Open-access Planejamento familiar: dilemas bioéticos encontrados na literatura

Resumo

O artigo traz resultados de revisão integrativa realizada conforme as recomendações do método Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses. O objetivo era investigar, à luz do modelo principialista, os dilemas bioéticos que emergem do planejamento familiar, de acordo com a literatura. Os dados foram levantados em pesquisa nas bases Medline, Lilacs e Scopus, por meio do cruzamento dos descritores “family planning and bioethics”. Após aplicação dos critérios de elegibilidade, sete artigos publicados entre 2011 e 2018 foram selecionados para compor o estudo. Esses artigos foram submetidos a análise de conteúdo, como proposta por Bardin. Quatro categorias temáticas foram observadas: direito a liberdade e autonomia sexual/reprodutiva; interferência de governos no planejamento familiar e reprodutivo; barreiras socioculturais e religiosas ao planejamento familiar; e aprimoramento de tecnologias voltadas à manipulação de pré-embriões. Os resultados sugerem que os avanços científicos andam mais rápido do que as discussões bioéticas, criando dilemas práticos e teóricos.

Planejamento familiar; Saúde da família; Saúde sexual; Saúde reprodutiva; Bioética

Abstract

This integrative review, based on the Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses method, investigates the bioethical dilemmas that emerge from family planning, in light of principlism. Data were collected based on literature research conducted at the Medline, Lilacs and Scopus databases, using the descriptors “family planning and bioethics.” After applying the eligibility criteria, seven papers published between 2011 and 2018 were selected for content analysis, performed according to Bardin’s proposal. The study identified four thematic categories: right to freedom and sexual/reproductive autonomy; government interference in family and reproductive planning; sociocultural and religious barriers to family planning; and technological enhancement for pre-embryo handling. Results suggest that scientific advances move faster than bioethical discussions, creating practical and theoretical dilemmas.

Family Planning; Family Health; Sexual Health; Reproductive Health; Bioethics

Resumen

Este artículo presenta los resultados de una revisión integrativa conforme al Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses. Su objetivo fue investigar, desde el modelo principialista, los dilemas bioéticos que surgen de la planificación familiar en la literatura. Para la recopilación de datos se llevó a cabo búsquedas en las bases de datos Medline, Lilacs y Scopus utilizando los descriptores “family planning and bioethics”. Tras la aplicación de criterios de elegibilidad, se seleccionaron siete artículos publicados entre 2011 y 2018. Se aplicó a los artículos el análisis de contenido propuesto por Bardin. Se obtuvieron cuatro categorías temáticas: derecho a la libertad y autonomía sexual/reproductiva; interferencia del gobierno en la planificación familiar y reproductiva; barreras socioculturales y religiosas a la planificación familiar; y mejora de tecnologías relacionadas al manejo de los preembriones. Los resultados apuntaron que los avances científicos van más rápido que las discusiones bioéticas, ocasionando dilemas prácticos y teóricos.

Planificación familiar; Salud de la familia; Salud sexual; Salud reproductiva; Bioética

Entende-se por planejamento familiar o conjunto de intervenções para regular a fertilização e garantir os direitos reprodutivos de cada indivíduo. Para tanto, faz-se necessária a sistematização de processos educacionais, além de meios que permitam conhecer, acessar e utilizar corretamente os métodos contraceptivos. O planejamento familiar é uma importante ferramenta que contribui não apenas para o controle populacional, mas também para o bem-estar biopsicossocial de indivíduos que se encontram na fase reprodutiva de suas vidas e devem ter total autonomia na tomada de decisões1 , 2 .

Apesar de as técnicas de controle de natalidade já serem bem exploradas e consideradas um direito básico do indivíduo, ainda há fortes tabus relativos a essas práticas. Em muitos contextos sociais e religiosos, as opiniões sobre os métodos anticoncepcionais são controversas e polêmicas, dificultando que homens e mulheres tenham liberdade de escolha sobre a contracepção3 . Por outro lado, países com grande contingente demográfico, como China e Índia, praticam políticas agressivas de controle populacional, monitorando rigidamente a taxa de natalidade, o que gera questionamentos em relação aos direitos reprodutivos de seus cidadãos4 .

É nesse complexo cenário que o planejamento familiar vem tentando se consolidar, garantindo educação e assistência de qualidade à saúde, voltada aos direitos sexuais e reprodutivos, sempre respeitando o contexto sociocultural de cada população, de modo a promover a autonomia e defender o livre-arbítrio de indivíduos e casais5 . Portanto, discussões e pesquisas voltadas a aspectos éticos, morais, filosóficos e políticos relacionados com o planejamento familiar continuam necessárias6 .

Diante do contexto apresentado e considerando o modelo principialista de Beauchamp e Childress7 , este estudo teve por objetivo investigar a literatura sobre dilemas bioéticos que emergem do planejamento familiar.

Método

Trata-se de revisão integrativa, caracterizada como estudo de tipo secundário que busca sintetizar criticamente os conhecimentos disponíveis na literatura científica em determinado momento8 . Para padronizar a coleta dos dados, seguiu-se o método Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (Prisma)9 , que divide essa etapa em quatro fases: identificação, seleção, elegibilidade e inclusão. Durante todo o processo, procurou-se responder à seguinte pergunta norteadora: quais dilemas bioéticos emergem do planejamento familiar de acordo com a produção científica atual?

Na primeira fase da coleta (identificação), buscaram-se artigos indexados nas bases Literatura Internacional em Ciências da Saúde (Medline), Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (Lilacs) e SciVerse Scopus. Utilizaram-se os descritores “family planning and bioethics”. As buscas foram realizadas no mês de outubro de 2019.

Na segunda fase (seleção dos estudos), aplicaram-se os seguintes filtros: artigos originais, idioma (inglês, português e espanhol) e ano de publicação (entre janeiro de 2008 e outubro de 2019). O recorte temporal foi estabelecido para garantir a atualidade das questões bioéticas em evidência. Já na terceira fase (elegibilidade), os títulos e resumos dos artigos foram lidos a fim de selecionar os que se adequavam aos critérios de inclusão: 1) responder à pergunta norteadora; e 2) ser um estudo com população-alvo composta exclusivamente por seres humanos. Doze trabalhos foram selecionados para leitura na íntegra, aplicando-se os seguintes critérios de exclusão: 1) artigos duplicados em diferentes bases de dados; e 2) teses, dissertações, revisões sistemáticas e integrativas, além de editoriais e notas técnicas ( Figura 1 ).

Figura 1
Diagrama do fluxo de seleção dos estudos, conforme escala Prisma

Durante toda a coleta, dois investigadores independentes realizaram a busca, obedecendo ao método duplo-cego preconizado pelo Prisma. As divergências entre os revisores foram resolvidas por um terceiro investigador, que deu o parecer definitivo. Por fim, dos 242 artigos identificados inicialmente nas bases de dados, sete respondiam a todos os critérios supracitados.

Após a coleta, os dados desses sete artigos foram submetidos a análise categorial (o desmembramento do texto em categorias agrupadas analogicamente com base na pergunta norteadora), como proposta por Bardin10 . Assim, as seguintes fases foram obedecidas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

Durante a leitura flutuante da pré-análise, organizaram-se os dados por meio de fichamento, e as informações foram processadas com auxílio de instrumento elaborado e validado por Ursi11 . Esse método permitiu minimizar erros na transcrição e tradução, garantindo maior precisão das informações coletadas.

O material foi explorado por meio de extração de unidades de registro (palavras-chave e temas que emergiram nos textos), sendo essa a primeira categorização. Essas categorias iniciais foram agrupadas tematicamente, gerando categorias intermediárias, que por sua vez foram aglutinadas em temas, até resultar nas categorias finais. Utilizou-se como critério de identificação a representatividade do tema em relação à pergunta norteadora.

Todo o processo de categorização obedeceu aos princípios de exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, fidelidade e produtividade. Por fim, chegou-se à etapa de inferência, na qual foi possível evidenciar os principais dilemas bioéticos que permeiam o planejamento familiar e discuti-los à luz dos quatro princípios morais prima facie da bioética principialista: autonomia, justiça, beneficência e não maleficência7 .

Resultados

Dentre os sete artigos selecionados, dois foram publicados em português e cinco em inglês. Os estudos mostraram-se heterogêneos em relação ao local, tendo origem tanto em países considerados mais conservadores (como o Irã) quanto mais liberais (como o Canadá). Quanto ao desenho metodológico, cinco estudos eram de natureza reflexiva e dois exploratórios ( Quadro 1 ).

Quadro 1
Distribuição dos artigos analisados por autor/ano, país de origem e desenho metodológico

Os principais resultados dos artigos selecionados são resumidos no Quadro 2 . Observa-se que os estudos apontam para a necessidade de mais discussões no campo da bioética para que o planejamento familiar seja uma possibilidade hegemônica e viável.

Quadro 2
Principais resultados dos estudos selecionados

As categorias iniciais que surgiram de palavras-chave e temas dos textos estão expostas no Quadro 3 . Da elaboração dos conceitos norteadores, emergiram as categorias intermediárias: 1) “a mulher como sujeito ativo na escolha reprodutiva”; 2) “independência sexual e reprodutiva”; 3) “políticas públicas de saúde”; 4) “consequências da ausência de políticas públicas eficazes”; 5) “opressão do Estado”; 6) “estigmas socioculturais e religiosos”; 7) “controle da hereditariedade”; e 8) “eugenia”.

Quadro 3
Exposição das categorias iniciais e intermediárias

Os conceitos norteadores das categoriais iniciais e intermediárias embasaram a construção das categorias finais: 1) “direito a liberdade e autonomia sexual/reprodutiva”; 2) “interferência de governos no planejamento familiar e reprodutivo”; 3) “barreiras socioculturais e religiosas ao planejamento familiar”; e 4) “aprimoramento de tecnologias voltadas à manipulação de pré-embriões” ( Quadro 4 ).

Quadro 4
Exposição das categorias finais

Discussão

O termo “planejamento familiar” não se refere apenas à prática reprodutiva, mas engloba também a construção da família como um todo, com ações que buscam melhorar as condições para o nascimento de crianças, promover adoções responsáveis e prevenir a gravidez indesejada. Como parte da assistência à saúde da população e importante ferramenta para garantir direitos reprodutivos, o planejamento familiar visa assegurar total autonomia em escolhas relativas a gravidez ou adoção, em situações pessoais, sanitárias e sociais mais adequadas12 , 17 .

Os avanços no planejamento familiar levam a questionar sobre o que de fato é uma família, visto que a mera combinação de genes e DNA não é suficiente para definir tal conceito. Formada por indivíduos com ou sem vínculos genéticos, a família é a mais antiga instituição social, e pode apresentar diferentes formas e composições.

É vital que o planejamento familiar colabore para uma construção mais responsável dessa instituição, proporcionando informações contextualizadas e fornecendo meios para que cada casal ou indivíduo faça suas escolhas, respeitando os princípios de autonomia, justiça, beneficência e não maleficência12 , 13 . Muitos dogmas antes vinculados à prática reprodutiva estão se tornando obsoletos, o que gera novas discussões e dilemas bioéticos que ainda precisam ser encarados.

Direito a liberdade e autonomia sexual/reprodutiva

A necessidade de se expressar sexualmente está enraizada na própria condição humana, e o direito a essa expressão não deve ter a reprodução como principal pressuposto. É importante que os indivíduos sejam autônomos e livres para desfrutar de suas vivências sexuais, escolhendo quando e como se relacionam. Logo, os conceitos de planejamento sexual e de planejamento reprodutivo precisam ser dissociados, visto que a sociedade atual já dispõe de métodos para usufruir uma prática sexual saudável, que não implique necessariamente a reprodução12 .

Um importante avanço nesse sentido foi o surgimento de contraceptivos com ampla eficácia e baixo custo, que proporcionaram às mulheres mais liberdade e bem-estar psicossocial. Assim, com uma combinação de assistência adequada e facilidade de acesso a anticoncepcionais, as mulheres passaram a ter meios para escolher como e quando ter filhos, podendo continuar os estudos ou seguir carreira sem se preocupar com uma gravidez não planejada. Os contraceptivos, portanto, estão de acordo com o princípio da autonomia, que defende o direito de escolher livremente uma opção sem interferência de pressões externas, contanto que tal escolha não seja danosa a terceiros ou aos envolvidos12 , 14 .

O papel da mulher no planejamento familiar não deve ser de mero objeto, mas sim de sujeito ativo e protagonista da própria história sexual e reprodutiva. Até o presente momento, a gravidez é uma condição humana que apenas as mulheres podem vivenciar e, por mais que seja completamente natural do ponto de vista biológico, tal evento acarreta riscos à saúde física, mental e emocional. Os métodos contraceptivos, portanto, respeitam o princípio da beneficência ao colaborar com a saúde e bem-estar feminino, possibilitando maior controle das vivências sexuais e reprodutivas12 .

No entanto, apesar de os métodos anticoncepcionais apresentarem inúmeras vantagens biopsicossociais, religiões e sociedades conservadoras acabam por censurá-los, ferindo o direito humano à liberdade sexual. Essas religiões e sociedades ainda consideram que o único objetivo do sexo é a reprodução, o que coloca barreiras a uma sexualidade livre e saudável16 , 17 . De maneira geral, mulheres são mais vulneráveis a esse tipo de opressão, mas seus direitos e autonomia de escolha jamais deveriam ser transferidos, renunciados ou negados, independentemente das circunstâncias.

Interferência de governos no planejamento familiar e reprodutivo

Políticas voltadas a informar a população sobre planejamento reprodutivo são fundamentais e devem ser encaradas como questão de saúde pública. O planejamento familiar pode melhorar os padrões de renda e vida da população, proporcionando maior bem-estar econômico e social. Assim, é importante construir políticas sólidas de acesso a programas educacionais de qualidade, visando empoderar as pessoas para a tomada de decisões reprodutivas15 .

Por outro lado, a ausência ou má elaboração de políticas públicas prejudica a saúde da população, acarretando aumento de gravidez indesejada, abortos ilegais, doenças e infecções sexualmente transmissíveis e agravando condições econômicas precárias. Dessa forma, colocam-se em questão os princípios da não maleficência e da justiça, segundo os quais não se deve beneficiar alguns à custa do malefício de outros15 , 17 .

É pela ambiguidade entre respeito à autonomia e uma possível beneficência socioeconômica que as políticas de planejamento familiar muitas vezes se confundem com o controle populacional exercido por alguns governos. Por isso vale chamar atenção para a diferença entre o planejamento familiar – conjunto de ações de regulação da fecundidade que garante direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal – e o controle de natalidade, que busca diminuir o número de nascimentos por meios frequentemente não consensuais. Embora seja compreensível, a depender do contexto, que o Estado procure intervir na estrutura populacional, há questões éticas relativas à autodeterminação de cada indivíduo ou casal que não devem ser menosprezadas12 .

O respeito à autonomia não se limita à tomada de decisões sem coerção. O consentimento é insuficiente para que uma escolha seja considerada livre de interferências externas. A deliberação precisa se basear em informações contextualizadas, já que as políticas de controle demográfico não são responsabilidade exclusiva dos indivíduos, mas da sociedade como um todo14 , 15 , 17 .

Barreiras socioculturais e religiosas ao planejamento familiar

Além do Estado, a religião – muitas vezes contrária a métodos artificiais que impedem ou dificultam a fertilização – exerce bastante influência sobre as práticas de contracepção. Embora alguns afirmem que a religião é favorável à construção familiar (prezando pelo acolhimento dos filhos mesmo antes de sua concepção), outros a veem como barreira ao planejamento reprodutivo, uma vez que ela pode interferir na tomada de decisões e gerar um dilema bioético relativo à não maleficência.

É comum que dogmas religiosos permeiem a estrutura do casamento tradicional com visões patriarcais que impedem o livre exercício da sexualidade12 , 16 , 17 . No entanto, a interferência da religião no planejamento familiar se torna ainda mais grave quando instituições de saúde vinculadas a igrejas sobrepõem normas e princípios internos ao devido aconselhamento reprodutivo. Todo indivíduo tem liberdade e autonomia para decidir se quer ou não seguir uma religião e viver conforme suas doutrinas, mas o direito à informação e o acesso a serviços de saúde não podem ser negados a ninguém16 .

Sociedades mais conservadoras, principalmente aquelas que atribuem à mulher um papel meramente reprodutivo, também tendem a interferir na tomada de decisão. Reduzir o corpo feminino a um simples objeto de concepção pode gerar impactos consideráveis à saúde psicológica e sexual das mulheres, principalmente daquelas que sofrem com a infertilidade16 . Radicalizando a ideia de que a função da mulher é reproduzir, certas culturas, na tentativa de controlar a sexualidade das mulheres, aderem à mutilação genital feminina, numa clara violação a direitos humanos. Nesses casos, cabe destacar que valores próprios de uma sociedade devem ser respeitados, mas desde que não interfiram na saúde e bem-estar de seus membros17 .

Aprimoramento de tecnologias voltadas à manipulação de pré-embriões

Embora a religião e a cultura da sociedade em que os indivíduos estão inseridos continuem sendo importantes na aceitação ou recusa do planejamento familiar, não se pode deixar de valorizar o impacto dos grandes avanços científicos das últimas décadas. A biotecnologia contemporânea permite diferentes intervenções e abordagens relativas à concepção, que vão desde a forma como a fertilização acontece até a quantidade e o perfil dos indivíduos envolvidos13 , 18 .

A tecnologia reprodutiva atual pode curar doenças genéticas por meio da manipulação de genes e seleção de gametas in vitro , trazendo benefícios a indivíduos que ainda serão gerados. Entretanto, como os avanços tecnológicos andam mais rapidamente do que as discussões bioéticas, surgem dilemas práticos e teóricos. Mesmo que as técnicas de manipulação de pré-embriões apresentem vantagens para a saúde pública e individual, não se deve menosprezar os limites históricos e ideológicos que nos impedem de socializar esses benefícios13 , 18 .

Os avanços na reprodução humana entusiasmam a comunidade científica, oferecendo vantagens que podem beneficiar muitas pessoas. Esses progressos, porém, também despertam reflexões complexas e grandes preocupações. Se, por um lado, a intervenção humana em um ato antes tido como natural faz avançar as terapias gênicas, por outro, criam-se situações que podem trazer a eugenia à tona novamente13 .

Nossas características e particularidades não devem ser definidas apenas por nosso perfil genético, pois transcendem barreiras sociais, culturais e ideológicas. Mesmo que se crie um ser humano geneticamente perfeito, o conceito de saúde, como sabemos atualmente, vai além da ausência de doença, abrangendo também a interação entre indivíduos e atitudes e hábitos do cotidiano. Somos complexos demais para que nos limitem e julguem apenas por nosso DNA12 , 13 , 18 .

Por fim, ressalta-se que os avanços tecnológicos na reprodução humana podem não ser acessíveis para todos devido a seu alto custo, o que fere o princípio da justiça13 . Com os novos métodos contraceptivos e as novas tecnologias reprodutivas, as discussões bioéticas sobre o planejamento familiar (que antes giravam em torno de “quando” e “como” ter ou não filhos) começam agora a refletir sobre que “tipo” de filhos queremos ter12 , 13 , 18 .

Considerações finais

Os dilemas bioéticos que emergem do planejamento familiar estão relacionados ao direito a liberdade e autonomia sexual/reprodutiva (principalmente das mulheres), à interferência de governos no planejamento familiar e reprodutivo, às barreiras socioculturais e religiosas ao planejamento familiar, e aos avanços tecnológicos que possibilitam a manipulação de pré-embriões. A discussão sobre esses dilemas precisa ser intensificada a fim de impedir retrocessos no campo da saúde e dos direitos reprodutivos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2021
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2021

Histórico

  • Recebido
    17 Dez 2019
  • Revisado
    11 Maio 2021
  • Aceito
    28 Maio 2021
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