Acessibilidade / Reportar erro

“Traficante não é vagabundo”: trabalho e tráfico de drogas na perspectiva de adolescentes internados.

“A drug dealer is not a tramp”: work and drug trafficking in the perspective of confined adolescents.

Resumo

A pesquisa realizou grupos focais com adolescentes internados em Unidade Socioeducativa para entender como esses sujeitos compreendem a categoria trabalho a partir da comparação entre trabalho lícito e tráfico de drogas.

Palavras-chave:
Tráfico de drogas; Adolescente infrator; Trabalho infantil

Abstract

The study conducted focus groups with adolescents confined at a house arrest to understand how them understand the work category from the comparison between licit work and drug trafficking.

Keywords:
Drug trafficking; Youth offenders; Child labor

Introdução

“Isso é uma empresa, dizia Lulu, você tem de pagar os fornecedores, os empregados, a família de quem morre, a família de quem vai preso, festas e comemorações (...) e, claro, propina para a polícia” (GLENNY, 2016GLENNY, Misha. O dono do morro: homem e a batalha pelo Rio. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.: 213). É desse modo que o jornalista Misha Glenny resume a forma como um conhecido traficante da favela da Rocinha no Rio de Janeiro compreendia o funcionamento do tráfico de drogas do qual era líder. A ideia de que aquele que participa do tráfico de drogas é um “empregado” do crime não é exclusiva do sujeito em questão e já foi tangenciada por outros autores que abordaram a temática do tráfico de drogas1 1 Dentre a ampla gama de autores que abordam a temática do tráfico de drogas, algumas linhas de análise acabam indiretamente tratando a participação no comércio de drogas ilícitas como um trabalho. Destacam-se os autores que entendem o tráfico de drogas sob a lógica das organizações criminais (OLIVEIRA, 2006; LESSING, 2008), na intersecção com a constituição de facções (MISSE, 1999; DIAS, 2011), e na formação da juventude masculina das periferias das grandes cidades (FELTRAN, 2008; ZALUAR, 2012; LYRA, 2013). , principalmente após a década de noventa quando o fenômeno ganhou intensidade na realidade urbana do país. Assim, a partir da ideia de que o mercado de drogas no contexto brasileiro, em certo momento histórico2 2 Entende-se que o período compreendido entre o final da década de oitenta e o início da década de noventa marca uma importante virada no comércio de drogas no Brasil, em que a cocaína transformou a lógica percebida até então. Segundo Dowdney, foram cinco as principais causas dessa virada: a) o crescimento da demanda por drogas ilegais; b) a chegada da cocaína colombiana a baixo preço e sua alta rentabilidade em relação à maconha; c) o aumento do policiamento violento e repressivo durante a ditadura; d) a chegada de armas leves de uso militar; e) o estabelecimento e a organização de facções da droga (2003: 28). , passou a funcionar em uma lógica organizativa, o recorte da presente pesquisa procura questionar a possibilidade de afirmar a existência de relações de trabalho dentro da lógica da venda de drogas no Brasil, buscando desmistificar como operam tais relações.

É dado que as particularidades do tráfico de drogas brasileiro apontam para um fenômeno social de extrema complexidade de análise, possível de ser explorado a partir de distintos atores sociais. O objetivo principal desta pesquisa, contudo, pretende restringir o grande campo de estudo do tráfico de drogas no Brasil para ater-se ao questionamento da possibilidade de vincular a venda de drogas a uma atividade laboral. Participar das redes de produção e venda de drogas, no Brasil, afinal, pode ser considerado um trabalho? Na visão dos adolescentes imbricados em tais atividades, “ser” do tráfico significa trabalhar no mercado de drogas? Quais são os possíveis desdobramentos que a análise da relação tráfico-trabalho possibilita para a compreensão mais ampla do fenômeno do tráfico de drogas? São essas as indagações chaves que guiam a presente pesquisa.

Para qualificar a análise da atividade ilícita de drogas como um trabalho, percebeu-se necessário utilizar certo referencial comparativo que também possuísse um sentido de trabalho na realidade dos sujeitos da pesquisa, possibilitando assim a delimitação do objeto de análise da presente investigação nos seguintes níveis: a) o tráfico de drogas é estudado nos limites da sua compreensão como trabalho; b) o estudo do tráfico de drogas como trabalho é compreendido nos limites da comparação com outras atividades laborais.

Optou-se pela realização de pesquisa que buscasse emergir vozes regularmente não consideradas no processo de compreensão de um fenômeno social. Essa escolha deu-se em razão de que, apesar da vinculação entre violência e juventude não ser propriamente uma novidade no campo das ciências sociais, as perspectivas tendem a trazer o jovem ora como um “problema social”, ora como um fator de “risco” (PIMENTA, 2014PIMENTA, Melissa de Mattos. Masculinidades e sociabilidades: compreendendo o envolvimento de jovens com violência e criminalidade. Dilemas. v.7. n.3, 2014: 701-730.: 706). Conforme bem observa Pimenta, essa dicotomia acaba contribuindo para que esses sujeitos não sejam percebidos como “sujeitos ativos”, responsáveis pelas escolhas que orientam suas trajetórias de vida (2014: 706), o que acaba produzindo uma percepção de que o tráfico é um ente em si, e não um fenômeno social formado por sujeitos com desejos e limitações próprias.

A análise foi produzida no encontro entre as perspectivas teóricas escolhidas e a conhecimento construído nos debates entre as pesquisadoras e dez adolescentes internados em uma Unidade de Atendimento parte da Fundação de Atendimento Socioeducativo do Rio Grande do Sul (FASE-RS), o que só foi possível após a aprovação no Comitê de Ética vinculado à Universidade que se filiam as autoras da pesquisa3 3 Número de aprovação: 69918917.1.0000.5347 . Trata-se, portanto, de uma pesquisa que busca ouvir a narrativa de adolescentes criminalizados por um sistema de justiça juvenil que deve, idealmente, trilhar os princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente o qual prescreve a garantia da livre manifestação dos sujeitos (COSTA, 2012COSTA, Ana Paula Motta. Os Adolescentes e seus Direitos Fundamentais: da invisibilidade à indiferença. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.: 164). Embora seja evidente que esse princípio fundador nem sempre é observado, a pesquisa buscou reafirmá-lo e, assim, ouvir o que têm a dizer esses jovens.

A abordagem metodológica utilizada foi aquela do grupo focal. Assim, os questionamentos realizados na mediação do grupo visavam estabelecer possíveis comparações e diferenciações entre o chamado “polo de trabalho legal”, constituído pelas experiências de trabalho lícito, e o “polo de trabalho ilegal”, representado pelo tráfico de drogas. Em seguida, sobretudo a partir do diálogo entre duas correntes teóricas (LUKÁCS, 2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.; SOUZA, 2003SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.), construiu-se uma certa categoria trabalho a qual foi utilizada por esta pesquisa como alicerce na comparação operada entre as atividades de trabalho lícito e de tráfico de drogas na perspectiva dos adolescentes participantes dos grupos focais.

A categoria trabalho

“Uma vida cheia de sentido fora do trabalho supõe uma vida dotada de sentido dentro do trabalho” (ANTUNES, 2005ANTUNES, Ricardo L. O caracol e sua concha: ensaios sobre a nova morfologia do trabalho, São Paulo: Boitempo, 2005.: 65). Tal afirmação representa a ideia bastante difundida na sociedade contemporânea de que o trabalho possui um papel importante na produção do sentido da vida do indivíduo, o que foi uma ideia própria da teoria de Lukács, ainda na segunda metade do século XX. Na obra “Para uma ontologia do ser social”, o autor, sobretudo a partir do aprofundamento de noções introduzidas por Marx, desenvolveu sua concepção do trabalho como o fator primeiro e essencial da construção do ser social (LUKÁCS, 2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.: 44). Para o autor, a essencialidade do trabalho humano residiria primordialmente no fato de que esse nasceu em meio à luta pela existência, sendo preferível, portanto, constituí-lo como ponto de partida para a análise de níveis mais avançados de sociabilidade do ser humano (LUKÁCS, 2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.: 44).

A partir dessa ideia, o autor explica que todas as demais categorias da sociabilidade do ser humano só podem ocorrer em um ser social já previamente constituído, enquanto “somente o trabalho tem, como sua essência ontológica, um claro caráter de transição” (2013: 44), por ser essencialmente, na sua forma primitiva, uma inter-relação entre homem e natureza. É, portanto, somente a partir do trabalho que ao homem é permitido transitar do ser biológico ao ser social, sendo essa a razão que justifica a importância de constituí-lo como objeto primeiro de estudo antes de transitar à compreensão de toda e qualquer sociabilidade dele decorrente.

Outro ponto para a compreensão da categoria em Lukács é a importância do trabalho na projeção de finalidades, isso é, a capacidade desse construir, no âmbito da consciência, determinada forma posteriormente objetivada no concreto. Assim, Marx e Lukács concordam que é somente a partir do intercâmbio entre homem e natureza (trabalho na sua gênese) que se possibilita a materialização de certa ideação abstrata. Em suma, trabalho é gasto de energia física acompanhada de um projeto. A mesma consciência que idealiza, portanto, é aquela que permite a concretização, sobretudo a partir da teologia, função através da qual “o homem projeta na sua consciência as formas daquilo que, em breve será seu trabalho objetivado” (FRANÇA JUNIOR; LARA, 2015FRANÇA JR., Reginaldo Pereira; LARA, Ricardo. Trabalho e Ser Social: reflexões sobre a ontologia LUKÁCSiana e sua incidência no Projeto Ético-Político Profissional. Textos e Contextos, v. 14, n. 1, 2015: 20-31.: 22).

Assim, para essa interpretação, o trabalho não se basta como transformação da natureza, na medida em que sua função teleológica lhe confere um caráter coletivo: é a partir das necessidades dos demais e do processo de aprendizado inerente ao trabalho que se afirma a sua finalidade social e seu caráter coletivo (FRANÇA JUNIOR; LARA, 2015: 22). Como se percebe, da teleologia do trabalho, ou da sua vinculação essencial com a concretização de um objetivo, nasce uma dupla socialização ao homem: de um lado, o trabalho como uma necessidade social e, de outro, como instrumento para satisfazer essa necessidade (LUKÁCS, 2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.: 56).

Portanto, a descrição do trabalho nesses termos possibilita compreender que junto dele surge no ser social uma característica que o difere substancialmente do homem existente até então. Tal característica consiste na realização da função teleológica pelo ser social, isso é, a produção pela consciência humana de um resultado “adequado, ideado e desejado” (LUKÁCS, 2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.: 61). Com isso, a consciência deixa de ser um simples epifenômeno, ultrapassando a simples adaptação ao meio ambiente, e tornando-se produtora de transformações intentadas da natureza.

O interessante da perspectiva de Lukács sobre a categoria trabalho é que, o autor, ao retomar a constituição do ser humano em sua gênese como ser social - centralizando sua análise, portanto, em um período pré-histórico - concebe o trabalho como uma característica constitutiva do ser humano que é conhecido hoje, mas por razões explicativas não restritas ao sistema capitalista. Também Marx realizou esse exercício teórico, estabelecendo o trabalho como a premissa pré-lógica de sua teoria, isto é, como sendo o elemento de distinção entre o homem e o animal (2001: 10). Para o autor, o primeiro fato histórico é a própria produção da vida material do homem, o que ocorreria no ato de suprir primeiro as necessidades físicas do ser e, após, também aquelas não físicas (MARX, 2001MARX, Karls; ENGELS, Frederich. A ideologia alemã. Tradução: Luis Claudio de Castro e Costa. São Paulo: Martins Fontes, 2001.: 21).

Entretanto, a partir do momento em que o homem estabelece relações com seus pares na direção de materializar um certo trabalho já idealizado em sua consciência, tal posição teleológica ultrapassa a característica mais simples do trabalho como intercâmbio entre homem e natureza e se dirige ao trabalho como práxis social, “entendida como um campo de possibilidade de transformação” (FRANÇA JUNIOR; LARA, 2015: 24). Sobre a construção da subjetividade do homem, Lukács ressalta que a essência ontológica do trabalho se dirige ao sujeito que trabalha e determina seu comportamento no trabalho, o qual, portanto, só poderá ser bem sucedido quando realizado com base na objetividade. Assim, o chamado “autodomínio do homem” aparece pela primeira vez no trabalho, mas se mantém regulado pela objetividade desse processo. Ao fim e ao cabo, trata-se da inserção de uma qualidade do ser social presente desde a sua ontologia até os dias contemporâneos cuja gênese está, segundo Lukács, na característica da práxis social do trabalho: o “domínio sobre os afetos” (LUKÁCS, 2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.: 104).

O trabalho na sua característica sócio histórica, contudo, apresenta facetas que não se resumem às características postas por Lukács. Certamente, o sistema capitalista da atualidade, impôs novas perspectivas de análise ao trabalho humano. Apesar dessas mudanças, o que parece ser ainda possível afirmar a partir da teoria lukácsiana é a permanência dos elementos constitutivos do trabalho, isto é, do seu caráter ontológico “por meio do qual possibilita o reconhecimento do homem enquanto ser humano, de sua relação com outros seres sociais e a possibilidade construtora das formas de linguagem, de sociabilidade, de cultura” (FRANÇA JUNIOR; LARA, 2015: 24).

A fim de complementar essa noção de trabalho construída, parece relevante retomar a noção de “ideologia do desempenho” criada por Kreckel (1992)KRECKEL, Reinhardt. Politische Soziologie der sozialen Ungleichheit, Frankfurt, Campus, 1992, pp. 67-106. a contextualizada para a realidade brasileira por Souza (2003)SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.. A “ideologia do desempenho” é ferramenta para a análise da distinção social brasileira, na medida em que a dignidade do cidadão não adviria pura e simplesmente da dimensão política dos direitos subjetivos universais. Tal garantia de direitos seria apenas uma das dimensões do reconhecimento social, responsável por produzir um pano de fundo igualitário e legitimador do atual sistema. Para Souza, contudo, o verdadeiro elemento diferenciador seria distinguível somente a partir da ideologia do desempenho, formada pela tríade meritocrática “qualificação, posição e salário” (2003: 65). Seria, portanto, a combinação de tais categorias que faria do indivíduo um “sinalizador” completo e efetivo do “cidadão completo” (SOUZA, 2003SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.: 65).

Justifica-se a retomada dessa perspectiva teórica dado o entendimento de Souza de que a tríade indicada tornaria compreensível as razões pelas quais apenas através do trabalho é possível ao indivíduo assegurar três categorias essenciais: identidade, autoestima e reconhecimento social (2003: 65). Assim, resta evidente a possibilidade de utilização da ideologia do desempenho como fator que acaba por determinar os grupos sociais dos sujeitos e que funciona como uma “legitimação subpolítica incrustada no cotidiano” (SOUZA, 2003SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.: 66), segundo a qual as pessoas estão ou não inseridas na esfera de aceitação social de acordo com os três fatores afirmados (posição, qualificação e salário), ou simplesmente, em razão de seu trabalho.

Ainda na temática do trabalho, o livro organizado por Souza sobre a chamada “ralé brasileira” traz uma reflexão importante sobre a importância do trabalho na distinção social entre aqueles que fazem parte da classe mais desfavorecida do país, sobretudo na medida em que, mesmo um trabalho muito precarizado, é entendido como mais digno do que qualquer forma de roubo ou desonestidade (MACIEL; GRILLO, 2011MACIEL, Fabrício; GRILLO, André. O trabalho que (in)dignifica o homem. In: SOUZA, Jessé de. A ralé brasileira: quem é e como vive. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. p. 241-277.: 241). Assim, as dificuldades na construção de possibilidades de “ser” para as classes carentes de recursos econômicos e culturais acabam colocando toda ênfase na transmissão para os mais jovens do contraexemplo, ou seja, do caminho a não seguir. Nesse sentido, as famílias derrotadas na busca por metas sociais “sentem que a única ‘opção’ é tentar afastar-se dos últimos lugares da ‘fila moral’ de vencedores e derrotados” (GRILLO; MACIEL, 2011: 245), apostando que o sucesso pessoal só pode se concretizar, portanto, pela negação do crime e pela aceitação do mundo do trabalho sejam quais forem as suas condições.

Diante do exposto, a noção de trabalho ora proposta constitui-se: a) na sua gênese, pelo caráter essencial na constituição do ser social, responsável pelos níveis de sociabilidade mais avançados, na medida em que a partir do trabalho o homem adquiriu a característica de projeção de ideais e de comunicação entre seus pares; b) na sua condição sócio histórica, pela aquisição de um papel fundamental na construção no indivíduo das categorias “identidade, autoestima e reconhecimento social” (SOUZA, 2003SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.: 65), na medida em que o trabalho torna-se, no paradigma da ideologia do desempenho, parâmetro de análise da distinção social.

Com essas ideias centrais em mente, torna-se possível, portanto, proceder na comparação entre duas atividades absolutamente distintas em seu conteúdo, objetivo e execução, uma vez que tanto o tráfico de drogas como o trabalho lícito, por razões diversas e em diferentes níveis de intensidade, parecem possuir características que vão ao encontro da noção de trabalho ora proposta. A interlocução entre as perspectivas teóricas apresentadas até então e o conhecimento compartilhado pelos adolescentes sujeitos desta pesquisa serão expostas nos tópicos que seguem, a fim de verificar de que modo a categoria trabalho operacionaliza-se em suas falas, e, sobretudo, quais são os avanços e os limites da compreensão do fenômeno social do tráfico de drogas quando a atividade é entendida como um trabalho.

A entrada no campo e a abordagem metodológica

Antes de iniciar o ponto de análise dos dados empíricos construídos no decorrer desta pesquisa, entende-se necessário uma breve contextualização sobre a entrada da pesquisadora no campo de pesquisa e sobre a metodologia escolhida. O local escolhido para de produção dos dados empíricos foi o Curso de Edição de Imagem e Vídeo que já possuía turma selecionada e havia iniciado seus encontros na Unidade CASE POA I, a qual integra as Unidades de Atendimento da FASE-RS. O curso trata-se de uma iniciativa do Projeto Pescar em parceria com a “União dos Skatistas de Cachoeirinha” que pretende desenvolver as faculdades relacionadas à produção de imagem e vídeo em interlocução com a temática do Skate.

Assim como em todas as unidades do Pescar, o curso é dividido em 40% das horas voltadas à iniciação profissional e 60% voltadas ao desenvolvimento pessoal e cidadania. No caso específico da Unidade da FASE, a carga horária da profissionalização é gerida por trabalhadores voluntários vinculados à União dos Skatistas de Cachoeirinha, além de profissional específico da produção de imagem e vídeo. Já as atividades relacionadas ao desenvolvimento pessoal e da cidadania são organizadas pela educadora social do Projeto Pescar responsável pelo curso em conjunto com voluntários de diversas áreas. Os grupos focais da presente pesquisa foram realizados no período destinado a essa última vertente do projeto. Foram realizados dois encontros prévios à realização da pesquisa em si, sendo o primeiro deles para observação e apresentação da pesquisadora aos jovens e o segundo para explicação da pesquisa aos responsáveis e assinatura dos Termos de Compromisso Livre e Esclarecido.

A técnica metodológica utilizada na produção dos dados foi qualitativa e ocorreu por meio de produção de grupos focais. Ou seja, realizou-se um grupo de discussão com os adolescentes em que o tema do tráfico de drogas e do trabalho lícito foram abordados. Observa-se que uma das situações em que a metodologia qualitativa é especialmente considerada no âmbito das ciências sociais é quando se busca a compreensão do “funcionamento complexo de estruturas e organizações complexas que são difíceis de submeter à observação direta” (HAGUETTE, 1999HAGUETTE, Teresa Maria Frota. Metodologias Qualitativas na Sociologia. Petrópolis: Vozes, 1999.: 64). Já o grupo focal tem a marca do uso explícito da interação para a produção dos dados (FLICK, 2009FLICK, Uwe. Introdução à Pesquisa Qualitativa. 3ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.: 188). A força da técnica sustenta-se, por um lado, na revelação através da discussão dos significados supostos pelas pessoas sobre o tópico em questão, e por outro “a maneira pela qual elas negociam esses significados” (LUNT; LIVINGSTON, 1996: 964 4 LUNT, P; LIVINGSTONE, S. Rethinking the Focus Group in Media and Communications Research. Journal of Communication, v. 46, pp. 79-98, 1996. apud FLICK, 2009FLICK, Uwe. Introdução à Pesquisa Qualitativa. 3ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.: 189).

Pelas razões que justificam o uso do método acima expostas, bem como por se acreditar que a temática da pesquisa seria melhor desenvolvida se os adolescentes pudessem discutir entre si, sentindo-se mais confortáveis por estarem com seus pares, a realização de grupos focais foi a metodologia base utilizada na pesquisa. De modo bastante resumido, a técnica metodológica consistiu na formação do que se pode chamar de rodas de conversa, nas quais a mediadora5 5 A mediação dos grupos foi realizada por uma das pesquisadoras que assina o presente artigo. introduziu a temática geral da discussão a ser realizada e, após, postulou certas questões como forma de especificar melhor os temas a serem debatidos pelos jovens. Evidente que a condução dos grupos observou os assuntos abordados com maiores dificuldades pelos jovens em contraste com aqueles que fluíam de modo mais espontâneo, de modo que os adolescentes não se sentissem pressionados a adentrar em temas que não desejassem.

Os adolescentes sujeitos da pesquisa, no número de dez6 6 Os adolescentes eram todos jovens entre 16 e 18 anos que se encontravam em cumprimento de medida de internação pelo cometimento de ato infracional. Optou-se por não realizar questionários mais objetivos a respeito das características socioeconômicas desses jovens, mas é possível supor que, em sua grande maioria, são adolescentes com famílias que habitam bairros considerados ‘periféricos’ da cidade de Porto Alegre, em contextos econômicos difíceis. Notou-se, contudo, distintos níveis de precarização entre os jovens – seja em relação ao contexto socioeconômico, seja em relação às relações familiares. Embora não se tenha a informação da cor autodeclarada, é possível afirmar que, dentre os 10 adolescentes, havia uma distribuição quase equiparada de jovens negros/pardos e brancos. , foram selecionados para constituir a primeira turma do “Curso de Produção e Edição de Imagem e Vídeo” do Projeto Pescar, o qual se realiza no interior da unidade Centro de Atendimento Socioeducativo de Porto Alegre I (CASE POA I), conforme já exposto. A seleção destes, realizada pelos próprios agentes socioeducativos da unidade, levou em consideração a motivação dos adolescentes para a participação do projeto, a possibilidade de convivência com os demais selecionados, a previsão de permanência na Fundação de Atendimento Socioeducativo (FASE) pelo período total do projeto (em torno de 12 meses), entre outras questões relacionadas às características pessoais e ao cumprimento da medida socioeducativa, como o comportamento do jovem na unidade, por exemplo.

Diante do número de adolescentes participantes do curso, foram realizados dois grupos focais, cada um contendo cinco jovens. Assim, enquanto o grupo focal “A” era desenvolvido, os adolescentes restantes realizaram oficina executada por voluntários. Após, invertia-se o processo de modo que todos os adolescentes tenham realizado dois grupos focais e participado de todas as oficinas propostas. Essas oficinas também foram preparadas pela pesquisadora em conjunto com os profissionais voluntários, na medida em que as atividades permitissem o bom desenvolvimento dos grupos, já que ambos foram realizados no espaço destinado ao Projeto Pescar.

O tema do primeiro encontro foi centralizado na temática do mundo do trabalho lícito e formal, o qual abarcou também as atividades do curso profissionalizante. Para o desencadeamento do debate, foram apresentadas fotos de diversos ambientes de trabalho lícito formal7 7 As imagens consistiam em trabalhadores exercendo as seguintes atividades laborais: professora; músico; pintor; trabalhadores da construção civil; agricultores; trabalhadores industriais; artesãos; pessoas de terno e gravata (podendo representar empresários, advogados, etc); e vendedores de loja de calçados. e cédulas com as inscrições das competências comportamentais do Projeto Pescar. A partir de um roteiro previamente determinado, certos questionamentos foram utilizados como a base para o direcionamento do grupo focal, mas sempre que os adolescentes traziam questões próprias que acabavam desencadeando discussões com os demais, a orientação do grupo focal ia moldando-se nesse sentido.

As questões centrais em relação ao grupo focal sobre o trabalho e a profissionalização foram as seguintes: quando pensam em trabalho, o que vem primeiro na cabeça? O que o trabalho pode trazer de bom e de ruim para uma pessoa? Porque uma atividade é considerada trabalho? Como as Competências do Projeto Pescar podem se relacionar com os trabalhos das imagens? Com qual trabalho melhor se relaciona cada competência? Como uma pessoa faz para aprender um trabalho? Um curso como o do Pescar ensina um trabalho? Que tipo de trabalho pode ser aprendido no Pescar? O que esse trabalho pode trazer de bom e de ruim pra uma pessoa? Como a profissionalização do Pescar pode se relacionar com as competências? Na medida em que o grupo focal foi acontecendo, e com a ajuda de materiais como papel pardo, canetas, cola e tesoura, demandou-se aos adolescentes que algumas conclusões mobilizadas durante a discussão fossem sendo transpostas para um grande cartaz que restou intitulado, por escolha dos adolescentes, “Trabalho na Vida”. Todo o processo repetiu-se exatamente da mesma forma com o segundo grupo de adolescentes.

Em um segundo encontro com ambos os grupos, foi realizada a discussão sobre a temática do tráfico de drogas. Após explicar aos adolescentes que a pretensão do grupo de debate era conhecer suas opiniões sobre um tema de grande relevância social para o Brasil atual - esclarecendo que o debate não possuía a intenção de saber se os sujeitos participaram desse tipo de atividade8 8 Aqui cabe referir que os adolescentes foram selecionados para participar do Projeto Pescar pela própria Unidade Socioeducativa, de modo que as pesquisadoras não foram informadas sobre os atos infracionais cometidos por eles. Entretanto, no decorrer dos debates realizados em grupo, foi possível identificar maiores ou menores níveis de vinculação dos jovens com as atividades do tráfico. Alguns inclusive se identificaram como sendo “do roubo”, o que não os impediu de tecer suas considerações a respeito da temática do mercado ilícito de drogas, na medida em que se trata de uma realidade muito próxima de todos eles. - foram apresentados fotos9 9 Imagens representando diferentes processos do ciclo do tráfico de drogas, consistindo em fotos contendo as seguintes imagens: plantação de cannabis sativa; porto com contaîners; pessoas de terno e gravata ao telefone; indivíduos com o rosto tampado por camisetas amarradas, portando armas no alto de uma edificação característica de uma favela; e uma mão com drogas embaladas entregando a outra mão com valores em espécie. e manchetes de jornais10 10 Foram apresentadas dois extratos de papel contendo as seguintes manchetes: “Jovens que trabalham para o tráfico estão há dois meses sem receber em morro do Rio” e “Polícia descobre tabela de cargos e salários do tráfico em favela de Magé-RJ”. com referências à atividade no tráfico de drogas. O roteiro do grupo focal foi guiado pelos seguintes questionamentos: quando pensam em tráfico, o que vem na cabeça de cada um? O que o tráfico pode trazer de bom e de ruim para uma pessoa? Quais atividades são exercidas dentro do tráfico? O que é preciso para participar do tráfico? Como uma pessoa pode aprender as atividades do tráfico? Como seria possível relacionar as competências do Pescar com o tráfico de drogas? Dessas imagens, quais vocês acham que poderia se relacionar com o tráfico? O que cada pessoa precisa fazer para participar do tráfico? E o que não pode fazer? Porque vocês acham que a notícia do jornal disse “Jovens que trabalham para o tráfico estão há dois meses sem receber em morro do Rio”?

Reitera-se que a mediação do grupo possuiu o cuidado de demandar aos adolescentes a explanação do seu conhecimento sobre a temática, sem que houvesse qualquer pretensão de que indicassem experiências pessoais específicas vividas por eles. Contudo, após a deflagração do debate, os próprios jovens iniciaram a narrativa de experiências pessoais vividas no tráfico de drogas, sem que houvesse um aparente desconforto ou pudor em relatar tais situações, conforme pode se observar nos tópicos seguintes.

Tráfico e trabalho: a percepção de adolescentes internados na FASE-RS

Os diálogos foram divididos em eixos de análise, sendo que tal divisão foi feita em acordo com as temáticas mais abordadas pelos adolescentes, de modo a facilitar a análise dos dados. Os nomes dos adolescentes foram retirados dos diálogos, e as indicações são feitas por letras escolhidas aleatoriamente para cada adolescente, sendo que a letra P diz respeito às falas da pesquisadora e a combinação ES às intervenções das educadoras sociais do Pescar.

Significado de trabalho e tráfico de drogas:

As primeiras articulações mobilizadas pelos adolescentes para explicar o sentido do trabalho relacionaram-se à possibilidade de possuir bens materiais e de poder garantir o bem-estar de seus familiares. Apenas em um segundo momento de discussão o trabalho foi vinculado a uma atividade que se faz por prazer ou “por amor”, mesmo que a conclusão tenha sido de que existem mais trabalhos que “não gosta, que gosta”. Em todo caso, é perfeitamente compreensível para os adolescentes que atividades sem ganhos financeiros possam ser entendidas como trabalho, no exemplo do voluntariado ou das atividades exercidas por eles no contexto da profissionalização.

Contudo, quando estimulados a pensar o sentido de trabalho conferido a tais atividades em comparação com trabalhos normalmente exercidos no ambiente externo - utilizando-se das imagens disparadoras para exemplificar - os adolescentes muito naturalmente indicaram as distinções entre ambos. Assim, no caso de atividades consideradas “trabalhosas”, como a montagem de bicicletas ou a confecção de origamis realizadas dentro da Unidade Socioeducativa, seria necessária a “liberdade”, além da organização de um “negócio”, para poderem se igualar à ideia mais tradicional de trabalho. Já em outro momento, ao trazerem o exemplo da atividade realizada dentro da FASE de barbearia11 11 Os adolescentes explicaram que alguns deles se voluntariam para realizar o corte da barba e do cabelo dos demais. Em um dos grupos focais realizados, havia um adolescente indicado como sendo responsável por tal atividade no interior dos “bretes” (dormitório no interior da Unidade de Atendimento Socioeducativo). , proferiram um entendimento de que, por ser algo em certo sentido prazeroso e feito em auxílio aos demais, tal atividade se afasta do significado do trabalho.

Há, portanto, uma distinção, dentro da categoria maior de trabalho, entre as atividades que possibilitam ganhos financeiros e aquelas que não são pagas. A essas observações somam-se duas outras mais: a) o trabalho é afirmado como gerador de valores não materiais, como respeito e dignidade, mas não é entendido como um valor em si, isto é, apresenta-se apenas como um instrumento e não como um fim em si mesmo; b) as figuras apresentadas que, na concepção dos grupos, melhor representam o trabalho são aquelas que mostram trabalhadores da engenharia civil e agricultores.

Assim, uma primeira possível conclusão é que há uma vinculação entre o sentido de trabalho apresentado pelos grupos focais e a ideia de Lukács do trabalho como produtor de valores de uso (2013: 44). A primeira característica apresentada pelo filósofo é também a característica mais óbvia na visão dos adolescentes: trabalho é trabalho porque gera dinheiro. Contudo, na medida em que esse dinheiro propicia tranquilidade, a qual é representada na possibilidade do trabalhador “entrar na vila a hora que quiser”, além da dignidade e do respeito, o trabalho da visão dos adolescentes diferencia-se por ser produtor de valores não-materiais, próprios da natureza humana enquanto socialidade.

É possível identificar que a construção da noção de trabalho dá-se pela contraposição ao tráfico de drogas, embora não seja necessariamente o oposto dele. Essa percepção, aparentemente contraditória, aparece, por exemplo, quando os adolescentes afirmam que quem trabalha “não pensa em crime”, embora a figura que representa a negação do trabalho não seja a atividade no tráfico, mas a dita “vagabundagem”, isso é: “ficar na baia ali, sem fazer nada, não lava nem uma louça, não limpa nem um pano ali (…)”. Os adolescentes parecem compreender o trabalho como um instrumento de fuga tanto da vida no crime, como da prisão; mas, ainda assim, compreendem que participar do tráfico de drogas significa aderir a um certo trabalho:

C: É que nem eu, eu trafico, eu trabalho.

(…)

P: Então tu acha que tá faltando alguma coisa aqui? (referindo-se às fotos representativas de trabalho)

C: Tá faltando os neguinho na favela trabalhando…

D: Claro.

C: É mas é!

Assim, a compreensão do traficante como um trabalhador reforça-se pela oposição ao vagabundo, ser moralmente inferior, que “não faz nada” e que não despende energia física em nenhuma atividade, quase como em estado de letargia diante da vida. Além de corroborar a ideia de que trabalhar é ação corporal, as interações dos adolescentes demonstraram a polarização entre “traficante” e “vagabundo”:

C: As pessoas pensam que traficante é vagabundo, traficante não é vagabundo.

P: Não?

C: Traficante é criminoso.

P: É diferente?

C: É diferente. Nós tamo envolvido com o crime vagabundo é aquele que fica em casa só deitado, nós ficamos na rua ali...

I: Deitado de murçilha.

Essa oposição possibilita identificar, também na realidade destes jovens, a chamada “ideologia do desempenho” em que é o trabalho o principal responsável pela distinção social dos indivíduos (SOUZA, 2003SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.: 65). Na realidade específica das comunidades periféricas de Porto Alegre, contudo, a distinção não se opera apenas entre as diferentes combinações de posição, qualificação e salário: o tráfico é incluído como uma das categorias da hierarquia social, estando um nível acima da “vagabundagem”, na medida em que entre os polos trabalho e não-trabalho a atividade ilícita está, na concepção dos adolescentes, mais próxima daquele do que desse. Veja-se que, de forma contrária, na hierarquia social da “ralé” categorizada por Grillo e Maciel, o empregado, ao poder provar “que escapou do último lugar da fila em nossa moralidade” (2011: 247), estaria sempre um nível acima do traficante, representante do primeiro degrau da delinquência (GRILLO; MACIEL, 2011: 249).

Ocorre que, na medida em que os adolescentes aproximam o tráfico de drogas do mundo do trabalho, entre outras razões, pela sua capacidade de produzir valores econômicos, a afirmação dos autores parece necessitar de uma complementação. Assim, justamente pela universalidade da ideologia do desempenho, mesmo aqueles que pertencem aos últimos degraus da hierarquia social acabam justificando seu “local no mundo” através da sua distinção em relação a um nível ainda pior. Se no caso do guardador de carros retomado por Grillo e Maciel, o traficante era o exemplo do “não ser” de quem era preciso se afastar, os adolescentes identificados com o tráfico de drogas produziram a sua própria distinção com os “vagabundos”, ou seja, na figura do jovem que não auxilia materialmente sua família.

Os adolescentes, portanto, entendem que o tráfico acaba sendo, na prática, um “trabalho fora da lei”. Veja-se que tanto o significado do tráfico relaciona-se com aquele do trabalho que, no momento de explicar a atividade ilícita, os adolescentes mobilizaram categorias próprias dos trabalhos regulados: “tem um horário, um cargo e um chefe”, além de possuir riscos envolvidos, com distintas consequências para cada tipo de erro ou falha. A pesquisa, portanto, reafirma aquilo que já havia sido constatado por Lyra: a adesão ao crime representa menos “um repúdio às instituições da escola e do trabalho” e mais um deslocamento do significado dessas categorias para outras esferas existenciais (2011: 99-100).

Após a vinculação do tráfico como produtor de dinheiro e de mercadorias possíveis de serem adquiridas através dele, como roupas e tênis de marca, os adolescentes relembram um segundo elemento fundamental na constituição do significado da atividade ilícita: a violência. Sobretudo a partir dos vocábulos “morte” e “guerra”, afirma-se ser impensável afastar essa característica do significado do tráfico de drogas, dada a configuração atual do mercado ilícito na cidade de Porto Alegre.

P: Tá então, relacionado diretamente com violência? Tem como não tá relacionado com violência ou não tem?

S: Hoje em dia não.

M: Antes até era, hoje não.

P: Porque?

M: Porque agora tá em guerra.

S: Porque se eu to vendendo aqui e ele tá vendendo lá na dele, se ele vender uma peteca a mais que eu ou eu que ele, eu vou querer matar ele ou ele vai querer me matar.

Nesse sentido, retoma-se a ideia de “mercadoria política” construída por Misse no contexto do mercado criminalizado e avesso a qualquer regulamentação estatal ou pública (1999: 295). A violência a que os adolescentes fazem referência é aquela que expropria do Estado a legitimidade para a resolução de conflitos econômicos privados. É, portanto, uma “mercadoria política” própria e inerente do mercado de drogas, já que esse, ao ser criminalizado, tende a não garantir a concorrência legítima, baseada na qualidade e no preço do produto, e a valorizar a desconfiança entre os agentes do mercado, o que leva ao uso da violência para a resolução de conflitos referentes à disputa pelo domínio do mercado (MISSE, 1999MISSE, Michel. Malandros, marginais e vagabundos & a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. 1999. p. 413. Tese de Doutorado em Sociologia - IUPERJ, Rio de Janeiro, 1999.: 298).

A incorporação da violência como elemento central no significado do tráfico de drogas gera uma segunda construção por parte dos adolescentes. Esses identificam que os ganhos financeiros oriundos da atividade são importantes sobretudo no primeiro momento de adesão ao tráfico, mas não bastam como razão explicativa. Assim, se em um primeiro momento a adesão ao tráfico é moralmente justificada pela sua distinção com a “vagabundagem”, a permanência nele, depois que instaurada “a guerra”, só é moralmente compreendida a partir de outros elementos, como a lealdade aos demais. “Depois que a guerra forma, daí já não é dinheiro”. Para continuar na atividade, é necessário estar presente quando “a guerra estourar”, demonstrar confiança, “honrar tua camisa” e “honrar tua vila”.

Quando se depararam com a notícia apresentada em que se lê a manchete “Jovens que trabalham para o tráfico estão há dois meses sem receber em morro do Rio”, o primeiro elemento que causa estranheza aos adolescentes é a ausência de recompensa. Ao discutirem a situação, contudo, percebem que existem justificativas que poderiam explicar o fato, como a necessidade de compra de armas pelo patrão da boca. Inclusive, nesse sentido, entendem que sair do “embolamento”12 12 O termo é trazido pelos adolescentes de forma muito natural, e parece se adequar ao sentido já conferido por Cipriani, de união de grupos criminosos mais expressivos com grupos menores, formando aquilo que em outras regiões do país é chamado de “comando” (2017: 18). nesses momentos seria atitude própria de “interesseiro” e “traidor”: há uma responsabilidade em “fechar até o final” e em permanecer do lado dos demais companheiros. Observa-se, portanto, que a partir da entrada do elemento violência, componentes que não estavam presentes no significado do trabalho passam a operar na explicação do sentido conferido ao tráfico de drogas. Dentre eles, destaca-se a necessidade de demonstrar lealdade ao grupo nos momentos de “guerra”, e de compreender que aderir ao tráfico de drogas não se restringe a produzir valores de uso:

P: E ai por exemplo que não tão ganhando, digamos que seja verdade que eles tão há dois meses sem receber, vocês acham que eles vão continuar, ou vão dizer “sem dinheiro não vale a pena”?

L: No caso tem que ter um motivo né.

C: No crime já é considerado um traidor né, se eles largar… “ah são um bando de interesseiro tavam aí só por causa do dinheiro”. Se voltarem de novo do no coco.

F: Não se sabe também se foi o patrão que mandou fogo pra ver se eles vão largar ou se vão ficar.

C: Quando vê é um teste.

P: Tá então na verdade vocês tão me dizendo que o que faz entrar é o dinheiro, mas se não ganha, tem que ficar também.

C: Ah muitas vezes é obrigado a ficar, não tem. Depois que tu fechar com os cara tu vai ter que fechar até o final. Vai ter que tua responsabilidade, vai ter que ter tua palavra de homem...Eu to contigo.

O que a pesquisa possibilitou concluir é que não há uma oposição entre aderir ao tráfico pela possibilidade de ganhos financeiros ou pela “fome simbólica de existência”, conforme apontam algumas interpretações (LYRA, 2011: 72). O que parece melhor explicar a entrada e a permanência de adolescentes no tráfico de drogas é uma confluência desses motivos. Por um lado, o tráfico é produtor de valores de uso, e nesse sentido seu significado se assemelha não só ao sentido conferido pelos adolescentes aos demais trabalhos, mas também à ideia do trabalho como atividade que se distingue por ser a atividade através da qual o homem exterioriza-se, permitindo que a natureza torne-se objetiva e subjetivamente disponível a ele (MÉSZÁROS, 2006MÉSZÁROS, István. A teoria da alienação em Marx. Tradução: Isa Tavares. São Paulo: Boitempo, 2006.: 155).

Por outro, na medida em que participar do tráfico requer necessariamente o envolvimento a um “embolamento”, os sentimentos de pertencimento a um grupo e da necessária lealdade a ele são também constitutivos do tráfico de drogas. De todo modo, os adolescentes exteriorizaram que toda a atividade de relacionar, compreender, explicar e descrever o tráfico foi realizada de forma muito mais espontânea em comparação ao trabalho. Afirmaram, portanto, saber e ser mais do tráfico do que do trabalho, o que restará mais bem demonstrado no tópico que segue.

Os prós e os contras das atividades:

As experiências de trabalho e tráfico acabam representando para os jovens ao mesmo tempo possibilidades e barreiras; instrumentos de ascensão e afirmação de limitações; resultado de uma escolha e decorrência inevitável das possibilidades existentes. Ressalva-se, portanto, que a escolha por opor aspectos positivos e negativos é apenas uma forma de melhor organizar as tantas ideias que foram expostas durante a realização dos grupos focais, já que as narrativas dos adolescentes apresentaram menos antinomias do que normalmente se poderia acreditar, conforme será exposto neste tópico.

A descrição positiva dos trabalhos lícitos abordou principalmente o aspecto do ganho do dinheiro, mas também levantou a possibilidade de conhecer pessoas diferentes, de mudar a forma como se é visto pelos demais, e de afastar os pensamentos relacionados ao crime. Logo de início, o trabalho aparece como uma ferramenta de oposição ao crime, na medida em que ele permite “não cair preso”, além de promover certos valores como liberdade, tranquilidade, dignidade e felicidade.

Nesse sentido, em alguma medida os adolescentes reafirmam o que fora constatado por Costa e Jacobina (2007)COSTA, Liana Fortunato; JACOBINA, Olga Maria. “Para não ser bandido”: trabalho e adolescentes em conflito com a lei. Cadernos da Psicologia do Trabalho, vol. 10, n. 2, 2007: 95-110.. Para as autoras, o trabalho no contexto da Liberdade Assistida figura como um importante fator de integração do adolescente em uma rede social de proteção e apoio, bem como no seio da sua própria família, na medida em que esse age como um meio de ressignificação das relações familiares e, sobretudo, como fator de diferenciação do criminoso, na medida em que as experiências laborais “os tiram da rua e contribuem para a formação de uma “não identidade de bandido”, mesmo que os adolescentes não experienciem, na atividade de trabalho, grandes desafios ou a sensação de superação” (COSTA; JACOBINA, 2007COSTA, Liana Fortunato; JACOBINA, Olga Maria. “Para não ser bandido”: trabalho e adolescentes em conflito com a lei. Cadernos da Psicologia do Trabalho, vol. 10, n. 2, 2007: 95-110.: 108).

A compreensão parece estar em acordo também com a concepção de Grilo e Maciel para quem o emprego exerce um papel de “signo distintivo” que marca uma condição de não delinquência, sobretudo quando o sujeito pode demonstrar a sua vinculação empregatícia, provando que “escapou do último lugar da fila em nossa moralidade” (2003: 247). Em que pese os adolescentes tenham indicado que o último lugar desta hierarquia social não seja representado pelo traficante, mas pelo “vagabundo”, ainda assim eles compreendem que, na hierarquia social da sociedade em que vivem, possuir um trabalho lhes coloca em um nível de distinção o qual, ao menos, lhes possibilita uma certa distância da prisão.

Já os pontos positivos do tráfico de drogas foram apontados de modo muito mais contido pelos adolescentes, os quais, em um primeiro momento, inclusive negaram a sua existência. O próprio dinheiro oriundo da atividade foi visto com ressalvas, uma vez que é um dinheiro que “vai fácil”. O elemento positivo melhor desenvolvido nas interações dos adolescentes foi aquele do auxílio do tráfico à comunidade, o que se materializa no auxílio para “arrumar um gás” ou “arranjar uma cesta básica” para o morador:

S: Às vezes é mais fácil tu arranjar uma cesta básica na boca que no governo… os morador.

Y: Arrumar um gás… se falta gás e os cara pede pros brigadiano, os brigadianos vai dizer “vai trabalhar”.

T: Já me pega ainda.

Y: Ainda capaz de dá umas cacetada.

M: Passando fome… criança passando fome.

Y: Na hora o homem já vai apoia.

M: Não é nem o homem, até os cara que vende… todo mundo precisa.

Sobre a relação tráfico de drogas e moradores, há uma certa divergência na literatura especializada sobre os aspectos preponderantes dessa relação, ou seja, se ela se pauta principalmente pela cooperação ou pela submissão. Silva e Leite apontam que o discurso dominante indica que a população residente nas favelas - principais territórios da violência - seria conivente com os agentes dessa violência, sobretudo com os traficantes de drogas (2008: 49). Entretanto, ao realizarem pesquisa empírica com moradores dessas localidades, os autores acabam concluindo que a grande crítica de tais agentes em relação à violência dos traficantes dá-se quando está se torna “imprevisível”, desrespeitando uma certa ordem social local - o que também ocorre no caso da violência policial - e agindo na interrupção das rotinas. Assim, para os moradores que convivem com o tráfico, não seria propriamente a violência ou o crime o problema central do fenômeno, mas “a interferência desta forma de vida sobre o fluxo rotineiro da vida nos territórios das favelas” (LEITE; SILVA, 2008LEITE, Márcia Pereira; SILVA, Luiz Antonio Machado da. Violência, crime e polícia: o que os favelados dizem quando falam desses temas? In: SILVA, Luiz Antonio Machado da. Vida sob cerco: violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008: 47-76.: 75).

Por outro lado, do ponto de vista dos adolescentes envolvidos no tráfico, haveria um certo dever de defesa da comunidade dos agentes externos, o que justificaria o uso da violência imprevisível quando essa estabilidade fosse rompida, seja pelos policiais seja pelos “alemão” - termo calcado na realidade carioca (LYRA, 2013LYRA, Diogo. A República dos Meninos: juventude, tráfico e virtude. Rio de Janeiro: Mauad X: FAPERJ, 2013.: 148) - o qual poderia ser traduzido por “contra” no contexto ora em análise. Nesse sentido, é possível compreender as razões pelas quais a atuação do tráfico de drogas é entendida pelos adolescentes como algo que vai além da simples atividade mercantil, na medida em que se preocupa com os moradores e se mobiliza para auxiliá-los em casos de necessidades financeiras, por exemplo. Para Lyra, esse entendimento dos jovens está ligado à noção de que “a melhoria das condições de vida na favela se efetua diretamente para e pelas crianças locais” (2013: 155), o que em certo sentido também foi observado na presente pesquisa. Note-se que os adolescentes entendem que não é apenas o “homem”13 13 Fazendo referência ao chefe do tráfico de drogas no local. quem pode ajudar os moradores, pois “até os cara que vende” possuem as condições materiais e a autorização simbólica necessária ao auxílio.

Assim, o que se percebe é que a interferência nas rotinas dos moradores das localidades em que o tráfico de drogas exerce ampla influência se articula ora pela interrupção, sobretudo quando a violência é mobilizada na defesa do ataque de agentes externos, ora pela garantia da continuidade, quando impede que uma carência material se torne um problema para o morador. Portanto, os adolescentes, ao se colocarem no papel de “guerreiros” da vila, parecem conferir um significado à atividade comercial mais vinculado à proteção de sua comunidade do que aos ganhos financeiros:

Y: Tem que honrar tua camiseta, honrar tua vila, saber que vai estourar aquela guerra lá com os cara (inaudível).

S: Tem que botar um braço.

Y: E não adianta só querer vender, só querer botar o teu e não pensar na vila. Tem que pensar em ti, na vila e nos morador.

Em relação ao viés negativo das atividades, o cansaço físico foi o principal elemento indicado no caso do trabalho. Esse, de modo geral, foi atrelado pelos adolescentes a uma concepção social negativa, na medida em que a ideia geral construída é de que “ninguém queria tá trabalhando”. Além disso, os adolescentes mobilizam as dificuldades nas rotinas dos trabalhadores como “levantar cedo, ficar o dia inteiro lá, pegar ônibus lotado”, além de “ter responsabilidade, fazer tudo certinho”. Vinculou-se, assim, de modo muito consistente, o trabalho ao cansaço físico, como no caso das mães empregadas domésticas ou prestadoras de serviços gerais em grandes lojas de departamento, e dos agricultores os quais restam “em baixo do sol”, “cheio de traumas na mão” o que acaba gerando “dor nas costela… nas costa”.

Do modo geral, portanto, houve uma compreensão de que o próprio significado do termo trabalho vincula-se ao cansaço, o que acaba retomando a ideia marxista do trabalhador como aquele que vende sua força de trabalho, sendo que “força” mantém, nesse caso, seu significado mais primitivo de qualidade daquele que faz mover algo. Se o conhecido conceito de força de trabalho para Marx consiste nas capacidades físicas, mentais e humanas de incorporar valor às mercadorias (HARVEY, 2013HARVEY, David. Para entender O Capital - livro I. São Paulo: Boitempo, 2013: 45-46: 102), ao que relatam os sujeitos desta pesquisa e no mesmo sentido que entende Souza, no caso da ralé brasileira, “não é o conhecimento incorporado no trabalhador que é a mercadoria vendida no mercado de trabalho, mas a capacidade muscular, comum a todos os animais” (2017__________. A elite do atraso: da escravidão à lava-jato. Rio de Janeiro: Leya, 2017.: 103).

Sobre a relação empregador-empregado, também retomaram os adolescentes as dificuldades do trabalho decorrentes do contato com o patrão, como as reclamações e os xingamentos proferidos, além dos desrespeitos aos direitos trabalhistas, como a ausência de pagamento das horas extras, o excesso de carga horária e a baixa recompensa para trabalhos que exigem muito esforço físico. Esses exemplos foram articulados a partir das vivências, sobretudo dos familiares dos adolescentes, sendo que, mesmo quando há uma certa relação de confiança entre patrão e empregado, qualquer empréstimo de valores em dinheiro será de alguma forma cobrado posteriormente:

Y: Ainda o patrão lá do serviço, capaz de te emprestar e ficar te perguntando “ah dá pra descontar esse mês”.

M: Fica jogando na cara.

Y: “Não dá pra descontar desse mês aquele dinheiro que eu te emprestei”, toda hora vai fica te cobrando.

A contraposição dos exemplos trazidos pelos adolescentes de situações limite da relação trabalhador-patrão é bastante sintomática daquilo que eles entendem como a principal diferença entre os patrões da atividade lícita e do tráfico de drogas. Enquanto o primeiro parece estar interessado somente na possibilidade da venda da força de trabalho pelo trabalhador, com o “patrão da boca” existe, em algum nível, uma relação de cooperação entre esses agentes. De qualquer forma, a conclusão operada pelos adolescentes é no sentido de que o bem-estar do trabalhador no exercício da sua atividade, seja ela lícita ou não, depende substancialmente do desejo momentâneo do patrão. Há uma noção compartilhada de que em ambas as atividades, em que pese a existência de parâmetros gerais definidores dos ganhos financeiros, das condições de trabalho e das consequências para desvios de conduta, a palavra final se dá de acordo com o “humor” de um homem.

Assim, a ideia comum de que é possível encontrar certa estabilidade na vida a partir da adesão a uma atividade rotineira cai por terra em relação ao tráfico, mas também em relação ao trabalho lícito:

C: Às vezes eles dão a segunda chance. É que tudo depende do teu patrão também entendeu né, como no tráfico como no serviço, como no trabalho. Tudo depende da pessoa, depende do humor da pessoa ali, depende de como a pessoa é.

Também como um fator negativo específico do tráfico, a violência é compreendida como um corte em um processo que, não fosse ela, poderia restringir-se ao aspecto favorável. Conforme já retomado no tópico anterior, a violência também pode integrar a ideia de “mercadoria política” quando a força física ou alguma de suas extensões é utilizada na resolução de um conflito que, não fosse o mercado criminalizado, resolver-se-ia pela lógica regulatória do Estado. Assim, a narrativa que antecede a “formação da guerra” apresentada pelo adolescente, estabelece um cenário em que os bens adquiridos com a atividade ilícita podem ser usufruídos apenas até um certo ponto, pois logo em seguida opera-se um corte nessa imagem idílica de proveito. Esse rompimento concretiza-se pelo uso de instrumentos de imposição da força física (como armas e tiros), os quais acabam provocando casos contínuos de violência letal, findando finalmente em uma “guerra”:

C: É tem vários momento, momento que tu pode curtir ali. Que nem ali na vila onde eu moro, sempre que nós não tinha guerra, nós ia pra baile, fazer um bolo, ostentar, dá várias bandas, shopping, bagulhada. Tinha várias roupas, era só dinheiro, e dinheiro, dinheiro. Força de dinheiro rolando, força de carro, roupa de marca, moto, arma. Depois daí só... Daí começa (inaudível) com os cara…

P: Daí o que que acontece?

C: Daí tu já vai ali na bocada de um, traficante já dá uns tiro lá. Daí o outro sobe lá, mata um na outra boca. Daí desse eu lá, matou o outro e daí formou a guerra.

O ponto que merece destaque nessa narrativa é a extrema relevância da violência oriunda dos conflitos entre aqueles que participam do tráfico de drogas. A violência policial, por exemplo, apareceu com muito menos ênfase se comparada com os conflitos gerados pelas disputas entre os “donos de boca”; de forma oposta, portanto, ao que observou Lyra (2013LYRA, Diogo. A República dos Meninos: juventude, tráfico e virtude. Rio de Janeiro: Mauad X: FAPERJ, 2013.: 151). As disputas entre pares no contexto específico em que foi realizada a presente pesquisa parece ocupar um local de maior peso para os jovens, os quais afirmaram em diversos momentos a necessidade de se preocupar a todo momento com os “contras” e a impossibilidade de projetar opções de vida diversas após o cumprimento da medida socioeducativa em decorrência da perseguição desses mesmos sujeitos. A vida dos adolescentes parece pautada em uma dualidade “a favor” e “contra”, em que o “embolamento” a que se faz parte representa o primeiro polo deste binômio, mesmo que o risco de morte se encontre também no interior deste agrupamento, na medida em que um simples deslize é o suficiente para a punição letal:

P: E vocês acham que fazendo uma balança é elas por elas.. ou tem um que prevalece?

M: Ta louco é pior

P: Mais ruim que bom?

S: Mais ruim que bom.

Y: Se no crime tu ta fortalecendo isso aqui, tu treino nisso aqui, os cara pegam… Teu próprio embolamento. Tu fez um montão, mato, fez um bolo por eles dai tu fez isso aqui, os cara…

S: Depois que o cara não serve mais…

P: Não consideram?

M: Ai já era.

Com essa ressalva, não se está dizendo que a polícia não representa um fator fundamental nesta vivência apresentada pelos adolescentes. Reitera-se que a presença do poder de polícia como uma ferramenta essencial na produção do ciclo do tráfico de drogas foi um elemento trazido pelos próprios adolescentes, de modo que a figura do policial não pode ser deixada de lado na tentativa de compreensão do tráfico de drogas. Em todo caso, o que emergiu dos diálogos foi uma proeminência dos riscos oferecidos pelos grupos rivais no mercado de drogas se comparado com outros possíveis fatores de risco. Parece haver uma confluência entre a “guerra” das “bocas” mencionada pelos adolescentes com a já conhecida desestabilização do “mundo do crime” percebida na cidade de Porto Alegre, sobretudo a partir da formação de grupo chamado de “Antibala”, no ano de 2016. O grupo criminal é entendido como um “embolamento voluntário”14 14 Segundo Cipriani, na constituição mais recente dos grupos que se articulam no interior do Presídio Central de Porto Alegre há uma forte vinculação com a divisão do espaço urbano pelo domínio do mercado ilícito de drogas (2016: 128). Essa vinculação se dá sobretudo a partir de estratégias de “embolamento”, como ao chamado “embolamento voluntário”, no qual pontos de tráfico menores se alinham a agrupamentos mais expressivos, ou quando facções passam a apoiar grupos menores a partir do fornecimento de armamento para a defesa da área (CIPRIANI, 2016: 128); e a do “embolamento forçado”, no qual o agrupamento entre um grupo mais expressivo e grupos menores se dá menos pela integração pacífica e mais a partir de relações hierárquicas constituídas com o uso da violência (CIPRIANI, 2017: 19). que visa o rechaço do “embolamento forçado” dos “Bala na Cara” (CIPRIANI, 2016CIPRIANI, Marcelli. Da “Falange Gaúcha” aos “Bala nos Bala”: a emergência das “facções criminais” em Porto Alegre/RS e sua manifestação atual. Direito e Democracia, v. 17, n.1, 2016: 105-130.: 127). Nesse contexto, não é surpreendente que os adolescentes afirmem que na balança entre os prós e os contras do tráfico é sempre “mais ruim do que bom”:

P: Teria como por alguma razão, ter só a parte boa do dinheiro..

C: No crime?

P: É?

C:É muito difícil hoje uma boca ai que não tem guerra, muito difícil, muito difícil. Acho que lugar nenhum de Porto Alegre, todas as boca ta em guerra.

C: Porque no começo sempre é bom, no início sempre é bom.

I: No final…

C: No final é peixe… No crime é difícil ter um final feliz.

Por fim, importa ressaltar que os resultados ora apresentados são apenas indicativos e mereceriam ser confrontados com outras pesquisas sobre a mesma temática. Entende-se, portanto, ser necessário o esforço das ciências sociais e sociais aplicadas em adentrar em questões bastantes sensíveis como o atual contexto de guerra entre grupos do tráfico de drogas em Porto Alegre. Só dessa forma parece ser possível a produção de um debate mais qualificado sobre o tema dos adolescentes envolvidos no tráfico, seja de forma a pensar ferramentas de modificação temporária dessa realidade, seja no sentido de apostar em mudanças mais estruturais que enfrentem o que, embora ilícito, na perspectiva dos agentes dessa realidade se manifesta como um trabalho.

Considerações finais

Os resultados obtidos a partir da análise da transcrição dos grupos focais realizados indicaram que, em relação aos significados do trabalho e do tráfico, ambos se mantiveram vinculados à ideia de atividades produtoras de bens de uso, e nesse sentido, em um primeiro momento, corresponderam à categoria trabalho de Lukács (2013LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.: 44). Essa conclusão reforçou-se, na medida em que, para os adolescentes, o traficante distancia-se moralmente do “vagabundo”, sujeito que não realiza qualquer atividade produtora de bens. Assim, se a imagem representativa do trabalho necessariamente envolve gasto de energia física, o sujeito que “não faz nada” seria o oposto do trabalhador, enquanto o traficante se localizaria em um nível mais próximo desse do que daquele.

Ademais, a oposição operada entre o vagabundo e o traficante também possibilitou concluir que a “ideologia do desempenho” (SOUZA, 2003SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.: 65) é incorporada pelos adolescentes, os quais entendem o trabalho como uma categoria de distinção social dos indivíduos. Entretanto, a ambiguidade central do sentido conferido ao tráfico de drogas - e o que impossibilita a afirmação do tráfico como um sinônimo de trabalho - se estabelece pelo elo inafastável entre a atividade e a violência. Na fala dos adolescentes, a violência é elemento constitutivo do tráfico e se representa principalmente pelos conflitos oriundos da disputa entre grupos rivais. Participar da atividade, portanto, pressupõe necessariamente ganhar dinheiro e aderir à “guerra” quando ela estourar, momento em que o sujeito deve mostrar ser capaz de “honrar a vila”. Nesse sentido, qualquer explicação para a adesão dos jovens ao contexto do tráfico de drogas que afaste uma ou outra característica não parece estar respaldada pela percepção dos próprios sujeitos agentes dessa realidade.

Na caracterização positiva das atividades, o trabalho foi compreendido mais como um instrumento de negação do crime e de afastamento da possibilidade de ser preso, do que propriamente como uma atividade com valor em si. Em alguma medida, os pontos positivos do tráfico também foram indicados apenas a partir da compreensão da atividade como instrumento para o alcance de um bem maior, representado sobretudo pela possibilidade de auxílio à comunidade em que se vive. Já em relação aos pontos negativos, a semelhança entre as atividades foi bem mais evidente, pois em ambos os casos há uma vinculação com o poder que o “patrão” opera sob os subalternos, sejam traficantes ou empregados. Em última instância, é o seu humor e a sua cooperação que farão a maior diferença em relação ao bem-estar do adolescente.

No caso do tráfico, contudo, no processo de descrição das atividades, o elemento da violência novamente apareceu como sendo o grande diferenciador, sendo essa uma das conclusões mais contundentes da pesquisa. Assim, foi possível constatar que o tráfico se afilia à noção de trabalho proposta por essa pesquisa por mais de uma razão: seja por ser uma atividade produtora de bens, seja por permitir a distinção do sujeito na hierarquia social própria da sua realidade. Porém, em ambos os casos, a violência - principalmente aquela que ocorre entre os pares - opera como elemento que afasta o tráfico do significado de trabalho. A centralidade e a relevância que a “guerra” tomou nas discussões realizadas levam a pensar que qualquer tentativa de oportunizar a esses jovens outras vivências deve pressupor sujeitos para quem a ameaça do “contra” constitui o primeiro e o mais iminente desafio na luta pela sobrevivência.

  • 1
    Dentre a ampla gama de autores que abordam a temática do tráfico de drogas, algumas linhas de análise acabam indiretamente tratando a participação no comércio de drogas ilícitas como um trabalho. Destacam-se os autores que entendem o tráfico de drogas sob a lógica das organizações criminais (OLIVEIRA, 2006OLIVEIRA, Adriano. As peças e os mecanismos do fenômeno tráfico de drogas e do crime organizado. 2006. Tese de Doutorado em Ciência Política - UFPE, Recife, 2006.; LESSING, 2008LESSING, Benjamin. As facções cariocas em perspectiva comparativa. Novos Estudos, v. 80, 2008: 43-62.), na intersecção com a constituição de facções (MISSE, 1999MISSE, Michel. Malandros, marginais e vagabundos & a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. 1999. p. 413. Tese de Doutorado em Sociologia - IUPERJ, Rio de Janeiro, 1999.; DIAS, 2011DIAS, Camila Nunes. Da pulverização ao monopólio da violência: expansão e consolidação do Primeiro Comando da Capital (PCC) no sistema carcerário paulista. 2011. Tese de Doutorado em Sociologia - USP, São Paulo, 2011.), e na formação da juventude masculina das periferias das grandes cidades (FELTRAN, 2008FELTRAN, Gabriel. Fronteiras de tensão: um estudo sobre política e violência nas periferias de São Paulo. Tese de Doutorado em Sociologia. Campinas: UNICAMP, 2008.; ZALUAR, 2012ZALUAR, Alba. Juventude Violenta: Processos, Retrocessos e Novos Percursos. Dados, v. 55, n. 2, 2012: 327-365.; LYRA, 2013LYRA, Diogo. A República dos Meninos: juventude, tráfico e virtude. Rio de Janeiro: Mauad X: FAPERJ, 2013.).
  • 2
    Entende-se que o período compreendido entre o final da década de oitenta e o início da década de noventa marca uma importante virada no comércio de drogas no Brasil, em que a cocaína transformou a lógica percebida até então. Segundo DowdneyDOWDNEY, Luke. Crianças no tráfico: um estudo de caso de crianças em violência armada organizada no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Sete letras, 2003., foram cinco as principais causas dessa virada: a) o crescimento da demanda por drogas ilegais; b) a chegada da cocaína colombiana a baixo preço e sua alta rentabilidade em relação à maconha; c) o aumento do policiamento violento e repressivo durante a ditadura; d) a chegada de armas leves de uso militar; e) o estabelecimento e a organização de facções da droga (2003: 28).
  • 3
    Número de aprovação: 69918917.1.0000.5347
  • 4
    LUNT, P; LIVINGSTONE, S. Rethinking the Focus Group in Media and Communications Research. Journal of Communication, v. 46, pp. 79-98, 1996.
  • 5
    A mediação dos grupos foi realizada por uma das pesquisadoras que assina o presente artigo.
  • 6
    Os adolescentes eram todos jovens entre 16 e 18 anos que se encontravam em cumprimento de medida de internação pelo cometimento de ato infracional. Optou-se por não realizar questionários mais objetivos a respeito das características socioeconômicas desses jovens, mas é possível supor que, em sua grande maioria, são adolescentes com famílias que habitam bairros considerados ‘periféricos’ da cidade de Porto Alegre, em contextos econômicos difíceis. Notou-se, contudo, distintos níveis de precarização entre os jovens – seja em relação ao contexto socioeconômico, seja em relação às relações familiares. Embora não se tenha a informação da cor autodeclarada, é possível afirmar que, dentre os 10 adolescentes, havia uma distribuição quase equiparada de jovens negros/pardos e brancos.
  • 7
    As imagens consistiam em trabalhadores exercendo as seguintes atividades laborais: professora; músico; pintor; trabalhadores da construção civil; agricultores; trabalhadores industriais; artesãos; pessoas de terno e gravata (podendo representar empresários, advogados, etc); e vendedores de loja de calçados.
  • 8
    Aqui cabe referir que os adolescentes foram selecionados para participar do Projeto Pescar pela própria Unidade Socioeducativa, de modo que as pesquisadoras não foram informadas sobre os atos infracionais cometidos por eles. Entretanto, no decorrer dos debates realizados em grupo, foi possível identificar maiores ou menores níveis de vinculação dos jovens com as atividades do tráfico. Alguns inclusive se identificaram como sendo “do roubo”, o que não os impediu de tecer suas considerações a respeito da temática do mercado ilícito de drogas, na medida em que se trata de uma realidade muito próxima de todos eles.
  • 9
    Imagens representando diferentes processos do ciclo do tráfico de drogas, consistindo em fotos contendo as seguintes imagens: plantação de cannabis sativa; porto com contaîners; pessoas de terno e gravata ao telefone; indivíduos com o rosto tampado por camisetas amarradas, portando armas no alto de uma edificação característica de uma favela; e uma mão com drogas embaladas entregando a outra mão com valores em espécie.
  • 10
    Foram apresentadas dois extratos de papel contendo as seguintes manchetes: “Jovens que trabalham para o tráfico estão há dois meses sem receber em morro do Rio” e “Polícia descobre tabela de cargos e salários do tráfico em favela de Magé-RJ”.
  • 11
    Os adolescentes explicaram que alguns deles se voluntariam para realizar o corte da barba e do cabelo dos demais. Em um dos grupos focais realizados, havia um adolescente indicado como sendo responsável por tal atividade no interior dos “bretes” (dormitório no interior da Unidade de Atendimento Socioeducativo).
  • 12
    O termo é trazido pelos adolescentes de forma muito natural, e parece se adequar ao sentido já conferido por Cipriani, de união de grupos criminosos mais expressivos com grupos menores, formando aquilo que em outras regiões do país é chamado de “comando” (2017: 18).
  • 13
    Fazendo referência ao chefe do tráfico de drogas no local.
  • 14
    Segundo Cipriani, na constituição mais recente dos grupos que se articulam no interior do Presídio Central de Porto Alegre há uma forte vinculação com a divisão do espaço urbano pelo domínio do mercado ilícito de drogas (2016: 128). Essa vinculação se dá sobretudo a partir de estratégias de “embolamento”, como ao chamado “embolamento voluntário”, no qual pontos de tráfico menores se alinham a agrupamentos mais expressivos, ou quando facções passam a apoiar grupos menores a partir do fornecimento de armamento para a defesa da área (CIPRIANI, 2016CIPRIANI, Marcelli. Da “Falange Gaúcha” aos “Bala nos Bala”: a emergência das “facções criminais” em Porto Alegre/RS e sua manifestação atual. Direito e Democracia, v. 17, n.1, 2016: 105-130.: 128); e a do “embolamento forçado”, no qual o agrupamento entre um grupo mais expressivo e grupos menores se dá menos pela integração pacífica e mais a partir de relações hierárquicas constituídas com o uso da violência (CIPRIANI, 2017____________. Segregação sócio-espacial e territorialidades do tráfico de drogas: as “facções criminais” diante do espaço urbano. Revista Conversas e Controvérsias, vol.3, n.2, 2017: 5-28.: 19).

Referências bibliográficas

  • ANTUNES, Ricardo L. O caracol e sua concha: ensaios sobre a nova morfologia do trabalho, São Paulo: Boitempo, 2005.
  • CIPRIANI, Marcelli. Da “Falange Gaúcha” aos “Bala nos Bala”: a emergência das “facções criminais” em Porto Alegre/RS e sua manifestação atual. Direito e Democracia, v. 17, n.1, 2016: 105-130.
  • ____________. Segregação sócio-espacial e territorialidades do tráfico de drogas: as “facções criminais” diante do espaço urbano. Revista Conversas e Controvérsias, vol.3, n.2, 2017: 5-28.
  • COSTA, Ana Paula Motta. Os Adolescentes e seus Direitos Fundamentais: da invisibilidade à indiferença. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
  • COSTA, Liana Fortunato; JACOBINA, Olga Maria. “Para não ser bandido”: trabalho e adolescentes em conflito com a lei. Cadernos da Psicologia do Trabalho, vol. 10, n. 2, 2007: 95-110.
  • DIAS, Camila Nunes. Da pulverização ao monopólio da violência: expansão e consolidação do Primeiro Comando da Capital (PCC) no sistema carcerário paulista. 2011. Tese de Doutorado em Sociologia - USP, São Paulo, 2011.
  • DOWDNEY, Luke. Crianças no tráfico: um estudo de caso de crianças em violência armada organizada no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Sete letras, 2003.
  • FELTRAN, Gabriel. Fronteiras de tensão: um estudo sobre política e violência nas periferias de São Paulo. Tese de Doutorado em Sociologia. Campinas: UNICAMP, 2008.
  • FLICK, Uwe. Introdução à Pesquisa Qualitativa 3ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.
  • FRANÇA JR., Reginaldo Pereira; LARA, Ricardo. Trabalho e Ser Social: reflexões sobre a ontologia LUKÁCSiana e sua incidência no Projeto Ético-Político Profissional. Textos e Contextos, v. 14, n. 1, 2015: 20-31.
  • GLENNY, Misha. O dono do morro: homem e a batalha pelo Rio. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
  • GOIS, Ancelmo. Jovens que trabalham para o tráfico estão há dois meses sem receber em morro do Rio. O Globo, Rio de Janeiro, 6 de ago. 2017. Disponível em: <http://blogs.oglobo.globo.com/ancelmo/post/jovens-que-trabalham-para-o-trafico-estao-ha-dois-meses-sem-receber-em-morro-do-rio.html> Acesso em: 08 de setembro de 2017.
    » http://blogs.oglobo.globo.com/ancelmo/post/jovens-que-trabalham-para-o-trafico-estao-ha-dois-meses-sem-receber-em-morro-do-rio.html
  • GONDIM, Sônia Maria Guedes. Grupos Focais como técnica de investigação qualitativa: desafios metodológicos. Paidéia, v.12, n. 24, 2003: 149-161.
  • HAGUETTE, Teresa Maria Frota. Metodologias Qualitativas na Sociologia. Petrópolis: Vozes, 1999.
  • HARVEY, David. Para entender O Capital - livro I. São Paulo: Boitempo, 2013: 45-46
  • KRECKEL, Reinhardt. Politische Soziologie der sozialen Ungleichheit, Frankfurt, Campus, 1992, pp. 67-106.
  • LEITE, Márcia Pereira; SILVA, Luiz Antonio Machado da. Violência, crime e polícia: o que os favelados dizem quando falam desses temas? In: SILVA, Luiz Antonio Machado da. Vida sob cerco: violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008: 47-76.
  • LESSING, Benjamin. As facções cariocas em perspectiva comparativa. Novos Estudos, v. 80, 2008: 43-62.
  • LYRA, Diogo. A República dos Meninos: juventude, tráfico e virtude. Rio de Janeiro: Mauad X: FAPERJ, 2013.
  • LUKÁCS, Gyorg. Para uma ontologia do ser social 2. São Paulo: Boitempo, 2013.
  • MACIEL, Fabrício; GRILLO, André. O trabalho que (in)dignifica o homem. In: SOUZA, Jessé de. A ralé brasileira: quem é e como vive. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. p. 241-277.
  • MARX, Karls. Processo de trabalho e processo de valorização. In: ANTUNES, Ricardo (org). A dialética do trabalho: escritos de Marx e Engels - vol.I. 2ed. São Paulo: Expressão Popular, 2013: 31-58.
  • MARX, Karls; ENGELS, Frederich. A ideologia alemã Tradução: Luis Claudio de Castro e Costa. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
  • MAY, Tim. Pesquisa social: questões, métodos e processos. 3a ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.
  • MÉSZÁROS, István. A teoria da alienação em Marx Tradução: Isa Tavares. São Paulo: Boitempo, 2006.
  • MISSE, Michel. Malandros, marginais e vagabundos & a acumulação social da violência no Rio de Janeiro 1999. p. 413. Tese de Doutorado em Sociologia - IUPERJ, Rio de Janeiro, 1999.
  • OLIVEIRA, Adriano. As peças e os mecanismos do fenômeno tráfico de drogas e do crime organizado 2006. Tese de Doutorado em Ciência Política - UFPE, Recife, 2006.
  • OLMO, Rosa del. A face oculta da droga Rio de Janeiro: REVAN, 1990.
  • PIMENTA, Melissa de Mattos. Masculinidades e sociabilidades: compreendendo o envolvimento de jovens com violência e criminalidade. Dilemas v.7. n.3, 2014: 701-730.
  • SILVA, Jean Sales da; TIETBOEHL, Lúcia Karam. Brete. In: LAZAROTTO, Gislei Domingas et al Medida Socioeducativa: entre A&Z. Porto Alegre: UFRGS; Evangraf, 2014.
  • SOUZA, Jésse de. (Não) Reconhecimento e Subcidadania, ou o que é ser gente? Lua Nova, n. 59, 2003: 51-73.
  • __________. A elite do atraso: da escravidão à lava-jato. Rio de Janeiro: Leya, 2017.
  • ZALUAR, Alba. Juventude Violenta: Processos, Retrocessos e Novos Percursos. Dados, v. 55, n. 2, 2012: 327-365.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    16 Ago 2018
  • Aceito
    29 Mar 2019
Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rua São Francisco Xavier, 524 - 7º Andar, CEP: 20.550-013, (21) 2334-0507 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: direitoepraxis@gmail.com