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Ações em tecnologia assistiva com mulheres hospitalizadas 1 1 Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da UFPE, sob parecer de nº 4.690.920, sendo resultado do Trabalho de Conclusão de Residência (TCR) do Programa de Residência Multiprofissional Integrado em Saúde do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco.

Resumo

Introdução

A saúde da mulher pode se tornar mais frágil durante a internação hospitalar por diversos motivos, o que pode afetar sua autonomia e independência. Nesse contexto, intervenções em tecnologia assistiva podem ser realizadas para favorecer o desempenho ocupacional da mulher.

Objetivo

Identificar quais ações em tecnologia assistiva são realizadas por terapeutas ocupacionais com mulheres no contexto hospitalar.

Método

Estudo descritivo, retrospectivo e exploratório, de abordagem quantitativa, realizado de agosto a dezembro de 2021, por meio de dados secundários extraídos de 155 prontuários de mulheres que foram assistidas em terapia ocupacional nas enfermarias de Neurologia, Oncologia e Saúde Mental em um hospital universitário do Recife, PE, Brasil. Foram utilizados como instrumentos um questionário estruturado de caracterização e um checklist de rastreamento de ações em tecnologia assistiva. Para análise dos dados, foi utilizada estatística descritiva por meio da planilha eletrônica do Microsoft Excel.

Resultados

48 pacientes receberam intervenções dos terapeutas ocupacionais em tecnologia assistiva, contemplando os serviços de avaliação, prescrição, confecção, orientação de uso e treino, tendo como principais dispositivos órteses de membros superiores e de auxílio para atividades de vida diária no setor de neurologia e o coxim no setor de oncologia, apresentando como predominância nos objetivos o favorecimento do desempenho ocupacional.

Conclusão

Foi identificado o predomínio das ações de tecnologia assistiva nas enfermarias de oncologia e neurologia com produtos de baixo custo; necessidade de melhorar o processo de acompanhamento de uso da tecnologia assistiva e de se investir no serviço de Tecnologia Assistiva; aumento de estudos sobre essa temática para gerar evidências.

Palavras-chave:
Dispositivos de Autoajuda; Funcionalidade; Terapia Ocupacional; Saúde da Mulher

Abstract

Introduction

Hospitalization can render women’s health more fragile for a variety of reasons, potentially impacting their autonomy and independence. Within this scenario, interventions using assistive technology can enhance women’s occupational performance.

Objective

To discern the assistive technology actions undertaken by occupational therapists for women in hospital settings.

Method

This descriptive, retrospective, and exploratory study with a quantitative approach was conducted from August to December 2021. It utilized secondary data from 155 medical records of women who received occupational therapy in neurology, oncology, and mental health wards at a university hospital in Recife, state of Pernambuco, Brazil. Instruments included a structured questionnaire for characterization and a checklist to trace assistive technology actions. Data analysis was performed using Microsoft Excel.

Results

Out of 155, 48 patients benefited from assistive technology interventions by occupational therapists. These interventions included evaluation services, prescription, manufacturing, use guidance, and training. The primary devices were orthoses for upper limbs and aids for activities of daily living in the neurology sector, with cushions being prominent in the oncology sector. A common goal was the enhancement of occupational performance.

Conclusion

Most assistive technology actions occurred in the oncology and neurology wards, focusing on low-cost products. There is a recognized need to refine the monitoring process for assistive technology use, invest more in assistive technology services, and promote research in this field to generate further evidence.

Keywords:
Self-help Devices; Functionality; Occupational Therapy; Women’s Health

Introdução

A Saúde da Mulher (SM) se refere ao conjunto de ações que visam a prevenção, assistência, promoção, proteção e recuperação da saúde, sendo exercidas na baixa, média e alta complexidade da assistência. Tais ações visam alcançar as mulheres em todos os ciclos da vida, resguardadas as especificidades das distintas faixas etárias e grupos populacionais (Brasil, 2004Brasil. (2004). Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: princípios e diretrizes. Brasília: Ministério da Saúde.).

Souza Araújo et al. (2020)Souza Araújo, J. C., Quinta, M. L. R., & Silva, A. M. B. F. (2020). Terapia Ocupacional em contextos hospitalares: uma solução assistiva para a prevenção e o tratamento das Lesões por Pressão. Research, Social Development, 9(10), 1-28. trazem em seu estudo o quanto essas pessoas são beneficiadas com as ações de acesso à assistência integral em saúde, sejam estas de cunho preventivo ou de reabilitação, independentemente das diferentes condições físicas, sociais ou mentais que apresentam ao longo da vida.

No que concerne à alta complexidade, a prestação do cuidado em saúde, por parte dos profissionais, é seguida de acordo com várias características que implicam a higidez desses indivíduos, como o tempo de internação, quebra da rotina, tipo de deformidades, os procedimentos cirúrgicos e as suas consequências e/ou alterações no grau de funcionalidade. Isolados ou em conjunto, esses fatores impactam diretamente o desempenho ocupacional dos indivíduos (Florisbal & Donelli, 2017Florisbal, G. S., & Donelli, T. M. S. (2017). Revivendo perdas: um estudo com pacientes hospitalizados em uma unidade de internação. Revista da SBPH (Belo Horizonte), 20(1), 75-98.).

De acordo com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), essas alterações, durante a hospitalização, podem gerar incapacidades de diferentes níveis, refletindo nas funções e estruturas do corpo, participação nas atividades e fatores ambientais que englobam os indivíduos (Organização Mundial da Saúde, 2020aOrganização Mundial da Saúde – OMS. (2020a). Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF. São Paulo: EDUSP.). A CIF enfatiza, dentro desse processo de assistência e serviços de suporte e benefício de prestação continuada, como os fatores ambientais impactam a funcionalidade e podem ser amenizados por meio de adaptações ou utilização de suportes pessoais (utensílios de Tecnologia Assistiva) (Organização Mundial da Saúde, 2020aOrganização Mundial da Saúde – OMS. (2020a). Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF. São Paulo: EDUSP.).

Dentro do que a CIF classifica como facilitador está a tecnologia de assistência apropriada, ressaltando ainda que a utilização desses facilitadores pode impedir que uma deficiência ou limitação de atividade se transforme numa restrição de participação, já que o desempenho real de uma ação é potencializado (Organização Mundial da Saúde, 2020aOrganização Mundial da Saúde – OMS. (2020a). Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF. São Paulo: EDUSP.).

O Comitê de Ajudas Técnicas (CAT) define o termo Tecnologia Assistiva (TA) como:

Área do conhecimento, de característica interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação, de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social (Brasil, 2009, pBrasil. (2009). Comitê de Ajudas Técnicas Tecnologia Assistiva. Brasília: CORDE.. 9).

Entretanto, quando se discute sobre a definição de TA, evidencia-se que algumas outras diferentes terminologias ainda são aplicadas para esse conceito, como ajudas técnicas, tecnologia de apoio, dispositivos assistivos, dispositivos de autoajuda e equipamentos assistivos, cujo uso ainda sofre influência do referencial teórico (Bersch, 2017Bersch, R. (2017). Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Assistiva: Tecnologia e Educação. Recuperado em 30 de abril de 2021, de http://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_Assistiva.pdf
http://www.assistiva.com.br/Introducao_T...
).

Para o campo prático, destaca-se a importância de classificar a TA, com o objetivo de organizar a área de conhecimento, a qual pode se destinar à pesquisa, promoção de políticas públicas, organização de serviços, catalogação e formação de banco de dados (Sartoretto & Bersch, 2017Sartoretto, M. L., & Bersch, R. (2017). Tecnologia Assistiva. O que é Tecnologia Assistiva. Porto Alegre: Assistiva: Tecnologia e Educação. Recuperado em 8 de maio de 2023, de https://www.assistiva.com.br/
https://www.assistiva.com.br/...
).

Bersch (2017)Bersch, R. (2017). Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Assistiva: Tecnologia e Educação. Recuperado em 30 de abril de 2021, de http://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_Assistiva.pdf
http://www.assistiva.com.br/Introducao_T...
classifica a TA em 12 categorias, sendo elas: auxílios para a vida diária; comunicação aumentativa alternativa (CAA) e comunicação suplementar alternativa (CSA); recursos de acessibilidade ao computador; sistemas de controle de ambiente; projetos arquitetônicos para acessibilidade; órteses e próteses; adequação postural; auxílios de mobilidade; auxílios para cegos ou com visão subnormal; auxílios para surdos ou com déficit auditivo; adaptações em veículos e esporte e lazer.

De acordo com a Resolução n. 458 do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), de novembro de 2015, os terapeutas ocupacionais têm a função de avaliar as potencialidades, dificuldades e necessidades dos indivíduos no uso dos produtos, recursos, métodos, estratégias de TA, práticas e serviços, além de instruir, treinar, prescrever, executar, desenvolver produtos, recursos e monitorar o uso dos dispositivos assistivos que auxiliem o desempenho ocupacional, promovam o conforto físico e mental e facilitem a participação em atividades de vida diária (AVD) (Brasil, 2015Brasil. Conselho Federal De Fisioterapia e Terapia Ocupacional - COFFITO. (2015). Resolução nº 458, de 20 de novembro de 2015. Dispõe sobre o uso da Tecnologia Assistiva pelo terapeuta ocupacional e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília.; Verdiani et al., 2016Verdiani, M. B., Gomes, J. L., Nishida, M. H., Marinho, M. P., & Braga, D. M. (2016). Aplicabilidade da CIF baseada nos objetivos funcionais na paralisia cerebral. Revista CIF Brasil, 5(5), 2-14.).

Diante disso, o terapeuta ocupacional tem um papel crucial, oferecendo uma ampla gama de serviços na aplicação de tecnologia, o que inclui a avaliação, recomendação, prescrição, justificação de necessidade, recursos de sensibilização e aceitação, customização, treinamento, integração e acompanhamento (Marins & Emmel, 2011Marins, S. C. F., & Emmel, M. L. G. (2011). Formação do terapeuta ocupacional: acessibilidade e tecnologias. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional,19(1), 37-52.).

Reafirmando a expertise do terapeuta ocupacional em contextos hospitalares, o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional instituiu, por meio da Resolução n. 429/2013, o reconhecimento e a atuação do terapeuta ocupacional nos contextos hospitalares, visando a proteção, promoção, prevenção, recuperação, reabilitação e cuidados paliativos do indivíduo e da coletividade, pautado na concepção de integralidade e humanização da Atenção à Saúde. Por meio do diagnóstico terapêutico ocupacional, determina-se a execução e utilização de métodos, técnicas e recursos pertinentes e adequados aos contextos hospitalares (Brasil, 2013Brasil. Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - COFFITO. (2013). Resolução n° 429, de 08 de julho de 2013. Reconhece e disciplina a especialidade de Terapia Ocupacional em Contextos Hospitalares, define as áreas de atuação e as competências do terapeuta ocupacional especialista em Contextos Hospitalares e da outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília.).

O contexto hospitalar apresenta características específicas na aplicação da Tecnologia Assistiva, o que deve ser considerado neste estudo. Segundo o modelo teórico de Tecnologia Assistiva Human Activities Assistive Technology – HAAT, a inserção de uma TA tem o propósito de facilitar a atividade de um ser humano em um determinado contexto, como ilustrado na Figura 1 (Cook & Polgar, 2015Cook, A., & Polgar, J. (2015). Assistive Technologies: principles and practice. Saint Louis: Elsevier.):

Figura 1
Modelo HAAT. Fonte: Cook & Polgar (2015)Cook, A., & Polgar, J. (2015). Assistive Technologies: principles and practice. Saint Louis: Elsevier., adaptada para a língua portuguesa.

No que diz respeito à prescrição da Tecnologia Assistiva, o ambiente de uso também é considerado pelo modelo Matching Person & Technology (MPT), que propõe uma abordagem centrada no usuário e no ambiente (Scherer & Craddock, 2002Scherer, M. J., & Craddock, G. (2002). Matching Person & Technology (MPT) assessment process. Technology and Disability, 14(3), 125-131.).

Dentre os potenciais usuários da TA e dentre os diversos contextos, está a mulher em situação de hospitalização. Segundo Kjeken et al. (2005)Kjeken, I., Dagfinrud, H., Slatkowsky-Christensen, B., Mowinckel, P., Uhlig, T., Kvien, T. K., & Finset, A. (2005). Activity limitations and participation restrictions in women with hand osteoarthritis: patients’ descriptions and associations between dimensions of functioning. Annals of the Rheumatic Diseases, 64(11), 1633-1638., Amaral (2016)Amaral, D. S. (2016). Dispositivos de assistência no tratamento não farmacológico da osteoartrite de mãos (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Pernambuco, Recife. e Paula (2017)Paula, P. M. D. S. (2017). Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: funcionalidade para pessoas com artrite reumatoide (Dissertação de mestrado). Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, São José do Rio Preto., as mulheres apresentam adoecimentos que acarretam uma maior limitação funcional, com perda da capacidade laboral e qualidade de vida, necessitando, muitas vezes, de recursos de TA que demonstram eficácia no tratamento. Nesse contexto, compreende-se que as mulheres, durante internamento hospitalar, possuem algumas limitações que podem interferir significativamente nas ações de suas atividades diárias, diminuição da autonomia e independência, e/ou incapacidade, sendo de responsabilidade e habilidade do terapeuta ocupacional avaliar, planejar, prescrever e confeccionar recursos que facilitem o desempenho ocupacional desta população.

O presente estudo teve como objetivo identificar quais ações em tecnologia assistiva são realizadas por terapeutas ocupacionais com mulheres no contexto hospitalar.

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo, retrospectivo, com abordagem quantitativa. Os dados foram coletados no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC-UFPE), por meio de prontuários dos setores de Neurologia, Oncologia e Saúde Mental. As informações foram obtidas pelo Serviço de Arquivo Médico e Estatística (SAME) e pelo Setor de Gestão de Processos e Tecnologia da Informação (SGPTI) – Sistemas Master Tools, dos anos 2018 e 2019.

Os critérios de inclusão envolveram mulheres que receberam intervenções terapêuticas ocupacionais, tendo em seu setor de internação alocado o terapeuta ocupacional, nos anos de 2018 e 2019. Foram excluídas mulheres sem registros dos atendimentos da terapia ocupacional no prontuário e aquelas que tiveram atendimentos ambulatoriais, pois o serviço assistencial é diferenciado da prestação na enfermaria.

A coleta de dados ocorreu entre agosto e dezembro de 2021 e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do HC – UFPE sob parecer n. 4.690.920. Os dados foram compilados utilizando-se o Questionário Estruturado de Caracterização das Participantes e o Checklist de Rastreamento de Ações em Tecnologia Assistiva.

Para o questionário, foram solicitados dados sociodemográficos e econômicos, e dados clínicos. Já para o checklist, foram solicitadas informações sobre a TA utilizada no hospital: tipo de serviço de TA ofertado (avaliação, apenas prescrição, apenas confecção, prescrição e confecção, orientação de uso, treino e em quantos atendimentos foi realizado o serviço de TA); a área da TA (dentre as 12 áreas reconhecidas); o nome do produto assistivo; os materiais utilizados no produto (e caso não tenham sido descritos, escrever como “não especificado”); a caracterização da TA (quanto ao custo: baixo custo/simples ou alto custo/sofisticada; fabricação: comercializada/pré-fabricada, individualizada/ adaptação de uma TA comercializada, individualizada/feita totalmente sob medida); a finalidade da TA; e o ambiente para o qual foi indicada a TA (hospital, domicílio, outros/quais?). Ambos foram adicionados em dois arquivos via plataforma on-line “Survio”, a qual foi utilizada como ferramenta para a coleta e organização dos resultados.

Para a determinação do tamanho da amostra, foi utilizada a equação de cálculo de amostra para estudo de proporção em população finita, dada por:

onde,

z = quartil da normal padrão (1,96, quando considerado um coeficiente de confiança de 95%);

p = prevalência esperada de mulheres que receberam ações de TA no serviço avaliado (p = 0,5);

q = prevalência esperada de mulheres que não receberam ações de TA no serviço avaliado (p = 1 -p = 1 - 0,5 = 0,5);

d = erro amostral (d = 0,05);

N = Número total de prontuários encontrados de pacientes mulheres nos anos de 2018 e 2019 no setor de Neurologia, Oncologia e Psiquiatria (N = 74, 151 e 33, respectivamente; totalizando uma população de 258 pacientes).

Considerando o nível de significância de 95%, a margem de erro na estimativa de 5%, a prevalência esperada de 50% para pacientes que receberam ações de TA e o número total de 258 prontuários nos anos de 2018 e 2019, tem-se o total de 155 prontuários para composição da amostra deste estudo.

A coleta ocorreu de forma estratificada, na qual o número de prontuários em cada serviço foi proporcional ao número total de prontuários cadastrados no serviço. Sendo assim, os números de prontuários para cada serviço foram: 44 da Neurologia, 91 da Oncologia e 20 da Psiquiatria. A seleção da amostra em cada estrato ocorreu de forma aleatória até completar o número de prontuários para cada setor (Arango, 2001Arango, H. G. (2001). Bioestatística teórica e computacional. In H. G. Arango, Bioestatística teórica e computacional (pp. 235-235). Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.).

A aproximação com os dados dos prontuários foi iniciada por meio do Setor de Gestão de Processos e Tecnologia da Informação (SGPTI) – Sistemas Master Tools, os quais foram encaminhados para o pesquisador principal; foi realizada uma triagem pelos censos de atendimento dos terapeutas ocupacionais do arquivo da chefia do setor e, em seguida, a lista de pacientes foi direcionada para Serviço de Arquivo Médico e Estatístico (Same) para separação e seleção dos prontuários.

Os dados coletados foram transcritos e exportados para planilha eletrônica do Microsoft Excel, tabulados e analisados por meio de estatística descritiva (criação de tabelas e valores percentuais). Em seguida, realizadas as operações de separação de números, porcentagens, gráficas e reagrupamentos analógicos conforme os objetivos do estudo.

Resultados

Os achados nos 155 prontuários revelaram que a maioria das mulheres avaliadas possui idade média de 52,01 ±15,55 anos. As características sociodemográficas da linha de base das participantes estão descritas na Tabela 1. Destaca-se que todos os resultados estão apresentados em porcentagem.

Tabela 1
Caracterização do perfil sociodemográfico e econômico das pacientes internadas nos anos de 2018 e 2019.

A Tabela 2 apresenta a caracterização das ações em TA, categorizadas por enfermaria: oncologia, neurologia e psiquiatria. Não foram encontrados uso de TA no setor de psiquiatria; portanto, os dados adiante passam a ser de 135 prontuários, sendo identificadas 48 intervenções dos terapeutas ocupacionais utilizando TA. O único profissional, além do terapeuta ocupacional, que prescreveu TA foi o enfermeiro, no setor da Oncologia.

Tabela 2
Caracterização do rastreamento de ações em TA nas enfermarias.

Quanto à prescrição da TA, verifica-se que a maioria foi realizada exclusivamente por terapeutas ocupacionais (oncologia 96%/ neurologia 100%), com destaque para os seguintes serviços: avaliação (oncologia 83%/ neurologia 89%), prescrição e confecção (oncologia 87%/ neurologia 63%), orientação de uso (100% nos dois setores) e treino (oncologia 21%/ neurologia 47%).

Dentre os dispositivos assistivos utilizados, enfatizam-se os auxílios para: AVD (oncologia 12%/ neurologia 50%), Coxim (oncologia 76%/ neurologia 6%), Dispositivo de Posicionamento (oncologia 12%/ neurologia 50%), Auxílios de mobilidade (oncologia 12%/ neurologia 6%). Além disso, ressalta-se que, de todas as TA utilizadas nos setores, os recursos e serviços de órtese de MMSS (28%) e o auxílio de mobilidade (6%) foram utilizados apenas no setor de Neurologia.

Com base nas informações apresentadas, há evidências de que, para as intervenções de TA na oncologia, a maioria requer de 1 a 2 consultas (21/67%), enquanto na neurologia a maioria requer 1 consulta (42%) e alguns mais de 4 consultas (26%). Utilizados exclusivamente no ambiente hospitalar de dois setores (Oncologia 100% / Neurologia 95%) e composto por materiais de baixo custo (Oncologia 87% / Neurologia 84%), portanto, individualizada – totalmente sob medida (Oncologia 87% / Neurologia 65%).

No que se refere às finalidades dos dispositivos assistivos utilizados nas intervenções, há predominância na melhoria de desempenho na AVD (alimentação/ banho) e posicionamento (27%); porém, outros objetivos foram encontrados, como melhora de edema (14%), medida de conforto (12%), melhora de queixa álgica (8%), estabilização e posicionamento de MMSS e motricidade fina (8%), melhoria na mobilidade funcional (2%) e melhoria no desempenho ocupacional na atividade significativa (2%), conforme descritos na Figura 2.

Figura 2
Distribuição de finalidades dos dispositivos assistivos utilizados nas intervenções. Fonte: Autores.

Os dispositivos para melhora de edema e queixa álgica e melhoria de motricidade fina, apesar de não serem identificados como TA, mas sim como tecnologia de reabilitação, fizeram parte desta pesquisa, visto que os profissionais assim os classificaram nos prontuários.

No que concerne à comparação entre os dispositivos assistivos utilizados nas intervenções e o diagnóstico das participantes (Tabela 3), percebe-se que há predominância do uso de coxim para outras doenças oncológicas (21%), além de câncer de mama e câncer de colo de útero (17%). Bem como o uso de dispositivo assistivo para alimentação e/ou banho (37%) e órtese de MMSS (21%) para outras patologias neurológicas (como descrito na nota de rodapé da Tabela 3).

Tabela 3
TA na Enfermaria de Oncologia e Neurologia por diagnóstico.

Discussão

Conforme os dados coletados, a média de idade das participantes foi de 52 ±15 anos, o que se observou coerente em relação ao que apontam outros autores, sugerindo que fatores hormonais, genéticos, ambientais e até idiopáticos predispõem as mulheres à doença. Segundo estimativas, 10% a 20% do público feminino com mais de 50 anos apresenta risco aumentado de desenvolver câncer e/ou um ou mais distúrbios neurológicos, em razão de alterações biológicas e/ou exposição cumulativa, ao longo da vida, aos fatores predisponentes (Silva & Silva, 2005Silva, M. M., & Silva, V. H. (2005). Envelhecimento: importante fator de risco para o câncer. Arquivos médicos do ABC,30(1), 11-18.; Organização Mundial da Saúde, 2020bOrganização Mundial da Saúde – OMS. (2020b). Health topics. Breast cancer: prevention and control. Geneva: WHO. Recuperado em 13 de maio de 2021, de https://www.who.int/cancer/detection/breastcancer/en/
https://www.who.int/cancer/detection/bre...
).

Quanto ao perfil sociodemográfico das participantes avaliadas, quando se vincula tais variáveis, como raça, etnia e situação de vulnerabilidade econômica, aos fatores de adoecimento, percebe-se que essas condições ocasionam maior dificuldade de acesso aos serviços de saúde, como medida preventiva, o que, consequentemente, acarreta diagnósticos tardios e diminuição de tratamentos de doenças. Diante desse pressuposto, estudos mostram que entre 5% a 15% das pessoas que precisam de produtos assistivos são de países com níveis de baixa e média renda (Brasil, 2004Brasil. (2004). Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: princípios e diretrizes. Brasília: Ministério da Saúde.; Sugawara et al., 2018Sugawara, A. T., Ramos, V. D., Alfieri, F. M., & Battistella, L. R. (2018). Abandonment of assistive products: assessing abandonment levels and factors that impact on it. Disability and Rehabilitation. Assistive Technology, 13(7), 716-723.).

No que se refere aos diagnósticos, predomina a presença de variados tipos de doenças neurológicas (22%), câncer de mama (16%), outras doenças oncológicas (13%) e câncer de colo de útero (9%). Estudos indicam que há um predomínio no público feminino de ser acarretado por patologias que causam limitação funcional (Kjeken et al., 2005Kjeken, I., Dagfinrud, H., Slatkowsky-Christensen, B., Mowinckel, P., Uhlig, T., Kvien, T. K., & Finset, A. (2005). Activity limitations and participation restrictions in women with hand osteoarthritis: patients’ descriptions and associations between dimensions of functioning. Annals of the Rheumatic Diseases, 64(11), 1633-1638.; Paula, 2017Paula, P. M. D. S. (2017). Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: funcionalidade para pessoas com artrite reumatoide (Dissertação de mestrado). Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, São José do Rio Preto.; Amaral, 2016Amaral, D. S. (2016). Dispositivos de assistência no tratamento não farmacológico da osteoartrite de mãos (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Pernambuco, Recife.).

Ao analisar esses adoecimentos, nota-se que a neuropatologia é considerada altamente incapacitante e necessita de suporte para as atividades diárias. Quando se trata de doenças oncológicas, a incapacidade está relacionada principalmente ao seu tratamento e pode levar à insônia, anorexia, repouso no leito, perda do convívio social, redução das atividades profissionais e recreativas, e aumento dos sintomas álgicos (Pimenta et al., 1997Pimenta, C. A. M., Koizumi, M. S., & Teixeira, M. J. (1997). Dor no doente com câncer: características e controle. Revista Brasileira de Cancerologia, 43(1), 21-44.). As complicações relacionadas ao desempenho das AVD e papéis ocupacionais são proeminentes nesse contexto, levando-nos a referir o conceito de funcionalidade, o qual, segundo a Organização Mundial da Saúde (2008)Organização Mundial da Saúde – OMS. (2008). Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo: EDUSP., abrange áreas baseadas em uma perspectiva corporal, do indivíduo e da sociedade (Carvalho, 2013).

Com base nesse pressuposto, no contexto hospitalar, o foco da assistência tende a ser o tratamento do problema agudo e a manutenção de habilidades afetadas, as quais podem sofrer efeitos deletérios exacerbados no período de internação, afetando significativamente o cotidiano e autonomia das pacientes, quando não identificados, tratados ou prevenidos precocemente (Quadro Dorneles et al., 2014Quadro Dorneles, S., Signori, L. U., Corrêa, L. Q., Silveira, D. F., Guerreiro, L. F., & Oliveira Teixeira, A. (2014). Efeitos da hospitalização na capacidade funcional e na qualidade de vida de pacientes cardiometabólicos. Conscientiae Saúde, 13(1), 101-109.).

Diante disso, vale ressaltar que a TA pode ser configurada como uma das estratégias utilizadas para favorecer o desempenho ocupacional do paciente hospitalizado, sendo reconhecida como elemento fundamental na reabilitação e inclusão social, promovendo a funcionalidade, a melhoria da independência e da autonomia de pessoas com deficiência, incapacidade ou mobilidade reduzida (Mendonça, 2012Mendonça, K. N. N. (2012). Conhecimento e utilização de equipamentos de tecnologia assistiva pelos terapeutas ocupacionais do Distrito Federal (Trabalho de Conclusão de Curso). Universidade de Brasília, Brasília.).

Nesse contexto, Bauer et al. (2011)Bauer, S. M., Elsaesser, L. J., & Arthanat, S. (2011). Assistive technology device classification based upon the World Health Organization’s, International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF). Disability and Rehabilitation. Assistive Technology, 6(3), 243-259. declaram que estudos realizados mostram que a TA se apresenta como ferramenta facilitadora para recuperar a funcionalidade, melhorar o desempenho ocupacional, posicionamento, estabilização e entre outras finalidades, principalmente quando utilizadas no ambiente hospitalar, validando, assim, os dados encontrados neste estudo.

Consequentemente, quando se correlaciona os diagnósticos de neuropatologias e os dispositivos utilizados para esses pacientes, o que se evidencia são os dispositivos de auxílio para AVD e órteses de MMSS, como mostrado no estudo de Amaral et al. (2017), oAmaral, D., Sanguinetti, D., da Silva, J., Caldas, P., da Costa, J., & Cabral, A. (2017). Tecnologia assistiva em 3D para pessoas com déficit de função manual por doença de parkinson/Assistive Technology in 3d for people with manual function deficit in parkinson's disease. Revista Interinstitucional Brasileira de Terapia Ocupacional - REVISBRATO,1(4), 465-474. qual teve como objeto de estudo as pessoas com doença de Parkinson e intervenções com utensílios usados nas AVD. Isso também se observou no estudo de Bez et al. (2021)Bez, L. R., Machado, J. C., Beirão, M. E., Santina, M. M., Cardozo, P. S., & Silveira, M. C. D. (2021). Órteses para membro superior e seu papel na reabilitação do paciente pós-acidente vascular cerebral (AVC) (pp. 98-109). In B. M. Bom, L. Alves, L. B. Ceretta, M. Tessmann, & P. S. Cardozo (Orgs.), Atenção à saúde na deficiência física e intelectual. Criciúma: UNESC. http://dx.doi.org/10.18616/saudef05.
http://dx.doi.org/10.18616/saudef05...
, que pesquisou como doença base o AVC no uso de órtese de MMSS, e no estudo de Rodrigues et al. (2015)Rodrigues, T. C. D. L., Marcelino, J. F. D. Q., & Nóbrega, K. B. G. (2015). Tecnologia assistiva na atuação terapêutica ocupacional com uma criança com doença degenerativa do sistema nervoso central. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, 23(2), 417-426., que mostrou o uso de órteses e utensílios para AVD por pessoas com doença degenerativa do sistema nervoso central. Dessa forma, tais resultados corroboram os achados deste estudo.

Entretanto, quando realizada a relação entre as patologias oncológicas e o uso da TA, foi possível identificar nos estudos brasileiros o uso de Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA) (Santos Araújo et al., 2018Santos Araújo, G., Paulo, Á. M. F., Neta, H. H. S., Costa, L. B., Santos, S. N. D. S. F., & Lima, I. L. B. (2018). Benefícios da tecnologia de comunicação aumentativa e alternativa em pacientes oncológicos. Revista Saúde & Ciência Online, 7(2), 145-156.), área da TA que não apareceu na presente pesquisa. Porém, quanto ao uso do coxim, prevalente na presente pesquisa, outros estudos apresentaram seu uso para pacientes internados em UTI e/ou com o diagnóstico de COVID-19 e da ala geriátrica (Marins, 2011Marins, S. C. F. (2011). Design Universal, acessibilidade e tecnologia assistiva: a formação profissional do terapeuta ocupacional na perspectiva da equidade (Tese de doutorado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos.; Santos et al., 2020Santos, N., Brito, J., Nascimento, L., Belo, A., Santos, D. D., Cavalcanti, G. L., & Silva, T. (2020). Plano de ação institucional de terapeutas ocupacionais de um hospital escola de Pernambuco frente a pandemia de COVID-19/Institutional action plan of occupational therapists from at Pernambuco school hospital in front of the COVID-19 pandemic. Revista Interinstitucional Brasileira de Terapia Ocupacional-REVISBRATO, 4(3), 389-396.; Marcelino, 2020Marcelino, M. (2020). Hospital de Clínicas cria órteses de coxins para ajudar no posicionamento dos pacientes acamados. Recuperado em 15 de outubro de 2021, de https://agenciapara.com.br/noticia/19902/hospital-de-clinicas-cria-orteses-de-coxins-para-ajudar-no-posicionamento-dos-pacientes-acamados
https://agenciapara.com.br/noticia/19902...
; Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, 2021Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – EBSERH. (2021). Enfermeiras adaptam coxins para prevenir lesões de pele e contribuem com a sustentabilidade do CH-UFC. Recuperado em 5 de fevereiro de 2020, de https://www.gov.br/ebserh/pt-br/hospitais-universitarios/regiao-nordeste/ch ufc/comunicacao/noticias/enfermeiras-adaptam-coxins-para-prevenir-lesoes-de-pele-e-contribuem-com-a-sustentabilidade-do-ch-ufc
https://www.gov.br/ebserh/pt-br/hospitai...
).

Em face do exposto, quando colocado em paralelo o quadro clínico dos pacientes que fizeram uso dos coxins e os pacientes oncológicos em fase média ou avançada do tratamento, somados ao internamento hospitalar, pode-se encontrar alguns sinais e sintomas que a literatura demonstra em outros estudos que se equivalem, sendo eles: edema, queixa álgica, lesão por pressão (LP), incontinência, permanência prolongada em repouso no leito, dificuldade de realizar sedestação e diminuição da flexibilidade articular (Brasil, 2020Brasil. (2020). Protocolo de manejo clínico da Covid-19 na Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde.; Lima et al., 2013Lima, A. D. D., Maia, I. D. O., Costa Junior, I., Lima, J. T. D. O., & Lima, L. C. (2013). Avaliação da dor em pacientes oncológicos internados em um hospital escola do Nordeste do Brasil. Revista Dor, 14(4), 267-271.; Mello et al., 2021Mello, I. R., Guimarães, N. M. J., Monteiro, L. S., & Taets, G. C. C. (2021). Cluster de sintomas e o impacto na qualidade de saúde global de pacientes com câncer avançado. Revista Brasileira de Cancerologia, 67(3), 1-8.).

Associado a tais fatores, como demonstrado nos resultados do presente estudo, pode-se colocar os objetivos de utilização de tais recursos, sendo eles: melhoria no posicionamento, redução de edema, medida de conforto, melhora do quadro álgico, entre outras, como os dados do presente estudo demonstram. Portanto, com base nos pontos supracitados, justifica-se a utilização de tais recursos com o público oncológico, principalmente quando associados à finalidade da utilização dos coxins.

Conforme mencionado nos resultados, também foram identificados outros dispositivos de TA com objetivos voltados para a reabilitação. Segundo Bersch (2017)Bersch, R. (2017). Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Assistiva: Tecnologia e Educação. Recuperado em 30 de abril de 2021, de http://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_Assistiva.pdf
http://www.assistiva.com.br/Introducao_T...
, deve-se diferenciar a TA de outras tecnologias, como aquelas relacionadas à área médica e de reabilitação. Esse tipo de tecnologia visa facilitar e qualificar a atuação profissional, seja na avaliação ou na intervenção terapêutica.

Vale ressaltar que tais recursos citados anteriormente são predominantemente de baixo custo, sendo confeccionados pelos terapeutas ocupacionais, pois o serviço não tem disponível em seu arsenal de insumos os materiais necessários para confecção de recursos de alto custo. De acordo com Françani et al. (2009), a TA de baixo custo se mostrou eficaz para indivíduos com limitações funcionais, auxiliando a melhora de sua autonomia.

Bersch (2017)Bersch, R. (2017). Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Assistiva: Tecnologia e Educação. Recuperado em 30 de abril de 2021, de http://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_Assistiva.pdf
http://www.assistiva.com.br/Introducao_T...
e García (2017) afirmamGarcía, J. (2017). Livro Branco da Tecnologia Assistiva no Brasil. São Paulo: Instituto de Tecnologia Social–ITS BRASIL. que, para realizar algum serviço de TA, o profissional deve fazer a avaliação, a seleção do dispositivo adequado, a orientação e o treino de uso do recurso, o que corrobora as intervenções deste estudo. No entanto, outras evidências ressaltam ainda a necessidade de acompanhamento durante a implementação e adaptação, as reavaliações e os ajustes que forem necessários (Silva & Carraretto, 2021Silva, M. N. C., & Carraretto, C. P. (2021). Percepção dos profissionais sobre a utilização da tecnologia assistiva de baixo custo na unidade de terapia intensiva adulto: um olhar do terapeuta ocupacional. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, 13(5), 123-138.; Bersch, 2017Bersch, R. (2017). Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Assistiva: Tecnologia e Educação. Recuperado em 30 de abril de 2021, de http://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_Assistiva.pdf
http://www.assistiva.com.br/Introducao_T...
). Isso não foi realizado com o público-alvo desta pesquisa, provavelmente como consequência da alta rotatividade das internações nos setores avaliados, a qual foi evidenciada na quantidade de atendimentos realizados neste estudo; descontinuidade do acompanhamento pela rede de atenção à saúde após alta hospitalar; e carência de conhecimento técnico relacionado à TA por outros profissionais de saúde, afetando diretamente a assistência ofertada, que deveria ocorrer de forma multiprofissional (Silva & Carraretto, 2021Silva, M. N. C., & Carraretto, C. P. (2021). Percepção dos profissionais sobre a utilização da tecnologia assistiva de baixo custo na unidade de terapia intensiva adulto: um olhar do terapeuta ocupacional. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, 13(5), 123-138.).

Por essa razão, no que concerne à equipe de saúde, o uso de TA sofre impactos relevantes marcados pela desarticulação intra-hospitalar quanto ao estímulo à prescrição compartilhada, aos encaminhamentos e à conscientização da necessidade desse serviço. Dessa forma, há a ausência de treino e/ou adaptações realizadas preponderantemente durante o acompanhamento, o que leva ao uso inadequado ou ao desconhecimento deste. Isso pode causar frustração ou aborrecimento no indivíduo, exacerbado pela dificuldade de aceitação e imaturidade, gerando abandono e renúncia da TA, bem como a perda de tempo de serviço que o profissional direciona para realizar desde a confecção até a intervenção (Missio & Queiroz, 2018Missio, M. M., & Queiroz, L. F. (2018). Tecnologias assistivas: aspectos que influenciam na assiduidade e no abandono dos recursos. Acta Fisiátrica,25(4), 185-190.).

Se o usuário não for contemplado com todos os procedimentos do serviço em TA, que culminam em receber a TA com devido treinamento, ser acompanhado e obter sucesso no uso da TA, o risco da descontinuidade do uso aumentará, o que pode causar prejuízos financeiros para o sistema público, usuário e equipe (World Health Organization & United Nations Children’s Fund, 2022World Health Organization & United Nations Children’s Fund. (2022). Global report on assistive technology. Geneva: WHO; UNICEF. Recuperado em 8 de maio de 2023, de https://www.who.int/publications/i/item/97892400494
https://www.who.int/publications/i/item/...
).

Dessa forma, torna-se importante estruturar um sistema de prestação de serviços que envolva o uso de protocolos de reabilitação multidisciplinar adaptado às necessidades dos pacientes (García, 2017García, J. (2017). Livro Branco da Tecnologia Assistiva no Brasil. São Paulo: Instituto de Tecnologia Social–ITS BRASIL.). Portanto, é necessário garantir que os processos de avaliação, prescrição, dispensação e, principalmente, de acompanhamento, sejam realizados por uma equipe multidisciplinar de profissionais qualificados (fortalecendo a importância da educação continuada).

Conclusão

No Serviço de Tecnologia Assistiva realizado por terapeutas ocupacionais nas enfermarias de Oncologia e Neurologia, as fases mais prevalentes foram as de avaliação, prescrição e confecção, o que apontou para a necessidade de um maior investimento em estratégias, no contexto hospitalar, na fase do acompanhamento do uso dos produtos assistivos.

Quanto aos dispositivos, evidenciou-se os de auxílio para AVD e órteses de MMSS no setor de neurologia e o coxim no setor de oncologia, tendo como intuito a melhoria no desempenho ocupacional, posicionamento e medida de conforto. Evidenciou-se, também, a importância da assistência prestada utilizando a TA nas intervenções pelos terapeutas ocupacionais e a urgência do aumento do conhecimento da equipe multiprofissional quanto a essa temática.

Como limitações do estudo, pode-se apontar a ausência do profissional de terapia ocupacional em diversas clínicas onde poderia haver intervenção em TA, consequente ao quadro reduzido de terapeutas ocupacionais no hospital. O limite de acesso aos prontuários estabelecido pelo SAME associado ao período de coleta do Programa da Residência impactou o tamanho da amostra.

Destaca-se que é essencial ampliar os estudos voltados aos pacientes hospitalizados em enfermaria que se beneficiam grandemente das intervenções prestadas em Tecnologia Assistiva. Ressalta-se, ainda, a importância de se ampliar os investimentos em educação continuada para a equipe assistencial e, em conjunto, a aquisição de insumos para os recursos de alto custo ofertados aos pacientes, o que pode ser avaliado e indicado de acordo com o intuito e necessidade do paciente.

  • 1
    Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da UFPE, sob parecer de nº 4.690.920, sendo resultado do Trabalho de Conclusão de Residência (TCR) do Programa de Residência Multiprofissional Integrado em Saúde do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco.
  • Como citar: Cipriano, A. S., Marcelino, J. F. Q., Nascimento, L. S., Lacerda, A. M., & Sanguinetti, D. C. M. (2023). Ações em tecnologia assistiva com mulheres hospitalizadas. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 31, e3339. https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO255933391

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Editado por

Editora de seção

Profa. Dra. Luzia Iara Pfeifer

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2022
  • Revisado
    12 Abr 2023
  • Aceito
    29 Ago 2023
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