Resumo
O objetivo deste artigo é levantar as características demográficas dos prefeitos eleitos, enfatizando os candidatos que se declaram empresários, e analisar se esse perfil tem melhores resultados quanto ao desempenho, medidos com base na situação fiscal e no Índice de Educação Básica (IDEB) do município. Para tanto, o trabalho foi dividido em duas partes. Na primeira, por meio de regressão logística, buscou-se encontrar o perfil do candidato eleito, centrando-se no fato de ele ser empresário. Na segunda seção do artigo, com o emprego da metodologia de regressão multinível, foi analisado se tal perfil escolhido pelos eleitores era responsável por um desempenho superior. Com relação aos resultados, apesar de os empresários constituírem a maioria entre os candidatos, essa característica não foi significativa para o sucesso eleitoral. Na segunda parte da pesquisa, de modo geral os resultados não encontraram correlação entre o perfil dos eleitos e o desempenho da gestão municipal. Somente a idade do prefeito foi significativa na questão fiscal dos municípios. Dessa forma, os empresários não apresentam resultados diferentes da média, o que permite pressupor que esse grupo não tem melhores habilidades e julgamentos.
Palavras-chave:
prefeito; empresário; resultado fiscal; gestão municipal
Resumen
El objetivo de este artículo es sondear las características demográficas de los alcaldes electos elegidos, con énfasis en los candidatos que se declaran emprendedores, y analizar si este perfil tiene mejores resultados de desempeño, medido por la situación fiscal del municipio y el puntaje del IDEB (Índice de Desarrollo de la Educación Básica). Para ello, el trabajo se dividió en dos partes. En la primera, mediante regresión logística, se buscó encontrar el perfil del candidato elegido. En la segunda parte del artículo se analizó si el perfil elegido por los votantes era responsable de un desempeño superior. La metodología utilizada fue la de regresión multinivel. En cuanto a los resultados, a pesar de que los empresarios fueron mayoría entre los candidatos, esta característica no fue significativa para explicar el éxito electoral. En general, en la segunda parte de la investigación, los resultados no demostraron correlación entre el perfil de los elegidos y el desempeño de la gestión municipal. Solo la edad del alcalde fue significativa para explicar el tema fiscal de los municipios. De esta forma, los emprendedores no presentan resultados diferentes a la media, lo que nos permite concluir que este grupo no tiene mejores habilidades y juicios. Entre las limitaciones de este trabajo, está la cuestión de que la variable “emprendedor” haya sido declarada libremente por los candidatos.
Palabras clave:
alcalde; empresario; resultado fiscal; gestión municipal
Abstract
This study analyzes the demographic characteristics of elected mayors in Brazil, emphasizing those who are business owners. The research observes whether mayors with a background as business owners obtain better performance in office, which is evaluated through the municipality’s fiscal situation and the IDEB (basic education development index) score. The research was conducted in two parts. The first part used logistic regression and sought to identify the profile of elected mayors. The second part analyzed whether mayors who were business owners obtained a superior performance using the multilevel regression model. The study observed that the majority of mayors had a background as business owners, but this characteristic was not significant to explain electoral success. The results of the second part did not find a correlation between mayors who are business owners and their performance. The only demographic characteristic relevant to explain differences in municipalities’ fiscal results was the mayor’s age. Therefore, mayors who were business owners did not present results different from those who have other backgrounds, which allows us to assume that this group does not have better skills and judgments. One of the limitations of this study is that the characteristic of being a business owner was obtained by self-declaration.
Keywords:
mayor; business owner; fiscal result; municipal management
1. INTRODUÇÃO
O papel das eleições na democracia é possibilitar aos eleitores escolher entre as melhores ideias e propostas. No processo eleitoral, os candidatos e os partidos expõem suas propostas e explicam de que forma elas ajudarão a melhorar o bem-estar dos cidadãos. Assim, os eleitores analisam e escolhem dentre as ideias propostas e quem vai colocá-las em prática (Przeworski, Stokes, & Manin, 1999Przeworski, A., Stokes, S. C., & Manin, B. (1999). Democracy, accountability, and representation(Vol. 2). Cambridge, UK: Cambridge University Press.). Dessa perspectiva, o processo de seleção ocorreria somente pela análise do debate político. Entretanto, vários trabalhos demonstram que características demográficas, partidárias e financeiras influenciam o resultado do pleito.
Com relação a essa temática, Marsh (2007Marsh, M. (2007). Candidates or Parties? Objects of Electoral Choice in Ireland. Party Politics, 13(4), 500-527. Recuperado dehttps://doi.org/10.1177/1354068807075944
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), por exemplo, discorre que o eleitor, na busca pela melhor opção de candidato, procura informações partidárias com o objetivo de definir o seu voto. Entretanto as características e atributos do candidato têm peso decisivo, uma vez que, na tomada de decisão, os votantes buscam informações do passado, o que os candidatos fizeram antes do pleito e, com base nisso, analisam o que eles poderiam fazer. Ao examinar as eleições americanas, Mondak e Huckfeldt (2006Mondak, J. J., & Huckfeldt, R. (2006). The accessibility and utility of candidate character in electoral decision making. Electoral Studies, 25(1), 20-34. Recuperado dehttps://doi.org/10.1016/j.electstud.2005.02.006
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) afirmam que a competência e a integridade dos postulantes ao cargo público são fatores relevantes para o sucesso do candidato e que os eleitores fazem avaliações com base em suas características.
No Brasil, vários trabalhos já discutiram a relação entre o sucesso eleitoral e as características do candidato (Codato, Cervi, & Perissinotto, 2013Codato, A., Cervi, E., & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, 14(2), 61-84.; L. D. Costa & Codato, 2012Costa, L. D., & Codato, A. (2012). Competição e profissionalização política: as eleições para deputado federal no Brasil em 2010. In Anais do 8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política, Porto Alegre, RS.; Dufloth, Horta, Silva, M. L. Costa, & Rocha, 2019Dufloth, S. C., Horta, C. J. G., Silva, M. M., Costa, M. L. M., & Rocha, M. S. (2019). Atributos e chances de sucesso eleitoral de prefeitos no Brasil. Revista de Administração Pública, 53(1), 214-234. Recuperado de https://doi.org/10.1590/0034-761220170241
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; Felisbino, Bernabel, & Kerbauy, 2012Felisbino, R. A., Bernabel, R. T., & Kerbauy, M. T. M. (2012). Somente um deve vencer: as bases de recrutamento dos candidatos à Prefeitura das capitais brasileiras em 2008. Revista de Sociologia e Política, 20(41), 219-234. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0104-44782012000100013
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). Tais pesquisas tiveram como objetivo apontar que atributos do candidato como idade, gênero, profissão, nível escolar, etc. são fatores relevantes para o êxito na eleição. Além dessas características, a profissão declarada pelos candidatos é um aspecto que merece atenção, uma vez que grande parte dos participantes do pleito declaram-se políticos e empresários, ou seja, funções ligadas à tomada de decisão.
Os eleitores, então, estariam em busca de candidatos com melhor capacidade para tomar decisões, ou seja, exercer o julgamento. Entretanto, segundo Downs (1957Downs, A. (1957). An economic theory of democracy. New York, NY: Harper.), a busca de informação envolve custos de procura, análise e avaliação. Esses custos, então, limitam um pleno conhecimento sobre as informações políticas. Assim, na tentativa de evitar esses custos, os eleitores desenvolvem atalhos ao longo do seu processo de decisão. Trata-se, portanto, de uma clara e estreita ligação com o que se chama de heurística de decisão. As heurísticas foram amplamente debatidas, como é o caso dos trabalhos sobre a possibilidade de viés (Kahneman, 2011Kahneman, D. (2011). Thinking, fast and slow. Nova York, NY: Macmillan.; Kahneman, S. P. Slovic, P. Slovic, & Tversky, 1982) e sobre o seu aspecto positivo (Gigerenzer, 2008Gigerenzer, G. (2008). Why heuristics work. Perspectives on psychological science, 3(1), 20-29. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008.00058.x
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). Sua aplicabilidade já foi analisada, por exemplo, no setor agrário (Gomes, Saes, Nunes, & Vilpoux, 2022Gomes, L. A. V., Saes, M. S. M., Nunes, R., & Vilpoux, O. F. (2022, maio). Heuristics and farm heterogeneity: Evidence from small-scale farmers in Brazil. Journal of Rural Studies, 92, 328-341. Recuperado dehttps://doi.org/10.1016/j.jrurstud.2022.04.010
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) e nas decisões de investimento (Shah, Ahmad, & Mahmood, 2018Shah, S. Z. A., Ahmad, M., & Mahmood, F. (2018). Heuristic biases in investment decision-making and perceived market efficiency: A survey at the Pakistan stock exchange. Qualitative Research in Financial Markets, 10(1), 85-110. Recuperado dehttps://doi.org/10.1108/QRFM-04-2017-0033
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). No campo político, por exemplo, os trabalhos de Ottati (1990Ottati, V. C. (1990). Determinants of political judgments: The joint influence of normative and heuristic rules of inference. Political Behavior, 12(2), 159-179. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/BF00992467
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) e Riggle, Ottati, Wyer, Kuklinski, e Schwarz (1992Riggle, E. D., Ottati, V. C., Wyer, R. S., Kuklinski, J., & Schwarz, N. (1992). Bases of political judgments: The role of stereotypic and nonstereotypic information. Political Behavior, 14(1), 67-87. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/BF00993509
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) já investigaram o papel das heurísticas na decisão do eleitor.
Na perspectiva política, os eleitores buscam candidatos com maior capacidade de julgamento, ou seja, políticos que tenham maior capacidade de tomar decisão. A abordagem teórica que trata sobre o julgamento é denominada judgment-based view (JBA). Nessa abordagem, Foss e Klein (2018Foss, N. J., Klein, P. G., & Bjørnskov, C. (2018). The context of entrepreneurial judgment: organizations, markets, and institutions. Journal of Management Studies, 56(6), 1197-1213. Recuperado dehttps://doi.org/10.1111/joms.12428
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) argumentam que o empreendedor combina os diversos recursos heterogêneos, em condições de incerteza, com o objetivo de obter lucro. O julgamento do empreendedor diz respeito às decisões que são tomadas sem um modelo formal ou racional que lhe garanta uma decisão ótima. Nesse contexto, partindo de um mesmo conjunto de dados, diferentes empreendedores poderiam tomar diferentes decisões. O julgamento pode ser exercido em diversos contextos e ambientes, e não necessariamente em uma startup (Foss & Klein, 2018Foss, N. J., & Klein, P. G. (2018). Entrepreneurial Opportunities: Who Needs Them? Academy of Management Perspectives, 34(3), 1-27. Recuperado dehttps://doi.org/10.5465/amp.2017.0181
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). Entretanto, no setor público, o resultado pretendido não seria a obtenção de lucro, mas a melhoria do bem-estar de algum aspecto da sociedade (Zerbinati & Souitaris, 2005Zerbinati, S., & Souitaris, V. (2005). Entrepreneurship in the public sector: a framework of analysis in European local governments. Entrepreneurship & regional development, 17(1), 43-64. Recuperado de https://doi.org/10.1080/0898562042000310723
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).
Nesse sentido, observa-se que os eleitores buscam, dentre diversos atributos, características passadas dos candidatos que estejam ligadas ao julgamento, mais precisamente capacidades, habilidades e conhecimentos que possam gerar resultados positivos. Pelo exposto, esta pesquisa pretende contribuir para a literatura de seleção política incluindo na análise o fato de o candidato ser empresário, já que essa é a segunda profissão mais declarada pelos postulantes. Todavia o foco principal do artigo é verificar se as heurísticas utilizadas pelos eleitores quanto à profissão dos candidatos corroboram os resultados de desempenho, isto é, o empresário teria resultados superiores na administração pública. Para tanto, por meio de regressão multinível, no artigo se analisará o desempenho dos prefeitos eleitos no período de 2013 a 2016, utilizando os indicadores superávit orçamentário e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) do munícipio.
Neste artigo, o texto está dividido da seguinte forma: a próxima seção, em que se discorre sobre o referencial teórico no qual se baseia a pesquisa, subdivide-se em “Seleção Eleitoral e Heurísticas do Eleitor” e “Judgment-Based View”. Na terceira seção, são apresentadas a metodologia, os dados e as variáveis utilizadas no estudo. Na quarta, são discutidos os resultados e, na quinta, as considerações finais.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Seleção eleitoral e heurísticas do eleitor
Na democracia representativa, as eleições designam-se à escolha dos melhores candidatos e propostas (Przeworski et al., 1999Przeworski, A., Stokes, S. C., & Manin, B. (1999). Democracy, accountability, and representation(Vol. 2). Cambridge, UK: Cambridge University Press.). O princípio da racionalidade limitada (Simon, 1959Simon, H. A. (1959). Theories of decision-making in economics and behavioral science. The American economic review, 49(3), 253-283.) é aplicado ao processo eleitoral: os votantes não conseguem prever todas as ações que o eleito tomará e, mais especificamente, se tais medidas lhes serão favoráveis. Dessa forma, o sucesso eleitoral está condicionado à criação de uma relação de confiança entre o candidato e o eleitorado. A confiabilidade, então, é um fator decisivo para se escolher em quem votar; afinal, trata-se de uma relação construída com base em diversos critérios. É preciso, no entanto, ressaltar que os eleitores não têm todas as informações necessárias nem não são capazes de processá-las para tomarem sua decisão (Mondak & Huckfeldt, 2006Mondak, J. J., & Huckfeldt, R. (2006). The accessibility and utility of candidate character in electoral decision making. Electoral Studies, 25(1), 20-34. Recuperado dehttps://doi.org/10.1016/j.electstud.2005.02.006
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).
Em uma das visões do processo de seleção eleitoral, os candidatos e os partidos elaboram e apresentam sua proposta de governo e explicam-na para os eleitores de modo a criar uma ligação entre as ações propostas e a melhoria de vida. Os votantes fazem sua escolha e os vencedores colocam as ideias apresentadas em prática (Przeworski et al., 1999Przeworski, A., Stokes, S. C., & Manin, B. (1999). Democracy, accountability, and representation(Vol. 2). Cambridge, UK: Cambridge University Press.). Contudo, dada a racionalidade limitada, os eleitores podem analisar fatores externos às propostas dos candidatos, conforme várias pesquisas já demonstraram, por exemplo, como as características demográficas são relevantes para o voto.
Dentro desse contexto, a escolha do candidato não é somente baseada nas propostas apresentadas. A complexidade do processo eleitoral e a racionalidade limitada dos eleitores levam-nos a tomar decisões considerando atalhos mentais conhecidos como heurísticas (Lago, 2008Lago, I. (2008). Rational expectations or heuristics? Strategic voting in proportional representation systems. Party Politics, 14(1), 31-49. Recuperado dehttps://doi.org/10.1177/1354068807083822
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). Tais comportamentos podem ser formados em virtude de características pessoais do candidato, experiências passadas, de maneira que o eleitor prevê o desempenho futuro com base em resultados anteriores (Kang, 2003Kang, M. S. (2003). Democratizing Direct Democracy: Restoring Voter Competence Through Heuristic Cues and Disclosure Plus. UCLA Law Review, 50, 1141-1188.). Esse processo ocorre de forma rápida e não é percebido pelos eleitores (Borgida, Federico, & Sullivan, 2009Borgida, E., Federico, C. M., & Sullivan, J. L. (2009). The political psychology of democratic citizenship. Oxford, UK: Oxford University Press.).
Na visão de Simon (1947Simon, H. A. (1947). Administrative Behavior. New York, NY: Macmillan.), as heurísticas podem ser entendidas como hábitos mentais que têm como finalidade simplificar o processo de tomada de decisão. Para Kahneman et. al. (1982Kahneman, D., Slovic, S. P., Slovic, P., & Tversky, A. (1982). Judgment under uncertainty: Heuristics and biases. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), elas são mecanismos que reduzem uma tarefa complexa que envolve avaliar probabilidade e predizer resultados em julgamentos mais simples. De forma geral, elas são úteis, todavia podem levar a erros. Mousavi e Gigerenzer (2017)Mousavi, S., & Gigerenzer, G. (2017). Heuristics are tools for uncertainty. Homo Oeconomicus, 34(4), 361-379. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s41412-017-0058-z
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as definem como a tomada de decisão sem que haja um completo levantamento de decisão e sem que cálculos probabilísticos sejam realizados. Os autores salientam que, apesar das heurísticas serem associadas em grande parte a uma estratégia inferior, podem ser benéficas em determinadas situações.
Dada a centralidade da assimetria de informação na tomada de decisão via heurística, Downs (1957Downs, A. (1957). An economic theory of democracy. New York, NY: Harper.) argumenta que, em um mundo onde houvesse perfeita informação, nenhuma pessoa poderia influenciar outra, já que cada indivíduo saberia qual proposta o beneficiaria mais. Assim, considerando que o pressuposto do pleno conhecimento não é realístico, isto é, que o conhecimento é imperfeito, os eleitores gastariam recursos escassos para superar tais limitações. Entre as consequências da assimetria informacional, estão a necessidade de persuasão e a possibilidade de os eleitores serem influenciados.
Os modelos heurísticos aplicados à seleção eleitoral, segundo Ottati (1990Ottati, V. C. (1990). Determinants of political judgments: The joint influence of normative and heuristic rules of inference. Political Behavior, 12(2), 159-179. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/BF00992467
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), consideram a influência de estereótipos. Assim, os eleitores levam em conta tais informações como meio de evitar custos cognitivos na avaliação de todas as informações para a tomada de decisão. Para esse mesmo autor, exemplos de estereótipo são: filiação partidária, raça, gênero, etc.; não se limitando, entretanto, a tais características. Dessa forma, quaisquer que sejam as heurísticas, elas são utilizadas para simplificar o julgamento. Dessa perspectiva, o trabalho de Riggle et. al. (1992Riggle, E. D., Ottati, V. C., Wyer, R. S., Kuklinski, J., & Schwarz, N. (1992). Bases of political judgments: The role of stereotypic and nonstereotypic information. Political Behavior, 14(1), 67-87. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/BF00993509
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) demonstrou que os eleitores, quando chamados a elaborar um julgamento de dois candidatos, anteciparam a dificuldade de efetuar a comparação e fizeram o julgamento considerando o estereótipo dos candidatos.
Parte da literatura trata as heurísticas como sendo um viés. Kahneman et. al. (1982Kahneman, D., Slovic, S. P., Slovic, P., & Tversky, A. (1982). Judgment under uncertainty: Heuristics and biases. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), por exemplo, salientam que, de forma geral, elas são úteis, mas podem levar a erros. A confiança nas heurísticas pode provocar vieses previsíveis e, muitas vezes, graves (Kahneman, 2011Kahneman, D., Slovic, S. P., Slovic, P., & Tversky, A. (1982). Judgment under uncertainty: Heuristics and biases. Cambridge, UK: Cambridge University Press.). Alguns autores, no entanto, enfatizam o seu lado positivo: Gigerenzer (2008Gigerenzer, G. (2008). Why heuristics work. Perspectives on psychological science, 3(1), 20-29. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008.00058.x
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) argumenta que as heurísticas funcionam, pois se utilizam de capacidades que são obtidas gratuitamente; além disso, ajudam na resolução de problemas em que não há possibilidade de utilizar a lógica ou a probabilidade. Desse modo, elas foram customizadas para a resolução de determinados problemas.
As heurísticas podem ser um mecanismo que explique por que certas características demográficas são significativas a ponto de um eleitor julgar que um candidato é mais competente para o cargo. Lau e Redlawsk (2001Lau, R. R., & Redlawsk, D. P. (2001). Advantages and disadvantages of cognitive heuristics in political decision making. American Journal of Political Science, 45(4), 951-971. Recuperado dehttps://doi.org/10.2307/2669334
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) identificaram cinco tipos de heurísticas que podem influenciar a escolha do eleitor. As duas primeiras referem-se à filiação partidária e à ideologia do candidato. Por exemplo, ser filiado ao partido republicano americano está associado à ideia de defender menores taxas de imposto; no caso de o candidato ser democrata, espera-se maior intervenção na economia. Outra heurística é o endosso. Isto é, o eleitor é influenciado pela posição de outros indivíduos ou grupos relevantes. As pesquisas eleitorais são outro tipo de heurística identificada. Por meio delas, os eleitores reduzem as alternativas, diminuindo o esforço cognitivo ao eliminar candidatos que julgam não terem chance. Por fim, a última heurística citada é a aparência do postulante ao cargo, o que significa que são considerados aspectos para além da vida política. Dessa forma, questões ligadas à vida social e profissional ganham peso, de modo que informações como gênero, raça e idade ativam estereótipos ligados a tais atributos.
No caso brasileiro, há vários estudos em que se pesquisou como as características demográficas dos candidatos influenciam nos resultados das eleições. Dufloth et al. (2019Dufloth, S. C., Horta, C. J. G., Silva, M. M., Costa, M. L. M., & Rocha, M. S. (2019). Atributos e chances de sucesso eleitoral de prefeitos no Brasil. Revista de Administração Pública, 53(1), 214-234. Recuperado de https://doi.org/10.1590/0034-761220170241
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), ao analisar as eleições para o executivo municipal, chegaram às seguintes conclusões: as mulheres têm menos chances de serem eleitas; em termos de escolaridade, ter um curso superior não afetou os resultados do pleito; no caso da profissão, verificou-se que ser político confere maior chance de eleição, apesar de os resultados, a depender do ano, apresentarem grande variabilidade. Também no âmbito do executivo municipal, Felisbino et al. (2012Felisbino, R. A., Bernabel, R. T., & Kerbauy, M. T. M. (2012). Somente um deve vencer: as bases de recrutamento dos candidatos à Prefeitura das capitais brasileiras em 2008. Revista de Sociologia e Política, 20(41), 219-234. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0104-44782012000100013
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) identificaram que a escolaridade não se mostrou relevante; ao contrário do gênero (no caso dos homens), de ser político, de ter maior gasto de campanha e de ter maior patrimônio: variáveis que aumentaram a probabilidade de eleição.
Na pesquisa de Codato et al. (2013Codato, A., Cervi, E., & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, 14(2), 61-84.), as variáveis políticas foram as mais relevantes para justificar o sucesso do candidato, como o partido de origem e a coligação. As variáveis pessoais como ser mais velho (idade) e mulher (gênero) reduziram as chances de sucesso. L. D. Costa e Codato (2012Costa, L. D., & Codato, A. (2012). Competição e profissionalização política: as eleições para deputado federal no Brasil em 2010. In Anais do 8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política, Porto Alegre, RS.) analisaram, nas eleições para deputado federal, o efeito de ser político profissional na probabilidade de ser eleito, e constataram uma relação significativa e positiva. Verificaram, também, que os políticos profissionais estão concentrados mais fortemente nos grandes partidos e arrecadam mais recursos de campanha.
Com relação à renda, à profissão dos candidatos e à visão dos eleitores sobre essas características, Carnes e Lupu (2015Carnes, N., & Lupu, N. (2015). Rethinking the comparative perspective on class and representation: Evidence from Latin America. American Journal of Political Science, 59(1), 1-18. Recuperado de https://doi.org/10.1111/ajps.12112
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, 2016) observam que, de forma geral, a posição financeira dos legisladores é consideravelmente superior à dos eleitores que os elegem. Eles descrevem que, em boa parte das democracias, há uma sub-representação da classe trabalhadora. Entretanto, em seu experimento, os eleitores não fizeram diferenciação entre candidatos do colarinho-branco e do colarinho-azul, contradizendo a visão comum de que a explicação para tal fenômeno se deve às preferências dos eleitores.
Ainda explorando os trabalhos de Carnes e Lupu (2015Carnes, N., & Lupu, N. (2015). Rethinking the comparative perspective on class and representation: Evidence from Latin America. American Journal of Political Science, 59(1), 1-18. Recuperado de https://doi.org/10.1111/ajps.12112
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, 2016Carnes, N., & Lupu, N. (2016). Do voters dislike working-class candidates? Voter biases and the descriptive underrepresentation of the working class. American Political Science Review, 110(4), 832-844. Recuperado dehttps://doi.org/10.1017/S0003055416000551
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), dado que os eleitores classificaram candidatos de classes diferentes como igualmente capazes, os autores presumiram que a baixa representação da classe trabalhadora é explicada pelo fato de que eles pensam que não têm possibilidade de Carnes encer as eleições e, dessa forma, não entram no pleito. Tal pensamento seria derivado de repórteres e analistas que propagam o viés de que os eleitores preferem os mais ricos. Outros fatores que podem explicar tal situação estão relacionados ao tempo e dinheiro necessários para a campanha, aos grupos de interesse organizados, às regras institucionais e às questões partidárias.
Dentro desse cenário, verifica-se que há altos custos para medir, ex-ante, o desempenho de todos os candidatos e, consequentemente, escolher aquele que teria o melhor desempenho. Tal situação leva o eleitor a utilizar determinadas heurísticas para definir o seu voto. Apesar dos vários trabalhos realizados, nenhum avançou a ponto de verificar se as características significativas para o sucesso no pleito eleitoral geram melhores resultados para a gestão pública, tampouco se analisou a questão da alta incidência de empresários na disputa pelo cargo. Assim, apresenta-se a seguinte hipótese para este trabalho:
Hipótese: Prefeitos que são empresários têm maior desempenho nas prefeituras.
2.2 Judgment-based view
O empreendedorismo é uma função do setor privado ou ele pode ser exercido no ambiente público? Segundo Foss e Klein (2012Foss, N. J., & Klein, P. G. (2012). Organizing entrepreneurial judgment: A new approach to the firm. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), essa função envolve uma série de agentes, mesmo aqueles que não estão nos mercados tradicionais, como gestores públicos e líderes de organizações filantrópicas. Assim, o julgamento pode ser exercido por diversos tipos de liderança, até mesmo por líderes carismáticos (Klein, 2008Klein, P. G. (2008). Opportunity discovery, entrepreneurial action, and economic organization. Strategic Entrepreneurship Journal, 2(3), 175-190. Recuperado dehttps://doi.org/10.1002/sej.50
https://doi.org/10.1002/sej.50...
).
O empreendedorismo como julgamento, segundo Foss e Klein (2005Foss, N. J., & Klein, P. G. (2005). Entrepreneurship and the economic theory of the firm: any gains from trade? In Z. J. Acs & D. B. Audretsch(Eds.), Handbook of entrepreneurship research(pp. 55-80). Boston, MA: Springer.), é a definição associada à linha de pensamento de Knight (1921Knight, F. H. (1921). Cost of production and price over long and short periods. Journal of Political Economy, 29(4), 304-335. Recuperado de https://doi.org/10.1086/253349
https://doi.org/10.1086/253349...
). Em sua obra Risk, Uncertainty and Profit, Knight (1921)Knight, F. H. (1921). Cost of production and price over long and short periods. Journal of Political Economy, 29(4), 304-335. Recuperado de https://doi.org/10.1086/253349
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apresenta a distinção entre risco e incerteza. Enquanto o risco pode ser medido, não há como fazê-lo no caso da incerteza. O empreendedor deve ter ciência sobre o nível de incerteza com que ele lida, confiando no seu próprio julgamento. Disso decorre o conhecimento sobre os poderes do empreendedor.
Na mesma linha knightiana, outra fundamental característica apontada pelo autor diz respeito à atividade empreendedora (de julgamento) ser de difícil mensuração. Em consequência, torna-se difícil remunerar o empreendedor por meio de um salário. Dadas essas circunstâncias, K. Foss, N. J. Foss, P. G. Klein, e S. K. Klein (2007Foss, K., Foss, N. J., Klein, P. G., & Klein, S. K. (2007). The entrepreneurial organization of heterogeneous capital. Journal of Management studies, 44(7), 1165-1186. Recuperado dehttps://doi.org/10.1111/j.1467-6486.2007.00724.x
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) argumentam que não há mercado para o julgamento, ou seja, tal habilidade não pode ser adquirida. Mesmo quando a tomada de decisão é realizada por consultores ou por pessoas ligadas a outras atividades correlatas, é correto afirmar que o empresário está exercendo seu julgamento, pois ele já tomou a decisão sobre trazer dado recurso para a empresa. Assim, infere-se que, na gestão pública, foi utilizado o julgamento quando da montagem da equipe de governo e de assessores.
A ideia de empreendedorismo público está ligada à busca de interesses comuns pela combinação e recombinação dos recursos públicos (Ostrom, 1990). A forma mais comum de empreendedorismo público é o ligado ao capitalismo de Estado, no qual o governo é proprietário de uma empresa, na forma de acionista majoritário ou minoritário, ou, ainda, quando o governo promove ações estratégicas com o objetivo de desenvolver uma indústria como um todo (Klein et al., 2010Klein, P. G., Mahoney, J. T., McGahan, A. M., & Pitelis, C. N. (2010). Toward a theory of public entrepreneurship. European management review, 7(1), 1-15. Recuperado dehttps://doi.org/10.1057/emr.2010.1
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; Musacchio, Lazzarini, & Aguilera, 2015Musacchio, A., Lazzarini, S. G., & Aguilera, R. V. (2015). New varieties of state capitalism: Strategic and governance implications. Academy of Management Perspectives, 29(1), 115-131. Recuperado dehttps://doi.org/10.5465/amp.2013.0094
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). Além dessa modalidade, Klein et al. (2010)Klein, P. G., Mahoney, J. T., McGahan, A. M., & Pitelis, C. N. (2010). Toward a theory of public entrepreneurship. European management review, 7(1), 1-15. Recuperado dehttps://doi.org/10.1057/emr.2010.1
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acrescenta mais três tipos de empreendedorismo público: aquele em que há alteração das regras institucionais; que apresenta gerência de novos recursos públicos - quando há a combinação e recombinação de recursos públicos já existentes para atingir um objetivo específico - e, por fim, no qual há aproveitamento de bens privados para o bem público, categoria na qual há uma busca de interesses públicos pelas empresas privadas.
Dada a ideia de combinação e recombinação dos recursos, pode-se dizer que o empreendedor público segue a linha de raciocínio de Barzel (1982Barzel, Y. (1982). Measurement cost and the organization of markets. The Journal of Law and Economics, 25(1), 27-48. Recuperado dehttp://dx.doi.org/10.1086/467005
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, 1997Barzel, Y. (1997). Economic analysis of property rights. Cambridge, UK: Cambridge University Press.). Nessa abordagem, os ativos devem ser vistos como um conjunto de atributos, ou seja, os recursos são heterogêneos. Os ativos que não foram especificados e criados estão em domínio público. Dessa forma, o papel do empreendedor é criar e descobrir novos atributos e tirá-los do domínio público. Entretanto, no setor público, o empreendedor não põe em risco o seu ativo (financeiro), pois seu prazo de atuação é curto (relacionado ao período do mandato) e sua coalização ou grupo de poder teriam a opção de buscar objetivos privados (Klein et al., 2010Klein, P. G., Mahoney, J. T., McGahan, A. M., & Pitelis, C. N. (2010). Toward a theory of public entrepreneurship. European management review, 7(1), 1-15. Recuperado dehttps://doi.org/10.1057/emr.2010.1
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). Ademais, esse tipo de empreendedorismo é classificado como derivado: não tem a propriedade do ativo, mas tem autoridade para tomar as decisões (Foss & Klein,2018Foss, N. J., Klein, P. G., & Bjørnskov, C. (2018). The context of entrepreneurial judgment: organizations, markets, and institutions. Journal of Management Studies, 56(6), 1197-1213. Recuperado dehttps://doi.org/10.1111/joms.12428
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; Klein et al., 2010Klein, P. G., Mahoney, J. T., McGahan, A. M., & Pitelis, C. N. (2010). Toward a theory of public entrepreneurship. European management review, 7(1), 1-15. Recuperado dehttps://doi.org/10.1057/emr.2010.1
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).
3. METODOLOGIA, DADOS E VARIÁVEIS
Para o desenvolvimento desta pesquisa, foi necessário dividi-la em duas etapas, visto que, apesar de haver uma série de estudos que analisaram as características demográficas como fator de sucesso eleitoral, nenhum deles focou no fato de o candidato e/ou prefeito ser empresário. Assim, na primeira etapa serão analisadas as características demográficas que são relevantes para o sucesso eleitoral; na segunda se investigará se as características que levaram ao sucesso eleitoral são relevantes para a obtenção de melhores desempenhos.
Para responder aos objetivos desta pesquisa, foi realizada uma análise de cunho quantitativo. Com esse fim, foram utilizados os modelos multinível de regressão para dados em painel. Na primeira parte, para a variável dependente “eleito”, foi utilizado o modelo multinível logístico; para a variável “% de votos”, foi utilizado o modelo multinível linear. Na segunda parte, para a variável dependente “superávit orçamentário”, utilizou-se o modelo multinível logístico, enquanto para as variáveis “relação superávit/Produto Interno Bruto (PIB)” e “IDEB” foi utilizado o modelo multinível linear. Para os modelos lineares, foi utilizado o método de estimação máxima de verossimilhança restrita. Essas variáveis de desempenho foram escolhidas com o intuito de abarcar a complexidade da administração pública e a multiplicidade de objetivos que poderiam ser almejados por cada governo. Nesse sentido, Alesina (1988Alesina, A. (1988). Credibility and policy convergence in a two-party system with rational voters. The American Economic Review, 78(4), 796-805.) pontua que diferenças nas políticas públicas surgem quando os partidos atuam conforme a sua ideologia e quando representam seus grupos eleitorais. Por exemplo, os governos de esquerda aumentam os gastos em educação e outros gastos socais (Gouvêa & Girardi, 2021Gouvêa, R., & Girardi, D. (2021, maio). Partisanship and local fiscal policy: Evidence from Brazilian cities. Journal of Development Economics, 150, 102637. https://doi.org/10.1016/j.jdeveco.2021.102637
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; Potrafke, 2011Potrafke, N. (2011). Does government ideology influence budget composition? Empirical evidence from OECD countries. Economics of Governance, 12(2), 101-134. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/s10101-010-0092-9
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). Dadas tais circunstâncias, foram escolhidas variáveis que medem diferentes espectros da gestão municipal. O software Stata foi utilizado para a realização das análises econométricas, e o nível de significância considerado foi de 5%.
Segundo Maas e Hox (2004Maas, C. J., & Hox, J. J. (2004). Robustness issues in multilevel regression analysis. Statistica Neerlandica, 58(2), 127-137. Recuperado de https://doi.org/10.1046/j.0039-0402.2003.00252.x
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), os modelos multiníveis são correlacionados a questões em que a população analisada está disposta em uma estrutura hierárquica, de forma que as observações estão circunscritas a grupos e subgrupos. Com esse modelo, segundo Fávero e Belfiore (2017Fávero, L. P., & Belfiore, P. (2017). Manual de análise de dados: estatística e modelagem multivariada com Excel®, SPSS® e Stata®. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier Brasil.), é possível identificar e analisar heterogeneidades de indivíduos, além de grupos e subgrupos dos quais esses indivíduos fazem parte, o que torna viável especificar componentes aleatórios em cada camada de análise. Para determinar a utilização desses modelos, foi analisado o teste de razão de verossimilhança, que compara os modelos multiníveis aos tradicionais de regressão.
O período de análise dos fatores determinantes para o sucesso eleitoral compreende a eleição municipal de 2012. Para o desempenho dos prefeitos eleitos, foi analisado o período de 2013 a 2016, e os indicadores utilizados foram o superávit orçamentário e o IDEB da rede de ensino administrada pela gestão municipal. As variáveis utilizadas constam do Quadro 1.
4. RESULTADOS
Inicialmente será realizada uma breve discussão sobre os resultados da primeira parte do trabalho, que teve como objetivo levantar quais as variáveis são significativas para o sucesso eleitoral e que representam as características que são utilizadas como heurísticas pelos eleitores. Essas heurísticas representam o perfil mais capacitado dos candidatos para o eleitor. A Tabela 1 mostra os resultados para a regressão.
Os modelos de regressão 1, 2 e 3 têm como variável dependente o sucesso eleitoral (1, se o candidato foi eleito). O modelo 1 tem como única variável explicativa o fato de ser empresário; o modelo 2 tem todas as variáveis que se pretende estudar nesta parte do artigo; por sua vez, na regressão 3 encontram-se somente as variáveis significativas. Os modelos 4, 5 e 6 seguem o mesmo raciocínio, mas a variável dependente é o percentual de votos recebidos por cada candidato.
Nos modelos em que a variável dependente é o sucesso eleitoral, em nenhuma das três regressões realizadas a variável independente “empresário” foi significativa. Por sua vez, nos modelos em que a variável independente foi o percentual de votos, o fato de ser empresário foi significativo e negativo para explicar a sua variância. Assim, verifica-se que o resultado da relação não foi o esperado, embora por meio da estatística descritiva observe-se um alto grau de participação dos candidatos empresários. Diante disso, pertencer a esse grupo não contribuiu para o sucesso eleitoral.
Esse resultado indica que o alto nível de candidatos que se declaram empresários no pleito eleitoral não corrobora o sucesso eleitoral. Tal decisão está mais relacionada aos partidos políticos que os indicam do que aos eleitores. Esse fato pode ser explicado pelo falso viés de que empresários (ou colarinhos-brancos) têm maiores chances de sucesso em razão de suas redes de contatos, o que acarreta a sua indicação e maior acesso, por parte destes, a recursos financeiros.
Essa variável apresenta resultados congruentes com um dado indicado por Carnes e Lupu (2015Carnes, N., & Lupu, N. (2015). Rethinking the comparative perspective on class and representation: Evidence from Latin America. American Journal of Political Science, 59(1), 1-18. Recuperado de https://doi.org/10.1111/ajps.12112
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, 2016Carnes, N., & Lupu, N. (2016). Do voters dislike working-class candidates? Voter biases and the descriptive underrepresentation of the working class. American Political Science Review, 110(4), 832-844. Recuperado dehttps://doi.org/10.1017/S0003055416000551
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): os não empresários podem pensar que não têm condições de serem eleitos e, por consequência, acabam por não entrar na disputa eleitoral. Além disso, tem-se os custos (pecuniários e não pecuniários) necessários para disputar a eleição. Nesse caso, os trabalhadores podem ter maiores custos nas oportunidades para deixar o trabalho formal; já os grupos de interesses podem dominar a estrutura partidária e, assim, indicar candidatos que estejam alinhados com seus interesses.
A questão do empresário candidato pode representar uma fonte de poder (empresários teriam acesso a recursos de poder). Entretanto, nos modelos utilizados, há outra variável relacionada ao poder (financeiro): os bens do candidato. Cabe ressaltar que, nos trabalhos de Carnes e Lupu (2015Carnes, N., & Lupu, N. (2015). Rethinking the comparative perspective on class and representation: Evidence from Latin America. American Journal of Political Science, 59(1), 1-18. Recuperado de https://doi.org/10.1111/ajps.12112
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, 2016Carnes, N., & Lupu, N. (2016). Do voters dislike working-class candidates? Voter biases and the descriptive underrepresentation of the working class. American Political Science Review, 110(4), 832-844. Recuperado dehttps://doi.org/10.1017/S0003055416000551
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), profissão (colarinho-branco ou azul) e recursos financeiros estão intrinsecamente ligados. Nesse contexto, os resultados para a variável “bens do candidato” são contrários aos verificados na variável “empresário”.
Nos modelos 2 e 3, a variável “bens do candidato” foi significativa e positiva na explicação de sua eleição. A pesquisa, então, aponta que a riqueza do candidato é um fator importante na explicação do seu sucesso eleitoral. A possível justificativa para isso está no fato de que os eleitores utilizam a riqueza do candidato como proxy para medir sua capacidade e conhecimento. A mesma relação foi verificada nos modelos 5 e 6, que visam explicar o percentual de votos. Os candidatos mais ricos tiveram maior número de votos. Portanto a relação de poder que se esperava encontrar na variável “empresário” foi verificada na variável “bens do candidato”.
Os resultados indicam que a fonte de poder e capacidade vai além da mera classe profissional. Ela atinge todas as profissões, visto que a riqueza dos candidatos é o indicador que captura a classe social e econômica destes. Além dos significados subjacentes que representam a riqueza, tal fato pode indicar a presença de grupos de interesse disputando as eleições. Pode, ainda, além disso, dados os altos custos da eleição, indicar que os candidatos mais ricos teriam mais recursos para estruturar a campanha. Vale ressaltar, diante do exposto, que, na eleição de 2012, não havia financiamento público de campanha.
Com relação ao gênero, ser homem foi significante e positivo para a eleição dos prefeitos. Entretanto tal relação não foi verificada quando se analisa o percentual de votos. Apesar de os resultados serem contraditórios, entende-se que, por se tratar de uma eleição majoritária, ser homem é uma característica que os eleitores preferem quando da decisão do voto. Com relação à educação, ter concluído o ensino superior não foi significativo, constituindo um fator negativo para explicar o percentual de votos. Paradoxalmente, ter concluído o ensino médio foi significativo e positivo para o sucesso eleitoral, correspondendo à mesma relação encontrada quanto ao percentual de votos. A variável idade foi negativa e significativa para a eleição, bem como maior número de votos do candidato.
Rico, homem, com ensino médio e de meia idade: esse é o perfil dos prefeitos que foram eleitos no pleito de 2012. Nesse sentido, na média, os eleitores, no ano de 2012, preferem tais características, o que permite inferir que são essas as heurísticas que o eleitor utiliza para escolher o candidato com mais capacidade e com maiores chances de realizar um bom julgamento. Esse perfil preferencial realmente tem melhor desempenho na gestão municipal? Para responder a tal questionamento, essas características serão regredidas, tendo o desempenho como variável dependente. A Tabela 2 mostra o resultado para essa regressão.
A variável “empresário” não foi significativa para elucidar o desempenho dos prefeitos em nenhum dos modelos testados. Nesse sentido, não houve nenhuma resposta empírica que justificasse a presença de um grande número de empresários no pleito eleitoral, pois essa variável não se mostrou importante para explicar nem a eleição, nem o resultado fiscal dos prefeitos e do IDEB dos alunos da rede municipal de ensino.
Diante de tal questão, o empresário como julgador (tomador de decisões) não teve resultados diferentes dos demais grupos de ocupação. Sendo assim, não se verificou um destaque dos agentes que exercem tal função no setor privado em relação aos demais gestores. O hábito de tomar decisões em condições de incerteza na esfera privada não contribuiu para uma melhor gestão. A intercambiabilidade que se esperava não foi concretizada, ou seja, a capacidade e conhecimento do empresário para gerir seu negócio não necessariamente se traduz em políticas que levem a um melhor desempenho fiscal e educacional.
O julgamento do empresário, portanto, não foi um recurso gerador de vantagem competitiva. A integração de tal recurso como meio de buscar resultados superiores, nesse sentido, não é necessária. Pode-se deduzir que a explicação para a grande participação de empresários deve-se a uma concepção do próprio candidato1 1 Um expoente dessa relação foi o então candidato à prefeitura de São Paulo, João Doria, que usou como um dos lemas de campanha a frase “sou gestor e não político”. , que considera ter maiores possibilidades de vitória. A isso devem-se acrescentar a impossibilidade de os trabalhadores se dedicarem à campanha e o alto custo financeiro necessário para se dedicar ao pleito.
Ser do gênero masculino não foi significativo para justificar o desempenho em indicadores fiscais. Entretanto foi significativo e positivo quanto ao desempenho relativo à nota no IDEB. Os prefeitos homens não tiveram desempenho superior em relação às contas públicas e, apesar de se tratar de uma variável importante para o resultado educacional, é preciso salientar que o resultado ficou bem próximo ao nível de significância de 5%; portanto, bastante sensível à introdução e/ou à retirada de novas observações e variáveis. Também merece destaque o fato de que os estados com os piores resultados são justamente os que tiveram maiores índices de mulheres eleitas.
Com relação às variáveis educacionais, ter concluído o ensino superior não foi importante no que diz respeito ao superávit orçamentário. Todavia foi significativo e positivo no percentual de saldo orçamentário em relação ao PIB. Ter concluído o ensino médio, por sua vez, não teve relevância em nenhuma das variáveis dependentes. Nesse sentido, verifica-se que o nível educacional do gestor público municipal não é um recurso capaz de originar vantagem competitiva. Assim, a educação do candidato não lhe conferiu maiores habilidades e conhecimentos capazes de gerar um melhor desempenho.
No que tange à idade do prefeito, constatou-se que houve uma correlação entre o aumento da idade e melhores desempenhos em relação às contas públicas. Em relação à variável dependente “desempenho educacional”, não houve tal associação. Portanto, prefeitos mais velhos têm, em média, melhores resultados fiscais. Ressalta-se que, dessa forma, os resultados foram paradoxais diante daqueles encontrados na elucidação do sucesso eleitoral, na primeira parte do trabalho, uma vez que a idade teve relação negativa com a eleição.
A lógica da variável “bens do candidato” segue o mesmo raciocínio da variável “empresário”, ambas vistas como fonte de poder, capacidade e conhecimento. Os resultados eleitorais melhores dos candidatos mais ricos não se repetiram quando foi analisado o desempenho de sua gestão, tanto fiscal quanto educacional. Dessa forma, a riqueza dos candidatos, considerada como uma proxy para demonstrar capacidade e habilidade, não foi comprovada. Nesse caso, não há fundamento empírico para que os eleitores tomem tal fato heurística para medir o sucesso do candidato.
Com relação aos fatores externos ao candidato, o tamanho populacional não foi significativo em relação ao saldo orçamentário positivo, nem ao sucesso na área educacional. Todavia teve relevância negativa quanto ao percentual do saldo orçamentário em relação ao PIB. Nesse sentido, verifica-se que o montante populacional tem baixa relevância nos resultados do município. O PIB per capita dos municípios foi positivo e significativo no desempenho do superávit orçamentário, bem como no resultado do IDEB. Assim, verifica-se que a riqueza do município, anterior à gestão do prefeito, foi um fator altamente expressivo em um melhor desempenho dos indicadores municipais analisados. Por sua vez, o PIB dos estados, variável que mede a riqueza da região na qual os municípios estão localizados, foi significativo apenas na variância do IDEB. Para essa variável, verificou-se que regiões mais ricas têm melhores desempenhos educacionais.
Pelo exposto, as características dos prefeitos eleitos em 2012 - rico, homem, com ensino médio completo e de meia-idade - não foram relevantes para explicar o desempenho municipal, medido pelosuperávit orçamentário e pelo IDEB. Considerando esse perfil como uma heurística utilizada pelos eleitores para escolher o candidato com maior potencial de sucesso, pode-se afirmar que se trata de um viés que não acarreta resultados superiores. A explicação para o sucesso desse perfil, portanto, não pode ser creditada aos resultados alcançados por esse grupo, já que a capacidade e a habilidade esperadas não foram comprovadas empiricamente.
A melhora no desempenho verificada nos anos finais de mandato não pode ser creditada às características individuais do gestor municipal, pois tal tendência foi encontrada em todo o conjunto de municípios, medida pela variável “ano”, que foi significativa e positiva na variação dos desempenhos analisados. Assim, os resultados de desempenho são explicados por fatores externos às características do prefeito, principalmente quanto à riqueza anterior do município. Outro fator importante é o aumento no desempenho como tendência geral, o que não pode ser computado como uma ação do governo municipal.
Como forma de dar maior confiabilidade e robustez à pesquisa, foi realizada uma série de regressões com mudanças nas especificações dos modelos. Os resultados são reportados na Tabela 3. A principal mudança se dá em relação à variável explicativa (empresário), que foi substituída por “profissões com histórico de julgamento”. Aqui, além dos prefeitos que se declararam como “empresário”, foram incluídos os que se denominaram “comerciante”, “comerciário” e “diretor de empresas”. Além disso, foram excluídas todas as observações em que não é possível identificar se o prefeito tem histórico de empresário, quais sejam: as que identificavam, como profissão, “deputado”, “prefeito” e “vereador”. Para mais, incluiu-se “partido político” como variável de controle. Com o objetivo de suprir quaisquer eventuais problemas causados pelo corte temporal, nos modelos 16, 17 e 18, foram excluídas todas as observações do primeiro ano (2013). Assim, os resultados que tinham pouca influência na atuação do prefeito foram retirados da pesquisa.
Os resultados apresentados na Tabela 3 não apresentaram mudanças em relação aos da Tabela 2. A variável “profissões com histórico de julgamento” não foi siginificativa estatisticamente para explicar o “superávit orçamentário”, a “relação superávit/PIB” e o IDEB. Dessa forma, mesmo após a inclusão de uma variável que amplia as profissões com histórico de julgamento e eliminação daquelas cuja identificação não é possível, não se observou resultado superior na gestão municipal para este grupo de análise. Em relação às variáveis de interação, em que se busca analisar se o julgamento dos prefeitos tem intermediação de outras variáveis demográficas, também não foi encontrada significância estatística. Assim, a renda, o gênero e a idade do prefeito, combinados com sua profissão, não alteraram os resuldos obtidos por eles.
Nos modelos 16, 17 e 18, em que se busca suprir quaisquer problemas causados pelo tempo de resposta da políticas implementadas, também não foram encontradas alterações relevantes nos resultados. Dessa forma, mesmo após considerar a necessidade de um espaço de tempo até que as políticas tenham resultados, os gestores municipais com histórico de julgamento não tiveram resultados superiores. As variáveis de interação também não foram relevantes quanto ao desempenho. As alterações importantes observadas dizem respeito ao gênero masculino deixar de ser significativo em relação à nota do IDEB e à variável “ensino superior” passar a ser significante estatisticamente, ou seja, prefeito com maior nível de escolaridade teve mehores resultados.
Com relação às implicações teóricas do artigo, os achados corroboram a pesquisa de Ottati (1990Ottati, V. C. (1990). Determinants of political judgments: The joint influence of normative and heuristic rules of inference. Political Behavior, 12(2), 159-179. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/BF00992467
https://doi.org/10.1007/BF00992467...
) e Riggle et. al. (1992Riggle, E. D., Ottati, V. C., Wyer, R. S., Kuklinski, J., & Schwarz, N. (1992). Bases of political judgments: The role of stereotypic and nonstereotypic information. Political Behavior, 14(1), 67-87. Recuperado dehttps://doi.org/10.1007/BF00993509
https://doi.org/10.1007/BF00993509...
) sobre a influência das heurísticas na decisão de voto do eleitor, bem como outros autores que analisaram a influência de fatores demográficos no sucesso eleitoral (Carnes & Lupu, 2015Carnes, N., & Lupu, N. (2015). Rethinking the comparative perspective on class and representation: Evidence from Latin America. American Journal of Political Science, 59(1), 1-18. Recuperado de https://doi.org/10.1111/ajps.12112
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, 2016Carnes, N., & Lupu, N. (2015). Rethinking the comparative perspective on class and representation: Evidence from Latin America. American Journal of Political Science, 59(1), 1-18. Recuperado de https://doi.org/10.1111/ajps.12112
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; Codato et al., 2013Codato, A., Cervi, E., & Perissinotto, R. (2013). Quem se elege prefeito no Brasil? Condicionantes do sucesso eleitoral em 2012. Cadernos Adenauer, 14(2), 61-84.; L. D. Costa & Codato, 2012Costa, L. D., & Codato, A. (2012). Competição e profissionalização política: as eleições para deputado federal no Brasil em 2010. In Anais do 8º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política, Porto Alegre, RS.; Dufloth et al., 2019Dufloth, S. C., Horta, C. J. G., Silva, M. M., Costa, M. L. M., & Rocha, M. S. (2019). Atributos e chances de sucesso eleitoral de prefeitos no Brasil. Revista de Administração Pública, 53(1), 214-234. Recuperado de https://doi.org/10.1590/0034-761220170241
https://doi.org/10.1590/0034-76122017024...
; Felisbino et al., 2012Felisbino, R. A., Bernabel, R. T., & Kerbauy, M. T. M. (2012). Somente um deve vencer: as bases de recrutamento dos candidatos à Prefeitura das capitais brasileiras em 2008. Revista de Sociologia e Política, 20(41), 219-234. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0104-44782012000100013
https://doi.org/10.1590/S0104-4478201200...
). O passo além desta pesquisa consiste em analisar se tais heurísticas são boas ou ruins, ou seja, se elas podem ser consideradas um viés cognitivo, como na visão de Kahneman et. al. (1982Kahneman, D., Slovic, S. P., Slovic, P., & Tversky, A. (1982). Judgment under uncertainty: Heuristics and biases. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), ou se são positivas, como na abordagem de Gigerenzer (2008Gigerenzer, G. (2008). Why heuristics work. Perspectives on psychological science, 3(1), 20-29. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008.00058.x
https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008...
).
Pelos resultados, pode-se considerar que as heurísticas utilizadas pelos eleitores quanto à profissão dos candidatos seguem uma lógica associada à visão das heurísticas como um viés (Kahneman, 2011Kahneman, D. (2011). Thinking, fast and slow. Nova York, NY: Macmillan.; Kahneman et. al, 1982Kahneman, D., Slovic, S. P., Slovic, P., & Tversky, A. (1982). Judgment under uncertainty: Heuristics and biases. Cambridge, UK: Cambridge University Press.). Nesse sentido, na busca por melhores candidatos, os eleitores optam por características que, na prática, não demostraram proporcionar resultados superiores. Os estereótipos escolhidos pelos eleitores não resultaram em vantagem competitiva na administração pública. Assim, esta pesquisa não validou o preconizado por Gigerenzer (2008Gigerenzer, G. (2008). Why heuristics work. Perspectives on psychological science, 3(1), 20-29. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008.00058.x
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), segundo o qual as heurísticas são positivas quando não há possibilidade de utilizar a lógica. Entretanto cabe ressaltar que, como elas são customizadas, pressupõe-se que haja um espaço de tempo para que sejam construídas. Todavia as heurísticas, hoje, não resultam em uma simplificação que gera melhores decisões.
Resumidamente, custos de análise e avaliação para a escolha de um candidato limitam o pleno conhecimento dos eleitores sobre os aspectos políticos, consequentemente, como forma de evitá-los, o eleitor recorre a heurísticas (Downs, 1957Downs, A. (1957). An economic theory of democracy. New York, NY: Harper.). Dentre as várias heurísticas e estereótipos utilizados pelo eleitor, este artigo utilizou, na análise, o fato de o candidato ser empresário. Todavia há duas linhas de análise das heurísticas, uma considera-a positiva (Gigerenzer, 2008Gigerenzer, G. (2008). Why heuristics work. Perspectives on psychological science, 3(1), 20-29. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008.00058.x
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); outra, como um possível viés (Kahneman, 2011Kahneman, D. (2011). Thinking, fast and slow. Nova York, NY: Macmillan.).
Com a proposta de analisar se as heurísticas empregadas são positivas ou negativas, o presente estudo teve como resultado a indicação de que as heurísticas, principalmente ligadas ao histórico de o candidato ser empresário, não confirmaram desempenho superior.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No processo eleitoral, um dos principais objetivos dos eleitores é escolher o candidato mais bem preparado para gerir o erário. Przeworski et al. (1999Przeworski, A., Stokes, S. C., & Manin, B. (1999). Democracy, accountability, and representation(Vol. 2). Cambridge, UK: Cambridge University Press.) discorrem que, ao longo desse processo, candidatos e partidos expõem suas ideias e, por meio do sufrágio, os eleitores escolhem os melhores projetos. Marsh (2007Marsh, M. (2007). Candidates or Parties? Objects of Electoral Choice in Ireland. Party Politics, 13(4), 500-527. Recuperado dehttps://doi.org/10.1177/1354068807075944
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) acrescenta que os eleitores, visando escolher as melhores ideias, buscam informações partidárias e características do postulante. Desse modo, os eleitores utilizam uma série de informações em busca do candidato mais adequado, ou, mais precisamente, o eleitor tem em mente encontrar o candidato que lhe pareça ter melhores condições de julgamento, seja mais bem capacitado e tenha mais habilidades e conhecimentos. O eleitor, no processo de seleção, busca por recursos que podem gerar resultados superiores no município.
No Brasil, uma série de estudos foi realizada para verificar a relação entre as características demográficas do candidato e o sucesso eleitoral. Dufloth et al. (2019Dufloth, S. C., Horta, C. J. G., Silva, M. M., Costa, M. L. M., & Rocha, M. S. (2019). Atributos e chances de sucesso eleitoral de prefeitos no Brasil. Revista de Administração Pública, 53(1), 214-234. Recuperado de https://doi.org/10.1590/0034-761220170241
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) e Felisbino et al. (2012Felisbino, R. A., Bernabel, R. T., & Kerbauy, M. T. M. (2012). Somente um deve vencer: as bases de recrutamento dos candidatos à Prefeitura das capitais brasileiras em 2008. Revista de Sociologia e Política, 20(41), 219-234. Recuperado dehttps://doi.org/10.1590/S0104-44782012000100013
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), ao analisar as eleições municipais, concluíram que ser do sexo feminino reduz a chance de vitória, enquanto ser político aumenta essa possibilidade; quanto ao nível educacional, ter concluído o ensino superior não foi significativo na eleição. Entretanto nenhum desses trabalhos avançaram na análise da correlação desse perfil priorizado pelos eleitores com o desempenho superior dos municípios.
Diante do exposto, este trabalho teve como primeiro objetivo fazer um levantamento do perfil dos candidatos eleitos acrescentando a variável profissional, já que grande parte dos candidatos se declarou empresário. O segundo objetivo consistiu em verificar se esse perfil de eleito, centrando-se no fato de o candidato ser empresário, tem melhores resultados no desempenho, para tanto foram utilizados como fatores de medição a situação fiscal e o IDEB (variável educacional).
Com vistas a alcançar esses objetivos, o trabalho foi dividido em duas partes. Na primeira parte, buscou-se encontrar o perfil do candidato eleito. Os resultados apontaram que o perfil de candidato preferido pelos eleitores corresponde àqueles com maior nível de riqueza, do gênero masculino, com ensino médio completo. Além disso, a probabilidade de eleição diminuiu com o aumento da idade. Dessa forma, conjecturou-se que os eleitores identificam esse perfil como de candidatos mais capazes e habilidosos, uma vez que poderiam utilizar dos seus conhecimentos para obter melhor desempenho. A variável “empresário” não foi significativa em relação ao sucesso eleitoral.
A segunda parte do trabalho teve como finalidade verificar se o perfil escolhido pelos eleitores resultava em um desempenho superior. De modo geral, os resultados não encontraram correlação entre essas heurísticas utilizadas pelos eleitores e o desempenho da gestão municipal. Somente a idade do prefeito foi significativa na questão fiscal dos municípios. Dessa forma, as gestões desse perfil de candidato não apresentam resultados diferentes da média, o que permite pressupor que esse grupo não tem melhores capacidades, habilidades e julgamentos. Os desempenhos analisados são explicados por fatores externos às características do prefeito e por uma tendência anual de melhora.
A principal contribuição teórica do artigo consistiu em verificar que as heurísticas empregadas pelos eleitores não se traduzem em resultados superiores por parte dos eleitos. Trata-se de um contexto em que os eleitores se utilizam de heurísticas para evitar os custos que a análise e a avaliação de um candidato exigem (Downs, 1957Downs, A. (1957). An economic theory of democracy. New York, NY: Harper.). Considerando, então, que há duas linhas de análise das heurísticas, uma que a considera positiva (Gigerenzer, 2008Gigerenzer, G. (2008). Why heuristics work. Perspectives on psychological science, 3(1), 20-29. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1745-6916.2008.00058.x
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); e outra, como um possível viés (Kahneman, 2011Kahneman, D. (2011). Thinking, fast and slow. Nova York, NY: Macmillan.), este artigo demonstrou que as heurísticas, principalmente ligadas ao histórico de o candidato ser empresário, não se confirmaram em desempenho superior.
Como limitações deste trabalho, há a questão de a variável “empresário” ter sido livremente declarada pelos candidatos. É possível que haja candidatos que declararam o exercício de outra profissão, mas, que, na prática, são empresários. Outro fator limitante diz respeito ao fato de a análise centrar-se em apenas um ciclo eleitoral (eleição de 2012 e gestão 2013 a 2016). Assim, trabalhos futuros podem analisar se os resultados apontados neste artigo também são verificados em outros períodos.
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
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Um expoente dessa relação foi o então candidato à prefeitura de São Paulo, João Doria, que usou como um dos lemas de campanha a frase “sou gestor e não político”.
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Relatório de revisão por pares: o relatório de revisão por pares está disponível neste link
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
11 Nov 2022 -
Data do Fascículo
Sep-Oct 2022
Histórico
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Recebido
21 Dez 2021 -
Aceito
05 Ago 2022