Resumo
O presente artigo constitui um relato da pesquisa desenvolvida pela primeira autora em seu mestrado em psicologia social e institucional tendo como tema os encontros da pesquisadora, como palhaça e como psicóloga, com os trabalhadores nos espaços de práticas de educação permanente em saúde mental. Tais encontros acontecem a partir das intervenções da palhaça Dulcinóia, encarnada na pesquisadora através da máscara do nariz vermelho, tanto nas práticas de educação permanente em saúde mental como no exercício da pesquisa. Estas intervenções foram designadas como intervenções riso-clínicas. Assim, discutem-se as relações da palhaçaria com a saúde mental a partir das experiências vividas e as possíveis invenções sobre diferentes modos de trabalhar e de cuidar neste contexto. As experiências são narradas e desenvolvidas a partir da metodologia do ensaio sobre as cenas vividas. Como conclusão, destacamos a importância da presença da figura do palhaço e do signo do humor como produtores de possíveis transformações e de uma ampliação do olhar sobre o trabalho em saúde mental.
Palavras-chave:
palhaço; saúde mental; educação permanente; riso-clínica
Abstract
This article is a report of the research developed by the first author in her master degree in social and institutional psychology, having as its theme the researcher’s meetings as clown and as psychologist with the workers in the spaces of permanent education practices in mental health. Such meetings take place from the interventions of the clown Dulcinóia, embodied in the researcher through the mask of the red nose, both at the permanent education practices in mental health and in the exercise of the research. These interventions were termed laugh-clinic interventions. Thus, the relationships of clown techniques with mental health from the lived experiences and possible inventions on different ways of working and caring in this context are discussed. The experiences are narrated and developed from the methodology of the essay on the lived scenes. As a conclusion, we highlight the importante of clown´s figure presence and sign of humor as producers of possible transformations and extention of the look on mental health work.
Keywords:
clown; mental health; permanent education; laugh-clinic
Resumen
Este artículo es un relato de la investigación desarrollada por la primera autora en su maestría em psicología social e institucional y tiene como tema sus encuentros, como payasa y psicóloga, con trabajadores de espacios de prácticas de educación permanente en salud mental. Estos encuentros se han dado a partir de las intervenciones de la payasa Dulcinoia, encarnada en la autora por medio de la máscara de la nariz roja, tanto en las prácticas de educación permanente en salud mental como en el ejercicio de la investigación. Estas actividades se han dado a llamar intervenciones riso-clínicas. Así, el estudio discute las relaciones de payasería y salud mental a partir de experiencias vividas y de ideas sobre diferentes modos de trabajar y cuidar en este contexto. Las experiencias se narran y se desarrollan a partir de la metodologia del ensayo sobre las escenas vividas. Como conclusión, destacamos la importancia de la presencia de la figura del payaso, así como del signo del humor como motivadores de posibles transformaciones que amplíen la mirada sobre el trabajo en salud mental.
Palabras clave:
payaso; salud mental; educación permanente; riso-clínica
Apresentação: uma palhaça pesquisa
Para iniciar este artigo, faz-se necessário evocar um convidado ilustre. O adorável vagabundo, o perdedor, o irreverente - o palhaço. Ou melhor, a palhaça. É ela a condição de possibilidade, a razão, e a desrazão, do estudo que ora apresentamos. Dulcinóia. A provocadora, desconfortável e prazeroso duplo, que nos impulsiona a querer acompanhá-la, sem prender seu fluxo, aproveitarmo-nos da sua força, unirmo-nos a ela e deixar que faça interferências dissonantes naquilo que temos experienciado (nós e ela) na área da educação permanente em saúde mental.
Se agora uma de nós, autora, está pesquisadora, é porque também está palhaça. A experiência de encarnar o nariz vermelho, vivida pela primeira vez no ano de 2005, tem perturbado nossa condição racional e ressentida, ampliando os modos de relação com a vida em suas variadas formas, apresentando-nos uma dimensão do humano em seu terrível, temível e maravilhoso ridículo. A condição a que nos referimos acompanha a leitura de Deleuze (2002DELEUZE, Gilles. Espinosa: filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002.) sobre Espinosa, quando afirma que o homem do ressentimento é aquele para o qual qualquer felicidade é uma ofensa, sendo a miséria e a impotência sua paixão. O ato de palhaçar extrapola o sentido da arte cênica de interpretação de um personagem para ocupar uma condição de ser/estar, de viver, de experiência de si. Inspiramo-nos em Foucault (1994, citado por PINHO, 2013PINHO, Luiz Celso. Por uma existência artística: ética e estética em Nietzsche e Foucault. Griot: Revista de Filosofia, Amargosa, BA, v. 8, n. 2, p. 108-117, 2013., p. 115), quando indaga: “Mas a vida de todo indivíduo não poderia ser uma obra de arte? Por que uma mesa ou uma casa são objetos de arte, mas nossas vidas não?”. Assim a experiência de encarnar o nariz vermelho revira certezas e produz potências em nosso ser-fazer-psicóloga, ser-fazer-pesquisadora, em nosso ser-fazer. Revira, portanto, e refaz o percurso desta escrita-pesquisa-artigo.
De 2005 a 2016, à medida que buscávamos novos cursos de palhaço, encontrávamo-nos com outros brincantes - e o corpo da palhaça-psicóloga se formava, expandia-se e diversificava. No ano de 2013 recebemos, em um processo de formação em clown, a nomeação de Dulcinóia. A palavra sugere hibridismo de doçura, romantismo, com loucura e desatino. As roupas também se quebram: sobrepõem-se as ceroulas ao vestido; as formas do corpo expõem-se, mas são coloridas por calças roxas justas; o chapéu de formato irregular esconde o cabelo, revelando orelhas e rosto. O rosto pintado não é para esconder, mas para marcar o que já está - olhar que desconfia, boca um pouco torta, bochechas infantis - tudo isso é Dulcinóia.
Com esse corpo, esse mesmo e outro corpo, realizamos o percurso do ser-psicóloga. Tais experiências, seja como estudante, seja como graduada, tiveram uma forte marca: a do contato com os trabalhadores em saúde mental e com o que se costuma nomear de educação permanente nessa área. Com tantos e distintos encontros, foi surgindo a vontade de levar Dulcinóia a participar destes espaços de trocas e construção de saberes e fazeres em saúde mental, sobretudo com os trabalhadores. Então, em 2012, demos início ao exercício de criação e apresentação de cenas de palhaço sobre os temas debatidos nos cursos, oficinas e seminários da área. Como veremos a seguir, tais criações multiplicaram-se, produzindo diversas reverberações, e hoje passam ao status de “intervenções riso-clínicas”, um termo inventado por nós, ao longo do percurso como psicóloga e como Dulcinóia nestes espaços, por uma tentativa - quase desesperada - de nomear o que temos realizado, já que não se trata puramente de uma ação artística, tampouco de uma intervenção apenas psi.
Algo se passa neste encontro sui generis entre o mundo da palhaça e o mundo da educação permanente em saúde mental. Algo que faz reverberarem afetos, incômodos, ideias, diferenças, vontades. Algo que busca mais, que tem levado as pessoas a quererem convidar os palhaços a participarem de seus eventos, a optarem pela aventura de se surpreenderem em risos a respeito do que vêm trabalhando e estudando com tanta dedicação e esforço. Algo que toca a palhaça em querer acompanhar a psicóloga em suas andanças como pesquisadora nas artes das relações humanas. Esse algo é o que nos propusemos a investigar, resultando na dissertação homônima de mestrado em psicologia social e institucional que nós e Dulci defendemos no segundo semestre do ano de 2016 da qual esta escrita-artigo constitui um recorte. Psicóloga, palhaça, pesquisadora escreveram juntas a dissertação, alternando suas vozes em solo, em duo, em trio; às vezes em uníssono, outrora dissonantes, dançando também com o jogo das pessoas - eu, tu, nós, ninguém - e assim apresentam-se também neste artigo.
Pesquisadora - Dulcinóia, temos um problema!
Dulcinóia - Temos? Uhuuuu!! Temos um problema!!
Pesquisadora - Quero dizer que é um incômodo, uma questão. Quase um desejo. Uma angústia.
Dulcinóia - Sim (passa a dançar).
Silêncio.
Dulcinóia - Vamos?
(Trecho do Diário de Campo1 1 Caro leitor: a experiência aqui apresentada constitui-se de muitas invenções, narrativas e coisas para as quais não se tem palavra para dizer, mas que queremos transmitir. Um jeito que encontramos de compartilhar essas invenções foi através do que aqui estamos denominando de “Trechos de Diário de Campo”: são escritas da pesquisadora-palhaça-autora elaboradas livremente a partir de suas experiências com o nariz de palhaço, sem a pretensão primeira de ser um texto acadêmico, mas com a intenção de elaborar os momentos vividos. Portanto, durante a leitura, você perceberá mudanças de tempos verbais e pessoas/sujeito. Esses trechos de diário de campo, então, quando apresentados no texto, virão com a formatação que vocês estão lendo. )
Sim, temos um problema! Fazer educação permanente em saúde implica um processo de aprendizagem a partir da problematização (uhu!) do próprio fazer dos trabalhadores, uma constante reflexão, invenção e reinvenção do que são as suas práticas (CECCIM, 2005CECCIM, Ricaro Burger. Educação Permanente em Saúde: desafio ambicioso e necessário. Interface: Comunicação, Saúde, Educação, v. 9, n. 16, p. 161-177, set. 2004/fev. 2005. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/icse/a/jC4gdtHC8RPLWSW3WG8Nr5k/?lang=pt&format=pdf . Acesso em: 20 out. 2020.
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). Assim, estão imbricados os atos de educação com os atos de trabalho e de ser trabalhador. Dessa forma, entendemos que o plano da educação permanente em saúde está diretamente ligado ao plano da saúde mental do trabalhador - como ele se vê e se sente como trabalhador e que prazeres e sofrimentos estão envolvidos nessa ação. Assim, um trabalhador envolvido em uma ação de formação em saúde deve estar também em um processo de intervenção sobre o seu próprio modus operandi e sobre o que sejam as práticas de trabalho em saúde. Para tanto, faz-se necessário um grau de implicação e de participação ativa desse trabalhador. Todavia, em contraponto ao quadro ideal que apresenta um trabalhador protagonista de um trabalho vivo e sensível, em um processo de aprendizagem significativa e crítica, apresentam-se diversos furos que marcam a cena da educação em saúde. Da mesma forma, o campo de trabalho na saúde mental é marcado por inúmeras precariedades e complexidades que contrastam com o que esperamos de uma prática ideal.
Por isso queremos trazer à cena o ser errante, o estar ridículo do palhaço, para que a educação permanente em saúde possa contagiar-se e potencializar-se com a sua presença irreverente. Parte deste investigar passa pelo esticar da pergunta-proposta oferecida por Dulcinóia à pesquisadora: “Sim. Vamos?”. Porém, essa presença-palhaça será fugidia. Quando não-fugidia, provavelmente se fará desviante. Assim, a pesquisa se faz no exercício de tatear jeitos de estar em relação com a palhaça e suas intervenções e com a pesquisadora e suas questões. Para tanto, esta escrita também precisará rebolar, esticar e saltar. E, como forma de acompanhar a intensidade da palhaça, optamos por tomar o exercício da escrita como um exercício de ensaio em que é permitido brincar, aliás, é esperado o brincar e o jogo para que seja possível acessar o estado de criação.
O ensaio nos permite uma escrita que habite essa zona esticada, onde cabem tanto as questões da pesquisadora quanto a dança da palhaça. As discussões de Larrosa (2003LARROSA, Jorge. O ensaio e a escrita acadêmica. Educação & Realidade [online], v. 28, n. 2, p. 101-115, 2003.Disponível em: Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/educacaoerealidade/article/view/25643 . Acesso em: 5 ago. 2020.
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) e Adorno (2003ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. In: ______. Notas de literatura I. Tradução e apresentação de Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, 2003. p. 15-45. Coleção Espírito Crítico.) acerca do ensaio em literatura irão nos inspirar nesse exercício, embora também se faça presente a experiência do ensaio cênico, que pulsa no corpo da pesquisadora-palhaça como metáfora para sua escrita. A propósito, engana-se aquele que pensa que quem dirige um ensaio cênico é o diretor ou o ator. Um ensaio é dirigido, na verdade, pela cena. É a cena que convoca o jogo do ensaio, é a ela que servimos enquanto a criamos e modulamos no exercício teatral.
Assim, optamos pela escrita dos ensaios como uma maneira de dançar os problemas (uhu!). Esse exercício será também o de aproximar a escrita do tempo da ação cênica e do palhaço, em que os afetos transbordam em ações e acompanham muito mais um fluxo desejante do que obedecem a um ritmo linear ou cronológico. O palhaço evoca a cena que deseja criar e, então, dá a ela vida deixando-a, por sua vez, criar o palhaço. Nesta pesquisa, as experiências vividas nos servem como cenas, nosso fio condutor, com as quais jogamos e por elas seremos jogados.
Então… Sim, vamos!
O palhaço, um ser errante
Mas, alto lá: que palhaço é esse que vai se encontrar com os trabalhadores, afinal? Não há descrição justa nem fidedigna para o palhaço. Ele não cabe em representação, e sua força reside justamente aí. O que é possível, então, é aproximar-se de significações que compõem essa figura cômica, sempre compreendendo que serão símbolos incompletos de um todo complexo, heterogêneo e mutante. Em sua tese a respeito do vigor do palhaço, Dorneles (2009DORNELES, Juliana Leal. Pelo vigor do palhaço. 2009. 116 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP, 2009., p. 12) afirma que “o palhaço se faz numa constelação sígnica de riso, afetos, gestos, corpos, vozes, arrotos, rebeldias, inocências, teatros, circos, danças, andares, velocidades, desconstruções, trapaças”.
Diante de tal constelação sígnica, elencamos o signo do humor como fio da meada para falar sobre a presença clownesca. A história do humor e do riso remonta à história da humanidade. Aristóteles (2010)ARISTÓTELES. Partes dos Animais. In: ______. Obras Completas. Tradução, introdução e notas de Maria de Fátima Sousa e Silva. Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2010. v. 4, tomo 3. já afirmava que o homem é o único animal que ri. Séculos depois, Millôr Fernandes (2008FERNANDES, Millôr. O homem do princípio ao fim. Porto Alegre, LP&M, 2008., p. 109) complementaria: “e é rindo que ele mostra o animal que é”. Assim é o riso. Singular, primitivo, conectado ao aqui-agora, ao que acontece no presente, ao que vivemos no passado e ao que projetamos para o futuro. O humor está presente nas mais diversas e antigas civilizações, como parte de um rito em que a figura cômica tem a autorização da comunidade para um tipo de inversão/subversão, desejada pelos participantes, para que possa eclodir o sagrado riso, a alegria. A história do cômico e da comédia nasce, então, associada a essa transgressão do status quo e, também, em sua maioria, relacionada a uma camada considerada inferior da sociedade: os subalternos, os mendigos, os deficientes e os anormais.
Assim como o fenômeno do riso e do cômico, a figura do palhaço está presente em vários momentos da história da humanidade, não tendo sua origem em um momento preciso (BURNIER, 2001BURNIER, Luís Otávio. A arte de ator: da técnica à representação. Campinas, SP: Unicamp, 2001.; CASTRO, 2005CASTRO, Alive Viveiros de. O elogio da bobagem: palhaços no Brasil e no mundo. Rio de Janeiro: Família Bastos Editora, 2005.). As diversas experiências e bibliografias (DORNELES, 2003DORNELES, Juliana Leal. Clown, o avesso de si: uma análise do clownesco na pós-modernidade. 2003. 114 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 2003. ; WUO, 2009WUO, Ana Elvira. A linguagem secreta do clown. Revista Integração, Ano XV, n. 56, p. 57-62, 2009. Disponível em: Disponível em: http://docplayer.com.br/10212104-A-linguagem-secreta-do-clown.html . Acesso em: 13 fev. 2020.
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) apontam o palhaço como um visitador às avessas da cidade dos homens. Em geral, ele aparece em contraponto a alguma outra persona que representa o equilíbrio, a ordem, a perfeição. O palhaço é aquele que tem medo e, não raro, representa as fraquezas humanas. Assim também acontece no circo, quando o palhaço contrasta com as virtuoses apresentadas sob a lona.
Estar palhaço, porém, não é exercer a representação de um personagem cômico. Kasper (2009KASPER, Kátia Maria. Experimentar, devir, contagiar: o que pode um corpo? Pro-Posições [online], v. 20, n. 3, p. 199-213, 2009. https://doi.org/10.1590/S0103-73072009000300013
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, p. 203) nos diz:
A busca de seu próprio clown é, em primeiro lugar, a busca de sua própria insignificância. Diferentemente da Commedia Dell´arte, o ator não entra em um personagem pré-estabelecido, mas descobre em si as partes clownescas que o habitam. Quanto menos se defende, menos tenta representar um personagem, mais o clown aparece forte.2 2 Afinal, é palhaço ou clown? É um e outro. Tem gente que acha que clown é um nome besta que se usa para chamar o palhaço. Para outros, usar essa palavra estranha ao nosso português pode ser importante. Isso porque ela diferencia pelo menos duas formas distintas de palhaçar. O termo palhaço costuma ser utilizado para referir-se ao artista do circo e da rua, e o clown para o artista do teatro. Acontece que o palhaço/clown é múltiplo, e não tem lugar para acontecer. O que existem são diferenças gerais nas linhas de trabalho (leia-se mais em Burnier, 2001). Sendo assim, como palhaços que somos, não vamos seguir essa regra. Vamos utilizar a regra do afeto e da vontade. De momento, pensamos que palhaço é mais simpático, e não queremos soar bestas, então aparecerá predominantemente a palavra palhaça na nossa escrita, principalmente quando referirmo-nos a Dulcinóia e seus comparsas. Mas também utilizaremos a palavra clown nos momentos que assim nos parecer interessante. Combinado?
Estar palhaço é estar em uma relação diferente com o mundo dos humanos, na qual o que impera sobre a razão é a sensibilidade e o encontro. A lógica do palhaço é a da ingenuidade, da crueldade, da simplicidade, da empatia e da afetividade. Seu contato com o mundo é um contato concreto: ele vê o que ele vê, sente o que sente, e exterioriza o que se passa com ele3 3 Essa definição sobre a concretude do contato do palhaço com o mundo foi-me transmitida dessa maneira nas oficinas com a clownóloga Laurence Marafante Brancão. - o palhaço não está em representação.
Por essa potência sensível, o palhaço tem protagonizado algumas experiências no campo da saúde que visam tornar esse campo mais sensível aos afetos e às questões da vida, como os Doutores da Alegria, os Palhaços de Plantão, entre outras.4 4 Algumas dessas experiências estão descritas em nossa dissertação de mestrado (BARBOZA, 2016). Foi também com interesse na potência do encontro do palhaço com os mais diversos âmbitos da vida cotidiana e, especialmente, com o campo do cuidado em saúde mental, que nós - eu-Dulcinóia-e-outros-loucos-que-estão-devidamente-citados-por-aqui - inventamos o Núcleo de Estudos e Intervenções de Palhaço (NEIP) e as intervenções riso-clínicas, que são o tema do nosso artigo.
Cena 1 - Doutor Choque
Em ação, Dulcinóia e Roliça. O pedido por coelhos distribuindo chocolates se transformou em clownelhas recolhendo amarguras. E ainda se transformou em bruxas realizando rituais de cura dentro dos consultórios e corredores assépticos do centro médico. Em troca dos chocolates, as palhaças solicitavam aos presentes que depositassem em uma caixa de madeira, devidamente fechada com cadeado, suas amarguras escritas em um papel - assim todos poderiam ter uma páscoa mais doce.
O consultório era de não-sei-o-quê. Como havia acontecido até então, iniciamos a brincadeira-ritual no espaço da sala de espera, com os pacientes que aguardavam e com as secretárias no balcão. Não ousávamos transpor a divisão, sempre bem definida, que separava e ocultava o setor onde, presume-se, ficavam os médicos e outros profissionais trabalhando em suas salas. Mas eis que a porta se abriu, e a pessoa que nos acompanhava e guiava nossa visita pelos andares do centro médico propôs, um pouco tímida e apreensiva, que entrássemos na sala do “doutor”, possível de ser vislumbrada de onde estávamos.
Entramos. Eu-Dulcinóia sento na pontinha da cadeira, Roliça fica em pé. Do outro lado da mesa, o médico, vestido a caráter, parece repetir sua fala de sempre: “Então, moças, como posso ajudá-las?”. A fala ecoa e bate em nós como vinda de um escudo, como um movimento que rapidamente interpela quem chega, antes que seja possível ser interpelado, convocado, afetado. Ele está diante de duas figuras excêntricas, coloridas, indefinidas entre mulher-coelho-palhaço, mas não ousa levantar os olhos pousados sobre sua mesa e seus papéis de prescrição. Sou tomada de uma vontade louca de cuidar do doutor. Perguntar a ele o que precisa, onde dói, examiná-lo com atenção. Mas contenho o impulso. A cena das palhaças auscultando o coração do médico não passa de uma imagem na minha cabeça, que parece tão distante da fria realidade que se apresenta. Ele escreve seu nome completo num papel e coloca-o na caixa que carregamos para depositar as amarguras. Claramente não entendeu o jogo, afinal, declarávamos que naquela caixa iriam todas as coisas ruins que a pessoa quisesse jogar fora. Mas nenhuma de nós corrigiu o doutor. Talvez por um secreto pressentimento de que ele deveria mesmo jogar aquele personagem fora.
Saindo do consultório, escuto de longe a brincadeira do doutor com as secretárias, referindo a necessidade de nos oferecer um “tratamento na tomada de 220 volts”. Eu podia não escutar. Mas era tarde. O tratamento de choque já chegava aos meus ouvidos.
Mais tarde, o acaso nos levou a pegar o mesmo elevador que o doutor. Brincávamos com algumas pessoas quando ele entrou. Novamente fechado em si, mas rindo, ele aconselha aos presentes que tenham cuidado com as malucas.
De quantos choques estamos falando? O choque do encontro de mundos. O choque da Reforma Psiquiátrica. O choque do afeto.
Parte do percurso da pesquisa aqui brevemente apresentada tem a ver com o choque referido na cena. Choque este que não é privilégio do doutor mencionado no ensaio. Muito antes dele, temos vivido esse tratamento. Nos pequenos atos cotidianos, nas experiências por que passamos em estágios, em extensão, em trabalho e nas relações pessoais, este choque reverbera tomando distintas formas. Talvez o ato de colocar o nariz vermelho e retornar ao encontro desses profissionais bem-intencionados, que sabem muito bem qual o lugar de cada coisa e de cada pessoa, parta de um desejo de resposta desta torta psicóloga, de uma vontade de olhar além dos jalecos, dos crachás, dos cartões do SUS, das portas e corredores.
Pode a educação permanente ser um espaço para lidar com o choque? O choque de mundos, de incômodas diferenças, de inúmeras indiferenças vividas pelo trabalhador no seu campo de trabalho? Um espaço para o trabalhador elaborar as suas loucuras, transviar os seus devires, ao mesmo tempo acolher seus medos e provocar suas seguras certezas?
Cena 2 - Eu vi um menino correndo: sobre o tempo para soltar uma pipa e o tempo do cuidado
Sobre soltar pipa
Eu gosto. De ver voar. Voar. Voar. E ver!
Ser pipa.
Sobre ser pipa.
É bom. Mas perigoso. E se furar, fudeu. (!!)
Agora eu sou uma pipa. Uuuuuuuuu!
(Voa)
Ser pipa cansa.
Tem que ter rabo. E nó.
Tem que ter menino faceiro pra segurar a gente.
Para subir bem alto. Coragem.5 5 Caro leitor: aqui apresentamos uma das maneiras desenvolvidas para aproximar a escrita pesquisadora da escrita palhaça: colocando o nariz, encarnando a Dulcinóia e pondo-nos a escrever. Então os trechos “escritas da Dulci” foram realizados assim mesmo, com a palhaça sentando-se em frente ao computador e tecendo seus comentários sobre a pesquisa e as experiências.
(Escritas da Dulci)
Mais uma cena para a Rede Multicêntrica - centro de referência e apoio institucional às políticas de cuidado ao uso de drogas.6 6 Centro Regional de Referência em crack e outras drogas, vinculado à Secretaria Nacional sobre Álcool e Drogas (SENAD) e organizado como projeto de extensão junto ao Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Nossos parceiros, nossos parteiros (com eles tudo começou). Quem tem medo de falar sobre drogas? Essa frase inspirava o evento que traria como conferencista a autora de um livro cujo título era justamente esta interrogação. Não sabíamos que ele havia sido escrito a partir de perguntas feitas por crianças e adolescentes a respeito do tema. Mas fizemos uma cena de menino. Nossa distração palhaça nos levou a criar a cena de uma fofoca que começava com: “Você sabe o que o filho da vizinha anda fazendo no meio da rua?”, acompanhada de um gesto: “ele anda fazendo Ó (movimento de mão)”, e gerava uma cadeia de acontecimentos que levariam os adultos a se espantarem e acionarem as suas instituições: escola, serviço social, conselho tutelar, polícia e, por fim, a saúde e sua internação - afinal, dizia a fofoca que o menino ainda estava a levar outros com ele, a fabricar e distribuir o produto, e a fazê-lo com euforia e agitação. Após uma trama cômica em que Dulcinóia e Joca alternam-se nos papéis de uma professora ingênua e nervosa, uma assistente social socialite, uma conselheira tutelar durona, uma policial destemida e uma médica acelerada, entremeada por gargalhadas da plateia composta por profissionais destas áreas, acontece o surpreendente final da cena. Entra o menino - o palhaço Albertino - empinando uma pipa. No meio da rua. No meio da cara de quem quisesse ver. Ali, eufórico, feliz, com seu produto de prazer. Cantando. Gerando silêncio e comoção de todos que, pouco a pouco, entram no coro: por isso uma força me levar a cantar, por isso essa força estranha no ar, por isso é que eu canto, não posso parar, por isso essa voz tamanha.
Após a cena das palhaças, a conferência e o debate. A conversa é permeada e inspirada pelo que evocaram os palhaços com sua intervenção riso-afeto-clínica. Em meio aos comentários, conta-se sobre um menino com quem a escola estava sempre incomodada e acionava a família para reclamar da sua conduta. O menino passa a fumar um baseado no caminho até a escola. A escola para de incomodar-se. Agora ele está tranquilo. Está tudo bem. Quando a escola descobre que ele está fumando, o problema (uhu!) retorna. O incômodo volta.
Um tema bastante presente no trabalho em saúde mental, sobretudo ao tratar da infância e adolescência, é o do limiar entre ações de cuidado e ações de controle. Trata-se de um ponto delicado, a tensão entre o interesse no apaziguamento dos conflitos e o empuxo ao apagamento dos corpos e desejos. Muitas vezes, na ânsia de aplacar o sofrimento e restabelecer a ordem, entendendo ser esta a condição para o bem-estar, os trabalhadores acabam por fechar olhos e ouvidos ao rumor deste outro, estranho, incômodo, que se apresenta cantando uma nota diferente da que sempre é escutada no bairro.
Assim, o exercício que é proposto àquele que está na condição de agente de um cuidado de outrem não é fácil, não é simples. É um exercício que exige o confronto com essa alteridade e com o que ela convoca. Escutar o ruído da diferença não é apenas acolher o outro a uma distância segura, porque não há distância segura. É também acolher-se, escutar-se, é estar disposto a suportar o que há de estranho em si, para poder receber a estranheza do outro sem matá-la, e quiçá construir um caminho para o nós.
Embora encenássemos a história de uma vizinha qualquer, com um filho qualquer, em um bairro qualquer, a trama envolvia a todos - gargalhadas, sorrisos, burburinho, uma comoção que dava a medida do envolvimento geral. O filho da vizinha não só convocava as personagens clownescas, mas convocava aquela plateia atenta ao seu enredo. E a sua ação vai desmontando as identidades instituídas: desestabiliza a professora que afirma que sua turma é composta de “meninos bons”, sacode a assistente social que diz que conhece bem todas as crianças do bairro, desvia da conselheira tutelar que carrega seus protocolos prontos, questiona a autoridade policial que se gaba em afirmar que na sua área de cobertura não há uso de drogas, e paralisa a ação da emergência em saúde com seus tranquilizantes para intercorrências.
O que pode esse palhaço errante e permeado pelas forças e afetos do fora oferecer aos trabalhadores como experiência de aprendizagem? Entende-se que o caminho para o cuidado em saúde mental passa pela possibilidade de sustentar esse incômodo do encontro com a alteridade, mas, para além do entendimento consciente, está o corpo do trabalhador e seus desejos, que pulsam e engolem e expulsam esse estranho que o interpela em suas (im)potências. Mais do que um exercício de apreensão de conhecimentos, aposta-se que, com o humor, o trabalhador-cuidador seja convocado a exercitar suas intensidades e a ser interpelado em suas certezas.
A plateia ri. Ri ao perceber a Conselheira Tutelar emaranhada em seu circuito de tarefas por ela nomeadas - “trabalho infantil, negligência familiar, abuso sexual” - e que se desespera porque o caso é outro, “é negócio de droga”. Ri quando o excesso de controle da policial atinge o ponto em que ela pergunta para a própria Conselheira Tutelar que está pedindo a sua ajuda: “O que a senhora está fazendo na rua a essa hora?” Ri quando a médica responde à policial que pede para escutá-la: “Eu sou médica, e não psicóloga”. E, quando ouve o canto do menino, quando vê a pipa no ar, a plateia chora. Todos cantamos.
Damo-nos conta da vida que encarceramos. Das muitas vidas e das muitas juventudes encarceradas: a juventude que voa solta, que não suporta a cadeira da escola e suas normas, a juventude que às vezes só encontra no entorpecente a chance de voar, e a juventude do trabalhador que não quer servir ao status quo, quer respirar além da prescrição, mas, ao sair de casa pela manhã, guarda seus ímpetos na gaveta e vai encontrar a rua, a vida, a cidade, desligado, “chapado” de seus vícios profissionais, regras e leis.
Bergson (1983BERGSON, Henri. O Riso: ensaio sobre o significado do cômico. 2. ed. Rio de Janeiro: J. Zahar, 1983.) e outros autores, como Kuppermann (2003)KUPERMANN, Daniel. Ousar rir: humor, criação e psicanálise. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003., tratam a possibilidade do humor como algo transgressor destes encarceramentos criados por nós mesmos. Kuppermann irá apontar a potência da arte em transformar a realidade, na verdade, fabricando novas realidades. A aposta, portanto, é na potência dos trabalhadores como artistas do seu fazer, forjando diferentes personas e estórias a partir das caricaturas que lhe ficam explícitas no encontro com os palhaços. Ainda, a aposta é na potência do palhaço como facilitador da partilha sensível da experiência (RANCIERE, 2005RANCIERE, Jacques. A partilha do sensível: estética e política. São Paulo: EXO Experimental/Editora 34, 2005.), colocando em jogo o embaralhamento das identidades, atividades e espaços, sendo a ficção uma possibilidade de redistribuição dos lugares sociais.
Intervenções riso-clínicas: uma forma de encontro
A invenção das intervenções de palhaço nasce de um desejo de transmissão. De uma paixão pelo tema do contar, inventar e compartilhar histórias. É como se diz: quem conta um conto aumenta um ponto - transmitir uma história é sempre uma oportunidade de criar uma nova história; aliás, é inevitável que seja nova, pois sempre será outra versão, edição, do que se conta, e essa é a marca da autoria. Escolhemos como narrador o palhaço. Esse alguém que possui em si o potencial de trapaça necessário ao ato de narrar. Trapaça como desvio e profanação da própria história que está a ser contada - o elemento de criação do aqui-agora, que liquida em si o que outrora era.
Que transmissão é essa que se dá no processo da intervenção clownesca a que nos propomos? A respeito da transmissão, em torno do tema da história e da narrativa, Benjamin (1997BENJAMIN, Walter. Rua de mão única. 5. ed. São Paulo: Brasiliense , 1997., p. 237) afirma: “Alguns transmitem as coisas, tornando-as intocáveis e conservando-as; outros transmitem as situações, tornando-as manejáveis e liquidando-as. Esses são os chamados destrutivos”. Entendemos que Benjamin utiliza o termo “destrutivo” para falar sobre algo que se torna passível de desmontagem, dentro do que desenvolve sobre o tema da história como uma história aberta. O que interessa ao autor não é a porção cristalizada da história, aquela que se repete ano a ano nos livros didáticos e que as crianças e os adultos “bem-educados” sabem reproduzir fielmente. O que interessa a Benjamin é justamente a dessacralização da história para que, ao tornar-se matéria manipulável, passível de jogo, possa ser ressignificada, transformando passado, presente e futuro. Assemelhando-se à discussão de um caso clínico, o foco das nossas intervenções não está em repetir a história. No caso do “filho da vizinha” (narrado na Cena 2 - Eu vi um menino correndo), por exemplo, não importam seus dados já quantificados e classificados - idade, nome, ano - mas sim narrar o que se passa na relação com ele: o que perturba, o que provoca, o que causa prazer e o que causa medo. É nesse compartilhar de afetos que o narrador abre a história à participação dos seus interlocutores, os quais se envolvem no que está sendo contado e participam da sua intensidade. Neste sentido, aposta-se que a intervenção, além de ser riso, é clínica - porque produz movimento, desacomoda sentidos e procura caminhos para os desejos mobilizados no seu desenrolar. E, sendo clínica, a intervenção inevitavelmente passa a ser crítica: instala-se a possibilidade do pensar a respeito do que se faz, deslocando os saberes até então instituídos.
Assim, o que se propõe passa pela possibilidade de esticar a história da experiência com o cuidado em saúde mental até um ponto em que seja possível falar sobre ela, criar outras histórias, rever o que se pensava até então. A esses trabalhadores que muitas vezes chegam sedentos pelo que chamam de “capacitações” - espaços onde poderão receber informações e orientações a respeito do que fazer em seu trabalho -, a esses trabalhadores que afirmam não possuir suficiente know-how para exercer o cuidado, o conselho que os palhaços oferecem é este: invente, invente-se, pois não podemos ajudá-lo - não podemos fazer por você. Podemos apenas contar uma história - pode ser que ela tenha algo a ver com você, algo a ver com seu trabalho, e, quem sabe, a partir daí possamos conversar sobre isso que experienciamos.
Compreendida assim, a relação do palhaço com a cena da saúde mental também se aproximará da proposta presente em Benjamin (1994BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política. 7. ed. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1994. Obras escolhidas.), acerca da função do narrador. Benjamin situará a figura do narrador como um estrangeiro-íntimo que instaura um tempo e uma atmosfera artesanal no ato de contar uma história a um grupo. Dessa maneira, a sustentação do ato de narrar é partilhada por contador e ouvintes. No exercício da narrativa, o ato de “ajudar ao próximo” - ou de “aconselhar”, como usualmente concebemos - torna-se impossível, já que não se trata de sentir o que o outro sente ou sofre, mas de sustentação coletiva de uma história comum. De acordo com Benjamin (1994BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política. 7. ed. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1994. Obras escolhidas., p. 200), “aconselhar é menos responder a uma pergunta que fazer uma sugestão sobre a continuação de uma história que está sendo narrada”. Gagnebin7 7 Comunicação da autora em 28 de maio de 2014 no curso oferecido pelo PPG em Psicologia Social e Institucional da UFRGS. situa o pensamento de Benjamin acerca da ajuda e do conselho como de uma relação, não de empatia, mas sim de compaixão, assim definida: estar com alguém, reconhecendo sua distância, sua assimetria em relação ao outro. A função do palhaço, então, não é de um cômodo igual, mas de um estranho diferente, que partilha com os outros a sua condição neste cenário.
Aí nascem as intervenções riso-clínicas - cenas de palhaço preparadas de maneira mais ou menos estruturada, para serem apresentadas em eventos na área da educação permanente em saúde mental, no contexto das políticas públicas. A apresentação da cena pode ser acompanhada, ainda, de alguma outra ação, como uma roda de conversa ou alguma atividade com ou sem nariz de palhaço junto ao público presente.
Nessas intervenções, procuramos palavras-chave, temas-nó, pontos de tensão da temática que está sendo abordada no referido curso, aula, situação, e apresentamos o olhar do palhaço sobre essas questões. Utilizamo-nos da doçura e da aparente fragilidade do palhaço, bem como de sua irreverência, para falar de coisas que não se quer dizer, ou que se tem dificuldade de dizer, ou, ainda, temas que parecem esgotados, para os quais não se encontram possibilidades de novos discursos.
Mas como acontece uma intervenção riso-clínica? Como se produz? A história costuma começar com um pedido recebido através de telefonema, e-mail, ou conversa que nos é endereçada por alguém que já assistiu ou ouviu falar de nossas intervenções em algum evento. Essas pessoas que nos procuram costumam ser trabalhadores, coordenadores ou não de seus serviços na área da saúde, assistência social e/ou educação, que estão interessados em uma abordagem diferenciada para seu cotidiano de trabalho. O interesse nem sempre visa à reflexão acerca dos fazeres e dos impasses que a eles se apresentam; muitas vezes ele expressa mais o desejo de oferecer algo diferente para uma cena de trabalho triste e pesada. A leveza do palhaço é o que abre as portas e convida a entrar. Diferente de pensar, normalmente o pedido passa por “desopilar”. Uma saturação costuma acompanhar esse pedido. Um cansaço com a repetição e o desejo de uma diferença, de que uma diferente alegria ocupe o seu espaço de labor.
Kupperman (2003KUPERMANN, Daniel. Ousar rir: humor, criação e psicanálise. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003., p. 15) afirma que vivemos em uma sociedade em que nos falta humor e prazer em viver: “A ‘sociedade liberal depressiva’, através da aliança com a indústria da medicalização da alma, terminou por fabricar, segundo Roudinesco, ‘um novo homem, polido e sem humor, esgotado pela evitação de suas paixões, envergonhado por não ser conforme ao ideal que lhe é proposto”. Por outro lado, o autor também aponta que assistimos a um desenvolvimento generalizado do código e do estilo humorísticos em nosso meio social. Este estilo generalizado de humor orienta-se sob a bandeira da descontração, acrítica, ausente de conflitos, sendo instrumento de evitação e alívio das tensões. É um humor que Kuppermann (2003KUPERMANN, Daniel. Ousar rir: humor, criação e psicanálise. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003., p. 16-17) categoriza de “cínico”: “O humor pós-moderno é, assim, uma espécie de lubrificante social”. O humor potente em transformação, portanto, não está dado, mas poderá ser construído conforme o uso que se faz da ferramenta riso.
Ao humor cínico, oferecemos a proposta de um humor clínico. Para tanto, percorrer-se-á um caminho que se inicia no pedido e se desenvolverá ao longo do contrato e da execução do trabalho. Trata-se de um humor de perspectiva clínico-institucional, que, de acordo com Silva et al (2012SILVA, Gilson Mafacioli da et al. O processo de trabalho na supervisão clínico-institucional nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental [online], São Paulo, v. 15, n. 2, p. 309-322, 2012. https://doi.org/10.1590/S1415-47142012000200007
https://doi.org/10.1590/S1415-4714201200...
, p. 311), define-se como:
[...] um dispositivo da formação permanente que deve sustentar a responsabilidade compartilhada da equipe, facilitar o diálogo para que as diferentes questões possam ser expostas, os casos e as situações sejam manejados com seus desafios e surpresas inerentes ao trabalho clínico na perspectiva da atenção psicossocial.
Aí encontramos semelhança com a prática riso-clínica a que nos propomos. Por exemplo, para a criação da cena que intitulamos “Serviço de Encolhimento e Redução de Planos”, o pedido veio de uma Coordenaria Regional de Saúde. A coordenadora queria algum elemento diferente para oferecer aos trabalhadores que participavam de uma reunião periódica em torno do tema da saúde mental na infância e adolescência. Dizia ela que os encontros se apresentavam muito esvaziados, que era um grande esforço dar sustentação a esse espaço, que parecia não estar sendo totalmente aproveitado em seu potencial. Ela queria oferecer algo diferente nessa reunião, que pudesse envolver os trabalhadores, fazê-los pensar para além da queixa que muitas vezes se apresentava no discurso dos participantes.
Em algum momento da conversa costuma ser feita a pergunta crucial: qual ou quais as dificuldades vocês enfrentam e sobre quais delas gostariam que os palhaços “colocassem o nariz”? A pergunta vem acompanhada de um esclarecimento sobre a função proposta pelos palhaços do nosso grupo: não se trata de recreação, mas sim de aproveitar, não só da alegria, mas da irreverência e do jeito de olhar do palhaço para o mundo, produzindo uma reflexão diferenciada sobre algum tema que necessite ser revirado, revisitado por esse grupo de trabalhadores. Nesse momento, o que surge é quase sempre um turbilhão.
A coordenadora então passou a desfiar os problemas (uhu!) que ela percebia e sentia no trabalho: dificuldades no entendimento dos trabalhadores a respeito do acolhimento e para pôr em prática a proposta de portas abertas solicitada pela coordenadoria - “no caso dos Caps-i, os trabalhadores não aceitam que o acolhimento das crianças seja feito junto com os adultos” (sic); a normatização dos espaços - “você chega no serviço e está tudo bem arrumadinho, sem nenhuma bagunça... não parece que crianças são atendidas ali...” (sic); a normatização dos planos terapêuticos singulares; o tensionamento na conversa com as escolas a respeito do que se entende como bom comportamento; a dificuldade com a excessiva medicalização da infância e com a possibilidade de conversar sobre isso com os médicos e demais trabalhadores. Esses, entre outros, são alguns dos problemas (uhu!) relatados.
E então? Diante desse turbilhão, o que pescar, que barco pegar? O que escolher e como trabalhar? O que se escuta fica pululando... pulsando em nós... Quando nos reunimos no NEIP,8 8 Cf. acima, Núcleo de Estudos e Intervenções de Palhaço. passamos a relatar aos colegas o que escutamos, e a história já começa a ser outra... A narrativa sempre vem acompanhada de sentimentos, sensações, tensões, enfim, dividimos com o grupo, não “a pauta”, mas a experiência vivida - contamos sobre como foi difícil atender ao telefone no supermercado, mas que não tínhamos conseguido outro horário para falar, sobre como foi tenso escutar tantas coisas e a sensação de que não havia espaço para nós falarmos, sobre o nervoso a respeito do que dizer, e de como explicar o nosso trabalho, o medo de não conseguirmos oferecer uma proposta adequada, a dificuldade na negociação orçamentária, o incômodo ao escutar tantos problemas (uhu!) diferentes, a necessidade de prazo para construirmos a proposta, etc. A fala escutada mistura-se à nossa fala, contamos experiências semelhantes vividas, pesquisas e palestras que escutamos sobre o assunto, o que pensamos a respeito... é a vez do nosso turbilhão. Os colegas palhaços escutam pacientemente... não sem intervir, seja com perguntas “sérias” - interessadas no tema em questão, como quantas pessoas participarão do evento, ou quais os municípios envolvidos -, seja com comentários “bobos” - trocadilhos com as palavras, observação de detalhes do que dizemos, do que não dizemos, do que está acontecendo agora (alguém engraçado que passa no corredor, uma chuva forte que cai lá fora, etc.).
Na conversa entre nós, procuramos capturar o que pode ser interessante no jogo encenado pelos palhaços e o que parece ser importante aos olhos das pessoas. Neste caso, o que gritava era a necessidade do trabalhador se “desenquadrar” - suportar a bagunça, o descontrole, para poder acolher e escutar as crianças em seus sofrimentos e desejos. Esse era o tema que parecia atravessar os problemas (uhu!) apresentados, e, ao mesmo tempo, seria um prato cheio para os palhaços que são, por constituição, desviantes da norma. Surgem os trocadilhos: Encolhimento ao invés de Acolhimento e Redução de Planos ao invés de Redução de Danos. Tratava-se de decantar o discurso escutado e selecionar palavras, trocadilhos e jogos possíveis de dialogar com o que já está instituído.
A potência do palhaço está justamente no ilimitado, enquanto o apelo à educação da infância tem tomado cada vez mais o caráter de impor limites às crianças. Então surge a ideia de colocar um palhaço para tentar a(en)colher os outros. Sempre buscamos encarnar o problema (uhu!) com os palhaços - ao invés de oferecermos uma solução pronta, tentamos apresentar a problemática de uma maneira furada, como uma rede, de maneira que os espectadores possam olhar diferente, perceber outras nuances nesse tema, sobretudo no que diz respeito à dimensão afetiva deste problema (uhu!). Assim, já não são espectadores passivos, envolvem-se na trama, sentem seus efeitos, e produzem desvios de pensamento.
Enfim, o jogo!
Pois é. É que o palhaço tem esse jeito transgressor de ser. Distraidamente inverte papéis, transforma choro em riso e vice-versa e, quando se espera que ele fale de alegria, ele abre espaço para escutar a dor. Assim, nas intervenções, com os temas propostos, aproximamo-nos de realizar aquilo que Certau (1998CERTAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1998.) chama de “astúcia do uso”: a reutilização desautorizada, ocasional, dos objetos, dos saberes, dos espaços e das linguagens. Aproximamo-nos também da noção de profanação em Agamben (2005AGAMBEN, Giorgio. Profanações. Tradução e apresentação de Selvino José Assmann. São Paulo: Boitempo, 2005. , p. 65), que é assim por ele definida: “Se consagrar (sacrare) era o termo que designava a saída das coisas da esfera do direito humano, profanar, por sua vez, significava restituí-las ao livre uso dos homens”. Aí Agamben refere-se ao uso do termo para os juristas romanos. Assim, profanar não significava a negligência simplesmente em relação à religião e, sim, algo próximo a uma atitude de distração que se desvincula das normas diante das coisas e do seu uso.
Os palhaços não negam ou ignoram, mas, sim, metem o nariz na questão. Chafurdam nela, sujam-se. E trazem à tona sua experiência como seus “usuários”. Por fim, compartilham seu uso. Profanar, dessa maneira, explica Agamben, aproxima-se da ação do jogo. Segundo o autor, o jogo tem origem nos rituais e cerimônias antigas ligadas a práticas divinatórias. O jogo representava a profanação pelo uso incongruente do sagrado. Assim, a brincadeira de roda tem origem nas danças circulares sagradas, o jogo de bola é a reprodução da luta dos deuses pela posse do sol, os jogos de azar originam-se das práticas oraculares, assim como o pião e o xadrez, que eram jogos de adivinhação. O jogo representaria metade da operação do ritual, que tem como objetivo reproduzir os mitos dos deuses. Jogar o ritual é aproveitar-se das ações, mas usá-las de maneira diferente daquela que foi proposta.
Assim, profanar não significa um descuido com a coisa em questão, mas a oferta de uma nova dimensão para seu uso. Dessa maneira, estamos compreendendo as intervenções riso-clínicas como atos-pensamento, produtoras de possíveis transformações e de uma ampliação do olhar sobre o trabalho em saúde mental, em uma dimensão que possa também alcançar o desejo do trabalhador, seu corpo, seus afetos, aumentando seu campo de possibilidades e de prazer em relação a sua prática.
A aposta é a de que experiências como essas possam trazer ao campo da saúde mental os fluxos que compõem a vida, evocando a nossa habilidade de nos envolvermos com o conhecimento em produção, provocando nossos corpos e afetos a estarem presentes e atuantes no processo de aprendizagem.
Espreguiçar (Ainda antes do fim)
Eu vou fazer um mestrado.
Estudar o já estudado.
Escrever o já escrito.
Só que de um jeito transado.
Rebolado.
Sim. Eu vou fazer um mestrado.
Ele vai ser um estrado.
Nele vou me deitar, entre nós um colchão vai estar.
De molas, de água, de penas. Água mole, pena macia, umas farpas talvez.
Olha eu escrevendo. Pareço até que estou sabendo.
Rita, querida, segure as pontas desta pipa, molhe o pano desta cuíca, seja ponte, seja amiga.
Ahá uhú! O mestrado é nosso!!!
Beijos da Dulci.
(Carta remetida em 16 de novembro de 2015. Forma de confecção: nariz. Envio: dedos).
Essa carta da Dulci foi escrita através da experiência que realizamos, de colocar o nariz de palhaço (e o chapéu roxo) e sentarmo-nos em frente ao computador. Foi escrita em total perturbação por uma provocação recebida no processo de pesquisa, que vinha no sentido de tornar a escrita mais palhaça, deixá-la invadir por essa lógica estranha, exercitar a proposta de uma escrita menos em representação, mais em apresentação. Entre outras palavras, saíram essas linhas acima.
Consideramos esta a intervenção riso-clínica da Dulcinóia para a nossa dissertação de mestrado. Como esta pesquisadora, bolsista, inclusive, pode escrever sobre sua própria produção dizendo que é fruto de um descanso, e mais, que é apenas uma repetição do já escrito e estudado? Sim. Quem sabe a preguiça seja o nosso vício - nosso e da Dulcinóia - que, nesse momento, emerge para nos apontar um desvio no pensamento do que até então construímos.
Diante dos encontros com trabalhadores e com contextos de trabalho tantas vezes esticados e exaustos, apresentamos a preguiça. A alegria de espreguiçar a experiência. Quem sabe um pouco dessa preguiça gostosa, na contramão da produção fabril, não possa ser interessante à nossa revolução do cuidado? Que possam as farpas na cama também serem cócegas que impelem o movimento com alegria e conduzem o corpo a encontrar outras e novas posições. O palhaço “Avner, o excêntrico”, enumera, em seus princípios para o clown, a necessidade de sentirmos prazer no jogo. Se não nos divertirmos com o que estamos fazendo, mesmo que seja uma proposta séria, dificilmente o público irá se interessar pelo que estamos apresentando. Avner diz: “Não tente ser interessante, seja interessado” (EISENBERG, 2021EISENBERG, Avner. Os princípios do palhaço. 2021. Disponível em Disponível em http://www.avnertheeccentric.com/eccentric_principles_portuguese.php . Acesso em: 28 dez. 2016.
http://www.avnertheeccentric.com/eccentr...
, n/p).
Para que o trabalhador não se torne um “burocrata do atendimento”, que só “toca o cotidiano”, será necessário, segundo Merhy (2004MERHY, Emerson Elias. Os CAPS e seus trabalhadores: no olho do furacão antimanicomial. Alegria e Alívio como dispositivos analisadores. 2004. Disponível em: Disponível em: https://docplayer.com.br/46200105-Os-caps-e-seus-trabalhadores-no-olho-do-furacao-antimanicomial-alegria-e-alivio-como-dispositivos-analisadores.html . Acesso em: 5 ago. 2016.
https://docplayer.com.br/46200105-Os-cap...
, p. 10), em seu artigo a respeito do trabalho nos Centros de Atenção Psicossocial, um coletivo que “possa estar em plena produção de vida em si e para si” [e que assim possa] “ofertar, com o seu fazer, a produção de novos viveres não dados, em outros. Ou, pelo menos, instigá-los a isso.” Em sua conclusão, o autor sugere que, “além dos eixos alegria e combustão, [é preciso] tomar o foco da produção do alívio produtivo antimanicomial como uma poderosa arma a favor da construção dos CAPS anti-manicômios” (MERHY, p. 13-14).
O ato de espreguiçar não acorda, mas acolhe a preguiça. Recebe-a, aceita, sem querer controlar, e então, ao invés de adormecer, a preguiça põe-se em movimento no ato de alongar. Apostemos, portanto, na potência do suspiro que surge imprevisível e intempestivo ao final de um belo espreguiçar.
O suspiro é assim: não é início nem fim, anuncia o tempo entre o começo do acordar e o final do dormir, ou vice-versa. Nesse entre o dormindo e o acordado, entre a luz do dia e a escuridão da noite, o espreguiçar assemelha-se a uma dança, já que absolutamente não está parado, mas encontra-se em pleno fluxo. Gostaríamos de encerrar este escrito aproveitando deste fluxo (es)preguiçoso, para que, ao chegarmos ao ponto final, algumas letras possam seguir dançando, saltando, rebolando. Manter-se no jogo, afinal, esse é o desafio que propomos, como palhaços, aos trabalhadores com os quais temos encontrado. Que não nos apaziguemos com respostas e técnicas (que têm lá a sua importância), para que possamos sustentar juntos a dança dos problemas.
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Caro leitor: a experiência aqui apresentada constitui-se de muitas invenções, narrativas e coisas para as quais não se tem palavra para dizer, mas que queremos transmitir. Um jeito que encontramos de compartilhar essas invenções foi através do que aqui estamos denominando de “Trechos de Diário de Campo”: são escritas da pesquisadora-palhaça-autora elaboradas livremente a partir de suas experiências com o nariz de palhaço, sem a pretensão primeira de ser um texto acadêmico, mas com a intenção de elaborar os momentos vividos. Portanto, durante a leitura, você perceberá mudanças de tempos verbais e pessoas/sujeito. Esses trechos de diário de campo, então, quando apresentados no texto, virão com a formatação que vocês estão lendo.
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Afinal, é palhaço ou clown? É um e outro. Tem gente que acha que clown é um nome besta que se usa para chamar o palhaço. Para outros, usar essa palavra estranha ao nosso português pode ser importante. Isso porque ela diferencia pelo menos duas formas distintas de palhaçar. O termo palhaço costuma ser utilizado para referir-se ao artista do circo e da rua, e o clown para o artista do teatro. Acontece que o palhaço/clown é múltiplo, e não tem lugar para acontecer. O que existem são diferenças gerais nas linhas de trabalho (leia-se mais em Burnier, 2001BURNIER, Luís Otávio. A arte de ator: da técnica à representação. Campinas, SP: Unicamp, 2001.). Sendo assim, como palhaços que somos, não vamos seguir essa regra. Vamos utilizar a regra do afeto e da vontade. De momento, pensamos que palhaço é mais simpático, e não queremos soar bestas, então aparecerá predominantemente a palavra palhaça na nossa escrita, principalmente quando referirmo-nos a Dulcinóia e seus comparsas. Mas também utilizaremos a palavra clown nos momentos que assim nos parecer interessante. Combinado?
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Essa definição sobre a concretude do contato do palhaço com o mundo foi-me transmitida dessa maneira nas oficinas com a clownóloga Laurence Marafante Brancão.
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Algumas dessas experiências estão descritas em nossa dissertação de mestrado (BARBOZA, 2016BARBOZA, Rita Pereira. Intervenções Riso-Clínicas: entre palhaços e trabalhadores na educação permanente em saúde mental. 2016. 88 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 2016.).
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Caro leitor: aqui apresentamos uma das maneiras desenvolvidas para aproximar a escrita pesquisadora da escrita palhaça: colocando o nariz, encarnando a Dulcinóia e pondo-nos a escrever. Então os trechos “escritas da Dulci” foram realizados assim mesmo, com a palhaça sentando-se em frente ao computador e tecendo seus comentários sobre a pesquisa e as experiências.
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Centro Regional de Referência em crack e outras drogas, vinculado à Secretaria Nacional sobre Álcool e Drogas (SENAD) e organizado como projeto de extensão junto ao Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
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Comunicação da autora em 28 de maio de 2014 no curso oferecido pelo PPG em Psicologia Social e Institucional da UFRGS.
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Cf. acima, Núcleo de Estudos e Intervenções de Palhaço.
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Apoio financeiro: Capes.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
05 Dez 2022 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
07 Fev 2017 -
Revisado
18 Fev 2022 -
Revisado
23 Maio 2022 -
Aceito
26 Maio 2022