Open-access A IDENTIDADE DE RAYMOND WILLIAMS1

THE IDENTITY OF RAYMOND WILLIAMS

Resumo

Segundo Paul Gilroy, Henry Louis Gates Jr., entre outros, Raymond Williams teria abraçado noções de autenticidade cultural e continuidade étnica comparáveis aos racismos da direita. Essa crítica influente se baseia em uma má interpretação da posição de Williams. O presente texto explora noções de identidade na crítica e nos romances de Williams para oferecer uma leitura alternativa. Embora frequentemente dispensado como um crítico inglês, branco, homem e membro do setor dominante da Grã-Bretanha, Williams era de fato galês e meditou ao longo de sua vida a respeito do significado dessa identidade. Jamais apoiou formas de superioridade ou excepcionalismo britânico, já que pontuou explicitamente em Politics and Letters (1979) que nunca se considerou britânico. Ademais, Williams rejeitou consistentemente formas de identidade racial e sanguíneas e enfatizou como sua formação marginal na fronteira País de Gales-Inglaterra o levou a uma conscientização do carácter sempre em evolução e historicamente contingente da identificação comunitária.

Palavras-chave: País de Gales; Grã-Bretanha; Raça; Nacionalismo; Raymond Williams; New Left

Abstract

For Paul Gilroy, Henry Louis Gates Jr. and others, Raymond Williams embraced notions of cultural authenticity and ethnic continuity compatible with the racisms of the Right. This influential critique is based on a fundamental misreading of Williams’ position. This text explores notions of identity in Williams’ criticism and novels to offer an alternative reading. Although often dismissed as a white, male, English critic, and a member of the dominant sector within British society, Williams was in fact Welsh and meditated throughout his life on the meaning of that identity. He never endorsed forms of British superiority and exceptionalism, since he noted explicitly in Politics and Letters (1979) that he never considered himself to be British. Furthermore, Williams consistently rejected racial and blood-based forms of identity and emphasized how his marginal formation on the Wales-England border led to an awareness of the always evolving and historically contingent nature of communal identification.

Keywords: Wales; Great Britain; Race; Nationalism; Raymond Williams; New Left

[Raymond] Wiliams sentia… desconforto com as políticas de identidade, as quais ele associava com - e essas são suas palavras - “muitos liberais e socialistas minoritários, e especialmente aqueles que pela natureza de seu trabalho e formação são eles mesmos nacional e internacionalmente móveis”. Em outras palavras: não estabelecidos, não eram verdadeiramente ingleses e nem parte da nação. Ele se sentia desconfortável com as políticas de identidade (Gates Jr., 2010: 42, tradução nossa)2.

Nessa passagem de Tradition and the Black Atlantic, Henry Louis Gates Jr. reforça uma visão estabelecida acerca de Raymond Williams. Desde sua morte prematura em janeiro de 1988, emergiu um amplo consenso crítico de que Williams defendia uma visão essencialista da cultura, sendo seus escritos severamente limitados pela sua negligência das temáticas de identidade, raça e império. John Higgins (1999: 170) argumenta que Williams era “constitutivamente cego às políticas de raça e gênero e às dinâmicas do imperialismo”. Rajagopalan Radhakrishnan (1993: 291) descreve Williams como “incapaz de lidar com as nuances sutis das políticas de localidade”. Benita Parry (1993: 123) se diz confusa com a admiração que Aijaz Ahmad expressa por Williams, tendo em vista o “provincianismo inglês” do falecido, bem como com o que Edward Said descreveu como seu “Anglocentrismo teimoso”. Laura Chrisman (1998: 53) tipifica os muitos que lamentam o foco “insularmente inglês” do trabalho de Williams e, de maneira ainda mais condenatória, os editores de uma coletânea americana sobre estudos culturais afro-britânicos descrevem Williams como tendo partilhado uma “postura ideológica” com “o racismo e o nacionalismo conservador inglês pós-industrial” (Baker Jr.; Diawara & Lindeborg, 1996: 4-5).

Henry Louis Gates Jr., ao oferecer uma versão particularmente vigorosa da história dos estudos culturais, adicionou sua voz influente a esse consenso. Gates Jr. nota que, “escrevendo em 1983”, Williams desenvolveu uma:

Concepção aparentemente organicista da cultura baseada em uma continuidade étnico-territorial: “A verdadeira história dos povos dessas ilhas […] remonta […] às sociedades notáveis dos pastores e fazendeiros do neolítico, e antes deles para os povos caçadores que não desapareceram simplesmente, mas que também estão entre nossos antepassados”. No entanto, se esta é a “história real”, decorre que alguns de nós - aqueles não incluídos na coletividade no possessivo “nossos antepassados” - não devemos ser o “povo real” da Grã-Bretanha. Essa passagem repete os mitos de linhagem anglo-saxões que servem para sustentar uma ideologia excludente e imperialista da “Inglesidade”3. (Lembremos que esse é um país no qual, nos anos 1950, Winston Churchill podia sugerir a Harold Macmillan que se o Partido Conservador quisesse ganhar as eleições, deveria adotar o slogan “Mantenha a Inglaterra Branca”) (Gates Jr., 2010: 39-40, tradução nossa).

Em suas palavras, e com base em citações seletivas, essa análise parece persuasiva o bastante. No entanto, as frases de Williams podem ser lidas de forma ligeiramente diferente quando colocadas em seu contexto original:

O que há de mais intolerável e irreal das projeções existentes de “Inglaterra” ou “Grã-Bretanha” é sua ignorância histórica e cultural. O “Yookay”4, claro, não é nem histórico e nem cultural; é um jargão do planejamento comercial e militar. Eu me lembro de um líder do Partido Trabalhista, opositor da entrada britânica na comunidade europeia, afirmando que aquilo seria o fim de “mil anos de história”. Eu me perguntei o porquê de mil. A única data significativa seguindo esse cálculo serial algo em torno de 1066, quando a monarquia franco-normanda tomou o lugar da Nórdico-saxã. O que dizer então dos ingleses? Isso levaria mais alguns quinhentos anos. Os britânicos? Uns dois mil e quinhentos. Contudo, a verdadeira história dos povos destas ilhas remonta a muito mais do que isso: pelo menos seis mil anos até as sociedades notáveis dos pastores e fazendeiros do neolítico, e antes deles para os povos caçadores que não simplesmente desapareceram, mas que também estão entre nossos antepassados. Portanto, o líder de um partido nomeadamente popular não pode, na prática, refletir sobre as realidades de seu próprio povo. Esse líder não pode conjeturar sobre a história deles, exceto em suas formas alienantes de estado-nação centralizado. E se esse líder empregasse projeções mesquinhas como argumento evidente contra as tentativas de uma identidade mais europeia, seria incompreensível - em todas as suas reorganizações atuais e aprovadas na Europa - se as realidades culturais e históricas não tivessem sido tão sistematicamente reprimidas por um “patriotismo” seletivo, funcional e dominador. Todos os povos mais variados que já moraram nessa ilha ainda estão aqui, em um sentido físico considerável. O que é projetado, de tempos em tempos, como uma “raça da ilha”, é na verdade um longo processo de conquistas e repressões sucessivas, e também sucessivas substituições e integrações relativas (Williams, R., 1983: 193, tradução nossa).

Mesmo se quiséssemos discordar do uso que Williams faz da coletividade no possessivo “nossos antepassados”, é totalmente enganoso ver esta passagem como uma repetição dos “mitos de linhagem anglo-saxões”. Williams não poderia ser mais explícito em seu desejo de rejeitar as “projeções existentes” da “inglesidade”. Ele defende o contrário: o centro do seu argumento acerca da história “real” das ilhas britânicas - a sequência sem fim de conquistas, repressões e integrações relativas - consiste em minar, desconstruir e rejeitar os mitos em que se baseiam as evocações contemporâneas de inglesidade e britanicidade. Williams nos alerta acerca dos modos pelos quais um presente e passado fundamentalmente plural têm sido substituídos por um “patriotismo dominador e seletivo”. Ele não está reforçando definições dominantes e excludentes da inglesidade, mas atacando-as. É surpreendente que um leitor atento e sensível como Gates Jr. possa oferecer essa reconstrução enganosa da análise de Williams. O que explica sua má-interpretação? O que está em jogo nessa deturpação de Wiliams e seu trabalho?

II

Uma resposta parcial a essas questões reside no fato de que todos os críticos acima mencionados, sem exceção, citam explicitamente ou em rodapé a crítica de Paul Gilroy ao livro Towards 2000, de Williams (1983). Gates Jr. oferece uma reconstrução espirituosa da crítica de Gilroy e argumenta que ela “merece ser citada extensivamente, pois como uma crítica advinda de uma minoria acerca do provincianismo da esquerda inglesa, tornou-se um ponto de referência nos debates subsequentes” (Gates Jr., 2010: 40). Em seu relato seminal sobre a “política cultural de raça e nação” na Grã-Bretanha, “There ain’t no black in the Union Jack”, Gilroy (1987: 49) argumenta que Williams traça “precisamente a mesma visão do relacionamento entre ‘raça’, identidade nacional e cidadania que [Enoch] Powell”. O infame discurso de Powell “Rios de Sangue” de 1968 foi - citando The Times - “a primeira vez que um político britânico sério apelou ao ódio racial de maneira direta na nossa história pós-guerra” (Shepherd, 1996: 352). Gilroy acredita que a compreensão de “raça” e “nação” de Williams é “reminiscente de outros aspectos do racismo e nacionalismo conservador moderno”, e encontra evidências para sua crítica severa e influente na seguinte passagem de um capítulo de Towards 2000, de título “A cultura das nações”:

[é] um sério mal-entendido […] supor que os problemas de identidade social são resolvidos por definições formais (meramente legais). Embora de forma desigual e às vezes precária, contudo, sempre por meio de uma longa experiência substancial, uma consciência efetiva da identidade social depende de relações sociais reais e constantes. Reduzir a identidade social a definições formais legais, a nível de Estado, é coadunar com as superficialidades alineadas de “nação” que são os termos funcionais limitados da classe dominante moderna (Williams, R., 1983: 195, tradução nossa).

Devido à seriedade e gravidade da crítica, vale citar a discussão de Gilroy sobre essa passagem detalhadamente. Gilroy faz referência a um trecho anterior em Towards 2000 para constatar que Williams apresenta seu argumento como uma resposta

aos antirracistas que responderiam à negação de que os negros podem ser britânicos, dizendo: “Eles são tão britânicos quanto você”. [Williams] dispensa essa resposta como uma variante “liberal padrão”. Sua concepção alternativa enfatiza que a identidade social é um produto da “longa experiência”. Mas isso incita a questão - Quanto tempo é suficiente para se tornar um britânico genuíno? Sua insistência de que as origens do conflito racial se encontram na hostilidade entre estranhos na cidade não faz muito sentido, dados os efeitos do Ato de Imigração de 1971 para impedir o primeiro assentamento negro. De modo mais perturbador, esses argumentos negam efetivamente que os negros possam compartilhar uma “identidade social” significativa com seus vizinhos brancos, os quais, ao contrário dos recém-chegados, habitam o que Williams chama de “assentamentos enraizados” articulados por “identidades vividas e formadas”. […] Seu uso do termo “identidade social” é tanto significativo quanto enganoso. Ele minimiza as especificidades do nacionalismo e das ideologias da identidade nacional e desvia a atenção da análise dos processos políticos, alinhados às identidades nacionais e sociais. […] Como essas identidades sociais se relacionam com as diferenças linguísticas e culturais evidentes não fica claro, exceto quando Williams salienta que as formas de identidade fomentadas pela “ordem artificial” do Estado-nação são incompletas e vazias quando comparadas com “identidades sociais plenas em sua diversidade real”. Isto, é claro, não as torna menos perversas. Onde o racismo exige repatriação e promove a exclusão de certos grupos da comunidade imaginada da nação, as contradições em torno da cidadania que Williams descarta como “superficialidades alienadas” continuam sendo componentes importantes do campo político. Elas fornecem um importante ponto de entrada para o senso de si mesma da nação […]. Para além do aparente apoio de Williams aos pressupostos do novo racismo, os silêncios estratégicos em seu trabalho contribuem diretamente para sua força e resiliência (Gilroy, 1987: 49-50, tradução nossa).

A crítica de Gilroy a respeito do contraste simplista entre as “superficialidades alienadas” das ordens políticas e as “identidades sociais plenas” das comunidades culturais de Williams é tanto incisiva quanto perspicaz; não há dúvida de que Williams tendia a subestimar o impacto do racismo na formação das identidades sociais. No entanto, é totalmente enganoso afirmar que Williams nega a indispensabilidade dos direitos de cidadania para os imigrantes, uma acusação que também foi reiterada por Stuart Hall (1992: 7). Aliás, Williams indica explicitamente no capítulo que “uma mera definição legal do que é ser ‘britânico’… é necessária e importante, assegurando devidamente a necessidade de igualdade e proteção dentro das leis” (Williams, R., 1983: 195). Williams aponta que esses apelos aos direitos legais, bem como às ideias superficiais e condescendentes de “assimilação” da parte de políticas da direita e da esquerda, são desiguais em relação às tensões sociais das mudanças na composição étnica da Grã-Bretanha no presente e revelam desconhecimento sobre a diversidade étnica britânica no passado. “Reduzir a identidade social a meras definições formais, a nível do estado”, aponta Williams, “é pactuar com as superficialidades alienadas de ‘nação’ que são termos funcionais limitados da classe dominante moderna” (Williams, R., 1983: 195). Esse argumento, na verdade, vai ao encontro da própria análise de Gilroy - algumas páginas à frente - a respeito de um pôster eleitoral do Partido Conservador de 1983 que mostra a imagem de um homem negro acima da legenda “O Partido trabalhista diz que ele é negro. Os Conservadores dizem que ele é britânico”. Gilroy argumenta que o termo “Grã-Bretanha” está sendo usado nessa situação para sugerir que “a categoria de cidadão e o pertencimento formal que ele outorga em seus portadores negros são essencialmente ‘sem cor’, ou ao menos daltônicos… Os negros estão sendo convidados a abandonar tudo o que os marca culturalmente diante da ‘inglesidade’ verdadeira que pode ser assegurada” (Gilroy, 1987: 59). Esse argumento é similar, tanto em conteúdo quanto em estrutura, à crítica de Williams acerca dos modos pelos quais a identidade nacional dominante pode ser usada para obscurecer disparidades econômicas e diferenças culturais e históricas legítimas. Nesse caso, talvez de maneira surpreendente, a ênfase cultural materialista de Williams sobre o significado da experiência humana e os efeitos constitutivos das “relações sociais reais e duradouras” demonstra que compartilha uma série de características com as análises de Paul Gilroy sobre a história negra e a consciência cultural. Certamente, um dos argumentos fundamentais de The Black Atlantic de Gilroy é que a experiência e o legado da escravidão determinam a forma e o conteúdo da expressão artística negra no século XX (Gilroy, 1993). Henry Louis Gates Jr. (2010) assinala a continuidade entre o pensamento de Williams e Gilroy e afirma que o último adota a noção de continuidade cultural, especialmente quando argumenta que, em relação à cultura, os imigrantes e “seus filhos nascidos britânicos preservaram ligações orgânicas com ela, em suas cozinhas e seus templos - em suas comunidades”. Estaria essa, pergunta-se Gates Jr., “retórica de Williams acerca da linhagem, organicidade e comunidade presente na prática do blackface?”. Talvez, continua Gates Jr., “mas nem toda blackface é igual” (Gates Jr., 2010: 45).

Se entendermos a evocação problemática de tradições trovadorescas feita por Gates Jr. enquanto uma metáfora para a adoção de identidade como um lugar a partir do qual se é possível falar dentro do “mundo da teoria”, então o exemplo de Raymond Williams sugere que pouco capital cultural se acumula pelo fato de ser galês. Ao discutir a crítica dura de Williams feita por Gilroy, Neil Lazarus (1999: 65) se pergunta: “como Gilroy pode insistir que a experiência histórica da escravidão permanece materialmente constitutiva da socialidade do atlântico negro, ao passo que nega a Williams o direito de fazer uma alegação similar sobre a determinação da socialidade galesa contemporânea”. De fato, Gilroy não nega as continuidades da socialidade galesa, pois ele nunca menciona o fato de que Williams era galês; Williams é forçado a utilizar uma máscara inglesa em todas as críticas listadas acima. Ele é um inglês que, além de tudo, não se dá conta de sua insularidade e provincianismo, que repete mitos da linhagem anglo-saxã. Williams estava ciente desses mitos, claramente, mas era mais uma vítima de seus efeitos do que um apoiador cego de seu uso contínuo. Ele se lembrava frequentemente de um colega da época de sua graduação em Cambridge; este, ao tentar colocar Williams, o garoto da classe trabalhadora galesa, em seu lugar, dizia-lhe “minha família imigrou com os normandos”, ao que Williams respondeu: “E vocês estão gostando daqui?” (Williams, R., 1979: 36). A piada se apoia em um senso de continuidade organicista da conexão entre os Bretões antigos e os galeses contemporâneos, e o próprio Williams admite que ele estava “jogando o jogo” do privilégio ancestral em sua resposta. O senso de identidade contingente de Williams, baseado em sua formação no lado galês da fronteira do País de Gales com a Inglaterra, é expresso diversas vezes em seus escritos. Um exemplo deve bastar:

Uma das vantagens principais de nascer e crescer entre presumidos galeses é a profusão de identidades oficiais. País de Gales e Monmouthshire, como assim o eram para mim nos tempos da escola, com ênfase especial pois morávamos no apêndice. Inglaterra-e-País de Gales: aquele território administrativo, legal e até mesmo meteorológico. País de Gales quando se tratava de Rugby, mas Inglaterra no cricket. País de Gales galês e Inglaterra galesa. País de Gales e Cymru. Para alguém buscando um status oficial era um pesadelo. Para qualquer um tentando refletir sobre comunidades e sociedades, uma benção: um presente nativo (Williams, D., 2003: 67, tradução nossa).

Passagens como essa são atualmente ignoradas, pois ao descrever Williams como um inglês “insular” e “provinciano” seus críticos reforçam uma narrativa já estabelecida, na qual os primeiros nomes da New Left britânica (especialmente Williams, mas E. P. Thompson também é criticado nesses termos) ignoravam questões sobre império, imperialismo e identidade. De acordo com essa vertente, foi somente nos anos 1980 que o império “respondeu” e uma nova geração surgiu, dando a essas questões um papel central. Gates Jr. enxerga a crítica que Gilroy fez a Williams, especialmente a comparação com Enoch Powell, como um ato de “torcer” a faca, que inaugurou uma cerimônia de “troca de guardas” (Gates Jr., 2010: 41). Os resultados desse golpe aparentemente violento foram modestos, e a partir dele, “a valorização da comunidade de Williams e os laços geracionais nunca foram abandonados, mas sim meramente pluralizados” (Gates Jr., 2010: 41).

III

Certamente há algo de verdadeiro nessa história dos estudos culturais britânicos. Nos seus escritos de início de carreira, Cultura e sociedade (Williams, R., 1958) e The Long Revolution (Williams, R., 1961), a ênfase de Williams residia em um processo de experiência vivida, um processo de crescente democratização e participação cultural que era o “fazer-se” de uma “cultura comum” emergente. Essa noção de “cultura comum” incorpora um dos desejos mais profundos que constituíram o pensamento cultural de Williams nos anos 1950: o desejo de traçar conexões em nome de um “todo” cultural e do “interesse comum”. O capitalismo é um sistema a ser combatido pois gera divisões: de classes, de pessoas, de nações. Essa dimensão de seu pensamento está particularmente explícita no capítulo intitulado “The Growth of Standard English” em The Long Revolution, o qual termina com a seguinte observação: “sem dúvida, sempre existirão pessoas e grupos ansiosos para mostrar que não são como os outros, mas o processo profundo de crescimento da grande linguagem internacional não será muito afetado por eles, apesar de se misturarem por algum tempo” (Williams, R., 1961: 252). É essa ênfase na experiência humana comum que evidencia a notoriedade dada por Williams ao realismo em seus romances. Realismo, para Williams, é concebido como um processo, um propósito da escrita que clama por novas formas e abordagens, já que nosso mundo - e o entendimento dele - muda. Ao rejeitar aquelas vozes no final dos anos de 1950, que argumentavam que “o romance realista […] se foi junto com a carruagem”, Williams afirmava, de forma Brechtiana, que o realismo era uma “intenção” que não requeria qualquer aderência a uma forma já estabelecida (Williams, R., 1961: 303). Realismo não se refere a imitações de convenções do século XIX, pois Williams insistia que as novas realidades sociais iriam pedir por novos realismos. Sua conclusão era que “um novo realismo é necessário” para capturar a forma e contribuir com a emergência de uma cultura em comum.

Seu primeiro romance, Border Country (Williams, R., 1960) - escrito de maneira concomitante a Cultura e sociedade, The Long Revolution e parte de “um trabalho que eu me propus a fazer dez anos atrás” -, pode ser lido como uma materialização da teoria do realismo de Raymond Williams (1961: 15). No entanto, o romance é significativo pois também é nele que estão inscritos os problemas inerentes do conceito de uma cultura britânica comum; assim, o livro antecipa desenvolvimentos futuros no pensamento de Williams. Esse é precisamente o caso quando se trata da relação do enredo do livro com o dialeto e a diferença linguística. De fato, a questão do discurso, do processo pelo qual modos de ver são refletidos, incorporados e edificados em jeitos de falar, é um tema central - e reiterado - no romance: personagens são constantemente identificados por seus jeitos de falar. Harry, nascido “desse lado do rio”, tem “o rápido sotaque galês”, já sua esposa Ellen fala “com a língua vagarosa e rica de Herefordshire” (Williams, R., 1960: 35). A voz do Dr. Evans é uma “voz galesa”, mas “diferente daquela do sotaque de Glynmawr: mais suave com as vogais mais restritas e com a entonação dos vales de mineração” (Williams, R., 1960: 177). A linguagem também é significativa, já que pode ser uma barreira ao - bem como um modo de - entendimento. Jack Price, por exemplo, caçoa de seu neto com “palavras do dialeto que ele sabia quando era um garoto, mas que caíram em desuso”. Ainda, em outro exemplo mais sério, quando o policial informa a Ellen que seu marido faleceu, ela ouve a notícia “como se os homens estivessem falando uma língua que ela não entendia” (Williams, R., 1960: 240, 400).

Esta exploração da comunicação é mais bem desenvolvida em relação à presença submersa da língua galesa no texto. Para o “aniversário Batista” na capela, ensinam para Will (personagem central baseado no próprio Williams) “um pequeno poema galês de dois versos” escrito por seu pai Harry, e o garoto o recita “claramente” enquanto está “nervosamente sob o arco do púlpito” (Williams, R., 1960: 145). Will ganha um livro de título The Holy Child por causa de seus esforços, e ele o atira no rio, causando constrangimento em seus pais. Em outra passagem, Harry, quem raramente expressa suas emoções abertamente, parece não controlar a sua raiva quando ouve o “pequeno pastor” Joshua Watkins: “Ensaiando suas orações e seu sermão. Durou mais de uma hora, em galês, embora a eventual apresentação fosse em inglês. O ensaio, ao que parece, era para acertar o primeiro fluxo” (Williams, R., 1960: 219).

A raiva de Harry é, em primeiro lugar, uma resposta à relutância de Watkins em ajudar a espalhar as cinzas sob a via congelada, seguida da relutância do pastor ao pedir a Harry que esvaziasse o seu penico. Mas é certamente significativo que a questão da diferença de idioma apareça nos momentos de maior carga emocional no romance, em que as motivações das personagens se tornam difíceis de compreender e que a afirmação realista do narrador - que diz “conhecer” os pensamentos das personagens - desmorona. Nos termos da crítica pós-estruturalista influente elaborada por Colin MacCabe e outros, parece que a língua galesa representa um discurso em que a metalinguagem narrativa (ou a voz da terceira pessoa onisciente) “não pode se transformar em um objeto”, resultando na “perda de controle do romance” naqueles momentos em que Will e Harry perdem o controle de suas próprias emoções contidas (Barthes, 1975; Belsey, 1980; MacCabe, 1978)5.

O papel do idioma galês no romance alcança seu clímax na seção sobre o eisteddfod (um festival cultural tipicamente galês que faz parte da vida comunitária do país de fronteira, Border Country). Aqui, as demarcações entre idiomas, entre gerações, entre Will e a cultura que o cerca, dissolvem-se em performances de corais seguidas do canto comunal d

Era a vez dos corais e Will sabia, ao olhar para cima, que não adiantava nem tentar se separar […] no baixar das mãos erguidas, e em seguida não vem aquela explosão meio que esperada, mas um baixo e distante som, um som como o do mar, embora insistentemente humano; um sussurro longo, profundo e em forma de carícia, salientado de repente e abruptamente interrompido, então repetido em um outro nível, ao mesmo tempo duro e líquido; interrompido novamente, cuidadosamente; então irresistivelmente a entrada e a ascensão de um poder extraordinário, e se põem todos a cantar; os rostos empenhados e as vozes crescendo ao redor, travadas, em movimento, no silêncio abafado que detinha toda a potência desses sons, até que você ouvisse o canto e a fronteira tivesse sido cruzada. Quando todos os corais cantaram, todos se levantaram e cantaram o hino. Já não era mais só ouvir, e sim um efeito direto no corpo: na pele, no cabelo e nas mãos (Williams, R., 1960: 258-259, tradução nossa).

O desejo de Will em “se separar” é claro, mas quando os corais começam a cantar, aquela posição de distanciamento se torna insustentável. Nos é contado que “uma fronteira foi cruzada” quando o ouvinte se torna um cantor no ato de empatia que, mais uma vez, parece existir “fora do controle” da metalinguagem do narrador. De fato, o eisteddfod em Border Country representa metonimicamente a própria cultura galesa, um espaço transformativo em que “Eu, Morgan, o relojoeiro” se torna “Illtyd Morgan y Darren” e no qual a fronteira é cruzada pois o poder da arte produzida por uma comunidade tem um “efeito direto no corpo” (Williams, R., 1960: 250, tradução nossa).

Se o País de Gales, como Williams notaria anos depois, tende a ser visto como “geralmente singular” a partir de uma perspectiva inglesa, o autor reverte o olhar em Border Country, já que é no lado galês da fronteira que as identidades se tornam instáveis, que a variedade e franqueza tomam o lugar da salvaguarda e insularidade inglesas (Williams, D., 2003: 27). Nas primeiras páginas do romance, Matthew (conhecido como Will em sua infância na zona fronteiriça, mas oficialmente registrado como Matthew agora que era um historiador em Londres) percebe a “indiferença contida” da capital inglesa quando “você não fala com as pessoas” e passa a generalizar que “de fato, você não fala com pessoas em nenhum lugar na Inglaterra; haverá tempo o bastante para esse tipo de coisa nas ocasiões determinadas” (Williams, R., 1960: 3). A Inglaterra é vista posteriormente como “uma grande casa com cada quarto dividido por ripa e gesso… Se você sair de seu próprio armário para ver um homem em outro armário, ainda assim você deve esperar que a porta do armário seja aberta, com a devida cerimônia, e por um atendente apropriado” (Williams, R., 1960: 331-332). Já o País de Gales, por outro lado, é um lugar acessível. A “naturalidade” da fala “que foi quase perdida” e que Matthew encontra na “condutora da Índia Ocidental”, na cena de abertura do romance, é repetida em seu retorno a Glynmawr, quando o diálogo tenso e formal entre Matthew Price e o amigo de seu pai Morgan Rosser dá lugar aos ritmos nativos da fronteira, o que ocorre quando Price nota que “no final foi fácil e o suficiente foi reestabelecido” (Williams, R., 1960: 3, 12). Essa naturalidade na fala é refletida em uma transparência observada em diversos pontos no romance, como em Glynmawr, quando os homens: “Caminham devagar, mostrando três camadas. O casaco aberto, a jaqueta aberta, o cardigan aberto, o colete aberto, a camisa aberta - nada, veja, a esconder” (Williams, R., 1960: 368).

Os termos binários dessa distinção entre o comedimento inglês e a franqueza galesa são certamente simplistas demais, mas podem ser entendidos como base dos compromissos posteriores de Williams com sua terra natal, nos quais argumentou que “a ênfase mais valiosa na cultura galesa é que todos devem falar e ter o direito de falar” (Williams, D., 2003: 3).

Embora Christopher Prendergast esteja certo ao notar que Williams é semelhante a Georg Lukács, “preferindo à arte da dispersão e fragmentação promovida pelas vertentes sancionadas do modernismo uma arte que conecta, especialmente […] formas que se unem, tão mutuamente necessárias para a inteligibilidade, a experiência individual e a formação social”, as coisas são um pouco diferentes quando se trata de sua avaliação da literatura galesa (Prendergast, 1995: 18). Pois, ao mesmo tempo que apoiava os escritos dos realistas dos anos 1930 (Gwyn Jones e Lewis Jones em particular), Williams sentiu-se atraído, sobretudo, por duas narrativas não representacionais nas quais a voz dominante do narrador realista onisciente dá lugar a um coro de vozes concorrentes e cuja visão de mundo é colorida por hipérboles selvagens e humor ácido: a peça Under Milk Wood (1954) de Dylan Thomas e o romance All Things Betray Thee (1949), de Gwyn Thomas. Ambas as obras ilustram a percepção de Williams de que “os escritores galeses não podem aceitar a pressão inglesa por uma ficção das vidas privadas” (Williams, D., 2003: 161). Nas análises reveladoras de Williams, Dylan Thomas acompanha Joyce ao descobrir uma “convenção viva” que justapõe a “linguagem do sonho” com a “linguagem pública do coro e da retórica”, ao passo que Gwyn Thomas cria uma “composição de vozes” que expressaria uma experiência histórica que não se confina a “representações achatadas ou frases ideologicamente aplicadas” (Williams, D., 2003: 155). Essa celebração do diálogo e da pluralidade nos escritos de Gwyn Thomas e Dylan Thomas reforça a ênfase de Williams de que o País de Gales “tem abrigado uma pluralidade de culturas”, o que resulta em uma situação na qual “qualquer formulação se torna um desafio” (Williams, D., 2003: 34).

Essa exposição da variedade interna e da pluralidade de um País de Gales visto, de uma perspectiva externa dominante, como singular e estático, é uma das características-chave de Border Country. A esse respeito, Williams parece estar apresentando uma encenação fictícia de um argumento desenvolvido em The Long Revolution. Se a carreira de Matthew em Londres o levou a enxergar o País de Gales de sua juventude como uma periferia estática e idealizada nas cenas de abertura do romance, logo sua perspectiva é compartilhada por muitos romancistas ingleses em suas representações de outros lugares. Williams, de maneira reveladora, seleciona A Passage to India (1924), de E.M. Forster, como um “bom exemplo” de narrativa que romantiza “a sociedade de fato em detrimento das necessidades de certas personagens”, e continua:

Isso é bem comum nessa forma: uma sociedade, um modo de vida em geral, está aparentemente ali, mas na realidade é - com frequência - uma paisagem altamente personalizada, para esclarecer ou enquadrar um retrato individual ao invés de um país dentro do qual estão contidos indivíduos (Williams, R., 1961: 308, tradução nossa).

Quando Matthew cruza a fronteira ao País de Gales para estar no leito de morte de seu moribundo pai, examina o mapa em formato da “Gales cabeça-de-porco” e segue observando as “fotografias de sempre” nas “laterais do mapa”: “Do outro lado estava a abadia, que ele conhece desde sempre: a abadia em ruínas de Trawsfynydd que está do mesmo jeito desde que ele nasceu. Próximo a ela, estava a orla de Tenby” (Williams, R., 1960: 8).

Matthew é lembrado dessas imagens no dia seguinte, quando, ao acordar em sua cama de infância em Glynmawr, pega um livro de história do condado que descreve a igreja da vila: “distingue-se por suas relíquias”, “sua varanda normanda” e “tumba saxã”, localizada em um território no qual se encontram “os castelos mais sangrentos da fronteira” e a “pedra de Treachery”. “Ontem as fotos no trem e agora isso”, conta Matthew, “as peças do passado e do presente que são seguras para o manuseio. Aqui nesse país vivo” (Williams, R., 1960: 81-82). Contra a história viva da qual, como historiador e como nativo deste lugar, ele está plenamente ciente, Matthew se volta a essas formas de ver que se oferecem para corrigir essa experiência em constante mudança, tornando-a “segura para o manuseio”. Ele descreve o trabalho histórico que está fazendo acerca dos “movimentos populacionais em direção aos vales mineradores galeses em meados do século XIX” em termos científicos: “As técnicas que eu aprendi têm a solidez e precisão de cubos de gelo, enquanto uma dada temperatura é mantida. Mas é uma temperatura que eu não consigo manter; a tampa da caixa continua se abrindo” (Williams, R., 1960: 4).

O trabalho empírico do historiador se aproxima da observação científica, e as experiências humanas nas quais esse trabalho se baseia forçam Matthew a considerar outros julgamentos: “não era um fragmento de pesquisa, mas um padrão emocional”, ele nota (Williams, R., 1960: 353). Border Country justapõe continuamente diferentes modos de ver e de saber quando, ao retornar ao País de Gales, Matthew nota uma sensação crescente de incerteza sobre seu trabalho como historiador, a trajetória de sua vida e, em última instância, seu próprio senso de identidade.

Assim, como um exilado retornando, Matthew parece encontrar algum consolo nas imagens fixas do vagão do trem e nos relatos descritivos de história popular. Estas são formas de ver que transformam a fluidez da experiência de volta em cubos de gelo. No início do romance, o passado de Matthew parece “outro país”, mais bem imaginado em formas estáticas e imutáveis, intimamente relacionadas às suas próprias memórias de infância, como sugerem suas observações - que as imagens do trem tinham “mais de trinta anos de idade: quase sua própria idade” (Williams, R., 1960: 8). À medida que a narrativa prossegue, Matthew começa a questionar as suposições que faz sobre esta paisagem, questionando os valores que informam sua concepção da realidade.

Em Gwenton, ele não encontrou nenhum conhecido e uma simples ida às compras foi difícil depois de Londres: as convenções eram diferentes. Ele se sentia vazio e cansado, mas a forma familiar do vale e das montanhas o abraçava e o substituía. Uma coisa era carregar a sua imagem na mente, como ele o fazia, para todos os lados, sem pular nenhum dia, no entanto ele fechou os olhos e enxergou novamente, sua única paisagem. Mas era diferente encarar a realidade. Não era menos bela; cada detalhe vinha à tona com sua velha empolgação. Mas não era imóvel, como a imagem tinha sido. Já não era mais uma paisagem ou uma visão, mas um vale utilizado pelas pessoas. Ele percebeu, conforme observava, o que aconteceu quando se foi. O vale como uma paisagem foi ocupado, já sua obra, esquecida. O visitante enxerga beleza; o morador vê o local onde trabalha e tem seus amigos. De longe, ao fechar os olhos, ele tem visto o vale, mas como um visitante o enxerga, como um manual o vê: esse vale, no qual ele havia morado mais do que a metade de sua vida (Williams, R., 1960: 89, tradução nossa).

Ao aprender novamente a se tornar um morador dentro de um espaço habitável, em oposição a um visitante que vê apenas a imagem, Matthew percebe até que ponto ele molda a paisagem e o ambiente do país de fronteira de acordo com suas próprias perspectivas cambiantes.

Essa análise ecoa o entendimento de Matthew, citado acima, no qual “O visitante enxerga beleza; o morador vê o local onde trabalha e tem seus amigos” (Williams, R., 1960: 89). Desse modo, a Índia de Foster é também uma projeção subjetiva e não uma sociedade propriamente dita. Podemos começar a ver aqui a influência do trabalho formativo de Williams na emergência da crítica pós-colonial. Em Orientalismo, Edward Said (1995) detecta a tensão entre tendências de visualização e narrativa dentro das descrições do “outro” colonial. “Contra o sistema estático do ‘essencialismo sincrônico’ que eu denominei de visão”, observa Said,

existe uma pressão constante. A fonte da pressão é a narrativa, pois se algum detalhe oriental se mostra em movimento, ou em desenvolvimento, a diacronia é introduzida no sistema. O que parecia estável - e o Oriente é sinônimo de estabilidade e eternidade imutável - agora se mostra instável (Said, 1995: 240, tradução nossa).

Existe evidência, especialmente em seus escritos tardios, de que Williams estava totalmente ciente dos modos pelos quais os “marginalizados” e “oprimidos” podem se tornar símbolos de resistência em voga. Isso apresenta-se mais notadamente no romance Loyalties, em que Emma, uma radical de classe média, pode ser vista nos anos de 1980 substituindo sua imagem de “cabeças verdes de mineiros” por “uma paisagem africana bordada” (Williams, R., 1985: 307). Contra essas armadilhas primitivistas, Williams enfatiza a mudança histórica e a mobilidade humana. No desenvolvimento de Matthew em Border Country, o vemos rejeitar a tendência de enxergar o País de Gales em termos estáticos e visualizados, à medida que se torna cada vez mais - consciente e preocupado com instabilidade inerente a seu país de origem. O movimento de contraponto do romance entre as experiências de Matthew no presente e as seções históricas mais longas, centradas em Harry Price e na Greve Geral de 1926, visa permitir uma ênfase na percepção pessoal, porém sempre inserida em um contexto social profundo, que se encontra em primeiro plano na mudança social e histórica. Nos movimentos de vai e vem entre o País de Gales e a Inglaterra, característica de todos os romances da “trilogia galesa”, Williams argumenta que todos os lugares e todas as pessoas possuem vidas e tensões internas próprias; nenhum lugar existe meramente como um pano de fundo estático, imutável e idealizado para algo ou outro alguém.

IV

O que Henry Louis Gates Jr. deixa passar ao chamar a atenção para as implicações potencialmente discriminatórias da “cultura em comum” como um conceito é que Williams já estava explorando as tensões e limitações de seu pensamento em relação a sua própria formação galesa. Essa exploração tomou a forma de ficção nos anos de 1950 e 1960. Quando foi indagado pelos seus interlocutores da New Left Review em 1979 a respeito da ausência de qualquer referência ao “nacionalismo ou imperialismo” em Cultura e sociedade, Williams respondeu o seguinte:

De fato, existem duas passagens do livro que se referem à experiência imperial, ainda que, de certo modo, essas confirmem a sua ênfase geral - a discussão de Carlyle acerca da crítica de imigração como uma solução social e a análise da função mágica das viagens para o império na ficção do período. Mas fora isso não há nada sobre […], [e] penso que uma das razões para isto seja que a experiência particular que deveria ter me permitido pensar mais a fundo e criticamente sobre o assunto esteve, por diversas razões naquela época, muito em suspenso: a experiência galesa. A maneira como eu utilizei o termo comunidade realmente se baseou em minhas lembranças do País de Gales, como já afirmei. Porém, a experiência galesa também foi precisamente uma experiência de sujeição à expansão inglesa e à assimilação histórica. Isso é o que deveria ter mais me alertado quanto aos perigos de um tipo persuasivo de definição de comunidade, que é, simultaneamente, dominante e única (Williams, R., 1979: 118-119, tradução nossa).

É essa passagem que Edward Said tinha em mente quando lembrou que Williams relacionava a ausência do “Império” em Cultura e sociedade à “indisponibilidade, à época, de [sua] experiência galesa” e que isso não era “tão importante como […] se tornaria mais tarde” (Williams & Said, 1989: 196). Isto parece sugerir que qualquer discussão sobre o envolvimento de Williams com a questão do colonialismo deveria ocorrer à luz de suas meditações acerca de sua experiência galesa. Infelizmente, a dimensão galesa do pensamento de Williams nunca foi citada por Said em sua interpretação influente de O campo e a cidade (1973), que consta no livro Cultura e imperialismo (1993). Naquela análise, Said registra que Wiliams “de fato trata da exportação da Inglaterra às colônias”, mas argumenta que ele o faz “de uma forma menos focada e menos ampla do que a prática de fato exige” (Said, 1993: 98-99; Said, 1983: 237-242). Said segue criticando Williams por ter limitado sua discussão sobre o imperialismo a meados do século XIX em diante. Esta é uma crítica que poderia ser feita com razão sobre o verbete “Imperialismo” em Palavras-chave [Keywords] (Williams, R., 1976), mas não se aplica tanto à obra O campo e a cidade, na qual o capítulo “A nova metrópole” traz em seu centro a questão do colonialismo:

Em 1770, 15% do comércio britânico era com as colônias. Em 1775, tornou-se um terço. Em um processo intrincado de interação econômica, sustentado por guerras entre as nações comerciais pelo controle das áreas de fornecimento, um sistema colonial organizado e o desenvolvimento de uma economia industrial mudaram a natureza da sociedade britânica (Williams, R., 1973: 280, tradução nossa).

Após essa discussão de como a consolidação das economias de plantations eram dependentes do trabalho escravo, Williams comenta que:

Os eventos sem precedentes do século XIX - no qual a Grã-Bretanha se tornou uma sociedade predominantemente industrial e urbana, com sua agricultura em declínio até um status marginal - são inexplicáveis e teriam sido impossíveis sem esse desenvolvimento colonial (Williams, R., 1973: 280, tradução nossa).

A tendência de universalizar uma formação particular (tendência da qual Williams é culpado em The Long Revolution) é criticada no decorrer de O campo e a cidade, de maneira mais forte e memorável na rejeição de Williams da tendência marxista de diminuir e ridicularizar o “cretinismo da vida rural”:

Em O manifesto comunista, Marx e Engels argumentaram que “a burguesia sujeitou o campo ao domínio das cidades […], criou cidades enormes […], fez países bárbaros e semibárbaros se sujeitarem aos civilizados”: a história familiar do capitalismo e imperialismo. Eles afirmaram que essas relações de centralização e dependência criaram as condições para a revolução e em certo sentido eles estavam certos.

Mas havia uma ambiguidade no centro do argumento. Eles denunciaram o que estava sendo feito no progresso dilacerante do capitalismo e do imperialismo; insistiram que os homens devem lutar para superá-lo e nos mostraram alguns caminhos. No entanto, implícito nessa denúncia, estava um outro conjunto de julgamentos de valor: os burgueses “salvaram uma parte considerável da população do cretinismo da vida rural”, as nações sujeitadas eram “bárbaras e semibárbaras”; os poderes dominantes, “civilizados”. Foi, então, apoiada nesse tipo de confiança nos valores singulares da modernização e da civilização, que uma grande distorção na história do comunismo foi erigida […]; essa dificuldade resolveu a si mesma de uma maneira surpreendente, em nosso próprio século. As revoluções não vieram dos países “desenvolvidos”, mas sim dos países “não desenvolvidos” […]. Assim, os “idiotas rurais” e os “bárbaros e semibárbaros” têm sido, nos últimos quarenta anos, a principal força revolucionária no mundo (Williams, R., 1973: 303-304, tradução nossa).

Como um resultado dessa nova perspectiva, O campo e a cidade marca o momento na obra de Williams em que, como Dai Smith (1989: 35) notou, “as referências mais amplas, complacentes e anglocêntricas são muitas vezes confrontadas com fontes de pesquisa irlandesas, escocesas e, mais desconhecidas de seus leitores, galesas”. Note-se ainda, no entanto, que estas referências celtas foram complementadas por discussões de escritores indianos e africanos cujos nomes circulavam de maneira mais limitada em 1973 do que atualmente: Achebe, Nwankwo, Ngugi e Narayan. O campo e a cidade expandiu as fronteiras do estudo da literatura como então era praticado em 1973, e dificilmente pode ser considerado como o trabalho de um homem que, de acordo com Gauri Viswanathan (1995: 190), “consistentemente e exclusivamente” estudou “a formação da cultura metropolitana dentro de seus próprios limites”. Deve ficar claro agora que, ao contrário de Enoch Powell e dos vários ideólogos da Nova Direita na Grã-Bretanha, Raymond Williams nunca comparou uma “Britanicidade” não problemática e enraizada com as mais recentes, menos enraizadas, menos “autênticas” identidades dos imigrantes. Em momento algum de Towards 2000, nem em nenhum de seus escritos, Williams nega, nas palavras de Gilroy (1987: 49-50), “que os negros podem compartilhar uma identidade social significativa com seus vizinhos brancos”, nem Williams nunca sugeriu, como alega Gilroy, que “as origens do conflito racial residem na hostilidade entre estranhos na cidade”. Williams precedeu as passagens citadas por Gilroy em “There ain’t no black in the Union Jack”, ao notar que:

O que é projetado de tempos em tempos como uma “ilha racial” é, na verdade, um longo processo de conquistas e repressões, e também de sucessivas substituições e integrações relativas […]. Deve ser óbvio que este longo e inacabado processo não pode ser racionalmente reprimido por versões de uma história nacional e de uma herança patriótica que, deliberadamente, exclui suas complexidades e, ao fazer isso, rejeita muitas de suas identidades sobreviventes e diversas (Williams, R., 1983: 193, tradução nossa).

Portanto, a diversidade cultural é anterior à imigração do século XX. Williams reforça esta ideia no final do capítulo em que ele relaciona a discussão anterior à história do País de Gales e sua própria experiência galesa em geral:

Acontece que eu cresci em uma área de fronteira antiga, o campo fronteiriço galês, onde, por séculos, houve lutas amargas e invasões e repressão e discriminação e na qual, a vinte milhas de distância de onde nasci, havia, naqueles séculos turbulentos, até quatro línguas diferentes faladas diariamente. É com essa história em mente que eu acredito na formação prática da identidade social - agora muito marcada aqui - e sei que ela tem que necessariamente ser vivida. Não muito longe estão os vales de mineração galeses, para os quais no século XIX houve uma imigração maciça e diversificada, mas que, depois de duas gerações, foram algumas das comunidades mais notavelmente sólidas e mutuamente leais de que temos registro. Estes são os verdadeiros motivos de esperança (Williams, R., 1983: 196, tradução nossa).

Longe de negar que os imigrantes podem sim compartilhar uma identidade social significativa com a população já estabelecida, Williams se volta, na verdade, para a diversidade da experiência do sul de Gales, “os verdadeiros motivos de esperança”. No final dos anos de 1970, Williams definia a si mesmo como um “galês-europeu”. Até mesmo quando era jovem, “britânico” era um termo “não muito utilizado, exceto por pessoas de quem se desconfiava” (Williams, R., 1979: 26). Também seria um erro ver Williams rejeitando uma Grã-Bretanha opressiva em favor de um País de Gales igualmente essencialista, senão minoritário. Isso porque Williams nunca se definiu, ou se considerou, um “britânico”; seus escritos sobre o País de Gales se caracterizam também pela rejeição e problematização da ideia de uma identidade unitária. Em sua resenha do “pequeno livro vermelho” do movimento linguístico de Gales - The Welsh Extremist, de autoria de Ned Thomas -, publicada no The Guardian em 1971, Williams adotou uma estratégia que repetiria muitas vezes em seus escritos posteriores acerca de seu país natal: o autor localiza a si mesmo no campo fronteiriço galês de sua juventude - um lugar “tão especial e de outros modos tão marginal” - e olha para o oeste em direção às duas sociedades que formaram as bases para as imagens dominantes e amargamente divergentes do País de Gales no século XX, a “poderosa política cultural do Sul de Gales industrial”, por um lado, e “o oeste e o norte, mais fechados, sobretudo rurais, majoritariamente falantes de galês”, do outro (Williams, D., 2003: 3, tradução nossa).

De maneira reveladora, em ambos os casos, o conhecimento de Williams sobre essas comunidades galesas se deve mais à pesquisa do que à experiência; ele recorda “focar-se primeiro” na história do Sul de Gales, para depois voltar a sua atenção ao oeste e norte falantes de galês, que “no começo […] era bem mais remoto” (Williams, D., 2003: 3). Essa posição de “forasteiridade”6 é levada a bom termo no artigo “Community” de 1985. Nele, Williams compara a celebração e a análise da “continuidade da língua e literatura galesa […] desde o século VI” do romancista e crítico Emyr Humphreys com Dai Smith e sua crítica das noções de continuidade e ênfase na “experiência turbulenta do Sul de Gales industrial” desde o final do século XIX (Williams, D., 2003: 27). Ao tentar enxergar para além do rancor dos debates culturais e políticos galeses, Williams procura unir as várias ideias de País de Gales que havia encontrado em sua vida e obra. Ele observa sua consciência particular “dos elementos comuns de autenticidade em cada caso aparentemente alternativo” e, apesar das divisões, argumenta que “quanto mais profunda a comunidade, maior sua área de discurso” (Williams, D., 2003: 27). Williams sugere que este argumento se desenvolve “vendo o problema em minhas próprias condições de vida, tanto por dentro como por fora”, um terreno ambivalente que está no cerne de seus compromissos ficcionais e teóricos com o País de Gales, com a “Galesidade”7 e seus compromissos com questões de nacionalismo e identidade nacional (Williams, D., 2003: 28). Williams enfatiza em diversos ensaios que ele “nasceu na fronteira, e […] falava sobre ‘os ingleses’ que não eram nós e os ‘galeses’ que não eram nós” (Williams, D., 2003: 87). Esta experiência de fronteira serve de base para uma concepção pluralista de nação que está totalmente em desacordo com a visão racialmente essencialista de nação defendida por Enoch Powell e seus seguidores.

V

Apesar dos clichês simplistas que agora circulam a respeito de Williams e sua obra, ele não era - usando as palavras de Gates - “desconfiado das políticas de identidade”. Era, sim, um intérprete profético das tensões históricas e contemporâneas que compõem a ideia de “Grã-Bretanha”. No segundo romance de Williams (1964), Second Generation, a experiência da classe trabalhadora britânica nos anos de 1960 se apresenta cada vez mais relacionada aos legados do Império. Esta linha temática atinge seu clímax em uma festa na qual o personagem central, Peter Owen, envolve-se na seguinte conversa com dois representantes da Federação da África Ocidental:

Eu tenho tido uma discussão com o ministro, disse Okoi. Eu tenho dito que o nosso nacionalismo é agora muito evidente e que não temos feito o suficiente na luta contra a pobreza.

A distinção é falsa, disse Akande. Mas se trata ainda de uma luta de classes, só que agora entre nações […]. Nacionalismo, disse ele de maneira precisa, é nesse sentido igual à classe. Tê-la e senti-la é o único jeito de acabar com ela. Se você não a reclamar, ou desistir dela muito cedo, você será meramente enganado, por outras classes e outras nações.

Eu concordo, disse Peter. É isso que eu tenho aprendido.

Então eu lhe desejo sorte, Sr. Owen.

Eu lhe desejo sorte, Sr. Akande. Para ambos, ele adicionou, sorrindo em direção a Okoi.

Será mais que sorte, será luta, Peter, disse Okoi (Williams, R., 1964: 321-322, tradução nossa).

Aquilo que Peter “tem aprendido” é, sem dúvida, reflexo do engajamento de Williams com as relações entre classe, nacionalidade e identidade. Duas posições reiteradas, que emergem de suas discussões sobre a questão nacional, estão implícitas neste diálogo. Em primeiro lugar, embora classe e nação sejam categorias sociais distintas, ambas podem oferecer possíveis recursos para a identidade comunitária e a ação política. Uma política baseada em “classe” ou “nação” será parcialmente disputada em um terreno definido pelos antagonistas, mas estas formas de identidade não podem ser contornadas; devem ser acolhidas e trabalhadas em busca de formas alternativas de ser e de pertencer. Em segundo lugar, enquanto a esquerda britânica é tradicionalmente opositora do nacionalismo em todas as suas formas (ao mesmo tempo que é cega a seus próprios preconceitos nacionais), as palavras de Akande sugerem que, de fato, é necessário discriminar entre as formas emancipatórias e opressivas do nacionalismo. Em seus escritos do início dos anos de 1970 em diante, Raymond Williams aplicaria cada vez mais estas questões - discutidas aqui por um membro da segunda geração da comunidade diaspórica galesa de Oxford e dois representantes de nações africanas recentemente independentes - à sua própria experiência galesa e às suas análises das culturas britânicas.

No entanto, vale a pena concluir, salientando em termos bem contundentes, que não estou defendendo que pensemos em Williams como o profeta de uma utopia socialista galesa descentralizada, enraizada em uma apreciação da diferença cultural. Embora Patrick Parrinder (1987: 78) tenha descrito Williams “retirando-se para o reduto de sua Galesidade” e James A. Davies (1993: 207) tenha se referido ao “País de Gales alternativo” de Williams como “uma comuna celta sob ameaça, mas indomável”, na verdade, Williams raramente foi um romântico nostálgico. Ele é uma figura que continua a perturbar as suposições pouco ponderadas da “esquerda” contemporânea, esteja esta em sua roupagem galesa, “britânica”8 ou “anglo-americana”.

Ainda que muitos tenham celebrado a mudança de identidades “étnicas” (baseadas na língua, religião, cultura) para “cívicas” (baseadas em instituições políticas), a identidade nacional nunca poderia ser puramente cívica para Williams. Segundo o autor, todos os nacionalismos são nacionalismos culturais, quer reconheçam ou não, pois nenhuma articulação política pode preceder uma formação cultural. O que nos é exigido pela ênfase de Williams na constituição cultural das identidades contemporâneas é refletir sobre até que ponto é possível fugir de uma insistência na distinção e na autenticidade, com seus perigos inerentes de nativismo, racismo e xenofobia, antes que uma cultura seja desprovida de qualquer especificidade? Esta é uma pergunta particularmente importante no País de Gales, no qual, do final do século XIX em diante, um desejo nacionalista de transcender as diferenças culturais a fim de forjar um sentido viável de uma identidade nacional única tem convivido com uma conscientização da diversidade cultural de um País de Gales moderno que emergiu da revolução industrial, além de conviver também com uma luta para manter um idioma minoritário celta ainda falado por mais de vinte por cento da população. Esta também é uma questão de importância central para a esquerda europeia, pois ela tenta compreender os laços supranacionais e regionais que estão sendo forjados dentro do contexto da europeização e colocados sob crescente tensão durante um período de depressão econômica. Na pós-devolução do Reino Unido, no qual a “britanicidade” está sendo redefinida sob pressões internas e externas, Williams deve ser entendido como uma voz profética. Para além do País de Gales, essa voz tem sido atualmente silenciada pela acusação reiterada da insularidade e provincianismo. Possíveis linhas de comunicação e bases para a solidariedade ainda podem surgir, contudo, da constatação de que, enquanto não houver negros na Union Jack9, o País de Gales também não estará lá.

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  • Williams, Raymond. (1985). Loyalties. London: Chatto & Windus .
  • 1
    Tradução de Carla Baute, doutoranda em História na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
  • 2
    No livro de Gates, aparece a palavra “internamente”. No entanto, no original é “internacionalmente”. Conferir Williams (1983: 195-196).
  • 3
    No original, “Englishness”. (Nota do Tradutor.)
  • 4
    Gíria para “UK”, sigla de “United Kingdom” (Reino Unido). (Nota do Tradutor.)
  • 5
    O papel da língua galesa em Border Country é similar àquele do hebraico em Daniel Deronda de T. S. Eliot, conforme teorizado por MacCabe (1978: 21): “[T]alvez mais potente do que tudo, a língua hebraica, que repousa no centro de Daniel Deronda, permanece impenetrável, questiona e mantem em suspenso o projeto do texto de Eliot. […] A descoberta de Deronda do idioma judeu e dos poemas de Mordecai perturba a metalinguagem na medida em que a língua judaica constitui uma área fora de seu controle. Deronda recebe a notícia de que o trabalho de Mordecai está em hebraico e intraduzível com “ansiedade”. Esse sentimento não é surpreendente quando se reconhece que os poemas constituem uma ameaça fatal à metalinguagem”.
  • 6
    No original, “Outsiderness”. (Nota do Tradutor.)
  • 7
    No original, “Welshness”. (Nota do Tradutor.)
  • 8
    No original, “Yookayan”, do UK (Reino Unido). (Nota do Tradutor.)
  • 9
    Referência ao título do livro de Paul Gilroy, “There ain’t no black in the Union Jack”, de 1987, citado anteriormente neste artigo. (Nota do Tradutor.)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2022
  • Aceito
    23 Ago 2022
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