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EDUCAÇÃO INFANTIL NA EMILIA-ROMAGNA, ITÁLIA: PARTICIPAÇÃO SOCIAL E DESAFIOS NA GARANTIA DO DIREITO À EDUCAÇÃO

EARLY CHILDHOOD EDUCATION IN EMILIA-ROMAGNA, ITALY: SOCIAL PARTICIPATION AND CHALLENGES IN GUARANTEE OF RIGHTS TO EDUCATION

EDUCACIÓN INFANTIL EN EMILIA-ROMAGNA, ITALIA: PARTICIPACIÓN SOCIAL Y DESAFÍOS EN LA GARANTÍA DEL DERECHO A LA EDUCACIÓN

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados da pesquisa de doutorado sobre a educação da criança pequena na região da Emilia-Romagna, Itália, que, além de progressistas práticas pedagógicas, desenvolve políticas públicas que sustentam seu sistema de educação de 0 a 6 anos. Com o aporte teórico do materialismo histórico-dialético, a pesquisa é um estudo de caso de abordagem qualitativa com análise documental. Também foi realizado trabalho de campo de dez meses na Itália. Concluiu-se que a luta social e as administrações de esquerda foram importantes para os avanços da educação infantil na região, mas a não garantia do direito, do dever do Estado e da gratuidade no atendimento na faixa de 0 a 3 anos impede o acesso de todas as crianças à educação, sendo o principal desafio a ser superado pelo poder público.

Palavras-chave
Educação infantil; Emilia-Romagna; Participação social; Políticas públicas; Democracia

ABSTRACT

This paper presents the results of doctoral research on early childhood education in the region of Emilia-Romagna, Italy, which develops public policies that support its education system from 0 to 6 years old, in addition to progressive pedagogical practices. The research is a case study with a qualitative approach, documental analysis, and theoretical support of historical-dialectical materialism. Ten-month fieldwork was also carried out in Italy. It was concluded that the social struggle and the left-wing administrations were important for the advances in early childhood education in the region. However, the non-guarantee of the right, the duty of the State, and the free care in the 0-3 year-old range prevents access of all children to education, being the main challenge to be overcome by the government.

Keywords
Child education; Emilia-Romagna; Social participation; Public policy; Democracy

RESUMEN

Este artículo presenta los resultados de la investigación de doctorado sobre la educación del niño pequeño en la Región de Emilia-Romagna, Itália, que además de progresistas prácticas pedagógicas, desarrolla políticas públicas que sostienen su sistema de educación de 0 a 6 años. Con el aporte teórico del materialismo histórico-dialético, la investigación es un estudio de caso de enfoque cualitativo, con análisis documental. También ha sido realizado trabajo de campo durante diez meses en Itália. Se concluye que la lucha social y los gobiernos de izquierda fueron importantes para los avances de la educación inicial en la región, pero la no garantía del derecho, el deber del Estado y la gratuidad de la atención en la edad de 0-3 años gama, impide el acceso de todos los niños a la educación, siendo el principal reto a superar por parte del poder público.

Palabras clave
Educación infantil; Emilia-Romagna; Participación social; Políticas públicas; Democracia

Introdução

A Itália, do ponto de vista de sua administração pública, apresenta descentralização, com unidades de governo gozando certa autonomia e, diante de suas especificidades, desenvolvendo suas próprias políticas1 1 Para a citação da região do estudo e de outros locais do território italiano foi utilizada a grafia da Constituição da Itália. Realizou-se a tradução de regione/regioni para região/regiões e provincia/province para província/províncias. O caso de comune no singular ou comuni no plural, que são os entes locais na divisão política e administrativa italiana, equivalentes aos nossos municípios, diante do peso que essa palavra tem na cultura italiana em relação à prestação de serviços à comunidade e sua relevância histórica e social, a opção foi de não utilizar sua tradução como município ou prefeitura, tendo sido, portanto, mantida a grafia em italiano, bem como a adjetivação derivante relacionada à administração local como comunale/comunali. No que tange ao Stato, instância máxima da organização administrativa italiana, empregou-se a denominação de governo central, sem tradução para governo federal, considerando que a Itália não se organiza como uma federação. . Esse tipo de organização política, no campo da educação de 0 a 6 anos2 2 A legislação italiana prevê a divisão da educação de 0 a 6 anos em duas etapas. A primeira é para crianças de 0 a 3 anos, definida como servizi educativi per la prima infanzia (serviços educativos para a primeira infância), da qual faz parte um conjunto de estruturas de atendimento dividido em dois blocos: nidi, micronidi e sezioni primavera, que têm funcionamento mais parecido com creches clássicas (utilizamos essa expressão para nos referirmos a essa estrutura de atendimento, que é a mais próxima da creche brasileira); e servizi integrativi (serviços integrados/complementares), organizados em spazi gioco (espaços para jogo/brincadeira), centri per bambini e famiglie (centros para crianças e famílias) e servizi educativi in contesto domiciliare (serviços educativos em contexto domiciliar). A segunda etapa, direcionada para crianças de 3 a 6 anos, é a scuola dell’infanzia. , é um dos motivos para a permanência de um quadro nacional fragmentado e desigual com relação ao atendimento e à qualidade, dependendo de cada região. Nesse contexto, é possível considerar que os governos subnacionais apresentam seu próprio sistema de educação, os quais, ao mesmo tempo que cumprem os desígnios do governo central, de acordo com a definição de suas competências, apresentam características próprias resultantes de sua conformação histórica, social, econômica e política.

Assim, as especificidades de cada ente público podem ser estudadas, resguardadas as devidas mediações, conforme os mesmos parâmetros utilizados para analisar os sistemas nacionais, pois o processo de elaboração e implementação das políticas públicas envolve diversas relações sociais. Nesse quadro, os elementos de contexto são fundamentais para a discussão sobre sistemas de educação, pois a materialização das políticas públicas não se efetiva de igual forma em todos os lugares. Conforme Ball (2011)BALL, J. S. Sociologia das políticas educacionais e pesquisa crítico-social: uma revisão pessoal das políticas educacionais e da pesquisa em política educacional. In: BALL, J. S.; MAINARDES, J. (org.). Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011. p. 21-53., deve-se recusar a visão de que as políticas são claras, abstratas e fixas, o que poderia levar a uma concepção de que elas “devem ser realizadas da mesma maneira em todos os lugares”, desconsiderando que “as condições, recursos, histórias e compromissos locais serão diferentes e que a realização da política vai, por isso, diferir” (Ball, 2011BALL, J. S. Sociologia das políticas educacionais e pesquisa crítico-social: uma revisão pessoal das políticas educacionais e da pesquisa em política educacional. In: BALL, J. S.; MAINARDES, J. (org.). Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011. p. 21-53., p. 37).

O Estado, por sua vez, não é indiferente à correlação de forças que move a sociedade e que determina a direção que as políticas tomam nos territórios e nos períodos históricos. Com base em Poulantzas (2015)POULANTZAS, N. O Estado, o poder, o socialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015., o Estado configura-se como uma relação de força entre classes e frações de classe, e, quando se entende o Estado segundo essa definição ampliada, sobressaem possibilidades de alteração das relações em que as classes dominadas sejam beneficiadas com base em sua força histórica.

O Estado tampouco é uma entidade neutra que formula suas próprias políticas independentemente das relações entre suas classes sociais ou subgrupos. Se a sobrevivência do capital passa pela necessidade da reprodução da força de trabalho, ao mesmo tempo que visa à manutenção da hegemonia da classe dominante no bloco que está no poder, o Estado, como indica Poulantzas (2015, p. 188)POULANTZAS, N. O Estado, o poder, o socialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.:

Organiza e reproduz a hegemonia de classe ao fixar um campo variável de compromissos entre as classes dominantes e as classes dominadas, ao impor muitas vezes até às classes dominantes certos sacrifícios materiais a curto prazo com o fim de permitir a reprodução de sua dominação a longo termo.

No campo de resistência das classes dominadas, ainda é preciso destacar a relevância da democracia, especificamente da democracia representativa, pois ela é parte significativa na constituição do Estado, uma vez que, “por mais mutilada que seja pelas classes dominantes e pela materialidade do Estado, não deixa de ser uma marca no seio dessa materialidade das lutas e resistências populares. Não sendo o único limite ao poder do Estado nem por isso é menos importante” (Poulantzas, 2015POULANTZAS, N. O Estado, o poder, o socialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015., p. 71).

Foi no âmbito da luta de classes, da resistência e das tensões sociais em torno das disputas pelo direcionamento das políticas públicas, em um campo democrático representativo, mas principalmente com fortes mecanismos da democracia participativa, que se desenvolveu a proposta de educação de qualidade para a criança pequena na região da Emilia-Romagna. Seu compromisso com políticas para a infância surgiu das ações individuais e coletivas com base no desejo de melhorar as condições de vida das crianças, das famílias e dos trabalhadores.

Em que pese o tema da educação infantil italiana apresentar grande literatura no Brasil sobre práticas pedagógicas, é importante um olhar para suas políticas. Um levantamento realizado no Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior com o descritor “Reggio Emilia” no período de 2002 a 2019 encontrou 27 pesquisas. Desse total, 17 são afiliadas da área das ciências humanas – 15 na área de concentração da educação e dois da área de psicologia. Foi verificado que em 13 delas são discutidas práticas pedagógicas e que apenas duas focam em políticas públicas3 3 Entre outras atividades, destacamos a entrevista com a representante do escritório do Ministero da Instrução e Ricerca (Ministério da Educação e Pesquisa) da região do Veneto; a conversa com representante do setor de serviços e políticas sociais e educacionais da Região da Emilia-Romagna; a entrevista com representante da Confederazione Generale Italiana del Lavoro (Confederação Geral Italiana do Trabalho); a entrevista com representante da Coperselius, cooperativa que atua na gestão de creches e pré-escolas na Emilia-Romagna; a conversa com liderança e administradora aposentada do Comune de Parma e ex-presidente do Gruppo Nazionale Nido Infanzia (GNNI), uma das principais organizações italianas de defesa da educação da primeira infância; e a participação em evento em Roma da organização Save The Children e a reunião do GNNI em Bologna. (Correia, 2021CORREIA, M. A. A. A educação da criança pequena na região da Emilia-Romagna na Itália: um estudo sobre organização, gestão e financiamento. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Estado, Sociedade e Educação, Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2021. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48139/tde-20102021-130426/. Acesso em: 23 jan. 2022
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
). Portanto, a discussão das políticas educacionais para a criança na Itália ainda é um campo a ser mais desenvolvido. Para realizar a investigação, são utilizadas as legislações, além do aporte teórico de autores italianos e brasileiros. O período de 10 meses na Itália envolveu a participação em eventos, conversas com gestores e pesquisadores sobre o tema e visitas a instituições de educação infantil.

Para discorrer sobre o tema, o artigo foi organizado em cinco partes, incluindo esta introdução. Na segunda parte, são apresentadas a caracterização da região e sua histórica vinculação com partidos de esquerda e mobilização social. Na terceira parte, oferecem-se informações a respeito da organização do atendimento para as crianças de 0 a 6 anos e as especificidades regionais. A quarta parte discute alguns dados quantitativos de atendimento, gestão e financiamento. O artigo é finalizado com as considerações finais, que podem ajudar a pensar a educação brasileira não no sentido de uma perigosa e inadequada adoção de modelos ou de arriscadas comparações, mas como possibilidade de inspiração e reflexão.

È una Regione di Sinistra: A Influência da Esquerda e da Participação Social na Emilia-Romagna

Se existe uma definição para a Emilia-Romagna, ela pode ser representada pela recorrente frase escutada na Itália: é una regione di sinistra (é uma região de esquerda), onde a arte da participação social se mescla com a estética regional, que nos proporciona um indelével patrimônio histórico e cultural. É terra de nascimento de grandes talentos, como Federico Fellini, Pier Paolo Pasolini, Bernardo Bertolucci, Giuseppe Verdi. Também é um território de importantes universidades, em Bologna, Parma, Modena, Reggio Emilia e Ferrara. Não se pode negar, contudo, o nascimento de Benito Mussolini na região, bem como a presença de símbolos e monumentos fascistas, como, aliás, ocorre em boa parte da Itália. A região apresenta o total de 330 comuni, organizados em nove províncias: Piacenza, Parma, Reggio Emilia, Modena, Bologna, Ferrara, Ravenna, Forlì-Cesena e Rimini.

Quando se discute outra região diferente daquela na qual nascemos e com a qual mantemos contato, é fundamental sua contextualização histórica, associando-a com as relações sociais, considerando que questões políticas, econômicas, históricas e culturais são determinantes em sua configuração para a discussão das políticas públicas.

Entender relações em contexto também se insere no conhecimento de um espaço geográfico, que é fundamental para se pensar nas políticas. Localizada na Itália setentrional, a região da Emilia-Romagna tem uma das paisagens mais diversificadas do país. Articula-se entre terra e mar por uma antiga estrada do Império Romano, a Via Emilia, a chamada strada maestra (estrada mestra), que liga a cidade de Rimini, no litoral, à cidade de Piacenza, na divisa com a região da Lombardia, cruzando a grande extensão da Pianura Padana (Planície Padana). Grande parte de sua produção econômica é resultado da relação da população com a planície, com o maior rio da Itália, o Po, para onde flui toda a bacia hídrica da região, e com o Rio Reno, o segundo mais importante da região e o décimo mais longo da Itália.

Em virtude de suas características geográficas e ambientais e de grandes mudanças nas técnicas agrícolas e nas relações de produção, cresceu no local a fazenda em padrões capitalistas de produção, que resultou em uma economia com grande massa de trabalhadores braçais e assalariados com histórico de notáveis lutas e forte vinculação solidária e cooperativa. Parte da configuração social da região oriunda desse processo:

A história da agricultura emiliana, em outros termos, não é somente história de técnicas, de instrumentos, de práticas agrícolas. É sobretudo a história de homens, de lutas sociais, de modificações lentas nas relações que conectaram nos séculos os proprietários de terra de um lado e os trabalhadores da terra de outro

(Cazzola, 1974CAZZOLA, F. Il paesaggio agrario Emiliano. In: CANTELLI, F.; GULGLIELMI, G. (org.). L’Emilia-Romagna. Milão: TETI, 1974. p. 131-152., p. 132-133, tradução nossa).

Ademais, é uma região que investiu nas atividades manufatureiras de pequenas e médias empresas no ramo de tecidos, roupas, alimentos, cerâmica etc., fator que incidiu na organização da população. De acordo com Ferri (1974)FERRI, G. C. L’economia. In: CANTELLI, F.; GUGLIELMI, G. L’Emilia-Romagna. Milão: TETI, 1974. p. 153-163., a consciência e força da luta social e política dos trabalhadores aumentaram o componente social, a democracia e a eficiência das administrações locais no decorrer dos anos. Segundo o autor:

De fato, o desenvolvimento típico da economia regional encontra os seus componentes na forte demanda social de bens e de serviços e na resposta, para muitos de maneira organizada e para outros espontânea, a essa demanda. Isto é dado pelo movimento democrático das massas, por uma capaz demanda de utilização do trabalho para ocupação mais alta, ampliada e qualificada; pela direção política democrática de esquerda e popular dos comuni, províncias e região; por uma capacidade empreendedora local estendida às massas sociais de artesãos, camponeses, pequenas indústrias, cooperativas e empresas públicas locais e de centros de serviços sociais.

(Ferri, 1974FERRI, G. C. L’economia. In: CANTELLI, F.; GUGLIELMI, G. L’Emilia-Romagna. Milão: TETI, 1974. p. 153-163., p. 156, tradução nossa)

É também a região italiana onde mais se destaca a atuação de uma comunidade cívica, representada pela grande participação social e política de sua população, por sua conformação histórica, pela formação de seu povo, pelas administrações de esquerda, ou ainda pelas tradições regionais arraigadas. A descrição de Putnam (2005)PUTNAM, R. D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália Moderna. 4. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2005. traduz certa ideia de dialética de uma região que mantém sua tradição e ao mesmo tempo se moderniza:

A Emilia-Romagna é uma das sociedades mais modernas, dinâmicas, abastadas e tecnologicamente desenvolvidas da face da terra. E, no entanto, abriga uma extraordinária concentração de redes de solidariedade social e uma população dotada de um espírito público extraordinariamente desenvolvido. [...] Todo tipo de ação coletiva, incluindo o governo, é facilitado por normas e sistemas de engajamento cívico. [...] Tais normas e sistemas estão profundamente arraigados nas tradições regionais, mas seria absurdo classificar a Emilia-Romagna como uma sociedade “tradicional”

(Putnam, 2005PUTNAM, R. D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália Moderna. 4. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2005., p. 127-128).

Além disso, a democracia participativa configurou-se como ponto central de convivência e prática da população da região. Exemplo foi a criação no pós-guerra dos conselhos comunali, experiências surgidas dos momentos em que a população se reunia para reconstruir cidades e fábricas. Organizava-se como assembleias democráticas populares cujo ponto central de discussão era a reconstrução, almejando uma sociedade mais justa, com liberdade e progresso (Ferri, 1974FERRI, G. C. L’economia. In: CANTELLI, F.; GUGLIELMI, G. L’Emilia-Romagna. Milão: TETI, 1974. p. 153-163.).

O engajamento da população da Emilia-Romagna em ações coletivas marcadas por solidariedade também esteve presente na Segunda Guerra Mundial, fazendo com que a história dessa região se confundisse com a própria história de uma parcela da sociedade italiana que lutou contra o nazifascismo, organizou a resistenza (resistência) e conquistou a liberazione (libertação), retomando ao final da guerra a democracia. Essa organização original é herdeira dos movimentos sociais e populares anteriores ao fascismo e que constituíram um elemento fundamental de coesão e participação, conforme afirma Bergonzini (1974, p. 104, tradução nossa)BERGONZINI, L. La Resistenza. In: CANTELLI, F.; GULGLIELMI, G. L’Emilia-Romagna. Milão: TETI Editore, 1974. p. 103-130.:

O despertar da solidariedade encontrava sua explicação na difusão e no latente descontentamento e aversão ao fascismo e à guerra, mas representava também a prova de que não tinha sido dispersa a herança do velho movimento socialista e popular emiliano-romagnolo, a experiência das primeiras organizações sindicais e cooperativistas, das primeiras “ligas” camponesas nas quais a solidariedade de classe foi, como os ideais de renovação e de progresso, um elemento fundamental de coesão e participação.

Desse processo da resistência, “surge na Emilia-Romagna uma grande vontade e consciência popular para refazer uma Itália diferente” (Ferri, 1974FERRI, G. C. L’economia. In: CANTELLI, F.; GUGLIELMI, G. L’Emilia-Romagna. Milão: TETI, 1974. p. 153-163., p. 155, tradução nossa). Essa ideia de “Itália diferente” continuou durante as décadas seguintes e, nos anos 1960, tomou nova forma, com um perfil de destaque que resultou de sua organização, mas também das reivindicações e da pressão social características desse período histórico. É a região que os italianos denominaram de Regione Rossa (Região Vermelha), o cinturão vermelho da Itália, pelo simbolismo e influência que os movimentos de esquerda receberam principalmente após o fim da Segunda Guerra Mundial, personificado no Partido Comunista Italiano (PCI). Nos pleitos regionais, o PCI, até sua dissolução, em 1991, destacou-se na Emilia-Romagna por duas décadas como o partido preferido pelos eleitores4 4 Apesar de a criação das regiões ter sido aprovada na Constituição de 1948, somente na década de 1970 começaram a ser realizadas as primeiras eleições regionais, que previam a escolha de um presidente e de um conselho regional. : 1970, 43,99%; 1975, 48,29%; 1980, 48,18%; 1985, 47,04%; e 1990, 42,06% (Itália, 2021ITÁLIA. Ministerio dell’interno. Archivio storico delle elezioni. Itália: Ministerio dell’interno, 2021. Disponível em: http://elezionistorico.interno.gov.it/. Acesso em: 29 maio 2021.
http://elezionistorico.interno.gov.it/...
).

Esse componente histórico que envolve discussão e participação política, permeado por lutas, paixões e mobilizações, foi fator de influência na criação do compromisso histórico com uma educação de qualidade para a criança pequena. A pressão social teve grande efeito sobre a instituição de políticas públicas para a infância, mormente em relação às creches, com destaque para a forte tradição de emancipação feminina, que em todo país, associada a outras forças, obrigou os governos locais e regionais a executarem políticas para a igualdade de gênero, incluindo a criação de creches (Sabatinelli, 2016SABATINELLI, S. Politiche per crescere: la prima infanzia tra cura e investimento sociale. Bolonha: Il Mulino, 2016.). No caso da Emilia-Romagna, esse contexto foi potencializado pelas condições objetivas de participação e mobilização criadas anteriormente e constitui uma tradição inegável.

No entrelaçamento entre a história da região, a política, a luta dos movimentos sociais e a defesa dos direitos das crianças, encontra-se a teia social criadora dos serviços regionais para a infância. Foi a strada maestra da Emilia-Romagna que criou “comunidades mais solidárias e justas, que é o compromisso com a educação da infância, seus serviços educacionais e suas escolas” (Campioni; Marchesi, 2018CAMPIONI, L.; MARCHESI, F. Presentazione. In: CAMPIONI, L.; MARCHESI, F. (org.). La strada maestra: Tracce di storia delle scuole comunali dell’infanzia nei Comuni capoluogo dell’Emilia-Romagna. Itália: Zeroseiup, 2018. p. 15-19., p. 15, tradução nossa).

A educação da infância consolidou-se como um projeto político e social em que se destacaram sobretudo a cidade de Reggio Emilia e grandes nomes da pedagogia italiana, originados das condições materiais proporcionadas pela região. Os atores sociais do período não estavam envolvidos apenas em questões didático-pedagógicas de creches e pré-escolas. Eles envolveram-se diretamente com a mobilização social, muitas vezes à frente das manifestações que reivindicavam ampliação de direitos, além de diferentes e melhores políticas sociais. Eles portam em suas biografias importantes participações nos movimentos de esquerda do período. O próprio Loris Malaguzzi, o grande pedagogo da abordagem de Reggio Emilia, foi filiado ao PCI e membro do governo municipal de administração comunista em Reggio (Faria, 2007FARIA, A. L. G. Loris Malaguzzi e os direitos das crianças pequenas. In: OLIVEIRA-FORMOSINHO, J.; KISHIMOTO, T. M.; PINAZZA, M. A. (org.). Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado, construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007. p. 277-292.). Foi nesse contexto que ele, com a população da região, promoveu ações voltadas para a educação da criança, consolidando seu compromisso social e político com a infância e desenvolvendo uma abordagem educacional que carrega aspectos éticos, estéticos e políticos (Planillo, 2014PLANILLO, A. H. Pedagogía y política en el pensamiento y obra pedagógica de Loris Malaguzzi. RELAdEI – Revista Latinoamericana de Educación Infantil, v. 3, n. 1, p. 43-61, 2014.).

As grandes conquistas sociais na região também são resultado das mobilizações nacionais. No caso das creches, é necessário recordar que um dos frutos dessa mobilização na década de 1960 foi a aprovação da Lei nacional nº 1.044/1971, que criou os serviços para a infância e descentralizou sua implementação (Itália, 1971ITÁLIA. Lei nº 1.044, de 6 de dezembro de 1971. Piano quinquennale per l’istituzione di asili-nido comunali con il concorso dell’Stato. Gazzetta Ufficiale, 1971. Disponível em: https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/1971/12/15/071U1044/sg. Acesso em: 5 set. 2020.
https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/...
). Como ressaltam Edwards, Gandini e Forman (2016, p. 36-37)EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. Introdução: origens e pontos iniciais. In: EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. As cem linguagens da criança: a experiência de Reggio Emilia em transformação. Porto Alegre: Penso, 2016. v. 2. p. 23-43.:

A Lei 1.044 responsabilizou os 20 governos regionais da Itália por cumprir a legislação e deu aos governos municipais a tarefa de estabelecer padrões e regulamentos, fazer pedidos de financiamento e construir e organizar os centros de cuidado infantil. Inevitavelmente, a rede de serviços desenvolveu-se de maneira desigual pelas regiões da Itália, influenciada por escolhas políticas, visões sobre o papel das mulheres, recursos financeiros e normas de efetividade administrativa. De maneira similar, a interpretação e a implementação da lei também variariam de acordo com os municípios.

No caso da Emilia-Romagna, essa descentralização, bem como a diversidade de possibilidades entre as províncias e os comuni, pode ser considerada um fator positivo, pois suas políticas para as creches e pré-escolas “nunca são centralistas nem autorreferenciais e têm apoiado um sistema policêntrico, eficiente e de qualidade diferente de outras realidades regionais” (Campioni; Marchesi, 2018CAMPIONI, L.; MARCHESI, F. Presentazione. In: CAMPIONI, L.; MARCHESI, F. (org.). La strada maestra: Tracce di storia delle scuole comunali dell’infanzia nei Comuni capoluogo dell’Emilia-Romagna. Itália: Zeroseiup, 2018. p. 15-19., p. 16, tradução nossa).

É uma proposta comprometida com a comunidade, com a satisfação das necessidades não apenas das crianças, mas também de toda a sociedade, trazendo benefícios econômicos e sociais, além de melhorias das condições de vida imateriais, na busca, como pensava Loris Malaguzzi, da equidade, e não de um modelo redentor (Faria, 2007FARIA, A. L. G. Loris Malaguzzi e os direitos das crianças pequenas. In: OLIVEIRA-FORMOSINHO, J.; KISHIMOTO, T. M.; PINAZZA, M. A. (org.). Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado, construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007. p. 277-292.).

Com o decorrer dos anos, a Emilia-Romagna também criou sua própria legislação para a educação infantil de 0 a 3 anos. Um dos marcos foi a promulgação da Lei regional nº 1/2000, que definiu as normas para as redes educativas para a primeira infância (Regione Emilia-Romagna, 2000REGIONE EMILIA-ROMAGNA. Lei nº 1, de 10 de janeiro de 2000. Norme in materia di servizi educativi per la prima infanzia. Gazzetta Ufficiale, 2000. Disponível em: https://www.gazzettaufficiale.it/atto/regioni/caricaDettaglioAtto/originario?atto.dataPubblicazioneGazzetta=2000-07-08&atto.codiceRedazionale=000R0256#:~:text=4%20del%2014%20gennaio%202000,1.&text=La%20Regione%20riconosce%20le%20bambine,essi%20siano%20rispettati%20come%20persone. Acesso em: 7 nov. 2020.
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). Essa lei representou um avanço para a faixa de 0 a 3 anos, porque consolidou a construção dessa etapa regionalmente, proporcionando novas reflexões sobre o tema da qualidade e a discussão de novos procedimentos para os comuni e províncias, como a regulamentação do credenciamento de creches (Bondioli, 2004bBONDIOLI, A. Dos indicadores às diretrizes da creche. In: BONDIOLI, A. (org.). O projeto pedagógico da creche e a sua avaliação: a qualidade negociada. Campinas: Autores Associados, 2004b. p. 13-33.). Posteriormente, a referida lei foi alterada pela Lei nº 19/2016, que especificou os serviços educativos para a primeira infância ao redefinir as estruturas de atendimento, tornando-as mais flexíveis e diversificadas (Regione Emilia-Romagna, 2016REGIONE EMILIA-ROMAGNA. Lei nº 19, de 15 de novembro de 2016. Servizi educativi per la prima infanzia. Gazzetta Ufficiale, 2016. Disponível em: https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2017/04/22/16R00560/s3. Acesso em: 7 nov. 2020.
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).

No caso da pré-escola, em que pese existir uma legislação nacional regulamentadora, a região também criou normas próprias para atuar na área, como a Lei regional nº 12/2003, que estabelece diretrizes para a igualdade de oportunidades e acesso ao saber para cada um e para todos ao longo da vida por meio do reforço da educação e da formação profissional (Regione Emilia-Romagna, 2003REGIONE EMILIA-ROMAGNA. Lei nº 12, de 30 de junho de 2003. Norme per l’uguaglianza delle opportunità di accesso al sapere, per ognuno e per tutto l’arco della vita, attraverso il rafforzamento dell’istruzione e della formazione professionale, anche in integrazione tra loro. Bollettino Ufficiale, 2003. Disponível em: https://demetra.regione.emilia-romagna.it/al/articolo?urn=er:assemblealegislativa:legge:2003;12. Acesso em: 1º jun. 2021.
https://demetra.regione.emilia-romagna.i...
).

Recentemente, foram divulgadas novas regulamentações nacionais, a Lei nº 107/2015 e o Decreto nº 65/2017 (Itália, 2015ITÁLIA. Lei nº 107, de 13 de julho de 2015. Riforma del sistema nazionale di istruzione e formazione e delega per il riordino delle disposizioni legislative vigenti. Gazzetta Ufficiale, 2015. Disponível em: https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2015/07/15/15G00122/sg. Acesso em: 8 ago. 2020.
https://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/...
; 2017ITÁLIA. Decreto nº 65, de 13 de abril de 2017. Istituzione del sistema integrato di educazione e di istruzione dalla nascita sino a sei anni. Gazzetta Ufficiale, 2017. Disponível em http://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2017/05/16/17G00073/sg. Acesso em: 5 maio 2018.
http://www.gazzettaufficiale.it/eli/id/2...
), que criaram o Sistema Integrado de 0 a 6 anos, que finalmente incluiu a educação de 0 a 3 anos no sistema de educação5 5 Na Itália, as creches passaram para a área da educação somente em 2017, sem diretivas nem financiamento do governo central. Já as pré-escolas tiveram seu desenvolvimento vinculado ao Ministério da Educação desde os anos 1960, com orientações e financiamento centralizados. . A região, além de buscar adequação à nova legislação com as diretivas nº 1.564/2017 e nº 704/2019 (Regione Emilia-Romagna, 2017REGIONE EMILIA-ROMAGNA. Diretiva nº 1.564, de 16 de outubro de 2017. Direttiva in materia di requisiti strutturali ed organizzativi dei servizi educativi per la prima infanzia e relative norme procedurali. Disciplina dei servizi ricreativi e delle iniziative di conciliazione in attuazione della L.R. 19/2016. Bollettino Ufficiale, 2017.; 2019aREGIONE EMILIA-ROMAGNA. Deliberação nº 704, de 13 de maio de 2019. Accreditamento dei nidi d’infanzia in attuazione della L.R. n. 19/2016. Bollettino Ufficiale, 2019a.), tenta manter o protagonismo e a vanguarda considerando a qualidade, com novas regulamentações para o processo de autorização de funcionamento e credenciamento das estruturas e para o investimento de recursos financeiros, cujo objetivo é a redução dos custos das mensalidades para as famílias.

Na cobrança para acesso ao atendimento, encontra-se uma inflexão na política de educação infantil, pois a atuação regional esbarra na forma histórica e estrutural da organização da educação de 0 a 3 anos, que sempre foi considerada como serviço de demanda individual, e não como direito, e sem a garantia de gratuidade para frequência a alguma instituição pública educativa.

A Lei nº 131/1983 estabeleceu que as creches são serviços de demanda individual, tais como os estacionamentos, banheiros públicos, mercados, matadouros, serviços funerários, cemitérios, teatros e instalações esportivas (Itália, 1983ITÁLIA. Lei nº 131, de 26 de abril de 1983. Conversione in legge, con modificazioni, del decreto-legge 28 febbraio 1983, n. 55, recante provvedimenti urgenti per il settore della finanza locale per l’anno 1983. Gazzetta Ufficiale, 1983. Disponível em: https://www.gazzettaufficiale.it/atto/serie_generale/caricaDettaglioAtto/originario?atto.dataPubblicazioneGazzetta=19830430&atto.codiceRedazionale=083U0131&elenco30giorni=false. Acesso em: 3 abr. 2021.
https://www.gazzettaufficiale.it/atto/se...
). De acordo com Sabatinelli (2016)SABATINELLI, S. Politiche per crescere: la prima infanzia tra cura e investimento sociale. Bolonha: Il Mulino, 2016., com essa lei, os entes públicos ficaram livres para oferecer, ou não, o serviço, com base na existência de orçamento, na quantidade e na forma que decidirem, além de requererem pagamento de tarifas ou contribuições aos cidadãos que o utilizam.

É uma problemática que se agrava pelo fato de o país não prever em sua legislação o acesso à educação de 0 a 6 anos como direito público subjetivo, o que implicaria no dever do Estado, como ocorre no Brasil, e na possibilidade de acionar “instrumentos jurídicos e processuais capazes de fazer respeitar um direito claramente protegido” (Cury, 2002CURY, C. R. J. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. Cadernos de Pesquisa, n. 116, p. 245-262, jul. 2002. https://doi.org/10.1590/S0100-15742002000200010
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200200...
, p. 260).

Segundo Sabatinelli (2017)SABATINELLI, S. Verso il sistema integrado 0-6 anni. 2017. Disponível em: https://welforum.it/verso-il-sistema-integrato-0-6-anni/. Acesso em: 7 mar. 2018.
https://welforum.it/verso-il-sistema-int...
, nos países nórdicos, onde a cobertura é mais ampla e mais homogênea para as crianças menores, além de manter uma etapa única integrada, o acesso aos serviços constitui um direito público subjetivo.

A questão da não garantia da gratuidade para as famílias torna a situação ainda mais grave, pois afasta muitas crianças da educação. No ano escolar de 2019/2020, o valor médio mensal pago na Emilia-Romagna em creches de gestão comunale, localizadas nas capitais de província, foi de € 314 (Cittadinanzattiva, 2019CITTADINANZATTIVA. Asili nido comunali: Indagine annual su costi, qualità e tutele. Cittadinanzattiva, 2019. Disponível em: https://www.informap-cittadinanzattiva.org/wp-content/uploads/2019/10/Report-nidi-2019-20-def.pdf. Acesso em: 15 maio 2021.
https://www.informap-cittadinanzattiva.o...
). O custo do atendimento está entre os principais motivos para a não opção das famílias pelas creches (ISTAT, 2020ISTITUTO NAZIONALE DI STATISTICA (ISTAT). Statistiche Repport. Offerta di asili nido e servizi integrativi per la prima infanzia. Anno educativo 2018/2019. ISTAT, 2020. Disponível em: https://www.istat.it/it/archivio/249522. Acesso em: 18 maio 2021.
https://www.istat.it/it/archivio/249522...
).

A situação é mais crítica em contextos de crise econômica, quando ocorre forte impacto na empregabilidade, afetando as decisões das famílias, que se veem compelidas a cortar despesas na educação dos filhos, restringindo assim o direito das crianças. Nesse quadro, a busca pela gratuidade é um dos principais desafios da educação italiana de 0 a 3 anos.

Por sua vez, a pré-escola, que teve historicamente um aporte de recursos do setor educacional, é um atendimento que apresenta um custo bem menor ou até mesmo gratuidade. Para exemplificar, no Comune de Reggio Emilia, uma família com indicatore dela situazione economica equivalente (indicador da situação econômica equivalente, em português – ISSE)6 6 É um mecanismo que mede a capacidade financeira das famílias, com base na renda, nos patrimônios mobiliário e imobiliário e nas características dos núcleos familiares. Com base nesses dados, é feito um cálculo para definir a faixa de renda na qual a família se enquadra e, consequentemente, o valor da mensalidade. O ISEE é acionado cada vez que as famílias ou os cidadãos solicitam serviços públicos subsidiados, principalmente para acesso a políticas sociais. Tem validade anual e, no caso das creches, deve ser enviado para o comune. de até € 21 mil paga mensalmente € 242 em uma creche integral e € 183 em uma creche de tempo parcial. Na pré-escola, o valor é de € 171 (tempo integral) e de € 145 (tempo parcial) em unidade comunale e privada conveniada e de € 127 em atendimento do governo central. Famílias com o menor valor de ISSE, € 4 mil, pagam apenas uma pequena tarifa de matrícula que varia de € 54 a 63 (Comune di Reggio Emilia, 2020aCOMUNE DI REGGIO EMILIA. Informazioni sulle norme relative alla frequenza e alle rette nei nidi d’infanzia comunali. Anno scolastico 2020/2021. Comune di Reggio Emilia, 2020a. Disponível em: https://www.comune.re.it/retecivica/urp/retecivi.nsf/PESDocumen tID/1BAFACB10B29F4FBC12576C100379229?opendocument&FROM=Rtt3. Acesso em: 13 fev. 2021.
https://www.comune.re.it/retecivica/urp/...
; 2020bCOMUNE DI REGGIO EMILIA. Informazioni sulle norme relative alle rette nelle scuole dell’infanzia. Anno scolastico 2020/2021. Comune di Reggio Emilia, 2020b. Disponível em: http://www.scuolenidi.re.it/allegati/REGOLAMENTO%20SCUOLA%202020-CONV.pdf. Acesso em: 13 fev. 2021.
http://www.scuolenidi.re.it/allegati/REG...
; 2020cCOMUNE DI REGGIO EMILIA. Informazioni sulle norme relative alle rette nelle scuole d’infanzia statali. Anno scolastico 2020/2021. Comune di Reggio Emilia, 2020c. Disponível em: https://www.comune.re.it/retecivica/urp/retecivi.nsf/PESDocumentID/65474561D1860 F4FC1257AD0003D5C39?opendocument. Acesso em: 13 fev. 2021.
https://www.comune.re.it/retecivica/urp/...
). Em outros comuni, quando o atendimento não prevê pagamento de mensalidade pelas famílias, pagam-se somente a alimentação e o transporte, ou um, ou outro.

Nessa diferenciação entre a configuração das creches e pré-escolas, que marca a história da educação infantil mundial, a região busca alternativas para a sua política educacional.

A Educação Infantil na Emilia-Romagna

Para a organização da educação de 0 a 3 anos, os servizi educativi per la prima infanzia (serviços educativos para a primeira infância), a região estabeleceu novas normas e, apesar de não apresentar um modelo de estrutura para o credenciamento, indica algumas orientações. Por exemplo: o orçamento deve observar alguns itens que constituem um padrão de referência de qualidade e que contemplem custos com profissionais educativos, auxiliares, coordenador pedagógico, formação de pessoal, alimentação, material didático, limpeza, vigilância, energia, água, gás, telefonia, manutenção etc. (Regione Emilia-Romagna, 2019aREGIONE EMILIA-ROMAGNA. Deliberação nº 704, de 13 de maio de 2019. Accreditamento dei nidi d’infanzia in attuazione della L.R. n. 19/2016. Bollettino Ufficiale, 2019a.).

Considerando a tradição regional de pensar uma proposta pedagógica democrática e participativa, os documentos elencam vários critérios que devem ser observados no trabalho pedagógico, sistematizados nas seguintes dimensões: organização do contexto educativo (espaços e materiais, tempos, relações, propostas educativas); serviço, famílias e território (relações e participação das famílias, relação com o território); funcionamento do grupo de trabalho (coordenação do grupo, planejamento, documentação); e avaliação. Também foi criada uma mesa de discussão com gestores públicos e privados para monitoramento das diretrizes.

As diretivas regionais (Regione Emilia-Romagna, 2017REGIONE EMILIA-ROMAGNA. Diretiva nº 1.564, de 16 de outubro de 2017. Direttiva in materia di requisiti strutturali ed organizzativi dei servizi educativi per la prima infanzia e relative norme procedurali. Disciplina dei servizi ricreativi e delle iniziative di conciliazione in attuazione della L.R. 19/2016. Bollettino Ufficiale, 2017.; 2019aREGIONE EMILIA-ROMAGNA. Deliberação nº 704, de 13 de maio de 2019. Accreditamento dei nidi d’infanzia in attuazione della L.R. n. 19/2016. Bollettino Ufficiale, 2019a.) – seguindo a conformação nacional – orientam para a organização de dois grupos de estrutura: as creches tradicionais ou clássicas, em tempo parcial ou integral, e os serviços integrados/complementares às creches. As creches clássicas englobam os nidi, micronidi e sezione primavera. Também fazem parte desse grupo os agrinidi, uma novidade localizada nas áreas rurais. A estrutura pode ser organizada de maneira diversificada quanto ao tempo de abertura, integral ou parcial, número de crianças e localização. O tempo de abertura é definido por cada comune. Já os serviços integrados/complementares têm estrutura diversificada e mais flexível e na região está organizada da seguinte forma:

  • Spazio bambini (espaço para crianças): pode receber somente 50 crianças ao mesmo tempo, sendo no máximo oito crianças por educador. O espaço deve ser organizado e equipado para criar um contexto educacional com brincadeiras estruturadas que respondam à necessidade das diferentes idades. Não são oferecidas refeições;

  • Centro per bambini e famiglie (centro para crianças e famílias): prevê locais para atividades conjuntas com adultos e crianças e espaços para atividades somente para adultos. Como são momentos compartilhados entre pais e crianças, não existe a figura da custódia das crianças. No entanto, quando estas são deixadas no local sozinhas com os educadores, a proporção não pode ser superior a 15 crianças por educador;

  • Servizi domiciliari (serviço domiciliar): pode receber no máximo sete crianças, mas se o grupo não atende crianças com idade inferior a 12 meses pode acolher até oito, com espaços configurados e requisitos para o processo educativo que podem ser organizados na residência do educador, em estrutura específica ou em locais de trabalho. O local deve garantir acolhimento, brincadeira, segurança, preparação e consumo da alimentação, repouso, higiene pessoal e depósito de materiais, bem como manter espaço adequado para higiene com todos os devidos insumos, tais quais sabão, toalhas etc. Como faz parte do sistema de serviços para a primeira infância, deve ser acompanhado por coordenação pedagógica. Com relação ao pessoal, existem modulações dependendo do número de crianças. Para até quatro crianças, é preciso um educador e, se necessário, pode haver mais um profissional de suporte, mesmo sem título de graduação. De cinco a sete crianças, é exigido um educador apoiado por outro trabalhador, ainda que sem formação, por pelo menos 50% do tempo de funcionamento do local.

Ainda estão previstos servizi ricreativi (serviço recreativo – baby park/ludotecas) e iniziative di conciliazione (iniciativa de conciliação), que são serviços de oferta ocasional e temporária que ocupam um nível diferenciado em relação aos serviços complementares descritos anteriormente e que não precisam de autorização de funcionamento, com frequência de não mais que dois dias por semana e máximo de duas horas diárias.

Recentemente foram implementados, de forma experimental, os servizi sperimentali (serviços experimentais), que são projetos para crianças de 0 a 6 anos, e os poli per l’infanzia (polos para a infância), estruturas que devem apresentar ao menos um atendimento de 0 a 3 anos e uma pré-escola, com a intenção de tornar-se modelo de um percurso escolar contínuo, atendendo a uma das principais demandas relativas à instituição do sistema integrado de 0 a 6 anos.

Essas estruturas complementares já vinham sendo desenvolvidas desde a década de 1990 e tornaram-se referência nas políticas italianas, pois, segundo Faria (1994, p. 211)FARIA, A. L. G. Impressões sobre as creches no norte da Itália: bambini si diventa. In: ROSEMBERG, F.; CAMPOS, M. M. (org.). Creches e pré-escolas no Hemisfério Norte. São Paulo: Cortez; Fundação Carlos Chagas, 1994. p. 211-232., são um sistema que funciona com “qualidade, flexibilidade e diversidade de oferta”. Em suas palavras:

Assim, além da creche propriamente dita, há uma variedade de espaços da mesma natureza. Conforme uma demanda é percebida, é experimentada uma nova tipologia (como eles denominam), sempre ampliando, e não substituindo, o que já existe [...] observa-se, então, uma pluralidade de serviços municipais, diferenciados entre si, atendendo às diferentes necessidades das crianças e das famílias (italianas e de outras culturas)

(Faria, 1994FARIA, A. L. G. Impressões sobre as creches no norte da Itália: bambini si diventa. In: ROSEMBERG, F.; CAMPOS, M. M. (org.). Creches e pré-escolas no Hemisfério Norte. São Paulo: Cortez; Fundação Carlos Chagas, 1994. p. 211-232., p. 211).

O diferencial desse processo foi sua remodelação com base na experiência acumulada na região, não constatando-se importações de modelos nem propostas de mercado ou de outros contextos. São alternativas alicerçadas no conhecimento e na experiência adquiridos no passado, conforme afirmam Edwards, Gandini e Forman (2016)EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. Introdução: origens e pontos iniciais. In: EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. As cem linguagens da criança: a experiência de Reggio Emilia em transformação. Porto Alegre: Penso, 2016. v. 2. p. 23-43..

Apesar de administrações responsáveis tentarem proteger seus serviços infantis (alguns distritos até continuaram a adicionar novos centros), o debate criou uma consciência sobre a diversidade de demandas dos pais em um período de transformação social e a necessidade de racionalizar todos os gastos públicos. Expandindo o conhecimento e a experiência adquiridos no passado, os educadores e os administradores encontraram uma maneira de oferecer novos tipos de serviço.

Em que pese a flexibilização das estruturas de atendimento ter se voltado para a satisfação das necessidades das famílias, também há que se considerar os componentes econômicos que influenciaram o processo de reavaliação das políticas para a primeira infância, mesmo com as ponderações relacionadas à origem pedagógica desses serviços e às inúmeras justificativas para a flexibilização e diversificação de atendimento. A ideia de “necessidade” ainda remonta à discussão da creche como “serviço de interesse individual”. Caso contrário, teríamos a disponibilização de atendimento de todos os tipos de serviço de forma universal para todas as crianças e famílias.

Não se trata de negar os benefícios que estruturas mais flexíveis podem trazer à população, e sim de possibilitar a reflexão sobre a dificuldade das crianças de utilizar as creches clássicas e a opção de as famílias matricularem as crianças nos espaços complementares diante de mensalidades mais caras em instituições de tempo integral, que são fundamentais para a socialização e a conciliação do trabalho dos pais.

Nesse aspecto, a questão dos investimentos financeiros torna-se um ponto complexo e de difícil combinação, mas essencial para garantir o acesso de todas as crianças e a redução do custo das famílias, um desafio histórico ainda não superado pela Emilia-Romagna.

Os Desafios da Gestão e do Financiamento

Na organização e disponibilização de vagas de seu sistema de educação de 0 a 6 anos, a região apresenta percentuais de cobertura diferenciados dependendo da província.

No cômputo total regional, o atendimento para o ano escolar 2018/2019 foi de 33% da população de 0 a 3 anos, e, na etapa de 3 a 6 anos, os percentuais foram similares entre as províncias, perfazendo o total de 93% de crianças atendidas. Com a média de cobertura da educação de 0 a 3 anos, a região já alcançou o objetivo da União Europeia, que instituiu na estratégia de Lisboa a meta para os países-membros do nível mínimo de oferta de vagas de 33% para crianças abaixo de 3 anos e 96% das crianças de 3 anos até a idade de início da educação obrigatória (Comissão Europeia, 2021COMISSÃO EUROPEIA. Educação e formação. Educação e acolhimento na primeira infância. Comissão Europeia, 2021. Disponível em: https://education.ec.europa.eu/pt-pt/education-levels/early-childhood-education-and-care. Acesso em: 22 maio 2021.
https://education.ec.europa.eu/pt-pt/edu...
). Vale destacar que, no caso da pré-escola, a região ainda não cumpriu a meta estipulada.

Na Tabela 1, é possível observar o atendimento de 0 a 6 anos de idade para as diferentes províncias da região.

Tabela 1
Atendimento em instituições educacionais por província para a população de 0 a 6 anos (ano escolar 2018/2019), Itália.

Os dados da Tabela 1 indicam que a província de Bologna, que historicamente teve papel decisivo na consolidação da educação da criança pequena na região, apresentou o maior percentual de atendimento para a população de 0 a 3 anos, 39%, enquanto a província de Piacenza teve o menor percentual, apenas 22,1%. Segundo Grazioli e Tanzi (2014)GRAZIOLI, P.; TANZI, V. I Nidi a Piacenza: storia della nascita e dello sviluppo dei servizi in un territorio di confine tra Emilia e Lombardia. In: CAMPIONI, L.; MARCHESI, F. (org.). Sui nostri passi: Tracce di storia dei servizi educativi nei Comuni capoluogo dell’Emilia-Romagna. Bolonha: Edizioni Junior, 2014. p. 341-370., uma explicação possível é a permanência em Piacenza de uma cultura ainda muito centrada na família, o que leva à maior valorização dos cuidados das crianças por parte dos agentes familiares.

Na pré-escola, por seu turno, as médias foram similares, alcançando altos patamares de cobertura em todas as províncias. A província de Forlì-Cesena foi a única que cumpriu a meta da União Europeia. Outras províncias com percentuais acima de 90% estão próximas de alcançá-la, registrando-se somente que a província de Parma, com 87%, abaixo desse percentual.

Já a Tabela 2 apresenta dados referentes à responsabilidade (titularidade) de cada ente pela oferta da educação de 0 a 6 anos. Ela pode ser do governo central (nacional), dos comuni ou do setor privado.

Tabela 2
Percentual de atendimento por província na educação de 0 a 6 anos segundo natureza jurídica do titular (ano escolar 2018/2019), Itália.

No caso das pré-escolas, o governo central apresentou o maior índice de participação no atendimento (47,6%), e é interessante observar a diversidade de titularidade em cada província. Em Piacenza, por exemplo, não existia nenhuma pré-escola administrada pelo comune, sendo a maioria (65%) administrada pelo governo central. Por sua vez, na província de Reggio Emilia, encontrou-se a maior presença de atendimento privado (40,7%), ficando a titularidade comunale com o menor índice (27%). Ainda pode ser destacada a realidade de Ferrara, onde predominou a oferta privada, com 48,8%, seguida pelo governo central, com 40,5%, e pelas unidades comunali, com apenas 10,7%.

Nas creches e serviços complementares, embora a titularidade pública respondesse pela maioria do atendimento, sobressaíram a total ausência do governo central (que não atua nessa faixa etária) e a forte presença do setor privado em algumas províncias. É o caso de Ravenna (60,2%) e de Forlì-Cesena (60,7%).

A Tabela 3 analisa a situação da matrícula entre os diferentes setores.

Tabela 3
Distribuição de crianças por província na educação de 0 a 6 anos segundo natureza jurídica do titular (ano escolar 2018/2019), Itália.

Com relação ao número de crianças atendidas, no caso de 0 a 3 anos, a maioria encontrava-se em unidades públicas: 71,8%, com destaque para Rimini, onde o índice atingiu 80,3%. Na pré-escola, por seu turno, 48,5% das matrículas estavam em escolas geridas pelo governo central e 20% com os comuni, totalizando 68,5%, ficando as demais 31,5% com o setor privado. Nesse caso, a maior participação do setor privado foi constatada em Ferrara e em Reggio Emilia.

Ao observar esses dados, é perceptível a força que o setor público cumpre no oferecimento de vagas para as crianças de 0 a 3 anos na Emilia-Romagna. Ravenna, por exemplo, que na disponibilização de vagas de 0 a 3 anos apresentava o percentual de 60,2% de unidades privadas, altera essa proporção quando se consideram as matrículas, com 59,5% em creches comunali. Outro caso interessante é o de Ferrara, que tem 43,5% do atendimento em unidades privadas, mas que acolhe 73,6% das crianças no setor público. A explicação fundamental para essa discrepância no caso das creches decorre do fato de a gestão privada concentrar-se nos espaços dos serviços integrados/complementares na etapa de 0 a 3 anos, enquanto o setor público arca com os serviços das creches clássicas, que abrigam o maior número de crianças por unidade. No que tange às pré-escolas, os percentuais não têm grandes disparidades, mantendo-se a proporção entre o número de unidades e o número de crianças atendidas.

Um aspecto importante a se considerar é que existe forte resistência à ampliação da participação do setor privado na gestão das creches clássicas. Na Emilia-Romagna, as propostas mais direcionadas para o mercado encontram forte oposição da sociedade local. A terceirização e a privatização sempre causaram grande controvérsia nas regiões do Centro e Norte italianos e geraram forte resistência, com oposição generalizada dos trabalhadores, dos pais, dos sindicatos e da sociedade. Na cidade de Parma, por exemplo, diante da proposta de elaboração de uma estrutura para a gestão de serviços por meio da iniciativa privada, foi criado um movimento de oposição das famílias com o Comitato dei Genitori in Defesa dei Servizi Educativi Comunali (Comitê de Pais em Defesa dos Serviços Educativos Comunali), que realizou mobilizações para contrapor-se ao processo e discutir o futuro das creches e pré-escolas da cidade (Parmatoday, 2011PARMATODAY. ParmaZeroSei: i genitori contro la svendita delle professionalità. Parmatoday, 2011. Disponível em: https://www.parmatoday.it/cronaca/genitori-contro-parma-zerosei.html. Acesso em: 7 nov. 2022.
https://www.parmatoday.it/cronaca/genito...
).

Em Modena, o movimento surgiu com força diante de propostas de privatização com foco na redução ao mínimo da gestão direta. Foi criado, em março de 2012, o Comitato di Genitori (Comitê de Pais) com o nome Giù le Mani Dagli Asili (Tirem as Mãos das Creches), que em algumas semanas coletou mais de 7.500 assinaturas contra a privatização e realizou uma grande manifestação em 17 de março de 2012 (Neri, 2012NERI, S. L’innovazione istituzionale al tempo della crisi: la fondazione per le scuole dell’infanzia di Modena. 2012. Disponível em: https://www.secondowelfare.it/governi-locali/enti-locali/la-fondazione-per-le-scuole-dellinfanzia-di-modena/. Acesso em: 1.º fev. 2021.
https://www.secondowelfare.it/governi-lo...
).

Com a pressão contra a privatização e a necessidade de ampliar o atendimento, a administração regional tenta direcionar seus recursos para financiar as creches por meio de uma proposta orçamentária que não se caracteriza como um fundo permanente. No caso da Emilia-Romagna e de grande parte do financiamento na Itália e nos comuni, a alocação dos recursos depende de aprovações legislativas, que podem ou não continuar sendo orçadas, a depender da conjuntura econômica e das prioridades que o ente público apresenta a cada ciclo orçamentário.

Em 2019, uma nova norma, a Diretiva nº 1.338/2019, foi aprovada com o objetivo exclusivo de reduzir as mensalidades das creches (públicas e privadas conveniadas), o que pode levar a um abatimento do valor pago, ou até mesmo chegar à gratuidade, com recursos exclusivos da região, alocados no “fundo regional para os serviços para a infância” (Regione Emilia-Romagna, 2019bREGIONE EMILIA-ROMAGNA. Deliberação nº 1.338, de 29 de julho de 2019. Misura sperimentale di sostegno economico alle famiglie denominata “al nido con la regione” per l’anno educativo 2019-2020. Gazzeta Ufficiale, 2019b. Disponível em: https://servizissiir.regione.emilia-romagna.it/deliberegiunta/servlet/AdapterHTTP?action_name=ACTIONRICERCADELIBERE&operation=dettaglioByDatiAdozione&ENTE=1&TIPO_ATTO=DL&ANNO_ADOZIONE=2019&NUM_ADOZIONE=1338. Acesso em: 21 jan. 2021.
https://servizissiir.regione.emilia-roma...
). A diretiva, denominada Al Nido con la Regione (Na Creche com a Região), teve dotação orçamentária de € 18,3 milhões para o ano escolar de 2019/2020. As famílias beneficiadas teriam de apresentar um ISEE de até € 26 mil.

Apesar do caráter positivo dessas medidas, ao tentar diminuir o dispêndio das famílias, os valores totais previstos nos orçamentos são modestos, e mantém-se a lógica da focalização conforme o limite da renda, sem a perspectiva da gratuidade universal. Além disso, os recursos não são permanentes, o que pode comprometer a garantia dos direitos das crianças beneficiadas a médio e longo prazos, sem falar das dificuldades financeiras dos comuni para expandir o atendimento.

De maneira geral, não se encontra nas regulamentações regionais a perspectiva do direito à gratuidade universal nas instituições públicas, como existe, por exemplo, no Brasil. Assim, mesmo apresentando uma proposta pedagógica inovadora e reconhecida internacionalmente, o sistema da região tem os mesmos problemas estruturais presentes em outras regiões da Itália relativos à ausência de gratuidade e à não garantia do direito à educação a todas as famílias que o demandam, o que afeta a perspectiva de qualidade da educação como um direito de todos e dever do Estado.

Esse pressuposto conduz à necessidade de quantificar a qualidade nas análises da educação de 0 a 6 anos, pois a viabilização do direito de todas as crianças à vaga é um fator primordial de um processo de democratização da educação, conforme afirma Corrêa (2003, p. 94)CORRÊA, B. C. Considerações sobre qualidade na educação infantil. Cadernos de Pesquisa, n. 119, p. 85-112, jul. 2003.:

Numa perspectiva democrática, a primeira ideia acerca da qualidade da educação que vem à mente diz respeito ao seu oferecimento, por parte do Estado, ou seja, a primeira questão refere-se necessariamente à ideia de quantidade. Por mais óbvio que possa parecer, uma vez que não se pode falar em qualidade de algo que não existe, é importante chamar a atenção para a relação entre qualidade e quantidade. Assim, é preciso considerar, em princípio, a capacidade de atendimento dos sistemas públicos diante da demanda existente, ou seja, a sua dimensão quantitativa.

O mais grave diante da não gratuidade é a presença de vagas ociosas na faixa etária de 0 a 3 anos. Na região, do total de 36.933 vagas disponíveis, 30.454 foram ocupadas no ano escolar de 2018/2019, ou seja, ociosidade de 6.479 vagas (Regione Emilia-Romagna, 2020REGIONE EMILIA-ROMAGNA. Servizio Politiche sociali e socio educative. Rapporto informativo sull’offerta educativa 0-6 in Emilia-Romagna dati dell’anno educativo e scolastico 2018-2019. Centro stampa Regione Emilia-Romagna, 2020. Disponível em: https://sociale.regione.emilia-romagna.it/documentazione/pubblicazioni/prodotti-editoriali/2020/rapporto-informativo-sullofferta-educativa-0-6-in-emilia-romagna. Acesso em: 25 jan. 2021.
https://sociale.regione.emilia-romagna.i...
), o que reforça a constatação de que, do ponto de vista desse sistema regional de educação infantil, a não gratuidade implica diretamente na negação do direito para as crianças das famílias mais pobres.

A creche, como um lugar público de educação infantil, “deve demonstrar capacidade de ir ao encontro de particulares carências, interesses, necessidades dos próprios usuários, como, por exemplo, em primeiro lugar, a possibilidade de acesso a ela” (Bondioli, 2004aBONDIOLI, A. Avaliação e o credenciamento. In: BONDIOLI, A. (org.). O projeto pedagógico da creche e a sua avaliação: a qualidade negociada. Campinas: Autores Associados, 2004a. p. 139-157., p. 143). A admirada qualidade da educação da criança pequena italiana favorece apenas um pequeno grupo no universo das crianças nascidas na região, 33%, que no limite gozam não um direito, mas um “privilégio” (Correia, 2021CORREIA, M. A. A. A educação da criança pequena na região da Emilia-Romagna na Itália: um estudo sobre organização, gestão e financiamento. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Estado, Sociedade e Educação, Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2021. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48139/tde-20102021-130426/. Acesso em: 23 jan. 2022
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).

Considerações Finais

Na região da Emilia-Romagna, que se diferencia pelo histórico de valores cooperativos, democráticos, solidários e igualitários, a luta está presente desde a resistência ao fascismo, na Segunda Guerra Mundial. Ela possibilitou uma forma diferenciada de construção social em que a ação coletiva não é a exceção, mas o padrão de convivência. Trata-se de um exemplo claro do Estado como elemento de disputa, não obstante a hegemonia da burguesia, como mostra a análise de Poulantzas (2015)POULANTZAS, N. O Estado, o poder, o socialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015. que abre este artigo.

Mesmo em uma região com forte organização popular, notam-se os diferentes arranjos entre as províncias na oferta da educação infantil, com maior ou menor presença do setor público e distintas taxas de atendimento, de maneira especial na faixa de 0 a 3 anos. Vê-se igualmente o avanço de formas mais flexíveis de atendimento, buscando atender às demandas e especificidades das famílias, mas é por onde também o setor privado, incluindo os lucrativos, se apresenta e amplia sua participação.

Sua proposta pedagógica é, acima de tudo, um projeto ético e político que teve e continuará tendo problemas e desafios. O legado dessa experiência é uma representação de que a luta por instituições escolares de qualidade extrapola o âmbito educacional, configurando-se como uma luta social. Todavia, o não reconhecimento da educação infantil como direito e a ausência da gratuidade em instituições públicas na faixa de 0 a 3 anos se configuram como sérios obstáculos ao acesso das crianças às instituições educacionais e à garantia de seu direito à educação.

Finalmente, não há como deixar de pensar algumas implicações desta pesquisa para a realidade do atendimento à criança pequena no Brasil. De um lado, há que se reforçar o avanço em nossa legislação no que se refere à garantia do direito às crianças, particularmente na faixa etária de 0 a 3 anos, à oferta gratuita da educação infantil em instituições oficiais e ao estabelecimento de metas de atendimento (50% para a faixa de 0 a 3 anos até 2024 e 100% na faixa de 4 e 5 anos desde 2016) mais avançadas que aquelas da União Europeia. Constatam-se no Brasil, contudo, os mesmos desafios da diversidade de taxas de atendimento entre as diferentes regiões, nos distintos padrões de oferta e no avanço do setor privado, com destaque à forma de convênios e parcerias.

Concluindo, cabe assinalar que, tanto na Itália como no Brasil, essas conquistas foram fruto de longas e duras lutas da população organizada, que deve continuar considerando o enorme avanço da lógica neoliberal no Brasil e no mundo, que preza pela privatização e diminuição dos serviços públicos.

Notas

  • 1
    Para a citação da região do estudo e de outros locais do território italiano foi utilizada a grafia da Constituição da Itália. Realizou-se a tradução de regione/regioni para região/regiões e provincia/province para província/províncias. O caso de comune no singular ou comuni no plural, que são os entes locais na divisão política e administrativa italiana, equivalentes aos nossos municípios, diante do peso que essa palavra tem na cultura italiana em relação à prestação de serviços à comunidade e sua relevância histórica e social, a opção foi de não utilizar sua tradução como município ou prefeitura, tendo sido, portanto, mantida a grafia em italiano, bem como a adjetivação derivante relacionada à administração local como comunale/comunali. No que tange ao Stato, instância máxima da organização administrativa italiana, empregou-se a denominação de governo central, sem tradução para governo federal, considerando que a Itália não se organiza como uma federação.
  • 2
    A legislação italiana prevê a divisão da educação de 0 a 6 anos em duas etapas. A primeira é para crianças de 0 a 3 anos, definida como servizi educativi per la prima infanzia (serviços educativos para a primeira infância), da qual faz parte um conjunto de estruturas de atendimento dividido em dois blocos: nidi, micronidi e sezioni primavera, que têm funcionamento mais parecido com creches clássicas (utilizamos essa expressão para nos referirmos a essa estrutura de atendimento, que é a mais próxima da creche brasileira); e servizi integrativi (serviços integrados/complementares), organizados em spazi gioco (espaços para jogo/brincadeira), centri per bambini e famiglie (centros para crianças e famílias) e servizi educativi in contesto domiciliare (serviços educativos em contexto domiciliar). A segunda etapa, direcionada para crianças de 3 a 6 anos, é a scuola dell’infanzia.
  • 3
    Entre outras atividades, destacamos a entrevista com a representante do escritório do Ministero da Instrução e Ricerca (Ministério da Educação e Pesquisa) da região do Veneto; a conversa com representante do setor de serviços e políticas sociais e educacionais da Região da Emilia-Romagna; a entrevista com representante da Confederazione Generale Italiana del Lavoro (Confederação Geral Italiana do Trabalho); a entrevista com representante da Coperselius, cooperativa que atua na gestão de creches e pré-escolas na Emilia-Romagna; a conversa com liderança e administradora aposentada do Comune de Parma e ex-presidente do Gruppo Nazionale Nido Infanzia (GNNI), uma das principais organizações italianas de defesa da educação da primeira infância; e a participação em evento em Roma da organização Save The Children e a reunião do GNNI em Bologna.
  • 4
    Apesar de a criação das regiões ter sido aprovada na Constituição de 1948, somente na década de 1970 começaram a ser realizadas as primeiras eleições regionais, que previam a escolha de um presidente e de um conselho regional.
  • 5
    Na Itália, as creches passaram para a área da educação somente em 2017, sem diretivas nem financiamento do governo central. Já as pré-escolas tiveram seu desenvolvimento vinculado ao Ministério da Educação desde os anos 1960, com orientações e financiamento centralizados.
  • 6
    É um mecanismo que mede a capacidade financeira das famílias, com base na renda, nos patrimônios mobiliário e imobiliário e nas características dos núcleos familiares. Com base nesses dados, é feito um cálculo para definir a faixa de renda na qual a família se enquadra e, consequentemente, o valor da mensalidade. O ISEE é acionado cada vez que as famílias ou os cidadãos solicitam serviços públicos subsidiados, principalmente para acesso a políticas sociais. Tem validade anual e, no caso das creches, deve ser enviado para o comune.
  • O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Código de Financiamento 001. Ele faz parte da pesquisa de doutorado A educação da criança pequena na região da Emilia-Romagna na Itália: um estudo sobre organização, gestão e financiamento, apresentada na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    11 Dez 2022
  • Aceito
    31 Ago 2023
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