RESUMO
O presente artigo é um recorte de duas pesquisas mais abrangentes e tem como objetivo analisar as relações que se constroem e se reconstroem em torno das ações de privatização da educação, formuladas e aplicadas por organizações do terceiro setor ligadas ao setor bancário brasileiro e às redes públicas de ensino. Utilizou-se a abordagem de análise de redes sociais para mapear os nós principais e elos relacionais que constituem tal rede. Foram encontrados 410 elos relacionais, originados de três braços sociais que atuam em educação, pertencentes a dois bancos brasileiros: Itaú Social, Instituto Unibanco e Fundação Bradesco. É possível perceber que a rede é constituída de 99 sujeitos e, além de possuir grande alcance e capilaridade, funciona de maneira orgânica e dissemina conteúdos em torno de pautas comuns, embora com modus operandi de atuação diverso.
Palavras-chave
Privatização da educação; Responsabilidade social empresarial; Análise de redes sociais; Setor bancário brasileiro
ABSTRACT
This article is an excerpt from two more comprehensive studies and aims to analyze the relationships that are built and rebuilt around education privatization actions, formulated and applied by third sector organizations linked to the Brazilian banking sector, together with public education systems. The social network analysis approach was used to map the main nodes and relational links that constitute such a network, and 410 relational links were found, originating from three social arms that work in education, belonging to two Brazilian banks: Itaú Social, Instituto Unibanco, and Fundação Bradesco. It is possible to see that the network is made up of 99 actors, and, in addition to having great reach and capillarity, it works organically and disseminates content around common agendas, although with a different modus operandi of action.
Keywords
Privatization of education; Corporate social responsibility; Social network analysis; Brazilian banking sector
RESUMEN
Este artículo es un extracto de dos estudios más completos y tiene como objetivo analizar las relaciones que se construyen y reconstruyen en torno a acciones de privatización de la educación, formuladas y aplicadas por organizaciones del tercer sector vinculadas al sector bancario brasileño, junto con las redes públicas de educación. Se utilizó el enfoque de Análisis de Redes Sociales (SNA) para mapear los principales nodos y vínculos relacionales que constituyen la red. Se encontraron 410 vínculos relacionales, provenientes de tres brazos sociales que actúan en educación, pertenecientes a dos bancos brasileños: Itaú Social, Instituto Unibanco y Fundação Bradesco. Se puede observar que la red está compuesta por 99 sujetos, y además de tener gran alcance y capilaridad, funciona orgánicamente y difunde contenidos en torno a agendas comunes, aunque con un modus operandi de acción diferente.
Palabras clave
Privatización de la educación; Responsabilidad social corporativa; Análisis de redes sociales; Sector bancario brasileño
Introdução
A pesquisa acerca dos processos de privatização da educação pública tem ganhado destaque e ampliado seu alcance nos últimos anos. Diversos pesquisadores (Croso; Magalhães, 2016CROSO, C.; MAGALHÃES, G. M. Privatização da educação na América Latina e no Caribe: tendências e riscos para os sistemas públicos de ensino. Educação & Sociedade, Campinas, v. 37, n. 134, p. 17-33, jan.-mar. 2016. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302016157622
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; Adrião, 2018ADRIÃO, T. Dimensões e formas da privatização da educação no Brasil: caracterização a partir de mapeamento de produções nacionais e internacionais. Currículo sem Fronteiras, v. 18, n. 1, p. 8-28, 2018. Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol18iss1articles/adriao.pdf. Acesso em: jul. 2023.
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; Macedo; Motta, 2019MACEDO, J. M.; MOTTA, V. C. Veias abertas para a privatização na educação brasileira. Revista Trabalho, Política e Sociedade, Rio de Janeiro, v. 4, n. 7, p. 171-188, 2019. https://doi.org/10.29404/rtps-v4i7.229
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; Morgan; Mocarzel, 2021MORGAN, K.; MOCARZEL, M. Formação para a conformação? Uma análise das redes da Fundação Itaú Social na implementação da BNCC. Interfaces da Educação, Dourados, v. 12, n. 35, p. 1039-1064, 2021. https://doi.org/10.26514/inter.v12i35.5979
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; Tripodi; Sousa, 2021TRIPODI, Z. F.; SOUSA, S. Z. Do governo à governança: permeabilidade do Estado a lógicas privatizantes na educação. Cadernos de Pesquisa, v. 48, n. 167, p. 228-253, 2021. https://doi.org/10.1590/198053144800
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) têm se debruçado recorrentemente sobre a temática, originando a produção de dissertações e teses, aprofundando o debate no campo e ensejando novas perspectivas analíticas.
Tal afirmação pode ser inferida por meio da verificação da produção acadêmica nas últimas três décadas. Ao inserir, entre aspas, o descritor “Privatização da educação” no Catálogo de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), circunscrevendo a busca à área de conhecimento e concentração “educação”, até o ano de 2021, obtivemos a informação de que foram defendidos 56 trabalhos nos programas de pós-graduação brasileiros que, de alguma maneira, abordaram a temática. Os dados do catálogo demonstram um crescente interesse na temática, uma vez que, dos 56 trabalhos identificados, 34 foram defendidos entre 2017 e 2021.
Neste artigo, adota-se a definição de privatização trazida por Adrião e Domiciano (2021, p. 672)ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
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, que a entendem “como transferência da esfera estatal para a esfera privada de reponsabilidades, atribuições ou ativos necessários à consecução e garantia da educação a todos e a todas”, o que deriva na “minimização da presença direta do poder público nesta tarefa”.
Para além das ações propriamente ditas que se inserem na educação pública sob forma de programas, políticas e parcerias, há a privatização das formas de organização, gestão e funcionamento interno das instituições educativas calcadas na disseminação de um discurso que se pretende hegemônico, com o objetivo de capturar as “almas pela liturgia da palavra” (Shiroma; Garcia; Campos, 2011SHIROMA, E. O.; GARCIA, R. M. C.; CAMPOS, R. F. Conversão das “almas” pela liturgia da palavra: uma análise do discurso do movimento Todos pela Educação. In: MAINARDES, J.; BALL, S. (org.). Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011. p. 174-197., p. 222).
Essa conversão envolve gestores, funcionários, docentes e o convencimento da sociedade civil em torno de determinadas premissas ligadas à nova gestão pública (NGP)1
1
“Do ponto de vista político as bases da NGP se encontram na crítica ao Estado de Bem-Estar Social, ao planejamento centralizado e ao papel indutor e promotor do bem social exercido preponderantemente pelo Estado, suas bases epistemológicas estão no Novo Institucionalismo” (Oliveira; Duarte; Clementino, 2017, p. 710).
e ao que Freitas (2014, p. 1093)FREITAS, L. C. Os reformadores empresariais da educação e a disputa pelo controle do processo pedagógico na escola. Educação & Sociedade, Campinas, v. 35, n. 129, p. 1085-1114, out.-dez. 2014. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302014143817
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tem chamado de neotecnicismo educacional, cujos objetivos são “padronizar, avaliar e controlar o processo pedagógico da escola”. Nesse contexto, compreendendo a privatização como um processo amplo, um relevante elemento coloca-se em evidência: a chamada responsabilidade social empresarial (RSE), cuja atuação tem ganhado relevância, de modo especial no cenário empresarial globalizado.
Morgan (2020)MORGAN, K. V. Um Itaú de vantagens feito pra você? A ação da Fundação Itaú Social na educação pública brasileira. 210f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2020. https://app.uff.br/riuff/handle/1/16004
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afirma, fundamentada em Barbieri e Cajazeira (2009)BARBIERI, J. C.; CAJAZEIRA, J. Responsabilidade social e empresarial e empresa sustentável. São Paulo: Saraiva, 2009., que a RSE conta com um movimento mundial vigoroso:
[...] que envolve empresas, organizações não governamentais e entidades empresariais, muitas delas ligadas à Organização das Nações Unidas (ONU). Ainda segundo o autor, pode-se atestar a relevância de tal movimento por meio da construção de uma normatização de responsabilidade empresarial pela mais importante entidade de certificação do mundo atual, a International Organization for Estandardization (ISO)
(Morgan, 2020MORGAN, K. V. Um Itaú de vantagens feito pra você? A ação da Fundação Itaú Social na educação pública brasileira. 210f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2020. https://app.uff.br/riuff/handle/1/16004
https://app.uff.br/riuff/handle/1/16004... , p. 90).
O presente artigo decorre de duas pesquisas mais abrangentes e objetiva analisar as relações que se constroem e se reconstroem em torno das ações de privatização da educação, formuladas e aplicadas por organizações do terceiro setor ligadas ao setor bancário brasileiro e às redes públicas e privadas de ensino. Usando a abordagem de análise de redes sociais (ARS) (Souza; Quandt, 2008SOUZA, Q.; QUANDT, C. Metodologia de análise de redes sociais. In: DUARTE, F.; QUANDT, C.; SOUZA, Q. (org.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008. p. 31-63.), buscou-se mapear os nós2 2 São denominados nós, de acordo com a ARS, os indivíduos ou grupos de indivíduos, corporações, fundações e demais atores ou agentes que compõem a rede de inter-relações a ser desvelada neste artigo (Souza; Quandt, 2008). principais e elos relacionais3 3 A “relação que estabelece uma conexão ou troca de fluxos entre dois atores” (Souza; Quandt, 2008, p. 31) é nomeada elo relacional ou aresta. Esses elos relacionais podem estar ligados a tipos de conexão diferentes, desde o compartilhamento de opiniões pessoais até a transferência de recursos. que constituem tal rede. Inicia-se com a conceituação e historicização da RSE no Brasil, com vistas à compreensão do contexto em que a pesquisa se insere.
Responsabilidade Social Empresarial no Brasil
Os conceitos de RSE ou responsabilidade social corporativa, aqui entendidos indistintamente, envolvem bem mais que ações esporádicas, requerendo continuidade. Dupas (2005)DUPAS, G. Atores e poderes na nova ordem global: assimetrias, instabilidades e imperativos de legitimação. São Paulo: Editora Unesp, 2005. esclarece que a renovação discursiva do que foi nomeado filantropia surge em virtude da necessidade de:
[...] dar respostas às graves questões sociais surgidas com a globalização, uma espécie de “regulação moral” do capitalismo global. Trata-se, mais uma vez, de parte das estratégias de legitimação do capital, num contexto em que ele é muitas vezes apontado como responsável por vários distúrbios sociais
(Dupas, 2005DUPAS, G. Atores e poderes na nova ordem global: assimetrias, instabilidades e imperativos de legitimação. São Paulo: Editora Unesp, 2005., p. 119).
Segundo Paoli (2002)PAOLI, M. C. Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da cidadania. In: SANTOS, B. S. (org.). Democratizar e democracia: os caminhos da democracia participativa. São Paulo: Civilização Brasileira, 2002. p. 375-418., há diversos motivos para que as empresas invistam em ações sociais. A autora menciona que, conforme pesquisas do setor empresarial, tais ações resultam em fidelidade dos consumidores aos produtos e serviços, aumentando o valor agregado das marcas. As análises de Dupas (2005)DUPAS, G. Atores e poderes na nova ordem global: assimetrias, instabilidades e imperativos de legitimação. São Paulo: Editora Unesp, 2005. e Paoli (2002)PAOLI, M. C. Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da cidadania. In: SANTOS, B. S. (org.). Democratizar e democracia: os caminhos da democracia participativa. São Paulo: Civilização Brasileira, 2002. p. 375-418. são corroboradas pelas declarações de Oded Grajew, empresário e presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente (1986–1992) e seu fundador (1990), em entrevista à revista Caros Amigos (apud Paoli, 2002PAOLI, M. C. Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da cidadania. In: SANTOS, B. S. (org.). Democratizar e democracia: os caminhos da democracia participativa. São Paulo: Civilização Brasileira, 2002. p. 375-418., p. 393): “Não tenho ilusões. A lógica empresarial é o lucro e não a solidariedade. Mas de repente há a percepção que lucro depende de posturas mais éticas e solidárias”.
Nesse mesmo sentido, Tomei (1984, p. 195)TOMEI, P. Responsabilidade social de empresas: análise qualitativa da opinião do empresariado nacional. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 24, n. 4, p. 189-202, 1984. https://doi.org/10.1590/S0034-75901984000400029
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, em análise qualitativa da opinião do empresariado nacional sobre a RSE, aponta que tal responsabilidade é vista como associada à função lucrativa, e não como um comportamento antimaximização de lucros. Groppo (2007)GROPPO, L. A. Responsabilidade social empresarial e a mercantilização da solidariedade. Serviço Social e Sociedade, v. 91, p. 143-162, 2007. afirma que o movimento de ação social das empresas oculta o fato de que sua busca pela maximização dos lucros aprofunda as desigualdades que a RSE tenta combater ou atenuar. Em outras palavras, as empresas criam os problemas sociais que suas fundações tentam solucionar.
A transferência de responsabilidades sociais do Estado para as empresas impede a construção de um espaço público onde os excluídos possam participar das discussões sobre as políticas que os afetam, sendo esses espaços “homogeneizados pela sua carência” (Paoli, 2002PAOLI, M. C. Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da cidadania. In: SANTOS, B. S. (org.). Democratizar e democracia: os caminhos da democracia participativa. São Paulo: Civilização Brasileira, 2002. p. 375-418., p. 403). Ball e Olmedo (2013, p. 33)BALL, S.; OLMEDO, A. A nova filantropia, o capitalismo social e as redes de políticas globais em educação. In: PERONI, V. (org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação. Brasília: Líber Livro, 2013. p. 33-47. destacam que essa nova configuração combina “soluções inovadoras e velhas soluções para problemas sociais e de desenvolvimento baseadas no mercado”, originando “novos filantropos” que relacionam diretamente caridade e resultados esperados, além de se envolverem na comunidade política.
Por conseguinte, esses novos filantropos, sejam indivíduos, sejam corporações, começam a assumir responsabilidades sociomorais antes atribuídas a “organizações da sociedade civil, entidades governamentais e agências estatais” (Ball; Olmedo, 2013BALL, S.; OLMEDO, A. A nova filantropia, o capitalismo social e as redes de políticas globais em educação. In: PERONI, V. (org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação. Brasília: Líber Livro, 2013. p. 33-47.), sem abrir mão do lucro. A filantropia tradicional transforma-se, passando da caridade paliativa (“Filantropia 1.0”) para a caridade voltada ao desenvolvimento (“Filantropia 2.0”) e, atualmente, para a caridade lucrativa (“Filantropia 3.0”) (Ball; Olmedo, 2013BALL, S.; OLMEDO, A. A nova filantropia, o capitalismo social e as redes de políticas globais em educação. In: PERONI, V. (org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação. Brasília: Líber Livro, 2013. p. 33-47., p. 34).
No Brasil, a discussão sobre RSE se consolidou na segunda metade dos anos 1990, com as primeiras manifestações envolvendo empresários, comunidade, políticos e meios de comunicação (Passador, 2002PASSADOR, C. S. A responsabilidade social no Brasil: uma questão em andamento. In: CONGRESSO INTERNATIONAL DEL CLAD SOBRE LA REFORMA DEL ESTADO Y DE LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA, 7., 2002. Lisboa. Anais [...]. 2002. Disponível em: https://cladista.clad.org/bitstream/handle/123456789/2318/0044201.pdf?sequence=1. Acesso em: ago. 2022
https://cladista.clad.org/bitstream/hand...
, p. 1). Diversos autores (Baldo, 2002BALDO, R. A empresa cidadã frente ao balanço social. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 15., 2002, Salvador. Anais [...]. 2002. Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/2760ec1e4c198b61ec134c72fce1fe91.pdf. Acesso em: jul. 2023.
http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/...
; Barbieri; Cajazeira, 2009BARBIERI, J. C.; CAJAZEIRA, J. Responsabilidade social e empresarial e empresa sustentável. São Paulo: Saraiva, 2009.; Oliveira, 2013OLIVEIRA, J. A. P. Empresas na sociedade: sustentabilidade e responsabilidade social. São Paulo: Elsevier, 2013.) indicam que o tema ganhou relevância nacional em 1996, com a campanha do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, que convocou os empresários a se engajarem socialmente e a publicar um balanço social, documento que reúne informações sobre projetos e ações sociais da empresa – um instrumento estratégico para a responsabilidade social corporativa (Torres, 2008TORRES, C. (org.). Balanço social, dez anos: o desafio da transparência. Rio de Janeiro: Ibase, 2008. v. 1.).
Essa campanha impulsionou a discussão sobre a responsabilidade das empresas com a comunidade e a sociedade brasileira, culminando na criação do Instituto Ethos em 1998, por empresários e executivos do setor privado. O referido instituto propôs-se a ser “um polo de organização de conhecimento, troca de experiências e desenvolvimento de ferramentas para auxiliar as empresas a analisar suas práticas de gestão e aprofundar seu compromisso com a responsabilidade social e o desenvolvimento sustentável” (Instituto Ethos, 2022INSTITUTO ETHOS. Sobre o Instituto. Instituto Ethos, 2022. Disponível em: https://www.ethos.org.br/conteudo/sobre-o-instituto/. Acesso em: jul. 2023.
https://www.ethos.org.br/conteudo/sobre-...
).
Nessa perspectiva, o Instituto Ethos elaborou um documento orientador para guiar as empresas na incorporação de práticas socialmente responsáveis em suas atividades diárias. Em 1998, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), sob a direção de Herbert de Souza, introduziu um selo para empresas que publicassem seus balanços sociais conforme o modelo proposto pelo instituto. Essa iniciativa não apenas incentivou a criação do documento, mas também impulsionou ações de RSE, visto que tais práticas seriam valorizadas pela sociedade e poderiam tornar-se um diferencial competitivo no mercado (Ventura, 2005VENTURA, E. C. F. Balanço social dos bancos/Febraban: uma análise da evolução da responsabilidade social empresarial (RSE). Cadernos EBAPE.BR, São Paulo, v. 3, n. 3, p. 1-23, 2005. https://doi.org/10.1590/S1679-39512005000300002
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).
Com isso, a RSE gradualmente se tornou um imperativo para as corporações, centralizando discussões em diversos campos, como administração de empresas, educação, filosofia e ciência política. A tomada de consciência das elites empresariais que teria surgido então se tornou um fenômeno no país, algo que já havia ocorrido quase um século antes nos Estados Unidos e na Europa. Sua atuação e adesão alavancaram a proliferação de fundações privadas e associações sem fins lucrativos (Fasfil), reunindo no levantamento realizado no ano de 2016, o último disponível da série histórica, 236.950 unidades, que, juntas, empregam mais de 2,2 milhões de pessoas no Brasil4
4
Os dados referem-se a censo especial realizado pelo IBGE e representam o último da série disponível.
(IBGE, 2016INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Estatísticas do Cadastro Central de Empresas – Cempre. Brasil: IBGE, 2016. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/comercio/9016-estatisticas-do-cadastro-central-de-empresas.html?=&t=destaques. Acesso em: jul. 2023.
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).
Metodologicamente para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para integrar o conjunto das Fasfil, cinco critérios precisam ser verificados: “Organizações privadas, distribuidoras de lucro, institucionalizadas, autoadministradas e voluntárias” (IBGE, 2016INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Estatísticas do Cadastro Central de Empresas – Cempre. Brasil: IBGE, 2016. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/comercio/9016-estatisticas-do-cadastro-central-de-empresas.html?=&t=destaques. Acesso em: jul. 2023.
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, p. 12). A Fig. 1 demonstra o crescimento desses braços sociais das empresas ao longo das últimas décadas.
A Fig. 1 aponta tendência de crescimento em todo o período analisado no número de Fasfil criadas. As décadas de 1990 e 2000 apresentaram crescimento percentual de 23,3 e 29,5%, respectivamente. Cabe lembrar que a abertura do Brasil ao mercado, iniciada no governo Fernando Collor de Mello (1990–1992) e aprofundada nos governos seguintes, contribuiu para que as grandes empresas abrissem capital na bolsa de valores e, consequentemente, buscassem imagens positivas que agradassem, além dos clientes, os acionistas.
Entretanto, considerando o total de Fasfil que permanecem funcionando, houve retração de 16,5% entre 2010 e 2016, período em que o total passou de 283.812 para 236.950 entidades. Ou seja, 46.862 entidades fecharam suas portas, um fenômeno que pode ser explicado pela crise econômica enfrentada pelo país nesse período. Em relação às atividades exercidas, as Fasfil do setor “religião” lideram o ranking, representando 35,1% do total, seguidas por “cultura e recreação”, com 13,6%, e “associações patronais e profissionais”, com 12,2%. As Fasfil dedicadas à “educação e pesquisa” somam 15.828, correspondendo a 6,7% do total (IBGE, 2016INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Estatísticas do Cadastro Central de Empresas – Cempre. Brasil: IBGE, 2016. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/comercio/9016-estatisticas-do-cadastro-central-de-empresas.html?=&t=destaques. Acesso em: jul. 2023.
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).
Esses números ilustram a dimensão que as Fasfil alcançaram no Brasil, contudo não foi possível determinar quantas dessas entidades estão ligadas a empresas e/ou ao setor financeiro. O ranking anual da Forbes Global 2000, que lista as maiores empresas de capital aberto do mundo, incluiu 22 empresas brasileiras em 2023. Conforme ilustrado no Quadro 1, as cinco primeiras posições, três são instituições financeiras, e todas possuem políticas de RSE.
Diante dos dados, é possível observar que as grandes corporações apresentam a tendência de envolvimento com políticas socialmente responsáveis, analisando o plano discursivo. A assertiva é corroborada por Tomei (1984, p. 195), ao entrevistar empresários de grande porte: “O grande empresário aborda a questão segundo uma dimensão macro, ampliando a inserção empresarial para fora dos domínios da organização”.
O Setor Bancário Brasileiro e a Educação
Os bancos, instituições e conglomerados financeiros, embora influenciados pela internacional demanda já consolidada, foram impulsionados a criar suas políticas de RSE com a atuação da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
Consideramos a Febraban um ator-chave no processo de institucionalização da RSE no setor bancário. Fundada em 1967, é a principal entidade representativa do setor bancário brasileiro e, operando em âmbito nacional, conta com 129 associados – de um universo de 161 instituições bancárias, em 2003, o que representa mais de 97,46% do total de ativos e 94,19% do patrimônio líquido do sistema –, o que lhe fornece um potencial disseminador da RSE e do balanço social
(Ventura, 2005VENTURA, E. C. F. Balanço social dos bancos/Febraban: uma análise da evolução da responsabilidade social empresarial (RSE). Cadernos EBAPE.BR, São Paulo, v. 3, n. 3, p. 1-23, 2005. https://doi.org/10.1590/S1679-39512005000300002
https://doi.org/10.1590/S1679-3951200500... , p. 8).
A consolidação veio em 2002, quando se criou uma comissão especial para que o assunto fosse mais bem trabalhado entre os envolvidos.
Há, na página virtual da Febraban, grande quantidade de material sobre responsabilidade ambiental. Encontrou-se na pesquisa exploratória material referente a atividades socialmente responsáveis focalizando outras áreas de atuação. A atuação da entidade é apresentada na página, em que afirma visar alcançar:
Conformidade com a legislação e regulação socioambiental; Menor insegurança jurídica relacionada a questões socioambientais em operações intermediadas pelo setor bancário; Melhoria contínua na gestão dos riscos ambientais e sociais aos quais os bancos estão expostos; Aumento do volume de negócios verdes e inclusivos e geração de impacto positivo para a sociedade
(Febraban, 2022FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS (FEBRABAN). Nossa atuação em sustentabilidade. Febraban, 2022. Disponível em https://portal.febraban.org.br/pagina/3059/37/pt-br/responsabilidade-socioambiental. Acesso em: jul. 2023.
https://portal.febraban.org.br/pagina/30... ).
Embora a Febraban não exponha em sua home page grande incentivo à educação, dados do censo de 2020 realizado pelo Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife, 2016GRUPO DE INSTITUTOS, FUNDAÇÕES E EMPRESAS (GIFE). Censo Gife 2016. Gife, 2016. Disponível em: https://gife.org.br/wp/media/2018/12/DADOS-GERAIS-v5_Final.pdf. Acesso em: jul. 2023.
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) demonstram que “a educação mantém sua predominância historicamente verificada”, embora tenha havido queda de 6% entre 2016 e 2020. Na pesquisa, 76% dos 131 investidores sociais respondentes afirmaram ter atuado em educação, tanto em iniciativas próprias quanto apoiando ações de outras organizações.
No que tange ao setor bancário, a maior parte dos bancos privados desenvolve ações de RSE na área da educação. A educação aparece como a destinatária preferencial de recursos cuja atuação tende a retornar benefícios para a empresa que investe. Tal investimento é:
[...] estratégico, uma vez que, além de possibilitar a formação de profissionais qualificados para o mercado de trabalho, promove a médio e longo prazo a inclusão social dos indivíduos, que passam a fazer parte do mercado de consumo dos serviços e produtos bancários
(Kuzma; Silva, 2018KUZMA, E. L.; SILVA, A. Q. Responsabilidade social corporativa no setor bancário: um estudo comparativo. Sistemas & Gestão, Niterói, v. 13, n. 1, p. 45-54, 2018. https://doi.org/10.20985/1980-5160.2018.v13n1.1132
https://doi.org/10.20985/1980-5160.2018.... , p. 49).
Em suma, como demonstrado no Quadro 2, entre os programas e ações de RSE dos 10 maiores bancos (por patrimônio líquido) em funcionamento no Brasil, encontrou-se em oito a área da educação em diversas frentes. Dos dois que ficaram de fora, verificou-se que o BTG Pactual atua com políticas para o meio ambiente, e o Banco Safra, por meio do Instituto Cultural J. Safra, trabalha com fomento à cultura.
O maior filantropo em educação no Brasil do setor bancário é a Fundação Bradesco (FB), a qual é mantenedora de 40 escolas de educação básica em todo o país. A FB empregou, em 2021, o montante de R$ 715 milhões. O maior conglomerado bancário brasileiro, no mesmo período, por meio da Itaú Social (IS) e do Instituto Unibanco (IU), aplicou R$ 257,57 milhões de acordo com informações constantes de seus balanços sociais.
Diante do exposto, para o escopo deste artigo foram selecionadas as ações de RSE dos dois maiores investidores sociais em educação, que dão origem a três braços sociais. Este estudo debruça-se sobre as ações, os sujeitos envolvidos, as redes de interlocuções e convergências da IS, do IU e da FB.
Análise de Redes da Itaú Social, do Instituto Unibanco e da Fundação Bradesco
Delimitado o alcance da pesquisa, metodologicamente, em um primeiro momento, inseriram-se na base de dados apenas as colaborações elencadas nas páginas virtuais das três organizações. Foram encontrados 99 nós iniciais (Fig. 2), coletados sobretudo na aba de notícias, em que as instituições parceiras são mencionadas. Esse foi o caminho utilizado para o acesso posterior a outras páginas de outras instituições.
A Fig. 2 demonstra que a IS apresenta 72 nós relacionados diretamente, sendo a instituição mais densa no grafo. O IU possui 32 nós, e a FB, apenas 17.
Para a continuidade e o aprofundamento da análise, adicionaram-se os elos encontrados em cada uma das 99 instituições anteriormente elencadas. Tal movimento foi capaz de revelar uma rede altamente complexa, composta de 410 arestas que representam as relações institucionais de diversas ordens e matizes, cujas origens são dois bancos privados brasileiros (Fig. 3). A rede que se coloca valida a ideia de que tais instituições possuem lugar privilegiado para a incidência na educação e propagação de suas premissas.
Elos relacionais dos parceiros diretos do Instituto Unibanco, da Itaú Social e da Fundação Bradesco.
A definição jurídica da maior parte dos nós de maior densidade, os que têm maior possibilidade de difusão via relações interinstitucionais, é instituto, fundação ou organização não governamental sem fins lucrativos, e a associação privada é a natureza jurídica mais recorrente.
Segundo o Código Civil (Brasil, 2002BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, ano 139, seção 1, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.), em seu art. 53, “constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. Assim sendo, a maioria das organizações não pode ter distribuição de excedente pecuniário entre associados e/ou gestores.
Ainda que mais da metade dos nós da rede traçada seja enquadrada na qualidade de associações, o Fig. 4 é capaz de demonstrar a pluralidade de sujeitos coletivos integrantes dessa rede5 5 É importante ressaltar, para fins de melhor compreensão, que secretarias de Educação de municípios e estados, embora diversos, foram contabilizadas como um único sujeito. . Cada qualidade de organização pode ter uma ou mais funções na rede, desde a replicação/disseminação de conteúdo, passando pela organização de eventos, até ações mais refinadas e com maior necessidade de organicidade, como o financiamento de outros projetos, o advocacy6 6 “A palavra ‘advocacy’, vinda do latim advocare, tem origem anglo-saxã, cujo significado era, basicamente ‘apoiar uma causa’. Contudo, ao elaborar um pouco mais o conceito, este seria a livre manifestação popular de entidades e instituições civis de maneira a influenciar nas decisões de formulação de políticas públicas. Em outros termos, é o instrumento pelo qual grupos, organizações e a própria sociedade civil realizam reivindicações perante o poder público de direitos indisponíveis, objetivando a formulação e implementação de políticas públicas que atendam aos anseios e às carências do povo” (ITCC, 2020). e a idealização e/ou execução de programas, políticas ou formação dos profissionais da educação com abrangência nacional.
Entre as categorizadas como empresas, constam consultorias educativas ou consultorias específicas para o terceiro setor, sistemas de ensino privados, imprensa e bancos. Segundo Ball (2014, p. 34)BALL, S. Educação Global S.A. Novas redes políticas e o imaginário neoliberal. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2014., os agentes aqui elencados – empresas, agências multilaterais, organizações não governamentais etc. – “podem constituir, separadamente ou em conjunto, uma poderosa alternativa para o ‘fracasso’ do Estado”, cujas ações guardam em si a potência de disseminar e legitimar conhecimentos, influenciando, em última instância, a construção de políticas educativas locais que garantam a hegemonia de suas premissas no que tange à organização e ao funcionamento estatal.
É de suma importância, para melhor compreensão do funcionamento da rede, analisar os agrupamentos de nós e elos relacionais de grande alcance (clusters). Alguns, se observada a rede mais detidamente, ultrapassam em densidade o cluster da própria FB. Na rede, são evidenciados os elos relacionais conectados à Fundação Lemann (31 nós), à Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (21 nós), ao Instituto Natura (29 nós) e ao Todos pela Educação (23 nós). Os clusters são subgrupos de nós e arestas robustamente conectados entre si que comungam de ações e/ou interesses comuns.
No que tange à rede de afiliados, foi possível construir clusters cuja atividade chega a 168 elos relacionais. Para melhor visualização da complexidade e densidade da rede ora analisada, foram retirados os rótulos (legendas) dos nós, permitindo demonstrar de maneira mais nítida a interconectividade dos sujeitos e da rede como um todo, além de evidenciar os clusters mais densos (Fig. 5).
Foi objeto de análise também o fato de que, entre os nós presentes na Fig. 5, são menos numerosos aqueles que se conectam com apenas um dos três nós originários (IS, IU ou FB). É preciso esclarecer que os nós da rede que aparecem no grafo sem nenhuma outra relação não possuem em suas páginas as informações necessárias para definir suas articulações precisamente. Nesse sentido, é possível que a rede seja ainda mais densa, que haja interconexões entre esses nós e outros sujeitos presentes na rede que não puderam ser identificadas pela ausência de informações disponíveis nas páginas e documentos consultados.
Observando os nós com maior densidade, identifica-se que alguns desses atores são velhos conhecidos da comunidade científica. Sobre a Fundação Lemann, por exemplo, existem sete teses e 10 dissertações defendidas cuja temática central versa acerca de sua atuação.
O Movimento Todos pela Educação (TPE), outro ego7
7
Egos referem-se, na ARS, aos nós focais da rede – aqueles definidos como objetos de investigação e atenção em uma rede definida (Souza; Quandt, 2008).
potente na rede, ultrapassou a visibilidade científica e tomou para si o “discurso competente” (Chauí, 1993CHAUÍ, M. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. São Paulo: Cortez, 1993.) em educação. Tal afirmativa pode ser confirmada observando-se que, no intervalo temporal compreendido entre 2019 e 2021, segundo as notícias publicadas em sua página (Todos pela Educação, 2022TODOS PELA EDUCAÇÃO. Portal. Todos pela Educação. Disponível em: https://todospelaeducacao.org.br/noticias-e-materiais/. Acesso em: 15 jul. 2022.
https://todospelaeducacao.org.br/noticia...
), o TPE esteve 16 vezes nas casas legislativas federais brasileiras a convite delas, para participar de audiências públicas e comissões que discutiram a política pública em educação. Desde financiamento, passando por violência na escola e pela prática pedagógica durante e após a pandemia, o TPE ajuda a pautar os problemas (e as soluções) a serem levados em conta na construção da política de educação no país.
O Instituto Natura (IN) e a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV) são organizações com menor visibilidade, tanto na comunidade acadêmica quanto na sociedade em geral. As organizações tiveram, respectivamente, três e um trabalhos defendidos nos programas de pós-graduação entre 2015 e 2020. Em contraste às pesquisas, sua articulação na rede aqui mapeada é bastante consistente, assim como sua atuação nos sistemas públicos de ensino, tendo alto grau de impacto.
Como não seria possível desvelar neste artigo a natureza dos 410 elos relacionais da rede delineada, optou-se por focalizar os clusters dessas duas organizações e suas relações com os nós originários da rede principal.
Análise dos clusters do Instituto Natura e da FundaçãoMaria Cecília Souto Vidigal
Segundo dados de sua página, o IN está presente em 21 estados e em 2.902 municípios brasileiros, tendo recentemente expandido sua ação para países latino-americanos (Argentina, Chile, México) e começado a organizá-la na Colômbia e no Peru. A atuação principal do IN é focalizada em quatro pilares: “Alfabetização na Idade Certa via Regime de Colaboração, Ensino Médio em Tempo Integral, Articulação com Agendas Prioritárias da Educação e Educação e Mobilização para as Líderes e Consultoras de Beleza Natura” (Instituto Natura. 2023INSTITUTO NATURA. Portal. Instituto Natura. Disponível em: https://www.institutonatura.org/. Acesso em: jul. 2023.
https://www.institutonatura.org/...
). As iniciativas oferecem apoio técnico e consultoria para as redes públicas de ensino sob a perspectiva gerencialista, que inclui avaliação e incentivos, distribuição de material didático para estudantes, formação docente em parceria com a Fundação Nova Escola, apoio à Base Nacional Comum Curricular em sua implementação, entre outros.
O financiamento de suas ações, em grande medida, advém de uma linha de produtos (não cosméticos – portanto, fora de seu nicho de mercado) vendidos pelas consultoras Natura sobre os quais a companhia não aplica margem de lucro. Em 2022, a arrecadação foi de mais de R$ 56 milhões. David Saad, diretor presidente do IN, é engenheiro de formação com MBA em administração pelo Insper. Iniciou sua carreira na área social como coordenador-geral do Programa Cultura e Cidadania para a Inclusão Social: Fábricas de Cultura, realizado pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Depois integrou a Fundação Victor Civita – ex-proprietária da revista Nova Escola – e o Instituto de RSE do Hospital Israelita Albert Einstein.
Percebe-se aqui uma característica comum quando observamos os altos cargos e funções das fundações e institutos que incidem sobre educação: a formação inicial em outras áreas que não a educação. A equipe fixa do IN conta com, além de Saad, mais 24 sujeitos, dos quais apenas um pedagogo e um licenciado (Letras) com formação inicial8 8 Os cursos de graduação dos sujeitos são: Economia (3), Relações Internacionais (2), Psicologia (2), Engenharia (1), Ciências Sociais (2), Administração (2), Políticas Públicas (2) e Bacharelado em Biologia (1). Cinco sujeitos não foram encontrados nas fontes consultadas – LinkedIn e Currículo Lattes. .
Tendo em vista que o IN está presente em mais da metade dos municípios brasileiros e impactou somente em 2021 mais de 2,5 milhões de estudantes, é relevante atentar que o foco de formação dos sujeitos que dirigem o instituto não é a educação e que, portanto, as políticas planejadas e realizadas por eles tiveram a influência de um pensamento gerencial9 9 Os autores compreendem pensamento gerencial como aquele influenciado pelo neotecnicismo citado por Freitas (2014). , presente em cursos de administração, engenharias, políticas públicas e relações internacionais.
Pode-se observar, nos 29 nós e 168 arestas que formam o cluster do IN (Fig. 6), que há relações recíprocas com aparelhos de origens diversas: além da IS e do IU, há egos ligados à mídia (Fundação Roberto Marinho, Associação de Jornalistas de Educação, Nova Escola); ao poder público (União dos Dirigentes Municipais de Educação, Conselho Nacional de Secretários de Educação e Secretarias de Educação); a instituições ligadas ao setor bancário e/ou rentista (BID, B3 Social); e a outras organizações do terceiro setor (muitas delas executoras de propostas advindas do próprio IN). A FB não está presente no cluster do IN.
Em análise à natureza das relações travadas especificamente entre os braços sociais dos bancos presentes na rede e o IN, inseriu-se “Instituto Natura” no buscador da IS e do IU. Retornaram, após o descarte das notícias que fugiram ao tema ou repetidas, 10 notícias com referência ao IN na página da IS e nove na página do IU. Após a leitura e definição do escopo de cada uma das notícias, sistematizamos os resultados da busca em quatro categorias. A categoria “Congresso/Mesa/Oficina”, identificada em sete ocorrências, reúne iniciativas em que ambos estão presentes em determinado evento, com direito à fala (mesa de debates), no desenvolvimento de oficinas ou ainda em encontros como seminários, congressos ou eventos congêneres. Verificou-se que os eventos foram organizados por eles próprios, quando um dos egos principais desse cluster realiza o evento e convida outro, ou por terceiros, quando outros organizam o evento e convidam dois ou mais nós para participarem com voz ou ação.
As temáticas tratadas nessas ocasiões são variadas e necessitam de análise mais aprofundada para revelar com precisão as aproximações ideológicas entre as organizações – o que será objeto de análise nas próximas fases desta pesquisa. De toda forma, diante do que até aqui temos consolidado, pode-se verificar a atuação conjunta das instituições, apoiando eventos realizados por elas ou por outros sujeitos ligados ao empresariado e/ou ao sistema bancário-rentista.
Além disso, é perceptível um esforço para a criação de espaços de diálogo que alcancem a população. Isso favorece o convencimento e a conquista da hegemonia sobre o que deve ou não ser feito em educação. Esses eventos contam com grande capilaridade e exposição midiática (incentivada, paga e espontânea) que acabam por naturalizar a ideia de que esses porta-vozes das Fasfil são também os porta-vozes da educação.
As seis notícias categorizadas como “Projeto/ação” são aquelas que indicam projetos e/ou ações realizados por ao menos um dos nós da rede principal. É nessa categoria que se percebe de maneira mais consistente o apoio recíproco e a atuação conjunta das instituições bancárias com os institutos/as fundações empresariais. Foram encontrados três projetos em que IS, IU e IN trabalham de maneira colaborativa: o Movimento Colabora Educação; a plataforma Segue os Profes; e a plataforma Conviva Educação.
O Movimento Colabora Educação, segundo sua página, afirma atuar na “produção e disseminação de conhecimento e [n]o advocacy no campo educacional” buscando fortalecer a “governança federativa da educação” (Movimento Colabora Educação, 2022MOVIMENTO COLABORA EDUCAÇÃO. Portal. Movimento Colabora Educação. Disponível em: https://movimentocolabora.org.br/. Acesso em: 2022.
https://movimentocolabora.org.br/...
). A iniciativa surgiu do Conselho da Sociedade Civil Organizada do BID. Além desse último, constam como mantenedores da iniciativa a IS, a Fundação Lemann, o IN, o Instituto Positivo, o IU, o TPE e o Itaú Educação e Trabalho.
A plataforma Segue os Profes define-se como:
[...] um projeto do movimento Profissão Docente10 10 O Movimento Profissão Docente, idealizador da plataforma ora em análise, é uma “coalizão de organizações do terceiro setor que atuam para a melhoria da educação e uniram esforços para a valorização da carreira docente e para o fortalecimento da atuação dos professores de todo o país” (Profissão Docente, 2022). Tal coalizão reúne IN, IU, IS, Fundação Lemann, TPE, Instituto Península e Fundação Telefônica Vivo. para aproximar os jovens da possibilidade de ser professora ou professor. Para gerar um olhar de prestígio sobre a profissão, um maior conhecimento sobre as possibilidades desta carreira, e para despertar o interesse em seguir nesta carreira tão bonita e útil!
(Segue os Profes, 2022SEGUE OS PROFES. Portal. Segue os Profes. https://segueosprofes.org.br/sobre/. Acesso em: ago. 2022
https://segueosprofes.org.br/sobre/... ).
Na página é possível identificar a aproximação entre o professor ideal e inspirador e um influencer (Segue os Profes, 2022SEGUE OS PROFES. Portal. Segue os Profes. https://segueosprofes.org.br/sobre/. Acesso em: ago. 2022
https://segueosprofes.org.br/sobre/...
). A argumentação informa que os professores são “os mais importantes influenciadores de todos os tempos”. Na página do Instagram do projeto se observam vídeos de docentes dotados de depoimentos, cujos conteúdos são questionáveis (Segue os Profes, 2022SEGUE OS PROFES. Portal. Segue os Profes. https://segueosprofes.org.br/sobre/. Acesso em: ago. 2022
https://segueosprofes.org.br/sobre/...
). Como exemplo, pode-se citar a publicação do dia 27 de dezembro de 2022, na qual o professor Iago Gomes afirma que o professor perfeito não é o que leva trabalho para casa, e sim “aquele que garante o ensino-aprendizagem do estudante” (Segue os Profes, 2022SEGUE OS PROFES. Portal. Segue os Profes. https://segueosprofes.org.br/sobre/. Acesso em: ago. 2022
https://segueosprofes.org.br/sobre/...
).
Em outro vídeo, em que a professora Flávia Godoy mostra sua rotina de trabalho, aparecem carteiras enfileiradas e uma lousa para atividades ligadas a uma metodologia claramente tradicional, a frase inicial é: “Essa é a rotina de uma professora que claramente escolheu a pedagogia por amor e não por dinheiro” (Segue os Profes, 2022SEGUE OS PROFES. Portal. Segue os Profes. https://segueosprofes.org.br/sobre/. Acesso em: ago. 2022
https://segueosprofes.org.br/sobre/...
). A mensagem implícita em ambos os vídeos é a minimização da precarização da profissão docente, além da romantização da escolha pela docência.
A plataforma Conviva Educação apresenta-se como um “sistema de gestão gratuito para Dirigentes Municipais de Educação (DME), equipes técnicas das secretarias, gestoras e gestores escolares” (Conviva Educação, 2023CONVIVA EDUCAÇÃO. Conheça do Conviva. Conviva Educação. Disponível em: https://convivaeducacao.org.br/oque-e. Acesso em: jul. 2023.
https://convivaeducacao.org.br/oque-e...
). Fundada em 2013 pela União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), a iniciativa recebe apoio estratégico da IS, IN, Porticus, FMCSV e Instituto Votorantim. Na mídia, conta com o canal Futura e a Fundação Roberto Marinho. No apoio técnico aparecem a Fundação Telefônica Vivo, Fundação SM, Instituto Alana, TPE e Fundo das Nações Unidas para a Infância.
Há disponível na plataforma 28 cursos, dos quais 25 elaborados e oferecidos em parceria com a IS. O Conviva disponibiliza também ferramentas de trabalho para a equipe das secretarias de Educação e outras para apoiar a gestão da educação (Fig. 7).
É interessante destacar que, nessa categoria, atrelado à plataforma Conviva Educação, há um prêmio de gestão escolar. Iniciativas como esta fomentam não apenas a desvinculação estatal com ações na educação pública, mas a valorização focal daqueles que cumprem as prescrições dessas organizações presentes, mesmo nos cursos ofertados pela Conviva Educação, em detrimento de uma política pública universal de valorização docente via plano de carreira ou legislações análogas.
Outra notícia dessa categoria nos traz a informação de que, ainda que as instituições não atuem diretamente no mesmo projeto, elas podem estar presentes concomitantemente compondo uma política educacional, como no caso do Piauí. O estado conta com projetos do IU, Fundação Lemann, IS, IN, Instituto Gesto, Itaú Educação e Trabalho, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) Nacional e Sebrae Piauí, e foi necessário, segundo o governo, um alinhamento desses institutos e fundações em suas práticas. Na ocasião, Ricardo Henriques afirmou:
O Unibanco tem uma parceria de longa data com a Educação do Piauí e nos últimos oito anos tivemos uma colaboração muito produtiva com os secretários e com o governador Wellington Dias, que gerou resultados fortes. O que nós estamos construindo agora é não só a continuidade da parceria com o governador Rafael e o secretário Washington Bandeira, mas podermos ser capaz de ajudar a [Secretaria de Educação] Seduc a dar um salto de patamar do ponto de vista da inclusão dos estudantes e da capacidade de aumentar significativamente a aprendizagem de língua portuguesa, em matemática, no Ensino Fundamental II e no Ensino Médio, sobretudo. Então, nós estamos calibrando a parceria para dar conta de seguir com mais sustentabilidade no circuito de gestão que é o coração da nossa parceria
(apud Lucas, 2023LUCAS, W. Acelera Educação: encontro de trabalho alinha parcerias com fundações nacionais. Governo do Piauí, 2023. Disponível em: https://antigo.pi.gov.br/noticias/acelera-educacao-encontro-de-trabalho-alinha-parcerias-com-fundacoes-nacionais/. Acesso em: 28 ago. 2024.
https://antigo.pi.gov.br/noticias/aceler... , grifos nossos).
Henriques coloca o IU como propulsor de “resultados fortes” no âmbito da educação estadual. Nos últimos oito anos, período mencionado pelo superintendente, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) piauiense teve acréscimo de 0,7, saindo de 4,6 (2015) para 5,3 (2021) nos anos iniciais, considerando apenas as instituições públicas de ensino. O movimento prioritário apontado por Henriques é a melhoria de aprendizagem nas disciplinas privilegiadas na Prova Brasil, português e matemática, em especial no segundo segmento do ensino fundamental e no ensino médio.
Outra ênfase dada no discurso de Henriques corrobora algo que já apontamos em pesquisas anteriores (Morgan, 2020MORGAN, K. V. Um Itaú de vantagens feito pra você? A ação da Fundação Itaú Social na educação pública brasileira. 210f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2020. https://app.uff.br/riuff/handle/1/16004
https://app.uff.br/riuff/handle/1/16004...
): a importância dada à área de gestão e à formação continuada de gestores – sejam eles diretores de escolas, sejam técnicos das secretarias, sejam os próprios secretários de Educação.
Os bancos, por meio de seus braços sociais, atuam com muita frequência em parceria com a Undime e com o Conselho Nacional de Secretários de Educação – organizações que reúnem secretários municipais e estaduais de Educação respectivamente e que, por sua composição, possuem grande capacidade de pulverização de programas, projetos e ideias.
Tais ideias, no entanto, precisam de legitimidade para disputar as mentes dos educadores nos territórios. As pesquisas, portanto, são uma importante estratégia para convencimento, pois, ao menos no discurso que propagam, trazem evidências de técnicas, organizações pedagógicas, gestão e reformas que levariam o Brasil a um salto de qualidade na educação – como afirmou Henriques em relação ao Piauí (apud Lucas, 2023LUCAS, W. Acelera Educação: encontro de trabalho alinha parcerias com fundações nacionais. Governo do Piauí, 2023. Disponível em: https://antigo.pi.gov.br/noticias/acelera-educacao-encontro-de-trabalho-alinha-parcerias-com-fundacoes-nacionais/. Acesso em: 28 ago. 2024.
https://antigo.pi.gov.br/noticias/aceler...
).
As categorizadas como pesquisas apareceram nas buscas em duas ocasiões e em situações diversas. A primeira, quando há a menção a uma pesquisa realizada em tríplice parceria. Coordenada pela Dados para um Debate Democrático na Educação (D3e), com apoio do IU e IN, o texto intitulado Implementação de reformas no ensino médio: Experiências internacionais e aprendizados para o Brasil (Braga et al., 2022BRAGA, F. M.; LABORNE, A. A.; MARINI, A.; SOUZA, L.; DUARTE, V. Implementação de reformas no ensino médio: Experiências internacionais e aprendizados para o Brasil. São Paulo: Dados para um Debate Democrático na Educação, 2022. Disponível em: https://d3e.com.br/wp-content/uploads/relatorio_2211_implementacao_reformas_ensino_medio.pdf. Acesso em: ago. 2023.
https://d3e.com.br/wp-content/uploads/re...
) versa sobre experiências de reforma no ensino médio instituídas internacionalmente (Chile, Portugal e a província de Ontário, no Canadá) que, como sugere o título, segundo seus autores, servem de lição para a nossa própria reforma.
Em outras quatro ocorrências foram destacados outros estudos realizados pelos sujeitos coletivos aqui analisados. Os estudos foram alvo de reforço de conteúdo por parte de outros, para além do autor/financiador da pesquisa em questão. Ou seja, se o estudo foi realizado por um sujeito, ele é repercutido por outros sujeitos da rede, que exercem o papel de reforçar e disseminar o conteúdo. Por esse motivo, nomeou-se a categoria de “reforço de conteúdo/pesquisa”.
Na notícia “Redução de danos na educação pós-pandemia” (Instituto Unibanco, 2021INSTITUTO UNIBANCO. Redução de danos na educação pós-pandemia. Instituto Unibanco, 2021. Disponível em: https://www.institutounibanco.org.br/conteudo/reducao-de-danos-na-educacao-pos-pandemia/. Acesso em: ago. 2022
https://www.institutounibanco.org.br/con...
), David Saad, diretor presidente do IN, e Ana Paula Pereira, diretora-executiva do Instituto Sonho Grande, falam sobre a recuperação da aprendizagem no pós-pandemia. Para debater o tema, o texto traz o estudo realizado pelo Insper e pelo IU. Percebe-se que o estudo do IU é repercutido em evento online pelo IN e que o estudo em si tem no Insper um elemento de legitimação do conteúdo produzido.
Em outra ocasião (Observatório de Educação, 2021OBSERVATÓRIO DE EDUCAÇÃO. Ricardo Henriques – Conselho de Classe | Estudo avalia as perdas de aprendizado na pandemia. Observatório de Educação, 2021. Disponível em: https://observatoriodeeducacao.institutounibanco.org.br/cedoc/detalhe/tf-cbn-podcast-ricardo-henriques-conselho-de-classe-estudo-avalia-as-perdas-de-aprendizado-na-pandemia,1ab8d925-601b-41d4-a674-c7af3688915f. Acesso em: ago. 2022
https://observatoriodeeducacao.instituto...
), o movimento é contrário. Esse movimento de replicação das pesquisas nas redes sociais e em espaços de debate indica convergência das pautas e o esforço de engajamento das organizações. Para além disso, nota-se que o movimento de disseminação dos conteúdos é recíproco entre os sujeitos coletivos e individuais que compõem as redes aqui analisadas.
Outra consequência de essas pesquisas serem realizadas por organizações privadas ligadas ao empresariado e apoiadas pelo setor bancário são a naturalização e identificação, por parte da sociedade em geral e dos educadores especificamente, desses sujeitos como detentores do conhecimento científico em educação, ao arrepio das universidades. Pode-se constatar, em análise do cluster do IN, a consolidação de uma rede completa na rede principal, cujas ações, mesmo em menor escala, têm o potencial de abarcar a produção de conteúdo para as redes de ensino e sua disseminação; o convencimento dos profissionais da educação em torno de determinada metodologia e de um conceito restrito de aprendizagem; a premiação de estudantes e professores que executam com êxito a sua proposta; entre outros.
Não é possível, pelas limitações que este artigo impõe, especificar as relações de maneira pormenorizada de cada um dos 168 elos relacionais encontrados. Entretanto, ao agrupá-los, podem-se compreender as formas como essas redes sociais, interligadas entre si nas ações e na ideologia, atuam no interior da educação pública brasileira. E é nessa mesma perspectiva que outro cluster se destaca na rede.
Com 75 elos na rede principal, a FMCSV vem despontando como capitaneadora de ações sobre a educação pública. Embora tenha mais de 50 anos de existência, a fundação deslocou seu foco inicial (saúde) para a primeira infância apenas no ano de 2007. Em 2019, incluiu entre suas metas a educação infantil.
Segundo o Relatório de Atividades do ano de 2021, a fundação executou um orçamento de mais de R$ 28 milhões. Entre as sete ações voltadas para a educação infantil, destacam-se o curso BNCC na Educação Infantil: Estratégias Teórico-Práticas para a Formação de Professores, a Implementação do Currículo de Educação Infantil Sobral (CE) e o Prêmio Educação Infantil Boas Práticas de Professores Durante a Pandemia. As ações destacadas têm como público-alvo gestores e equipes técnicas municipais, professores, famílias e organizações. A organização teve como parceiros principais para a execução das ações a Undime, a IS, o Instituto Singularidades e secretarias de Educação e alcançou ao menos 1.267 municípios.
Ao isolar apenas a sua rede social, é possível observar que é composta de 21 nós e 75 elos relacionais, contando com relações com o BID, a Associação Nova Escola, a Fundação Roberto Marinho, o Ministério e as secretarias de Educação, instituições de ensino e pesquisa, entre outros (Fig. 8).
Ao analisar sua atuação, pode-se perceber que os cursos ofertados e as parcerias demonstradas indicam convergência com o cluster do IN, haja vista a focalização nos gestores municipais e equipes, em parceria com a Undime. Assim, o lastro de atuação alarga-se, pois incide sobre os responsáveis pela tomada de decisão em contexto local.
Nesse ponto, é interessante observar que a incidência sobre a gestão (de sistemas e escolar) pode ser explicada pela necessidade de se construir estratégias que sejam capazes de aprisionar a ação gestora, sob o pretexto da descentralização e desburocratização. Segundo Laval (2004, p. 257)LAVAL, C. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. Tradução: Maria Luiza M. de Carvalho e silva. Londrina: Planta, 2004., nesses contextos surgem os “encarregados de aplicar eficazmente as políticas de modernização decididas pelas altas esferas e capazes de mobilizar as energias; de introduzir as inovações e de controlar os professores na base”.
Tais ações são pensadas e projetadas na FMCSV por um total de 56 pessoas, divididas entre o Conselho de Curadores (7BARBIERI, J. C.; CAJAZEIRA, J. Responsabilidade social e empresarial e empresa sustentável. São Paulo: Saraiva, 2009.); Conselho Fiscal (3AFONSO, A. J. Para uma concetualização alternativa de accountability em educação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 119, p. 471-484, abr. 2012. https://doi.org/10.1590/S0101-73302012000200008
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201200...
); Comitê de Investimentos (5BALL, S. Educação Global S.A. Novas redes políticas e o imaginário neoliberal. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2014.); Comitê de Comunicação (7BARBIERI, J. C.; CAJAZEIRA, J. Responsabilidade social e empresarial e empresa sustentável. São Paulo: Saraiva, 2009.); e a Equipe (34MURPHY, A.; SCHIFRIN, M. The Global 2000. Forbes, 2024. Disponível em: https://www.forbes.com/lists/global2000/. Acesso em: Ago. 2022.
https://www.forbes.com/lists/global2000/...
). Do total, no que tange à formação dos profissionais envolvidos, há apenas uma pedagoga no Comitê de Comunicação, uma psicóloga com mestrado e doutorado em Educação e uma licenciada em Ciências Sociais.
A exemplo das outras organizações aqui analisadas, é quase inexistente a presença de profissionais da educação, sendo a maior parte ligada às áreas econômicas e da administração. Destaca-se nessa instituição o número de profissionais ligados às relações internacionais e comunicação, no qual se inclui a chief executive officer (CEO) da fundação.
Seguindo a metodologia de análise do primeiro cluster, foi inserido nos buscadores dos três egos principais o termo “Fundação Maria Cecília Souto Vidigal”. Obtivemos 37 retornos na IS, cinco retornos no IU e nenhum retorno na FB. Novamente, assim como no primeiro cluster investigado, a FB aparece de maneira periférica, em relações secundárias ou apenas de manutenção de outras entidades. O protagonismo nas ações, entre os egos centrais da rede principal, fica a cargo dos braços sociais do Itaú-Unibanco. Nesse caso, por tratar-se de ações voltadas para a educação infantil, a IS destaca-se, tendo em vista que o foco de atuação do IU é o ensino médio.
Após a exclusão de temáticas alheias ao escopo deste trabalho e notícias repetidas ou com o mesmo conteúdo, as ocorrências foram tratadas e categorizadas utilizando os mesmos critérios do cluster do IN.
Embora este último tenha maior densidade na rede, a IS e o IU repercutem mais as ações realizadas em conjunto com a FMCSV. São 38 menções em suas notícias.
Pode-se perceber a possibilidade de análise seguindo as mesmas categorias, mas não sem atentar para diferenças entre elas.
Na categoria “congresso/mesa/oficina”, em que há 18 recorrências, uma temática chama a atenção por repetir-se em dez delas. A avaliação aparece em seminários, debates, em análises de casos concretos, entre outras situações, mesmo a avaliação na primeira infância – foco da FMCSV. Em seu relatório de auditoria do ano de 2021, a FMCSV afirma que “a cultura avaliativa faz parte da Fundação, por isso dizemos o que não se pode medir não se pode melhorar, ou seja, buscamos ter e fomentar os sistemas de avaliação do desenvolvimento e da educação infantil implementados”.
A atenção dispensada ao tema é compreensível conforme o que postula Afonso (2012)AFONSO, A. J. Para uma concetualização alternativa de accountability em educação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 119, p. 471-484, abr. 2012. https://doi.org/10.1590/S0101-73302012000200008
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201200...
, que compreende a avaliação como um dos eixos fundamentais para a consolidação de políticas de responsabilização e/ou de remuneração por mérito. A avaliação foi tema de, pelo menos, quatro seminários internacionais de avaliação para o investimento social privado. A iniciativa foi realizada pelo Gife, Fundação Roberto Marinho e IS, contando com o apoio da FMCSV e da Move Social.
A Move Social é uma Empresa B, ou seja, segundo a página do Sistema B Brasil (2023)SISTEMA B BRASIL. Portal. Sistema B Brasil. Disponível em: https://sistemabbrasil.org/#:~:text=As%20Empresas%20B%20s%C3%A3o%20um,apenas%20as%20melhores%20DO%20mundo. Acesso em: ago. 2023.
https://sistemabbrasil.org/#:~:text=As%2...
, “um novo tipo de negócio que equilibra propósito e lucro, considerando o impacto de suas decisões em seus trabalhadores, clientes, fornecedores, comunidade e meio ambiente”. Olmedo (2013)OLMEDO, A. Heterarquias e governança filantrópica global: implicações e controvérsias para o controle social das políticas públicas. Revista Educação e Políticas em Debate, v. 2, n. 2, p. 470-498, 2013. aproxima-se desse conceito de empresa ao analisar a governança filantrópica neoliberal. Com a intenção de promover o bem sem abrir mão da maximização dos lucros, os novos filantropos estão investindo em empreendimentos lucrativos destinados a resolver diversos problemas sociais. Eles propagam a mensagem de que somente a iniciativa privada, com seu sucesso no setor empresarial, deve realizar essas ações e, adicionalmente, de forma mais eficaz do que o Estado.
Da categoria “projeto/ação”, responsável por cinco ocorrências, constam dois tipos de notícia. A primeira traz a produção de conteúdo a ser veiculado na Rede Globo, maior emissora de televisão do país e parceira constante das redes traçadas. O conteúdo sobre desenvolvimento da primeira infância foi desenvolvido por iniciativa da IS, FMCSV, Fundação Van Leer, Instituto Samuel Klein e Porticus América Latina, com produção da Prodigo Films.
O segundo, mais ligado à educação, traz duas premiações: uma para boas práticas de professores da educação infantil e outra para a gestão escolar, esta última também presente no cluster do IN. Tais premiações têm a potência de pautar a atuação de gestores e docentes em torno de critérios determinados. Essas ações corroboram o que Peroni e Caetano (2015)PERONI, V. M. V.; CAETANO, M. R. O público e o privado na educação: projetos em disputa? Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 9, n. 17, p. 337-352, jul./dez. 2015. Disponível em: https://retratosdaescola.emnuvens.com.br/rde/article/view/584
https://retratosdaescola.emnuvens.com.br...
afirmam: “O ‘conteúdo’ pedagógico e de gestão da escola é cada vez mais determinado por instituições que introduzem a lógica mercantil, com a justificativa de que, assim, estão contribuindo para a qualidade da educação pública”.
A categoria “reforço de conteúdo/pesquisa” apresentou 11 recorrências e traz um ponto forte da atuação da FMCSV: a produção de conhecimento no que tange às temáticas caras à primeira infância. As pesquisas e estudos mais citados nas notícias são três: “Educação infantil em debate: a experiência de Portugal e a realidade brasileira”; “Avaliação da qualidade da educação infantil”; e “Desigualdades e impactos da Covid-19 na atenção à primeira infância”. As duas primeiras foram iniciativas da IS e da FMCSV. Na terceira pesquisa a IS entrou somente na parceria, sendo iniciativa apenas da fundação. As pesquisas contam com terceiros para a coordenação técnica, a exemplo do Centro de Criação de Imagem Popular, do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, do Laboratório de Pesquisa em Oportunidades Educacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, do Plano CDE e da Quantiz Consultoria Empresarial.
No que tange à categoria “representação”, as organizações aqui investigadas se articulam em atividades em que suas instituições são representadas em algum espaço. A primeira revela que o observatório do Plano Nacional de Educação terá parceiros para monitorar as metas e estratégias. Segundo a reportagem (Itaú Social, 2023ITAÚ SOCIAL. Fundação Itaú participa do fórum “Reconstrução da Educação”. Itaú Social, 2023. Disponível em: https://www.itausocial.org.br/noticias/fundacao-itau-participa-do-forum-reconstrucao-da-educacao/. Acesso em: ago. 2022
https://www.itausocial.org.br/noticias/f...
), uniram-se organizações especializadas nas etapas e modalidades. A nota lista 18 organizações, das quais apenas a Fundação Capes e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada são públicas. Nenhuma universidade foi incluída. A plataforma foi desenvolvida com o apoio do BID.
A segunda notícia versa sobre a representação do Unibanco no Conselho do Gife, ocasião em que, para o mesmo biênio, também foram eleitos representantes da FMCSV e de outras organizações (Instituto Unibanco, 2013INSTITUTO UNIBANCO. Superintendente do Instituto Unibanco integra novo conselho do Gife. Instituto Unibanco, 2013. Disponível em: https://institutounibanco.org.br/conteudo/superintendente-do-instituto-unibanco-integra-novo-conselho-do-gife/. Acesso em:ago. 2022
https://institutounibanco.org.br/conteud...
).
Observando as duas redes e diante da rede principal, algumas reflexões finais podem ser tecidas.
Considerações Finais
A análise dos principais clusters da rede conjunta da IS, IU e FB aponta para uma convergência de interesses e temáticas, mas diferenças no modus operandi das instituições. Enquanto a IS e o IU têm forte atuação nos espaços públicos e se inserem como players proeminentes no debate educacional, a FB tem uma atuação dotada de menor exposição, embora potente. Em seu relatório de atividades de 2021, a FB deixa clara a sua intenção de “promover formação humanista para desenvolver futuras lideranças em todas as regiões do nosso País” (Fundação Bradesco, 2021FUNDAÇÃO BRADESCO. 2021 Relatório de Atividades. Fundação Bradesco, 2021. Disponível em: https://fundacao.bradesco/Content/Documents/RA_2021_PORT_site_V3.pdf. Acesso em ago. 2022
https://fundacao.bradesco/Content/Docume...
). Tal intenção materializa-se não apenas no atendimento educativo nas 40 escolas sob sua tutela, mas também em parcerias, com manutenção financeira, apoio institucional e representação.
A FB, por exemplo, é uma das mantenedoras do TPE, que exerce advocacy em educação e forma assessores parlamentares. É mantenedora também, com outros da iniciativa privada, do Canal Futura. Ainda, faz parte do Conselho do Gife, do Parceiros pela Educação, entre outros. Sua influência e interferência na educação estatal e na elaboração de políticas públicas para o setor parecem ser mais infraestruturais. Ou seja, na rede exerce a função de dar condições para que outros players possam atuar. Muitas das ações apoiadas pela FB são apoiadas também pela IS e pelo IU. Já estas últimas executam as pautas postas em evidência na sociedade e no campo educacional e dialogam mais diretamente com elas, com bastante exposição midiática, ressalta-se.
Nesse sentido, evidenciou-se a formação de uma “coalizão advocatória”, que une:
[...] atores públicos e privados, provenientes de diversas instituições e níveis governamentais, que dividem um conjunto de crenças e valores comuns e que buscam manipular as regras, orçamentos e recursos humanos governamentais visando a atingir seus objetivos no longo prazo
(Simielli, 2013SIMIELLI, L. E. R. Coalizões em educação no Brasil: relação com o governo e influência sobre o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Revista de Administração Pública, São Paulo, v. 47, n. 3, p. 567-586, 2013. https://doi.org/10.1590/S0034-76122013000300002
https://doi.org/10.1590/S0034-7612201300... , p. 568).
Os bancos, por meio dessas parcerias aqui salientadas, atuam em quase todas as facetas da educação: desde a formação e “mentoria” de secretários de Educação, técnicos de secretarias e assessores parlamentares, passando pela construção do significado de boas práticas pedagógicas, incluindo as premiações e culminando nas pressões em favor de determinada organização curricular.
Tais instituições expandem-se e ganham terreno no campo educativo, como é o caso de outro braço social do Itaú – o Itaú Educação e Trabalho11 11 Itaú Educação e Trabalho é um braço social do Banco Itaú Unibanco, que “atua em parceria com entidades civis e o poder público para apoiar e incentivar a implementação de políticas de Educação Profissional e Tecnológica” (Itaú Educação e Trabalho, 2023). . Surpreendentemente, a proposta de um novo Exame Nacional do Ensino Médio apresentada pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) veio com o selo deles, como um trabalho encomendado. O fato de a IS não ser o braço do Itaú Unibanco envolvido com essa iniciativa nos indica a forte vinculação entre o novo ensino médio, o currículo que vem sendo debatido e o mercado de trabalho.
Na Fig. 9, retirada da apresentação realizada pelos conselheiros, é possível observar a autoria do trabalho encomendado de Eduardo Deschamps, presidente do CNE à época, e Beatriz Lomonaco, da Gerência de Gestão de Conhecimento da Itaú Educação e Trabalho. Aqui fica bem marcada a sobreposição entre o privado e o público na construção de políticas para a educação brasileira.
Slide de apresentação de proposta do novo Exame Nacional do Ensino Médio pelo Conselho Nacional de Educação.
Os nós, arestas, clusters e as análises realizadas sobre eles nos ajudam a entender a sincronia do movimento que se coloca cada vez mais intenso e dinâmico na perspectiva da condução de uma articulação intencional entre os diferentes atores de modo a pautar a educação, sobretudo a pública, de acordo com seus interesses empresariais.
É importante ressaltar que muito falta à educação estatal e, em muitos momentos, lhe falta o básico, mas a alternativa à omissão do Estado não deve ser a privatização da agenda educacional ou da condução da política educativa, mas sim a reestruturação, de modo a atender aqueles que necessitam de uma educação de melhor qualidade, buscando parcerias público-público.
É preciso destacar que este artigo representa um primeiro esforço analítico de uma pesquisa mais ampla, e a construção e divulgação científica dos dados aqui contidos têm a potência de contribuir para o alargamento do debate no campo, jogando luz sobre a proliferação e consolidação das ações dos atores privados, especialmente os agentes financeiros, na esfera pública. Por fim, fica a reflexão: nem mesmo Paulo Freire foi capaz de prever que a educação bancária seria, além de um ensino pouco reflexivo e emancipador, também uma educação exercida pelos bancos.
Notas
-
1
“Do ponto de vista político as bases da NGP se encontram na crítica ao Estado de Bem-Estar Social, ao planejamento centralizado e ao papel indutor e promotor do bem social exercido preponderantemente pelo Estado, suas bases epistemológicas estão no Novo Institucionalismo” (Oliveira; Duarte; Clementino, 2017OLIVEIRA, D. A.; DUARTE, A.; CLEMENTINO, A. M. A nova gestão pública no contexto escolar e os dilemas dos(as) diretores(as). Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 707-726, 2017. https://doi.org/10.21573/vol33n32017.79303
https://doi.org/10.21573/vol33n32017.793... , p. 710). -
2
São denominados nós, de acordo com a ARS, os indivíduos ou grupos de indivíduos, corporações, fundações e demais atores ou agentes que compõem a rede de inter-relações a ser desvelada neste artigo (Souza; Quandt, 2008SOUZA, Q.; QUANDT, C. Metodologia de análise de redes sociais. In: DUARTE, F.; QUANDT, C.; SOUZA, Q. (org.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008. p. 31-63.).
-
3
A “relação que estabelece uma conexão ou troca de fluxos entre dois atores” (Souza; Quandt, 2008SOUZA, Q.; QUANDT, C. Metodologia de análise de redes sociais. In: DUARTE, F.; QUANDT, C.; SOUZA, Q. (org.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008. p. 31-63., p. 31) é nomeada elo relacional ou aresta. Esses elos relacionais podem estar ligados a tipos de conexão diferentes, desde o compartilhamento de opiniões pessoais até a transferência de recursos.
-
4
Os dados referem-se a censo especial realizado pelo IBGE e representam o último da série disponível.
-
5
É importante ressaltar, para fins de melhor compreensão, que secretarias de Educação de municípios e estados, embora diversos, foram contabilizadas como um único sujeito.
-
6
“A palavra ‘advocacy’, vinda do latim advocare, tem origem anglo-saxã, cujo significado era, basicamente ‘apoiar uma causa’. Contudo, ao elaborar um pouco mais o conceito, este seria a livre manifestação popular de entidades e instituições civis de maneira a influenciar nas decisões de formulação de políticas públicas. Em outros termos, é o instrumento pelo qual grupos, organizações e a própria sociedade civil realizam reivindicações perante o poder público de direitos indisponíveis, objetivando a formulação e implementação de políticas públicas que atendam aos anseios e às carências do povo” (ITCC, 2020).
-
7
Egos referem-se, na ARS, aos nós focais da rede – aqueles definidos como objetos de investigação e atenção em uma rede definida (Souza; Quandt, 2008SOUZA, Q.; QUANDT, C. Metodologia de análise de redes sociais. In: DUARTE, F.; QUANDT, C.; SOUZA, Q. (org.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008. p. 31-63.).
-
8
Os cursos de graduação dos sujeitos são: Economia (3AFONSO, A. J. Para uma concetualização alternativa de accountability em educação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 119, p. 471-484, abr. 2012. https://doi.org/10.1590/S0101-73302012000200008
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201200... ), Relações Internacionais (2ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223... ), Psicologia (2ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223... ), Engenharia (1ADRIÃO, T. Dimensões e formas da privatização da educação no Brasil: caracterização a partir de mapeamento de produções nacionais e internacionais. Currículo sem Fronteiras, v. 18, n. 1, p. 8-28, 2018. Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol18iss1articles/adriao.pdf. Acesso em: jul. 2023.
http://www.curriculosemfronteiras.org/vo... ), Ciências Sociais (2ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223... ), Administração (2ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223... ), Políticas Públicas (2ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223... ) e Bacharelado em Biologia (1ADRIÃO, T. Dimensões e formas da privatização da educação no Brasil: caracterização a partir de mapeamento de produções nacionais e internacionais. Currículo sem Fronteiras, v. 18, n. 1, p. 8-28, 2018. Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol18iss1articles/adriao.pdf. Acesso em: jul. 2023.
http://www.curriculosemfronteiras.org/vo... ). Cinco sujeitos não foram encontrados nas fontes consultadas – LinkedIn e Currículo Lattes. -
9
Os autores compreendem pensamento gerencial como aquele influenciado pelo neotecnicismo citado por Freitas (2014)FREITAS, L. C. Os reformadores empresariais da educação e a disputa pelo controle do processo pedagógico na escola. Educação & Sociedade, Campinas, v. 35, n. 129, p. 1085-1114, out.-dez. 2014. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302014143817
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020141... . -
10
O Movimento Profissão Docente, idealizador da plataforma ora em análise, é uma “coalizão de organizações do terceiro setor que atuam para a melhoria da educação e uniram esforços para a valorização da carreira docente e para o fortalecimento da atuação dos professores de todo o país” (Profissão Docente, 2022PROFISSÃO DOCENTE. Portal. Profissão Docente. Disponível em: https://www.profissaodocente.org.br/#:~:text=Professores%20s%C3%A3o%20os%20principais%20agentes,professores%20de%20todo%20o%20pa%C3%ADs. Acesso em:ago. 2022
https://www.profissaodocente.org.br/#:~:... ). Tal coalizão reúne IN, IU, IS, Fundação Lemann, TPE, Instituto Península e Fundação Telefônica Vivo. -
11
Itaú Educação e Trabalho é um braço social do Banco Itaú Unibanco, que “atua em parceria com entidades civis e o poder público para apoiar e incentivar a implementação de políticas de Educação Profissional e Tecnológica” (Itaú Educação e Trabalho, 2023ITAÚ EDUCAÇÃO E TRABALHO. Quem somos. Itaú Educação e Trabalho. Disponível em: https://www.itaueducacaoetrabalho.org.br/institucional/quem-somos. Acesso em: jul. 2023.
https://www.itaueducacaoetrabalho.org.br... ).
-
Artigo decorrente das seguintes pesquisas: “Os bancos nos bancos da escola: uma análise do investimento social privado do capital financeiro na educação pública” e “A expansão do ensino privado-mercantil no estado do Rio de Janeiro: estratégias do capital financeirizado na oferta educacional”, financiadas pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – Processos nº: 210.292/2024 e 200.214/2023.
Referências
- ADRIÃO, T. Dimensões e formas da privatização da educação no Brasil: caracterização a partir de mapeamento de produções nacionais e internacionais. Currículo sem Fronteiras, v. 18, n. 1, p. 8-28, 2018. Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol18iss1articles/adriao.pdf Acesso em: jul. 2023.
» http://www.curriculosemfronteiras.org/vol18iss1articles/adriao.pdf - ADRIÃO, T.; DOMICIANO, C. Novas formas de privatização da gestão educacional no Brasil: as corporações e o uso das plataformas digitais. Retratos da Escola, v. 14, n. 30, p. 668-684, 2021. https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223
» https://doi.org/10.22420/rde.v14i30.1223 - AFONSO, A. J. Para uma concetualização alternativa de accountability em educação. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 119, p. 471-484, abr. 2012. https://doi.org/10.1590/S0101-73302012000200008
» https://doi.org/10.1590/S0101-73302012000200008 - BALDO, R. A empresa cidadã frente ao balanço social. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 15., 2002, Salvador. Anais [...]. 2002. Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/2760ec1e4c198b61ec134c72fce1fe91.pdf Acesso em: jul. 2023.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Set 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
20 Set 2023 -
Aceito
05 Ago 2024