Resumos
INTRODUÇÃO: A via radial evoluiu na última década para uma abordagem versátil, mostrando resultados equivalentes ou superiores aos da via femoral. Avaliamos a incorporação da técnica radial em um centro formador de cardiologistas intervencionistas, e comparamos seus resultados aos da técnica femoral. MÉTODOS: Estudo observacional, unicêntrico, que incluiu pacientes consecutivos submetidos a intervenção coronária percutânea (ICP) entre 2007 e 2011. A via de acesso foi escolhida pelo residente, em conjunto com o intervencionista responsável pela ICP. Comparamos o desfecho combinado de óbito, infarto do miocárdio (IM) periprocedimento, acidente vascular cerebral isquêmico ou sangramentos maiores entre os dois grupos na fase hospitalar. RESULTADOS: Foram submetidos a ICP 5.545 pacientes, 29,8% pela via radial e 70,2% pela via femoral. A média de idade foi de 60,8 ± 11,7 anos, sendo 68,9% do sexo masculino e 29% portadores de síndromes coronárias agudas. Houve aumento do uso da via radial até 2010, e estabilização no ano subsequente (11,8% em 2008, 26,1% em 2009, 45,1% em 2010 e 42,6% em 2011). Os pacientes que utilizaram a via radial tinham perfil tanto clínico como angiográfico menos complexo. Não houve diferenças nos desfechos combinados (5% vs. 5,9%; P = 0,18), no óbito (0,1% vs. 0,8%; P = 0,71), no acidente vascular cerebral (0,06% vs. 0,03%; P = 0,53) ou no IM periprocedimento (4,5% vs. 3,8%; P = 0,27). Contudo, menor incidência de sangramentos maiores (0,4% vs. 1,3%; P < 0,01) e de complicações vasculares (0,5% vs. 2,2%; P < 0,01) foi observada com a via radial. CONCLUSÕES: Em nosso centro formador de cardiologistas intervencionistas, a ICP pela via radial foi rapidamente incorporada, e trouxe, para pacientes selecionados, resultados equivalentes aos da via femoral, com redução dos índices de sangramentos maiores e de complicações vasculares.
Angioplastia; Stents; Artéria radial; Artéria femoral; Hemorragia
BACKGROUND: The radial artery access has evolved into a flexible approach in the last decade, showing similar or superior results when compared to the femoral approach. We assessed the incorporation of the radial artery access in a training center for interventional cardiologists and compared the results to those of the femoral artery access. METHODS: Observational, single-center study, including consecutive patients undergoing percutaneous coronary intervention (PCI) between 2007 and 2011. The access route was chosen by the resident along with the interventionist responsible for PCI. We compared the composite endpoint of death, periprocedural myocardial infarction (MI), ischemic stroke or major bleeding between the two groups during hospitalization. RESULTS: Among 5,545 patients undergoing PCI, 29.8% used the radial approach and 70.2 used the femoral approach. Mean age was 60.8 ± 11.7 years, 68.9% were males and 29% had acute coronary syndromes. There was an increase in the use of the radial approach until 2010 and stabilization in the subsequent year (11.8% in 2008, 26.2% in 2009, 45.1% in 2010 and 42.6% in 2011). Patients using the radial approach had a less complex clinical and angiographic profile. There were no differences in the composite endpoint (5% vs. 5.9%; P = 0.18), death (0.1% vs. 0.8%; P = 0.71), stroke (0.06% vs. 0.03%; P = 0.53) or periprocedural MI (4.5% vs. 3.8%; P = 0.27). However, there was a lower incidence of major bleeding events (0.4% vs. 1.3%; P < 0.01) and vascular complications (0.5% vs. 2.2%; P < 0.01) with the radial approach. CONCLUSIONS: At our interventional cardiology training center, PCI through the radial approach was quickly incorporated and provided, for selected patients, outcomes similar to those of the femoral approach, with decrease of major bleeding and vascular complication rates.
Angioplasty; Stents; Radial artery; Femoral artery; Hemorrhage
ARTIGO ORIGINAL
Intervenção coronária percutânea pela via radial: incorporação da técnica e resultados de um centro de formação em cardiologia intervencionista
Gentil Barreira de Aguiar FilhoI; Dimytri A. SiqueiraII; Áurea J. ChavesIII; Felipe M. CoelhoIV; J. Ribamar Costa JrV; Mateus VelosoVI; Louis N. OheVII; Ricardo A. CostaVIII; Daniel ChamiéIX; Rodolfo StaicoX; Sergio BragaXI; Fausto FeresXII; Alexandre AbizaidXIII; Amanda G. M. R. SousaXIV; J. Eduardo SousaXV
IMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
IIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
IIIDoutora. Médica cardiologista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
IVMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
VDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
VIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
VIIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
VIIIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
IXMédico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
XDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
XIDoutor. Chefe da Seção de Hemodinâmica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
XIIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
XIIILivre-docente. Diretor do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
XIVLivre-docente. Diretora geral do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
XVLivre-docente. Diretor do Centro de Intervenções em Doenças Estruturais do Coração do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil
Correspondência Correspondência: Gentil Barreira de Aguiar Filho Rua Borges Lagoa, 1.209 - Vila Clementino São Paulo, SP, Brasil - CEP 04038-033 E-mail: gentilbarreira@gmail.com
RESUMO
INTRODUÇÃO: A via radial evoluiu na última década para uma abordagem versátil, mostrando resultados equivalentes ou superiores aos da via femoral. Avaliamos a incorporação da técnica radial em um centro formador de cardiologistas intervencionistas, e comparamos seus resultados aos da técnica femoral.
MÉTODOS: Estudo observacional, unicêntrico, que incluiu pacientes consecutivos submetidos a intervenção coronária percutânea (ICP) entre 2007 e 2011. A via de acesso foi escolhida pelo residente, em conjunto com o intervencionista responsável pela ICP. Comparamos o desfecho combinado de óbito, infarto do miocárdio (IM) periprocedimento, acidente vascular cerebral isquêmico ou sangramentos maiores entre os dois grupos na fase hospitalar.
RESULTADOS: Foram submetidos a ICP 5.545 pacientes, 29,8% pela via radial e 70,2% pela via femoral. A média de idade foi de 60,8 ± 11,7 anos, sendo 68,9% do sexo masculino e 29% portadores de síndromes coronárias agudas. Houve aumento do uso da via radial até 2010, e estabilização no ano subsequente (11,8% em 2008, 26,1% em 2009, 45,1% em 2010 e 42,6% em 2011). Os pacientes que utilizaram a via radial tinham perfil tanto clínico como angiográfico menos complexo. Não houve diferenças nos desfechos combinados (5% vs. 5,9%; P = 0,18), no óbito (0,1% vs. 0,8%; P = 0,71), no acidente vascular cerebral (0,06% vs. 0,03%; P = 0,53) ou no IM periprocedimento (4,5% vs. 3,8%; P = 0,27). Contudo, menor incidência de sangramentos maiores (0,4% vs. 1,3%; P < 0,01) e de complicações vasculares (0,5% vs. 2,2%; P < 0,01) foi observada com a via radial.
CONCLUSÕES: Em nosso centro formador de cardiologistas intervencionistas, a ICP pela via radial foi rapidamente incorporada, e trouxe, para pacientes selecionados, resultados equivalentes aos da via femoral, com redução dos índices de sangramentos maiores e de complicações vasculares.
Descritores: Angioplastia. Stents. Artéria radial. Artéria femoral. Hemorragia.
ABSTRACT
BACKGROUND: The radial artery access has evolved into a flexible approach in the last decade, showing similar or superior results when compared to the femoral approach. We assessed the incorporation of the radial artery access in a training center for interventional cardiologists and compared the results to those of the femoral artery access.
METHODS: Observational, single-center study, including consecutive patients undergoing percutaneous coronary intervention (PCI) between 2007 and 2011. The access route was chosen by the resident along with the interventionist responsible for PCI. We compared the composite endpoint of death, periprocedural myocardial infarction (MI), ischemic stroke or major bleeding between the two groups during hospitalization.
RESULTS: Among 5,545 patients undergoing PCI, 29.8% used the radial approach and 70.2 used the femoral approach. Mean age was 60.8 ± 11.7 years, 68.9% were males and 29% had acute coronary syndromes. There was an increase in the use of the radial approach until 2010 and stabilization in the subsequent year (11.8% in 2008, 26.2% in 2009, 45.1% in 2010 and 42.6% in 2011). Patients using the radial approach had a less complex clinical and angiographic profile. There were no differences in the composite endpoint (5% vs. 5.9%; P = 0.18), death (0.1% vs. 0.8%; P = 0.71), stroke (0.06% vs. 0.03%; P = 0.53) or periprocedural MI (4.5% vs. 3.8%; P = 0.27). However, there was a lower incidence of major bleeding events (0.4% vs. 1.3%; P < 0.01) and vascular complications (0.5% vs. 2.2%; P < 0.01) with the radial approach.
CONCLUSIONS: At our interventional cardiology training center, PCI through the radial approach was quickly incorporated and provided, for selected patients, outcomes similar to those of the femoral approach, with decrease of major bleeding and vascular complication rates.
Descriptors: Angioplasty. Stents. Radial artery. Femoral artery. Hemorrhage.
Tradicionalmente, as intervenções coronárias percutâneas (ICPs) são realizadas por via femoral, pois apresentam referências anatômicas e radiológicas bem definidas e sua técnica é amplamente dominada pelos intervencionistas.1 A via radial, utilizada há mais de duas décadas, tanto nos cateterismos cardíacos como nas ICPs, evoluiu para uma abordagem versátil, mostrando resultados clínicos equivalentes, ou mesmo superiores, aos da via femoral.2-6
Como vantagem, a abordagem por via radial promove menores taxas de sangramento e de complicações vasculares,2-4 além de estar associada a menor mortalidade em alguns subgrupos de pacientes.2,5 A taxa de sucesso é similar à da via femoral,4,6 especialmente em serviços com operadores experientes. Dessa maneira, o aprendizado da técnica radial é de fundamental importância na formação de especialistas em cardiologia intervencionista.
O objetivo de nosso estudo foi avaliar a incorporação ao longo dos últimos anos, em nossa instituição, da técnica radial e comparar seus resultados aos da técnica femoral.
MÉTODOS
Desenho do estudo
Estudo observacional, unicêntrico, que incluiu pacientes consecutivos submetidos a ICP, no período de dezembro de 2007 a novembro de 2011. A via de acesso foi escolhida pelo médico residente em cardiologia intervencionista, em conjunto com o intervencionista responsável pela ICP, após avaliação subjetiva do pulso radial, complementada pela avaliação objetiva do teste de Allen.
Os procedimentos percutâneos foram realizados de acordo com as recomendações das atuais diretrizes.1 Os dados da evolução hospitalar foram coletados durante a internação, com o preenchimento de formulários padronizados. A coleta incluiu características clínicas, angiográficas e do procedimento, assim como a evolução clínica até a alta hospitalar.
Procedimento
A punção radial foi realizada por meio da técnica de Seldinger, preferencialmente no membro superior direito. A punção radial era realizada 1 cm proximal ao processo estiloide do rádio, sendo utilizado o introdutor hidrofílico Glidesheath (Terumo Medical, Tóquio, Japão) com morfologia afunilada, dedicado para artéria radial. Foi administrada heparina na dose de 5.000 UI pelo introdutor, e sua dose complementada para atingir 70 UI/kg a 100 UI/kg. Imediatamente após o procedimento, o introdutor era retirado, sendo realizada hemostasia com o dispositivo TR BandTM (Terumo Medical, Tóquio, Japão) para compressão da artéria radial.
A punção da artéria femoral foi feita conforme técnica padrão de Judkins, preferencialmente na região inguinal direita. Foram utilizados introdutores 6 F ou 7 F, sendo a heparina administrada na dose de 2.500 UI pelo introdutor e complementada para atingir 70 UI/kg a 100 UI/kg. O introdutor era retirado cerca de 2 horas após o término do procedimento e a hemostasia era realizada por compressão manual.
Definições e seguimento intra-hospitalar
Comparamos o desfecho combinado de óbito, infarto do miocárdio (IM) periprocedimento, acidente vascular cerebral isquêmico ou sangramentos maiores entre os dois grupos na fase hospitalar. Comparamos também os componentes individuais do desfecho combinado e a incidência de complicações vasculares.
Como regra, todas as mortes foram consideradas cardíacas, a não ser que uma causa não-cardíaca pudesse ser claramente estabelecida por estudo clínico e/ou patológico. IM periprocedimento foi definido como presença de novas ondas Q em duas ou mais derivações contíguas ou elevação de creatina quinase fração MB (CK-MB) pelo menos três vezes acima do valor superior de normalidade.
Os sangramentos maiores incluíram acidente vascular hemorrágico ou qualquer sangramento que causasse comprometimento hemodinâmico e necessitasse tratamento. As complicações vasculares incluíram hematomas > 5 cm, pseudoaneurismas, e fístulas arteriovenosas ou hemorragias com necessidade de transfusão ou cirurgia. O sucesso angiográfico foi definido como a obtenção de fluxo final TIMI 3, com ausência de dissecções e estenose residual < 20%.
Análise estatística
Utilizou-se o programa estatístico SPSS para Windows. As variáveis categóricas foram descritas como frequências e porcentagens, e comparadas com o teste qui-quadrado ou exato de Fisher, quando apropriado. As variáveis contínuas foram descritas como médias e desvios padrão e comparadas com o teste t de Student. Todos os testes foram bicaudais e um valor de P < 0,05 foi considerado estatisticamente significante.
RESULTADOS
No período de dezembro de 2007 a novembro de 2011, 5.545 pacientes consecutivos foram submetidos a ICP, 1.652 (29,8%) pela via radial e 3.893 (70,2%) pela via femoral. A média de idade da população foi de 60, 8 ± 11,7 anos, sendo 68,9% do sexo masculino, 30% diabéticos e 29% portadores de síndromes coronárias agudas (11,4% com IM com supradesnivelamento do segmento ST).
Houve aumento progressivo da utilização da via radial para a realização da ICP até 2010, e estabilização no ano subsequente (11,8% em 2008, 26,1% em 2009, 45,1% em 2010 e 42,6% em 2011) (Figura). O aumento global da utilização da técnica radial foi de 30,8% em relação à via femoral (P < 0,01).
Os pacientes que utilizaram a via radial tinham, em geral, perfil clínico menos complexo, sendo mais jovens (59,8 ± 11,6 anos vs. 61,3 ± 11,7 anos; P < 0,01), mais frequentemente do sexo masculino (76,4% vs. 65,8%; P < 0,01), com menos IM prévio (39% vs. 42,2%; P = 0,02), cirurgia de revascularização do miocárdio prévia (5,8% vs. 11,9%; P < 0,01) e insuficiência renal crônica (23% vs. 29,8%; P < 0,01) (Tabela 1).
Ao avaliarmos as características angiográficas e do procedimento (Tabela 2), no grupo radial observamos que foi tratado menor número de vasos (1,14 ± 0,38 vs. 1,19 ± 0,42; P < 0,01), com menor utilização de pré (43% vs. 55%; P < 0,01) e pós-dilatação (74% vs. 77%; P = 0,01), menor uso de filtros de proteção distal (0,3% vs. 1%; P = 0,01), menor volume de contraste utilizado (85,8 ± 39,5 ml vs. 97,3 ± 48,1 ml; P < 0,01), e menor utilização de procedimentos ad hoc (12,5% vs. 17,3%; P < 0,01). O sucesso angiográfico foi de 94,8% no grupo radial e de 94% no grupo femoral (P = 0,33).
Ao analisarmos os eventos adversos hospitalares, não foram detectadas diferenças nas taxas de desfechos combinados (5% vs. 5,9%; P = 0,18), óbito (0,1% vs. 0,8%; P = 0,71), acidente vascular cerebral (0,06% vs. 0,03%; P = 0,53) ou IM periprocedimento (4,5% vs. 3,8%; P = 0,27). Contudo, menor incidência de sangramentos maiores (0,4% vs 1,3%; P < 0,01) e de complicações vasculares (0,5% vs. 2,2%; P < 0,01) foi observada nos pacientes submetidos a ICP por via radial (Tabela 3). Dentre os casos de complicação vascular com maior gravidade, ocorreram 4 (0,1%) casos de hemorragia retroperitoneal e 3 (0,7%) fístulas arteriovenosas no grupo femoral.
DISCUSSÃO
Este estudo demonstrou importante aumento da incorporação da técnica radial no período de 2008 a 2010, com estabilização posterior, sendo essa via responsável, na atualidade, por quase metade das ICPs realizadas em nossa instituição, centro de formação de cardiologistas intervencionistas. Em uma das poucas publicações que abordam o tema em nosso meio, Andrade et al.7, utilizando dados da Central Nacional de Intervenções Cardiovasculares (CENIC), demonstraram a subutilização do acesso radial em todo o Brasil, no período que antecedeu o ano de 2008 (12,7% em 2005, 14,9% em 2006, 11,2% em 2007 e 14% em 2008).
Nosso estudo também demonstrou redução da incidência de complicações vasculares e sangramentos, da mesma forma que uma série de estudos publicada recentemente.2-4 A avaliação do sangramento maior pós-ICP tem ganho importância, porque a ocorrência desse evento, relacionado ao sítio de punção, está diretamente associada ao aumento da morbidade e da mortalidade,8-11 além de reduzir a adesão à terapia antiplaquetária, importante preditor de trombose do stent.12 A redução do sangramento da via de acesso traz ainda maiores benefícios aos subgrupos de maior risco, como idosos3,13 e pacientes do sexo feminino3 ou com síndrome coronária aguda14.
Especificamente, no tratamento da síndrome coronária aguda, com e sem supradesnivelamento do segmento ST, Romagnoli et al.5 desmonstraram que o uso do acesso radial reduziu em 30 dias a morte cardiovascular, a incidência de sangramento e o tempo de internação hospitalar, semelhante ao encontrado em metanálise evolvendo 21 estudos e 8.534 pacientes.15 A análise dessa mesma população no estudo RadIal Vs femorAL access for coronary intervention (RIVAL) também demonstrou benefício na redução da mortalidade, porém esse achado foi limitado ao subgrupo com supradesnivelamento do segmento ST.2
As complicações vasculares da via de acesso radial em nosso estudo, e em diversos estudos, são pouco frequentes, predominando a oclusão da artéria radial.16 A via de acesso radial raramente determina hematoma em antebraço, perfurações ou síndrome compartimental.17,18 Em grupos experientes, a taxa de complicação vascular é pequena (0,5%), semelhante à encontrada em nossa população, e a necessidade de substituição da via de acesso é menor quanto maior for a experiência do operador.19
A experiência do operador é um dos principais determinantes no sucesso da ICP por via radial. Louvard et al.20 demonstraram insucesso da técnica de 10% nos primeiros 50 casos, que é reduzido para 1% após mil casos, e sugerem realização de 800 casos para curva de aprendizado. Spaulding et al.21 relatam como ideal a experiência com 415 casos, já que a falha ocorre em 14% nos primeiros 80 procedimentos, reduzindo até 2% nos últimos 100. Looi et al.22 demonstraram que, em um ano, operadores pouco experientes podem atingir o mesmo patamar que os mais experientes, desde que utilizem rotineiramente a via radial.
Ball et al.23 demonstraram que para cada 50 ICPs realizadas por via radial, há um decréscimo de 32% na incidência de falência da técnica, no uso de contraste, no número de guias utilizados e no tempo de fluoroscopia. No Brasil, Cardoso et al.24 demonstraram que procedimentos realizados por operadores mais experientes (mais de 500 procedimentos por via radial) foram responsáveis por reduzir os tempos de punção e de fluoroscopia e o tempo total do exame, sem alterar a taxa de complicações.
Limitações do estudo
Trata-se de estudo observacional, com todas as limitações inerentes a esse tipo de estudo, realizado em um único centro de formação e sem seguimento clínico tardio. Também não foram avaliados as taxas de mudança da via de acesso (crossover), o tempo de punção, o número de guias utilizadas e o tempo de fluoroscopia.
CONCLUSÕES
Em nossa experiência, como centro de formação de cardiologistas intervencionistas, a ICP pela via radial foi rapidamente incorporada, e trouxe para pacientes selecionados resultados equivalentes aos da via femoral, com redução dos índices de sangramentos maiores e de complicações vasculares.
CONFLITO DE INTERESSES
Os autores declaram não haver conflito de interesses relacionado a este manuscrito.
Recebido em: 26/9/2012
Aceito em: 3/12/2012
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Correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
25 Fev 2013 -
Data do Fascículo
Dez 2012
Histórico
-
Recebido
26 Set 2012 -
Aceito
03 Dez 2012