino básico, ensino secundário e superior, casadas e integradas numa família nuclear.

O processo de análise de conteúdo das narrativas, permitiu o estabelecimento de duas categorias, sendo estas a capacitação dos pais e a tomada de decisão em parceria e respetivas subcategorias. A categoria capacitação dos pais contemplou as subcategorias envolvimento/participação dos pais (10); informação/comunicação com os pais (9); ter uma enfermeira de referência (7); aprender a cuidar da criança (5); o conhecimento dos enfermeiros (4); modos de agir dos enfermeiros (3). Por sua vez, da categoria tomada de decisão em parceria emergiram três subcategorias: negociação da decisão para aprender (4); negociação de cuidados partilhada (4); apoiar a decisão dos pais (4).

Com os resultados obtidos a partir da análise das narrativas, construímos uma representação esquemática das oportunidades de parceria (figura 1).

Figura 1
Representação esquemática das oportunidades de parceria na perspetiva dos pais de crianças com NES

A representação esquemática apresentada na figura 1, configurada em círculos, idealiza um sistema de desenvolvimento humano, aberto e dinâmico. A imagem de fundo foi adaptada do modelo bioecológico do desenvolvimento humano, apresentado por Bronfenbrenner e Morris12. Estes autores defendem modelos de desenvolvimento humano que consideram os diversos ambientes em que a pessoa vive, relaciona-se e desenvolve-se. A interação sujeito/ambiente é caracterizada pela reciprocidade, ou seja, um influencia o outro, é um processo de mútua interação. A partilha de saberes e experiências resultam de processos que têm como “palco” os contextos de trabalho em parceria.

O modelo assenta na premissa de que o desenvolvimento humano é sistémico, onde nenhuma parte faz sentido sem a visão do todo. O todo só é possível ser analisado a partir das suas partes e os contextos são ambientes que influenciam e são influenciados pela pessoa. Considera quatro elementos essenciais: a pessoa, o processo, o contexto e o tempo. A pessoa é significativamente influenciada pelas interações entre ecossistemas (contexto/ambiente) que se sobrepõem.

Para o nosso estudo, considerámos pertinente utilizar dois ecossistemas: o microsistema e o mesosistema. Um microssistema é um padrão de atividades, papéis sociais e relações interpessoais experienciados pela pessoa em desenvolvimento num dado ambiente com características físicas, sociais e simbólicas particulares que convidam, permitem ou inibem o envolvimento sustentado em atividades progressivamente mais complexas, em interação com o meio ambiente. Um mesosistema inclui as interligações e processos que acontecem entre dois ou mais ambientes que contém a pessoa em desenvolvimento. Salienta o desenvolvimento como estando diretamente relacionado com o número de contextos em que a pessoa participa.

Os nomes apresentados: a criança, os pais e os enfermeiros, são entendidos como sujeitos ativos, dinâmicos, que criam e recriam de forma progressiva o meio onde se encontram. O Ser Humano age tendo em conta as significações construídas a partir das interações sociais que desenvolve, influenciando as suas atitudes, formas de organização e relações interpessoais que estabelece10,12.

A criança ocupou a posição central dos cuidados de parceria3,13:

Foi um bem “[…]” ter aprendido “[…]” para a criança (P3). E então “[…]” tinham uma salinha bonita para os meninos brincarem, “[…]” eram as enfermeiras que punham os meninos no chão para eles brincarem “[…]” eles “[…]” têm que ganhar saúde (P6).” […]” eu vi que ela tudo o que tinha feito “[…]” era só mesmo para o bem dele (P7).

Os contextos onde se desenrolou o trabalho em parceria e o tempo em que o mesmo decorreu foram entendidos como recursos para as mães, que trabalham em conjunto com os enfermeiros para obterem ganhos em bem-estar, qualidade de vida1,14 e desenvolvimento integral das crianças5,13.

Desde que nasceu, viveu os primeiros 10 meses dentro do hospital e foi “[…]” a constância era diária “[…]” a realizar com os enfermeiros, desde saber lidar com um bebé com os fios agarrado a ele, desde a própria alimentação (P6). Esta parceria que estabeleci com elas, foi, foi muito bom (P8).

Os restantes termos apresentados na representação esquemáticas consagram-se como resultados do estudo. A capacitação dos pais e a tomada de decisão em parceria surgem-nos como oportunidades de parceria, estabelecidas no âmbito dum processo relacional, dinâmico, singular e contínuo desenrolado nos contextos de parceria.

A capacitação dos pais e o estabelecimento de uma relação de parceria

Nos dados referentes à categoria capacitação dos pais, o envolvimento/participação nos cuidados à criança teve como finalidade a sua capacitação plena. Com o passar do tempo, a maioria dos participantes desejou ter a oportunidade de aprender a lidar com a complexidade da condição de saúde/doença das crianças4, ou seja, a capacitar-se gradualmente. A oportunidade de aprendizagem conduziu ao desenvolvimento de conhecimentos e habilidades das mães para cuidarem dos seus filhos4,14.

“[…]” eu tive que fazer “[…]” como se eu fosse a enfermeira (P1). E depois daquele dia “[…]” era passo a passo. Enquanto eu não me senti capaz de fazer tudo sozinha cá no hospital, elas não me mandaram embora (P3). “[…]” dia para a noite ou da noite para o dia, acordei com aquela vontade de que tinha que ser e que tinha que iniciar e pronto, tinha que conseguir “[…]” eu era uma mestra em processo (P4). Quando nós estávamos a fazer a alimentação parentérica “[…]” primeiro tivemos a ver como elas faziam uma ou duas vezes e depois começamos a fazer e correu tudo bem (P9).

Os termos envolvimento parental e participação parental são sinónimos e abrangem a prestação de cuidados e a tomada de decisão6,15. Nesta perspetiva, as mães sentiram-se totalmente envolvidas nos cuidados que prestaram aos seus filhos. Quando se sentiram capacitadas para cuidarem da criança, envolveram-se, assumindo a realização plena dos cuidados.

“[…]”eu virei a enfermeira do A “[…]” 24 horas, o pai era o assistente da enfermeira (P6). “[…]” desde que eu estava, era eu que prestava os cuidados do início ao fim “[…]” elas davam essa oportunidade, estando presentes (P8).

Quando os pais se sentem envolvidos como parceiros, descrevem um processo interativo que se assemelha a uma “dança”, em que a “coreografia muda ao longo do tempo”, assim como o ritmo do envolvimento e da participação4.

A informação/comunicação foi valorizada, em concordância com os resultados de estudos em que foi atribuída uma acrescida importância aos pais, por serem detentores de uma ampla gama de informações sobre a situação da criança e os cuidados a prestar à mesma3,15. Os pais tornam-se especialistas nos cuidados ao filho e os seus conhecimentos e capacidades devem ser respeitados pelos enfermeiros3.

Por sua vez, ter uma enfermeira de referência significou poderem usufruir dos cuidados de uma pessoa com uma vasta experiência, o que lhes transmitiu tranquilidade16.

Da primeira vez que eu fiz sozinha em casa foi ao telefone com a “[…]” enfermeira de apoio, a ver se estava tudo bem e ela disse que sim. Acho que é importante nós termos alguém com quem comunicar. Foi uma grande oportunidade e um grande apoio que nós temos (P2). Estão ali “[…]” informam-nos. Não nos deixam preocupadas, portanto, há sempre, há comunicação, em todos os sentidos, há comunicação, comunicam e ouvem-nos “[…]” qualquer coisa que aconteça em casa é a primeira pessoa que eu falo “[…]” é sempre aquela enfermeira (P5). Uma enfermeira como ela no serviço “[…]” tinha muita experiência e isso a mim deu-me muita tranquilidade (P6).

Em continuidade referiram que aprender a cuidar da criança foi fundamental para a sua capacitação. Nas diversas experiências de parceria estabelecidas com os enfermeiros para além de valorizaram os momentos de aprendizagem, conferiram uma especial ênfase ao conhecimento dos enfermeiros sobre as condições destas crianças4,17 e aos modos de agir dos mesmos. Os modos de agir dos enfermeiros, surgem assim com ênfase à natureza da parceria assente em processos interativos de ajuda5, tornando a relação real e útil tanto para os pais como também para a criança.

Tive duas enfermeiras [X e Y] a ensinar-me (P2). “[…]” fiz um aprendizado com cada enfermeira “[…]” aqueles pormenores, aquelas dúvidas que surgem na situação, que a gente não sabe o que é que há-de fazer e pergunta à enfermeira [X] e ela diz: olhe é melhor assim “[…]” as maneiras como cada um trabalha são diferentes “[…]” juntar o que cada uma sabe “[…]” acabou por me ajudar “[…]” dá para aprender muito “[…]” são tudo experiências positivas (P5). “[…]” ensinam-nos conforme manda o livro “[…]” era engraçado ver as técnicas daquela gente “[…]” via fazer coisas novas “[…]” aprendemos muito (P6). Eles “[…]” começaram a “[…]” instruírem-nos e a treinarem-nos “[…]” ela “[…]” tinha muitos conhecimentos “[…]” têm os conhecimentos necessários “[…]” são conhecedoras das situações (P8). Cada uma tem “[…]” no final é tudo o mesmo, mas cada uma tem as suas maneiras de fazer e nós fomos apanhando uma maneira de uma, outra parte de outra e fizemos o nosso método, não é “[…]” e fazemos em casa (P9).

Os pais valorizam a sensibilidade e a atenção do enfermeiro para trabalhar as circunstâncias da vida real e potencial da criança e da sua família, quer ao nível mais superficial e concreto dos aspetos clínicos, quer na satisfação das necessidades emocionais específicas4.

O processo de consolidação da tomada de decisão em parceria

No que diz respeito aos dados obtidos na categoria tomada de decisão em parceria, estamos em concordância com os resultados de estudos realizados em Portugal, que demonstram não existir em geral, disponibilidade para o estabelecimento da negociação da decisão5). No entanto, algumas das mães valorizaram a negociação de cuidados partilhada, como parte do trabalho em parceria com os enfermeiros ao contrário do que se verificou na subcategoria anterior.

“[…]” eles também nos ouvem, eles também nos ouvem. Por exemplo, a vestir uma camisola e a gente dizer-lhes que não, que é mais fácil pegar assim no braço, eles ouvem-nos, acatam a nossa opinião (P5). “[…]” nunca houve imposição nenhuma, deixavam-nos sempre à vontade “[…]” estavam sempre abertas “[…]” se houvesse alguma coisa que fosse prejudicial para ele “[…]” eles diziam “[…]” e nós entendíamos “[…]” davam-nos várias alternativas para tudo (P9).

Depreendemos que à medida que as mães se foram sentindo capacitadas, pretenderam tomar a maioria das decisões de forma independente e/ou em colaboração com os enfermeiros, liderando as decisões que implicaram a gestão dos cuidados dirigidos aos seus filhos4,14. Desta forma, os enfermeiros devem apoiar a decisão dos pais, sendo esta outra subcategoria a que as mães atribuíram valor.

A primeira vez que rebentei os sacos eu furei um saco e enchi a cama de líquido “[…]” estava na hora de fazer o tratamento à minha filha, mas eu tive que por logo outro saco a aquecer “[…]” e fazer só meia hora mais tarde “[…]” depois telefonei à enfermeira [X] que é a enfermeira de referência e ela disse que não fazia diferença e podia fazer meia hora mais tarde. Acho que “[…]”. Foi uma grande oportunidade e um grande apoio que nós temos (P2). Uma decisão que eu tomei, em que “[…]” fui apoiada pela minha enfermeira (P5).

As mães sentiram-se confortáveis com o apoio que receberam dos enfermeiros em relação às suas decisões, em concordância com as conclusões de outro estudo onde é referido que apesar das circunstâncias específicas em que ocorreram as experiências de parceria, é importante discutir as decisões com os enfermeiros15. Contudo, “este modelo de cuidados requer um nível de colaboração entre os pais e os enfermeiros, assente no respeito mútuo e confiança, com impacto na autoconfiança e na capacidade total dos pais para “viverem” com um filho com NES”3-4. Esta asserção veio refletir o valor do aspeto participativo e relacional do trabalho em parceria com os pais, nomeadamente serem ouvidos, respeitados e apoiados nas suas decisões.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A capacitação dos pais e a tomada de decisão em parceria são oportunidades valorizadas pelas mães de crianças com NES, dado que vieram facilitar o desempenhar do seu papel parental. Os elementos de análise ao terem sido valorizados pelos pais, devem ser referenciais para os enfermeiros, porque poderão facilitar o planeamento do trabalho em parceria.

Embora a capacitação e a tomada de decisão já fizessem parte dos termos utilizados nos modelos de parceria, não estavam identificados como oportunidades de parceria. Surgiram termos/expressões novas associados ao conceito de parceria, denominadas como elementos constitutivos do mesmo: aprender a cuidar da criança, modos de agir dos enfermeiros, ter uma enfermeira de referência.

Para a prática de cuidados de enfermagem, os resultados deste estudo em particular, permitirão aos enfermeiros elaborar processos de cuidados às crianças com NES que abarquem as oportunidades de parceria, traduzindo a necessidade de capacitar os pais e envolvê-los na tomada de decisão. Os elementos associados às oportunidades de parceria são pressupostos fundamentais da parceria de cuidados, com enfoque na criança e nos pais enquanto recursos.

Com implicações na gestão dos cuidados de enfermagem, emergiu a importância do papel do enfermeiro de referência, que foi muito valorizado pelos pais, nomeadamente no apoio à capacitação e suporte emocional que este disponibiliza aos mesmos. Ficou ainda patente que a utilização do método de trabalho por enfermeiro de referência, é significativo nos períodos em que a criança e os pais estão internados, mas também quando estão no domicílio, porque este profissional constitui-se como elo de apoio informativo/formativo, podendo articular com outros profissionais e/ou recursos disponíveis. O conhecimento e os modos de agir dos enfermeiros foram sensíveis à capacitação das mães, pelo que deduzimos que devem ser os enfermeiros mais qualificados, detentores de competências cognitivas, técnico-instrumentais e relacionais a desempenharem este papel.

Por fim, destacamos a possibilidade de continuidade deste estudo de modo a poder dar resposta às questões que derivaram da discussão e interpretação dos dados obtidos, das quais: que modelo de parceria de cuidados é significativamente relevante no cuidar de crianças com NES? Qual a relação entre as oportunidades de parceria no cuidar de crianças com NES e a qualidade de vida destas crianças e famílias?

Globalmente, os resultados deste estudo encontraram fundamento nos referenciais teóricos dos modelos de parceria e na prática de cuidar em parceria (modelo em uso), pelo que veio acrescentar maior apropriação do conceito de parceria com implicações para a disciplina de enfermagem e maior conhecimento acerca das oportunidades de parceria.

Como limitações do estudo não nos foi possível obter dados em pais de crianças com NES relacionadas com problemas respiratórios crónicos, diabetes e oncológicos, de entre condições de saúde frequentes nesta população pediátrica.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    31 Dez 2016
  • Aceito
    27 Jul 2017
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