Open-access Guerra urbana e expansão de mercados no Rio de Janeiro

Urban war and expansion of markets in Rio de Janeiro

Resumos

Resumo  O objetivo deste artigo é discutir os nexos entre violência e mercados, entre violência como tecnologia de poder e de expansão dos mercados nos limiares entre legalidade e ilegalidade. Esta é questão que nos parece ser o ponto cego dos debates correntes acerca das relações entre (neo)liberalismo e autoritarismo, e a “crise da democracia”. Trata-se de uma questão que se explicita desde a guinada à direita na constelação política do país e que se cristaliza no governo Bolsonaro, mas diz respeito a uma racionalidade neoliberal em curso desde meados dos anos 2000 e que ganha forma sob a lógica militarizada de gestão da ordem urbana. Tomamos como referência dois momentos que marcaram a história recente do Rio de Janeiro: primeiro, a montagem dos dispositivos político-institucionais voltados aos preparativos e realização da Copa do Mundo (2014) e dos Jogos Olímpicos (2016); segundo, a intervenção militar-financeira em um contexto de crise econômica e falência fiscal do estado (2018).

Palavras-chave:  Militarização da gestão urbana; Tecnologias de poder; Expansão dos mercados; Unidades de Polícia Pacificadora (UPP/RJ); Intervenção militar


Abstract  This article addresses the links between violence and markets, between violence as a technology of power and of market expansion, on the thresholds between legality and illegality. We believe this question is the blind spot of current debates about the relationship between (neo)liberalism and authoritarianism, and the “crisis of democracy”. As we postulate, such question became explicit since the right-wing turn in the political constellation of the country and that it is crystallized in the Bolsonaro government. However, it concerns a neoliberal rationality ongoing since the mid-2000s and that has been shaped under the militarized logic of management of the urban order. The paper addresses two moments that have marked the recent history of Rio de Janeiro: first, the assembly of political-institutional devices aimed at the preparation and realization of the World Cup (2014) and the Olympic Games (2016); second, military-financial intervention in a context of economic crisis and fiscal bankruptcy of the state (2018).

Keywords:  Militarization of urban management; Technologies of power; Expansion of markets; Pacifying Police Units (UPP/RJ); Military intervention


Introdução

Desde a guinada à direita na constelação política que ganhou forma no governo Bolsonaro, pudemos testemunhar a versão local da combinação de autoritarismo e neoliberalismo - para reter os termos de um debate em pauta atualmente, às voltas com a ascensão da extrema direita, em meio a um mundo convulsionado pelas soluções excludentes para a crise econômica de 2008.1 Dessa discussão nos interessa um aspecto nem sempre contemplado nas versões correntes sobre a “crise da democracia”: os nexos entre violência e mercados, entre violência como tecnologia de poder e de expansão dos mercados nos limiares entre legalidade e ilegalidade. Esta questão é central no diagrama de relações que vem se redesenhando no cenário de nossas cidades (e não só nelas…). É questão que se cristalizou no governo Bolsonaro; mas diz respeito a uma racionalidade neoliberal em curso desde meados dos anos 2000 e que ganha forma sob a lógica militarizada de gestão da ordem urbana.

Tomamos como referência dois momentos que marcaram a história recente do Rio de Janeiro: primeiro, a montagem dos dispositivos político-institucionais voltados aos preparativos e realização da Copa do Mundo (2014) e dos Jogos Olímpicos (2016); segundo, a intervenção militar-financeira em um contexto de crise econômica e falência fiscal do estado (2018). Sob moldes distintos, consoantes à conjuntura política e econômica de cada período, esses dois momentos se caracterizaram por uma escalada na militarização dos dispositivos de segurança pública. Em 2008, momento de forte crescimento econômico, iniciou-se no Rio de Janeiro um projeto de “pacificação” militarizada de favelas, visando a produção de uma cidade segura para a recepção dos megaeventos e a expansão de mercados. Em 2018, em um contexto de falência fiscal do Estado do Rio de Janeiro, de pauperização crescente da população e aumento dos crimes contra o patrimônio, uma intervenção militar, decretada pelo governo federal, a pretexto de uma “crise da segurança pública” altamente dramatizada e midiatizada nas semanas anteriores, teve como alvo privilegiado a proteção das empresas afetadas sobretudo por roubos de carga.

A lógica militarizada na gestão da ordem urbana não é de agora. Já se vão mais de 30 anos que Leite (2000) assinala os efeitos de poder da “metáfora da guerra” que rege as políticas de segurança no Rio de Janeiro, recurso discursivo e altamente mediatizado a justificar a intervenção violenta das forças policiais-militares nas favelas cariocas. Ademais, desde o início dos anos 1990, o Rio de Janeiro recebeu diversas operações de “Garantia de Lei e de Ordem” (GLO),2 com envio de tropas das Forças Armadas a pretexto de garantir a ordem pública em situações tidas como de urgência ou de “crise da ordem pública”. Estas são algumas evidências do estabelecimento de um padrão autoritário de gestão do conflito social com raízes em uma história de longa duração e que se atualizou sob arranjos político-institucionais conformados no período da ditadura militar (1964-1985). Alguns deles persistem até os dias atuais sob o regime democrático, tais como a Polícia Militar, subordinada às Forças Armadas e a vigência de um Tribunal Militar, próprio para supostas situações de guerra. Porém, não se trata apenas de persistências de uma tradição histórica. Essa lógica militarizada de gestão da ordem pública se atualiza e se reconfigura em sintonia com as características próprias do “urbanismo militar” de que fala Graham (2010) e que ganharam forma nos dispositivos globalizados de segurança no correr dos anos 2000. Sob primado da “guerra urbana” (e seus avatares: guerra ao crime, guerra à droga, guerra ao terrorismo, também guerra à insurgência), são acionados dispositivos militarizados de vigilância e controle dos espaços urbanos como formas de garantia, segurança e expansão dos mercados urbanos; esses mesmos dispositivos se constituindo, eles próprios, em mercado, o expansivo e altamente lucrativo mercado globalizado da segurança.

Como mostra Graham (2010), esse “urbanismo militar” se alimenta de experimentos, técnicas e tecnologias testados em zonas de guerras (neo)coloniais - Iraque, Afeganistão e sobretudo Gaza. Modelos explicitamente coloniais de “pacificação”, controle e contenção, testados e afinados nas ruas do Sul global, que se espalham pelos principais centros urbanos de diferentes países. Halper (2016) vai mais longe e fala de uma “palestinização” do mundo por via de sistemas globais de controle e tecnologias de segurança, testados nos territórios ocupados de Gaza, afinados em centros de pesquisa, sustentados por fundos corporativos poderosos e vendidos nesse expansivo mercado global de segurança.

Conforme Stockmarr (2016), as tecnologias de policiamento desenvolvidas nos territórios ocupados em Gaza são vendidas com a promessa de ajudarem na contenção de “sujeitos sem lei”, dos quais “populações em risco” precisam ser protegidas. Sujeitos sem lei podem ser migrantes, refugiados, contrabandistas, coiotes, traficantes - também quadrilhas criminosas nas favelas do Rio de Janeiro. Foram esses os termos usados por um especialista em segurança israelense em entrevista à autora: “como no caso dos terroristas em Gaza, suspeitos ou membros de uma quadrilha criminosa nas favelas do Rio de Janeiro precisam ser controlados”. Este especialista esteve presente nos preparativos da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, organizando o treinamento das equipes de segurança - como “limpar o espaço” de infiltrações indesejadas em áreas de risco através do uso de tecnologia avançada e know-how importado de Israel.

A militarização dos dispositivos de segurança pública, em particular da segurança urbana, não é exclusiva do Rio de Janeiro. Os experimentos militarizados nessa cidade, porém, levam ao paroxismo situações presentes em outros lugares e por isso mesmo explicitam seus elementos estruturantes. Não é de agora que a cidade é figurada como “laboratório da guerra urbana” - termo que circula amplamente entre o Alto Comando das Forças Armadas, estrategistas e consultores militares.3 E foi essa a principal “credencial” das Forças Armadas brasileiras para assumirem a linha de frente da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah), entre 2004 e 2017,4 também considerado como “laboratório de guerra urbana”. “Insurgência criminal” foi o termo cunhado pelos operadores da Missão para enquadrar as “guerras de gangue” que assombravam o Haiti. A experiência brasileira no combate à “insurgência criminal” em áreas ditas “sem lei e sem Estado” no Rio de Janeiro, era o que parecia qualificar as forças militares brasileiras para “missão de paz” no Haiti. Não por acaso, a maioria dos militares brasileiros na Minustah foi recrutada em unidades originalmente sediadas no Rio de Janeiro. Também não por acaso, serão militares com experiência no Haiti que estarão à frente das operações de “pacificação” nas favelas do Rio de Janeiro por ocasião dos preparativos da Copa do Mundo em 2014 e na intervenção federal no estado do Rio de Janeiro em 2018.5 Serão ainda oficiais de alta patente, que estiveram no comando nas operações de pacificação no Haiti, que irão ocupar o primeiro escalão do Governo Bolsonaro. O suposto sucesso das operações militares no Haiti foi um argumento de peso na pressão das autoridades militares por “regras mais flexíveis de engajamento” (Charleaux, 2018) por ocasião da intervenção militar em 2018. Como no Haiti, as tropas precisariam de maior liberdade para agir, com a garantia de que não seriam punidas criminalmente por eventuais “excessos”, ditos “efeitos colaterais” próprios da guerra urbana contra a “insurgência criminal” associada às gangues, aqui nomeadas facções atuantes no tráfico de drogas (Müller e Steinke, 2018).

Ao invés da discussão até certo ponto inócua sobre os (in)sucessos das operações de “guerra urbana” no combate ao crime, em particular ao tráfico de drogas, nos interessa chamar a atenção para uma questão não contemplada nos debates em curso e que diz respeito às reconfigurações dos mercados ilegais e criminais e suas relações com a economia e os poderes legais e formais. Os ilegalismos urbanos se recompõem sob os efeitos da “guerra urbana”.

Pesquisas realizadas em outros momentos e outros lugares também sob o impacto de agressivas reformas neoliberais, mostram que a expansão predatória dos mercados tem a sua contrapartida no crescimento dos circuitos ilegais, não poucas vezes agenciados por acordos nebulosos, entre a lei e o extralegal, entre acertos informais, mafiosos ou criminosos.6 Nesse campo de indeterminação entre o legal e ilegal, entram em ação empresários dos negócios ilegais (mercado de terras e negócios imobiliários, prestação de bens e serviços, também os de proteção) que constroem seus recursos de poder - também de coerção - em um terreno social devastado por uma deterioração das condições de vida que desestabiliza rotinas, protocolos, acordos formais e informais dos quais dependem as ordens de vida.7 A expansão e poder das chamadas “milícias” hoje no Rio de Janeiro pode ser tomado aqui como exemplo, talvez o mais evidente.

De maneira geral, podemos dizer que os ilegalismos urbanos se redefinem e se redistribuem nos territórios da cidade sob o efeito de medidas legais repressivas, acompanhando formas de gestão dos mercados urbanos. Traficantes de drogas e assaltantes redefinem suas territorialidades e modos de lidar com seus negócios (Hirata, 2016). Vendedores ambulantes, em número crescente, conforme se aprofunda a crise econômica que assola o país, precisam negociar sua permanência nas ruas com uma guarda municipal regida, também ela, por uma lógica militarizada - seja no que diz respeito ao aparato bélico utilizado no controle da venda nas ruas, seja no que diz respeito às formas de extorsão a que são submetidos (Hirata, 2016; Pires, 2011). Os transportes informais ou clandestinos agora têm seus arranjos modificados, formalizando-se e integrando-se a poderes criminais e grupos políticos, compondo uma zona cinzenta entre os negócios e os serviços públicos (Hirata, 2011; Campos, 2016). Sob o impacto de uma profunda crise econômica, chama a atenção o flagrante aumento da incidência de roubos de cargas, alvo primordial da intervenção militar em 2018.

I - Mega eventos e operações de “pacificação” das favelas cariocas

Em outubro de 2013, as favelas do chamado “Complexo do Lins”, zona norte do Rio de Janeiro, foram ocupadas pela Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) para a posterior instalação de uma UPP. Participamos do “mutirão” formado por advogados, jornalistas independentes e ativistas de direitos humanos que, a pedido de moradores, compareceu para acompanhar a ocupação. A moradora que nos recebeu alertou sobre o “teatro” montado: numa praça, uma criança montava um cavalo da PM, conduzido por uma policial mulher - era a imagem de fundo da entrevista concedida por um oficial à TV Globo; este falava eloquentemente sobre o “binômio polícia e comunidade”, apresentado como “receita do sucesso da pacificação”; mais adiante, um veículo blindado do Batalhão de Operações Especiais (BOPE), unidade de elite da polícia militar; ao lado, uma bandeira hasteada expondo o símbolo da corporação - uma caveira trespassada por um punhal e ornada por duas garruchas cruzadas; ao fundo, o som atordoante de uma canção em loop anunciando a pacificação. Moradores assistiam calados ao espetáculo.

Policiais do Regimento de Cavalaria da PMERJ cavalgavam pelas ruas da favela. Enquanto isso, dezenas de agentes comerciais das empresas de telecomunicações Sky e Claro batiam à porta das casas oferecendo contratos de serviço de TV por assinatura. Muitos moradores de favela no Rio de Janeiro são usuários do chamado “gato-net”, serviço de TV a cabo ilegalmente desviado fornecido por grupos criminais locais. Intimidados pela presença da polícia, moradores forneciam seus dados pessoais e firmavam contratos com essas empresas.

Implementadas a partir de 2008 pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, as UPPs visavam à “retomada” pelo Estado de territórios que se encontravam sob controle de facções do tráfico de drogas A cidade do Rio de Janeiro estava se preparando para sediar partidas da Copa do Mundo da FIFA de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, passando por grandiosas obras de infraestrutura e aguardando volumosos investimentos públicos e privados em diversos setores. A oferta de segurança pública era requisito essencial para atrair investimentos, mas a presença de grupos criminais armados nas centenas de favelas da cidade e os tiroteios entre esses grupos e forças policiais desafiavam as autoridades públicas.

A compra dos pacotes de segurança internacionais, sobretudo com recursos e fundos públicos, também constituía um grande negócio. Os chamados Sistemas Integrados de Comando e Controle (SICC) foram instalados na cidade. Legalmente viabilizados pelos decretos de GLO vigentes durante a realização dos megaeventos, os SICCs conferiam centralidade ao Exército, no seio de uma infraestrutura específica e de protocolos operacionais em que policiais, bombeiros e órgãos civis eram submetidos à avaliação e decisões militares. É o que Cardoso (2013) chama de “estrutura gerencial-militarizada”: infraestrutura tecnológica (softwares, conexão e equipamentos físicos), infraestrutura de obras, protocolos operacionais, arquitetura institucional e aparelhamento das forças da ordem. O autor estima em R$ 2,8 bilhões de reais os gastos com essa estrutura de segurança, incluindo os contratos públicos com empresas e os recursos de secretarias e ministérios envolvidos direta ou indiretamente nas questões de segurança pública e defesa nacional. O investimento público no aparato securitário-militar, pelos valores envolvidos, talvez apenas encontre paralelos nas obras de construção dos equipamentos esportivos. Os sistemas integrados de Comando e Controle foram instalados em cada uma das cidades sede da Copa do Mundo da FIFA de 2014.

No Rio de Janeiro, o Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) á atuava nessa arquitetura institucional de coordenação das instituições de segurança pública desde a Copa das Confederações de 2013. A fim de evitar situações como a ocorrida às vésperas dos Jogos Pan Americanos de 2007 - a morte de 19 pessoas durante uma operação policial na chamada “chacina do Pan”, que repercutiu internacionalmente - o Governo do Estado do Rio empenhou-se previamente na “pacificação” de favelas. Três territórios - as favelas de Santa Marta, Cidade de Deus e Batan - foram definidas como “laboratórios” de ocupação para a criação da “marca UPP” (Menezes, 2015).

Nos primeiros cinco anos das UPPs foram ocupadas cerca de 40 favelas em áreas consideradas estratégicas para a segurança dos megaeventos pela proximidade com áreas de interesse turístico ou esportivo ou por abrigarem lideranças e paióis de armas das facções cariocas. A PMERJ passou a ocupar de maneira estável e policiar regularmente uma série de regiões consideradas “áreas de risco” ou “áreas sensíveis”. As Forças Armadas, por sua vez, ocuparam as favelas que compõem os chamados “Complexo do Alemão” (2010-2012) e “Complexo da Maré (2014-2015), ambos definidos como alvos de operações de GLO. 8

Antes das UPPs, por décadas seguidas, a presença das forças do Estado nas favelas cariocas se dava apenas por meio de operações esporádicas e relativamente imprevisíveis de incursão armada. Essas operações se constituíram como o principal instrumento da ação pública em segurança no Rio de Janeiro (Hirata e Grillo, 2019), submetendo os moradores ao “fogo cruzado” dos enfrentamentos violentos entre traficantes locais e forças policiais (Machado da Silva e Leite, 2008).

Nos primeiros anos das UPPS, apesar de os traficantes continuarem a atuar nas áreas ocupadas, os tiroteios tornaram-se menos frequentes e houve significativa queda na incidência de mortes violentas, sobretudo as mortes decorrentes de ações policiais.9 Tomados como indicadores de sucesso das UPPs, esses resultados positivos foram amplamente alardeados e festejados pela imprensa. Eram altos os índices de aprovação por parte de moradores de favelas (FGV, 2009; IBPS, 2010), por especialistas em segurança pública e pesquisadores, em que pesem reservas críticas ao formato da “pacificação”. Entre as principais análises, um ponto comum era a crítica a uma concepção de cidadania restrita à integração no mercado de consumo por meio do assim chamado empreendedorismo e a legalização de serviços antes garantidos por vias ilegais (água, luz, TV a cabo).

O programa das UPPs recebeu doações de empresas como a Coca-Cola, Souza Cruz, Bradesco Seguros e, principalmente, do grupo EBX, do empresário Eike Batista, que doou 20 milhões de reais anuais entre 2010 e 2013. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) custeou algumas instalações. Entidades empresariais como a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) e a Federação do Comércio do Rio de Janeiro (Fecomercio/RJ) realizaram projetos sociais de formação, capacitação e criação de incubadoras de microempresas em várias das áreas ocupadas. O interesse empresarial pelo sucesso da UPP também estava na abertura de frentes de expansão dos mercados.

Como explicou ao Jornal Folha de São Paulo a então subsecretária de Ações Integradas no Território, a socióloga Silvia Ramos,10 as favelas tinham se tornado um “mercado socialmente atraente”. Segundo Ramos, uma das primeiras ações da polícia ao “expulsar o tráfico armado” era destruir as ligações clandestinas de luz e TV a cabo. A Light, empresa privada que detém o monopólio do fornecimento de energia na cidade, realizou a troca de cabos e a instalação de relógios novos, ao passo que a Sky, fornecedora de TV por assinatura, passou a oferecer pacotes de serviços a preços populares em favelas ocupadas. As UPPS criaram uma oportunidade para formalizar o “consumo informal” existente nas chamadas “áreas de risco”. A cena etnográfica que abre esta sessão ilustra justamente esse acoplamento entre a ocupação militarizada de territórios e a expansão das fronteiras de mercado de empresas parceiras.

De posse de contas formais desses serviços, os moradores poderiam agora comprovar residência para a abertura de contas bancárias e a obtenção de crédito - uma nova frente de expansão dos negócios de instituições financeiras. Ao lado da inauguração dos serviços de luz e internet, agências bancárias e redes varejistas passaram a atuar de forma mais intensa nas favelas “pacificadas” (Fleury, 2012). A articulação do projeto da UPP com a chamada “inclusão financeira” ficou evidente em 2013,11 momento em que a ex-Secretária de Fazenda Eduarda La Roque assumiu a presidência do Instituto Pereira Passos (IPP). Tal instituto coordenava as ações da UPP Social, braço social da ocupação armada, voltado à promoção dos ditos projetos de “inclusão social”, quer dizer: inclusão no mercado por meio de iniciativas de ‘fomento e consultoria de negócios’ e o fortalecimento da ‘cultura do empreendedorismo’” (Rocha e Carvalho, 2018).

Nos termos de Leite e Gomes (2019), trata-se de uma “inclusão produtiva”, sob formatos diferenciados dependendo das suas supostas “potencialidades” - projetos sociais e culturais, pequenas empresas, hostels, turismo em favelas ou quaisquer outras formas do assim chamado empreendedorismo. Na lógica desses projetos, no mais das vezes de sucesso incerto ou improvável, a produção de uma subjetividade neoliberal (Dardot e Laval, 2016a) - a construção de indivíduos-empresas e o primado da concorrência como forma de construção dos vínculos sociais. Não é irrelevante o fato de essas iniciativas e práticas terem sido estendidas a espaços ocupados, sujeitos à vigilância e controles militarizados, sinalizado para uma articulação entre produção de mercados e uso da força no governo de territórios e populações.

Mas é na escala da cidade que é possível aquilatar o impacto dos megaeventos na reestruturação urbana e na expansão dos mercados. Conforme pesquisa realizada pelo Observatório das Metrópoles, a reestruturação urbana no período tomou três direções: o fortalecimento das centralidades existentes, na Zona Sul da cidade onde se localizam os bairros abastados; a “revitalização de centralidades decadentes”, como a zona portuária, no centro do município; a criação de uma nova centralidade, por meio dos investimentos na Zona Oeste, área de possível expansão imobiliária (Castro et al.; 2015). Os principais equipamentos esportivos (como a Cidade Olímpica) foram instalados nessa área, bem como as obras de acessibilidade urbana (corredores de ônibus e outras modalidades de transporte) - dois vetores de uma forma de expansão do mercado imobiliário que fez do Rio de Janeiro o metro quadrado mais caro do Brasil. A valorização imobiliária dos bairros dessa região variou entre 120% e 223% no período de 2008-2014 (Castro et al; 2015).

As áreas que receberam as primeiras 40 unidades das UPP’s localizam-se exatamente nos anéis olímpicos, previstos no dossiê de candidatura para os Jogos Olímpicos, reforçando assim o processo de reorganização do mercado imobiliário da cidade. As UPP’s garantiam, como admitiu um entrevistado e membro de um importante banco de investimentos, “que a sensação de segurança pública produza efeitos imobiliários” (Hirata et al., 2021). Ou seja, áreas nobres da cidade, entrecortadas por favelas, assombradas por tiroteios constantes e, por isso mesmo, desvalorizadas no mercado imobiliário (compra, venda, aluguel), passavam a ser atrativas. Este era fenômeno também em curso nas favelas incrustadas nos bairros ricos, como é próprio da paisagem do Rio de Janeiro: “remoções brancas” foi a expressão usada para se referir ao deslocamento de moradores em busca de preços mais acessíveis do que os agora valorizados lotes nas favelas. Mas, as remoções forçadas também se multiplicaram nesse perímetro ampliado, com ostensivo uso de força policial para desalojar moradores de assentamentos precários, em linha de continuidade com períodos anteriores da história urbana da cidade no que se refere ao uso de força como instrumento de promoção imobiliária.

Por outro lado, também se expandiram os circuitos informais e ilegais dos negócios imobiliários em áreas sob controle das chamadas milícias. As UPP’s foram implementadas sobretudo em áreas de atuação do chamado Comando Vermelho, facção criminal que controla o tráfico de drogas na maioria das favelas do Rio de Janeiro. As milícias, por sua vez, encontraram terreno fértil para sua expansão nas franjas urbanas da cidade e à margem dos controles e enfrentamentos com as forças da ordem - apenas uma UPP foi instalada em área sob seu controle. Grupos armados, as milícias são formadas por agentes policiais da ativa e reserva, associados a grupos político-partidários. Nos locais em que se instalam, exploram ilegalmente os mercados de transporte, habitação, água, luz, gás, sinal de TV a cabo e proteção, além de eventualmente vender drogas (Cano e Duarte, 2012). Sujeitos a baixa repressão policial e favorecidos pelos investimentos públicos na ampliação da infraestrutura urbana, os grupos milicianos puderam se expandir, agenciando os altamente lucrativos negócios imobiliários nos circuitos ilegais dos mercados de terra e construção de moradias populares (Hirata et al., 2021).

Temos aqui, portanto, as duas faces dessa combinação entre expansão imobiliária e uso da força. Em áreas de interesse para mercado imobiliário formal, dispositivos estatais sao acionados seja para promover remoções forçadas, seja sobretudo para garantir a “pacificação” das favelas sob controle de facções criminais associadas ao tráfico de drogas. Por outro lado, expandem-se os mercados imobiliários irregulares nas franjas e interstícios da cidade, em grande medida sob o controle armado de milícias que, como apurado por uma Comissão Parlamentar de Inquéritos, a chamada “CPI das Milícias”, mantêm relações orgânicas com grupos políticos influentes na arena parlamentar e política do Rio de janeiro (ALERJ, 2008).

No ano de 2013, a chamada “crise das UPPs” tornou-se evidente. Desde 2012, já havia evidências de uma retomada dos confrontos entre traficantes locais e as forças da ordem. No bojo dos protestos que trouxeram milhões de pessoas às ruas em 2013, ganhou ampla repercussão o “desaparecimento” do ajudante de pedreiro Amarildo Dias de Souza, visto pela última vez adentrando a unidade de UPP da Rocinha, sob a custódia de policiais. Denúncias de abuso de poder, assassinatos, tortura, agressão, corrupção, dano ao patrimônio e confisco de bens cometidos por policiais contra a população local saíram da sombra e desestabilizaram o apoio até então hegemônico da opinião pública às UPPs (Amoroso et al., 2014). Antes mesmo dos megaeventos, o projeto das UPPs já começava a ruir. Depois, sob o impacto da crise fiscal que assolou o estado do Rio de Janeiro, as UPPs foram perdendo recursos, efetivo policial e legitimidade. No ano de 2018, com o Rio de Janeiro já sob intervenção federal na segurança pública, operações policiais foram realizadas para retirar containers da Polícia Militar utilizados como base da UPP em áreas antes ditas “pacificadas”.

Se é possível falar do “legado” das UPPs em articulação com os preparativos dos megaeventos, são os dispositivos de segurança implementados nesse período que terão continuidade nos anos seguintes, solidamente inseridos no globalizado circuito bélico, proporcionando a implementação de tecnologias e experimentos de centralização militar do comando e controle de operações.

No contexto de crescimento econômico, a articulação entre políticas de Estado e interesses privados se qualificava na perspectiva da expansão das fronteiras urbanas dos mercados - os mercados imobiliários, de segurança, das obras públicas, também os mercados populares, na “base da pirâmide”, para utilizar o termo consagrado nesse debate. No momento seguinte, marcado pela estagnação econômica e a falência financeira do Estado do Rio de Janeiro, o objetivo se desloca para a proteção da propriedade e das condições de circulação das mercadorias, em face do aumento da pobreza.

II - Crise socioeconômica e proteção patrimonial: mercados protegidos, mercados ampliados

Em 2014, uma crise econômica profunda atinge o Rio de Janeiro de forma particularmente dramática. Um dos “legados” dos megaeventos e UPPs fora a espoliação de fundos públicos aliada à gestão duvidosa desses programas, situação agravada por um orçamento publico deteriorado por força de uma série de circunstâncias de bloqueio ou diminuição drástica das fontes de arrecadação fiscal (Pinto, 2019). Como resultado, foi observada a inviabilidade operativa da administração publica, o fechamento ou privatização de setores estratégicos, a ocorrência de atrasos no pagamento de salários e o sucateamento de serviços públicos. Os efeitos sociais dessa crise são evidentes: aumento exponencial do desemprego, chegando a 15,1% da população ativa em 2018, superando a média nacional; expansão dos mercados informais, em especial dos vendedores ambulantes; aumento da pobreza e deterioração dos níveis salariais, revertendo de forma especialmente aguda no Rio de Janeiro a tendência dos anos anteriores de diminuição da pobreza e da desigualdade social.

Em fevereiro de 2018, é decretada a intervenção federal na segurança pública defesa civil e administração penitenciária estado do Rio de Janeiro. O argumento constitucional invocado pelas autoridades políticas de Brasília foi a necessidade de “pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública”. Nas semanas anteriores, a grande imprensa e o noticiário televisivo se empenharam na promoção do pânico urbano com uma cobertura midiática sistemática, diária e intensamente dramatizada, de roubos e arrastões nas ruas da cidade. Estava-se construindo as condições de plausibilidade da intervenção, com forte apelo por apoio popular. Cenas dramatizadas figuravam uma situação de “crise na segurança” e urgência de “lei e ordem”. Entre analistas e observadores da cena brasileira há consenso no sentido de que os indicadores de criminalidade estavam longe de justificar a intervenção. A situação era muito mais preocupante em outras cidades brasileiras com taxas de homicídio muito mais elevadas do que a verificada no estado Rio de Janeiro. Também há certo consenso de que a intervenção federal respondia ao oportunismo político do Presidente Michel Temer, às voltas com altíssimo índice de reprovação popular, com sua legitimidade fragilizada sob o peso do golpe parlamentar que destituiu a presidente Dilma Roussef em 2016 e, sobretudo, com dificuldades de composição política para a aprovação da reforma da Previdência, peça central da agenda neoliberal defendida pelos novos governantes e sua base.

O que estava então em jogo nessa intervenção? Prevista para ser suspensa no final do ano em função do calendário eleitoral, a intervenção militar foi decretada em conjugação com uma intervenção financeira no Rio de Janeiro: negociação de um regime de recuperação fiscal, avalizado pelo grupo francês Paribas, no valor de R$ 2,9 bilhões de reais, sob a condição de revisão da aposentadoria dos funcionários, contingenciamento de despesas em todos os setores de atuação do Estado, além da privatização de serviços públicos, com destaque para o serviço de abastecimento de água. Versão local, poderíamos dizer, da “terapia do choque” de que fala Klein (2008), fazendo da deterioração dos serviços públicos e redes urbanas, “janelas de oportunidade” para investidores, conforme os termos que circulam entre empresários, gestores políticos e economistas neoliberais. Com uma particularidade carregada de consequências: o protagonismo militar dos anos anteriores parecia em vias de consolidação.

“A intervenção é uma janela de oportunidades para a segurança pública do Rio de Janeiro”, declarou em coletiva de imprensa o General do Exército Walter Souza Braga Netto, então nomeado interventor federal . Na mesma coletiva de imprensa, concedida no dia 27 de fevereiro de 2018, o general descreveu a “arquitetura de comando e controle e relações institucionais” e anunciou que a intervenção consiste num “trabalho de gestão” - isto é, no gerenciamento da integração e cooperação interagências com a finalidade de “recuperar a capacidade operativa dos órgãos de segurança e baixar os índices de criminalidade”. Afirmou ainda que o “Rio é um laboratório para o Brasil”, dando a entender que havia uma expectativa de multiplicação desta experiência para outros estados da federação. Na ocasião, o exército passou a ter controle dos recursos financeiros, tecnológicos e estruturais e humanos do Governo do Estado do Rio de Janeiro.12

A intervenção militar-financeira contou com o apoio das entidades empresariais do Rio de Janeiro. Não foi um apoio tópico e de circunstância. Nos anos anteriores, a Firjan já vinha atuando para pressionar pelo retorno das tropas federais para o estado por meio da GLO. Não se tratava de um apelo genérico por “lei e ordem”. No centro das preocupações empresariais estavam os crimes contra o patrimônio, em particular o roubo de cargas que vinha crescendo sistematicamente naqueles anos no Rio de Janeiro - aumento de 200% no período da crise, segundo os dados oficiais do Instituto de Segurança Pública. O presidente da Federação dos Transportadores de Carga (Fetranscarga) afirmou que já vinha, desde antes, apelando por uma intervenção federal no Rio de Janeiro, mas que esta só ocorrera após a adesão da Firjan.13 Reuniões mensais entre representantes de entidades empresariais e autoridades policiais e militares eram realizadas no CICC, sede da intervenção, para debater as medidas de combate ao roubo de carga.

A compreensão desse momento, portanto, deve passar pela atenção às relações entre grupos políticos que há tempos governam o estado do Rio de Janeiro e poderosos grupos privados, que tem direcionado as políticas de segurança pública cada vez mais à proteção patrimonial. Pressionando as autoridades públicas por maior segurança para a posse e circulação de bens da cidade, a Firjan produziu uma série de relatórios relacionados ao tema como: “O impacto econômico do roubo de cargas no estado do Rio de Janeiro” (FIRJAN, 2017a;14 “O impacto do roubo de cargas no Brasil” (FIRJAN, 2018);15 e “O Avanço da criminalidade no Rio de Janeiro: Retrato e propostas para a segurança Pública” (FIRJAN, 2017b).16 Nos anos que antecederam a intervenção, a entidade reivindicou a aprovação de projetos de lei voltados ao combate ao roubo de carga. É o caso do Projeto de Lei 1.639/12, aprovado em 2016 pela Alerj, que vedou a comercialização, fabricação e aquisição de aparelhos eletrônicos usados para bloquear sinais rastreadores de veículos. Assim, os crimes contra o patrimônio estiveram no centro da construção das figurações de descontrole da segurança pública no Rio de Janeiro. Não por acaso, foi tema de cobertura quase diária da grande imprensa, registrando o aumento expressivo da prática do roubo de carga na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, sobretudo a partir de 2015.

Na contramão de um senso comum consagrado, não é o combate ao tráfico de drogas que parece ter impulsionado o aumento das ações policiais. Analisamos as chamadas operações policiais nos últimos anos para averiguar o direcionamento da atuação das forças da ordem (Hirata e Grillo, 2019): nos anos de 2017 e 2018 as operações policiais voltadas para o combate aos crimes contra o patrimônio, sobretudo roubo de cargas, tiveram um crescimento notável, verdadeira mudança de patamar. De 2007 a 2016, a média dessas operações representava cerca de 5,2% de todas as operações policiais no período. Entre 2017 e 2018, passa a 23,7% do total de operações. Quanto aos bens apreendidos, mais da metade foram cargas (31,5%) e veículos de carga (18,5%). Nesses últimos anos, as operações se tornaram também mais violentas, com registros crescentes de letalidade policial.

O direcionamento das políticas de segurança pública para a defesa patrimonial não é novidade; há uma longa história a ser reconstituída em em outro momento. Porém, nessa conjunturade crise econômica e falência fiscal do estado do Rio de Janeiro, em meio às circunstâncias que presidiram a intervenção militar-financeira, a ênfase dos crimes contra o patrimônio na construção das “evidências” de um descontrole na segurança pública no Rio de Janeiro aponta para o sentido de uma “ordem pública” a ser garantida. Todos os dispositivos de construção da “guerra urbana”, gestados no período dos megaeventos, seriam, mais uma vez, acionados em defesa dos mercados. A centralidade do roubo de carga pode ser tomada como um prisma pelo qual entender os modos como essa conjuntura de crise vinha afetando e, como veremos, reconfigurando os mercados criminais.

Entre 2014 e 2017, houve um aumento de 41,86% dos roubos a transeuntes, 94,15% dos roubos de veículos e 199,91% dos roubos de carga. Este mantivera-se em um patamar estável durante toda a década de 2000, inclusive com registro de queda nos seus últimos anos. No momento em que a crise econômica se inicia, o crescimento é muito expressivo, passando de 3.534 registros, em 2013, para 10.599, em 2017. Nos outros estados, o roubo de cargas é praticado por quadrilhas especializadas, tendo como alvo produtos de alto valor agregado (produtos eletrônicos, por exemplo) ou destinados à indústria (aço, café cru etc.). No Rio de Janeiro os produtos de primeira necessidade são aqueles mais frequentemente roubados. Entre os itens subtraídos nos roubos de carga, alimentos e bebidas ocupam as primeiras posições, respondendo por 31,5% de todas as cargas roubadas (ISP-RJ, 2016).

“Roubo de carga no Rio de Janeiro é saque”, afirmou o presidente da Fetranscarga em evento público realizado na OAB/RJ em 27 de março de 2018. Segundo ele, no Rio de Janeiro rouba-se sobretudo aquilo que é possível distribuir em poucas horas dentro das favelas para os receptadores a que se tem acesso. Não se trata de quadrilhas especializadas no roubo de produtos específicos, mas de assaltantes que interceptam quaisquer cargas que por eles passarem. A imprensa, antes e durante a intervenção em 2018, divulgou imagens de caminhões sendo descarregados por pessoas que, como num saque, apressadamente levavam consigo o que podiam.

Crise econômica e aumento da desigualdade e pobreza urbana parecem ter relação com o aumento expressivo do roubo de carga e suas peculiaridades no Rio de Janeiro. Se é possível postular uma relação entre dinâmicas socioeconômicas e criminalidade, essa relação é algo que precisa ser investigado. Nossa hipótese é de que o um impacto da crise econômica, em condições de controle militarizado dos espaços urbanos, está na reconfiguração dos mercados criminais e não criminais, assim como nas relações entre as cadeias de aprovisionamento de diferentes produtos e serviços, legais e ilegais (Hirata e Grillo, 2019).

A drástica redução do poder de compra estimulou pequenos mercados populares, situados em regiões pauperizadas, bem como os vendedores ambulantes, que comercializavam produtos mais baratos, no mais das vezes de proveniência duvidosa. Dessa observação emergiu a hipótese de que legalidade e ilegalidade conectam-se em um intricado jogo de relações entre a prática do roubo de carga e os mercados de receptação. Pequenos mercados de bairro ganham relevância nesse circuito, assim como as grandes redes varejistas formais, apontadas por nossos entrevistados como responsáveis por distribuir produtos roubados, muitas vezes sob o rótulo de “promoções”. A comercialização de cargas roubadas tem permitido evitar a perda de clientela por parte dos lojistas e o acesso a produtos com preços acessíveis para o consumidor final.

Por outro lado, o aumento expressivo do roubo de veículos, sobretudo o roubo de cargas, parece ter também induzido a uma reconfiguração dos modos como traficantes de droga regulam seus negócios nos territórios sob seu comando. Até então, os traficantes interditavam o descarregamento de produtos roubados nas favelas e suas relações com “assaltantes” eram tensas, quando não conflituosas (Grillo, 2013). Havia razões pragmáticas para isso: evitar incursões violentas da polícia para a apreensão dos produtos roubados. E isso parece ter mudado. Circulam entre policiais e moradores de favelas rumores de que chefes do tráfico estariam agora incentivando e participando dos lucros de roubos. No caso de roubos de cargas, a chamada “contenção” das “bocas de fumo”, isto é, a resistência armada dos traficantes às incursões policiais, tem sido determinante para que caminhões sejam descarregados a salvo de intervenção policial. Quando as forças policiais identificam o paradeiro do caminhão, não conseguem organizar uma operação em tempo hábil para a sua recuperação. Limitam-se à eventual apreensão de veículos e cargas já abandonadas. Só lhes resta, então, a retaliação violenta ao fracasso das operações.

Esta a nossa hipótese: as recentes iniciativas de reforço na segurança pública, que culminaram no ano de 2018, podem ser vistas como respostas a essa reconfiguração dos mercados criminais sob o impacto da crise econômica que afeta drasticamente toda a rede de circulação de bens entre o legal e ilegal, entre mercados criminais e não criminais.

Durante o período da intervenção federal, o roubo de cargas teve uma queda de 17,2% em todo o Estado do Rio de Janeiro, número comemorado pelas autoridades interventoras e representantes empresariais. No entanto, o histórico de confrontos armados não foi interrompido. Muito pelo contrário, na medida em que as mortes por intervenção de agente do Estado se mantiveram como regra. Conforme relatório do Observatório da Intervenção, organizado pelo pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), “o ano de 2018 atingiu um record histórico de mortes efetuadas por agentes de segurança pública (1532 mortes, um aumento de 36% em relação a 2017)”. O número de tiroteios aumentou em 56,6% em relação ao mesmo período do ano anterior, totalizando 8613. O número de chacinas (quando três ou mais pessoas são vitimadas) aumentou em 63,6% - foram notificadas 54 chacinas, com 216 pessoas mortas (CESeC, 2019). Esta a contrapartida da ativação de dispositivos da “guerra urbana” em nome da proteção patrimonial - uma violência estatal concentrada nas chamadas zonas de risco, favelas e regiões periféricas, mas com consequências que deixam suas marcas em todo o tecido social. A guerra urbana, podemos dizer, se constitui como interface entre governantes e governados e recurso discursivo que justifica a violência policial e o uso de instrumentos extralegais para o combate ao crime e controle dessas populações.

Desdobramentos

Em 6 de maio de 2021, em meio à pandemia do COVID-19 que assolava o país desde 2020, 28 pessoas (dentre elas um policial) foram assassinadas durante uma operação realizada pela Polícia Civil - episódio que ficou conhecido como a “Chacina do Jacarezinho”, favela situada na zona norte da cidade do Rio de Janeiro. a Operação foi nomeada Exceptis, em deliberado deboche e desobediência à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 635), que restringia as operações policiais em favelas durante a pandemia a situações absolutamente excepcionais. No dia seguinte à tragédia, o então governador Claudio Castro declarou em vídeo o seu apoio à ação policial, argumentando que: “A reação dos bandidos foi a mais brutal registrada nos últimos tempos. Armas de guerra, prontas para repelir a ação do estado e evitar as prisões a qualquer custo. Em nenhum lugar do mundo a polícia é recebida com fuzis e granadas quando vai cumprir seu papel”. Mais uma vez, as referências à “guerra urbana” despontavam como justificativa para a flagrante violência do Estado contra as populações de “áreas sensíveis”. E desde janeiro de 2022, a favela do Jacarezinho encontra-se novamente ocupada pela PMERJ, destacando-se com a vitrine do projeto Cidade Integrada, que busca reeditar a proposta de retomada de territórios da UPP, só que em menor escala.

Se já faz quatro décadas que militares e policiais adotam termos bélicos no trato com os pobres, a experiência das UPPs e dos preparativos de segurança para os megaeventos no Rio de Janeiro parece ter consolidado essa tradição: territórios hostis, áreas sensíveis, ocupação, saturação, pacificação, neutralização do inimigo etc. “Guerra assimétrica” é termo que já faz parte do vocabulário das forças policiais e militares. “Guerra urbana” e seus “efeitos colaterais” são termos cada vez mais frequentes em pronunciamentos de autoridades militares, de comandos policiais e de gestores urbanos.17

Nada disso é retórico, pois tem efeitos de poder que precisam ser bem aquilatados. As operações de “pacificação” e ocupação militar significam um modo de governo das populações regido pela criminalização - versão atualizada do “governo pelo crime”, para lembrar aqui o livro de Simon (2007). Nos termos de Müller e Steinke (2018), versão própria de uma lógica (neo)colonial de ocupação de regiões ditas “sem lei e sem Estado”, pelas quais se militariza relações sociais em áreas supostamente não-governáveis, tendo como pressuposto e consequência colocar populações inteiras sob a suspeita do crime - como dizem os autores, trata-se de um modo de gestão das desigualdades e de governo de populações.

Essa questão é importante para entender os critérios mais do que seletivos na definição desses territórios, deixando à margem das operações militares, essas vastas “zonas cinzentas” que se espalham nas franjas da cidade, sob domínio de milícias. O poder desses grupos se expande na própria medida em que a nebulosa de negócios ilegais e ilícitos também se expande nessas regiões, envolvendo policiais e representantes eleitos dos poderes executivo e legislativo, influentes no jogo político das esferas municipal, estadual e federal (Manso, 2020).

Três ordens de questões ajudam a entender a escalada da extrema direita nas eleições de 2018. Duas delas são evidentes; uma terceira, mais obscura, mas com marcas evidentes na superfície do tecido social. Primeiro, a consolidação do protagonismo militar na cena brasileira, questão que remete à história recente do país e que exigiria um outro espaço para ser discutida. Segundo, a ressonância popular do discurso de “lei e ordem” e o populismo penal, que exploram o sentimento de insegurança experimentado pela população e potencializado por imagens altamente midiatizadas de “desordem” e “caos”. Em terceiro lugar, a lógica bélica, militarizada, inscrita no ordenamento politico-institucional do país opera como caixa de ressonância, poderíamos dizer, dos “estados de violência” (Gros, 2006) que vem se disseminando no tecido social. A violência policial, que não é novidade no Brasil, recebe agora novo amparo normativo que confirma, repõe e exacerba práticas violentas - e de extermínio - em situações cotidianas da vida social e política nas cidades. Uma lógica miliciana, para além das situações mais conhecidas do Rio de Janeiro, vem se manifestando nessas “zonas cinzentas” em expansão nas franjas precárias e precarizadas de nossas cidades.

Transversal a esses três pontos, uma agressiva criminalização de movimentos sociais, de protesto e resistência à escalada da violência do Estado. Não por acaso, foi em meio ao ciclo ampliado de protestos desencadeado em 2013 e amplificado por ocasião dos preparativos e realização da Copa do Mundo no Brasil (2014) que dispositivos próprios da assim chamada contra insurgência foram incorporados à normatividade legal do país - em fina sintonia, aliás, com o que vem acontecendo em outros lugares (Rigouste, 2009; Bonelli e Bigo, 2018; Harcourt, 2018).Em agosto de 2013 (governo Dilma Rousseff, PT), em um cenário convulsionado por protestos de rua, enfrentamentos e violenta repressão aos manifestantes, foi aprovada lei federal que define “organização criminosa”.18 No final deste mesmo ano, o Ministério da Defesa promulga uma portaria que regulamenta as Operações de GLO, definindo como alvo não o “inimigo nas formas clássicas das operações militares”, mas “forças oponentes” (Portaria Normativa nº3.461, p.28)19 Uma nova portaria foi editada 45 dias depois (Portaria Normativa nº186),20 com um texto amenizado, mas não menos problemático, com uma definição vaga (flexível, poderíamos dizer) de “organizações criminosas”, também mantendo os “movimentos sociais reivindicatórios” como “forças oponentes”, sendo estas definidas nos termos também vagos de “agentes de perturbação da lei e da ordem”.21 Em 2016 (segundo mandato de Dilma Rousseff), entrou em vigor a Lei Federal nº 13.260, conhecida como Lei Antiterrorismo. Nos termos do relator que apresentou o projeto “o país precisa de uma lei precisa, uma regra clara que garanta segurança jurídica especialmente em períodos de grandes eventos como as Olimpíadas de 2016” (Melo, 2015).

Em outubro de 2017 (governo Michel Temer, PMDB) foi aprovado projeto de lei que desloca para o âmbito das Justiça Militar o julgamento de mortes de civis por membros das Forças Armadas em suas operações de segurança,22 altera-se artigo do Código Penal Militar de 1996, segundo o qual mortes de civis em operações militares deveriam ser julgadas pela Justiça Comum e submetidas ao Tribunal de Júri. A exceção era prevista apenas para as operações de GLO. Agora, adota-se uma noção expansiva de “crime militar”. O que antes era circunscrito a situações excepcionais, próprias das operações de GLO, passa a ser adotado para as operações militares regulares. Isso equivale a uma “licença para matar”, avalia Soares (2017). Conforme o autor, seria a obstrução de uma tipificação possível de crime nas ações militares nas ruas da cidade, nos bairros, nas favelas, sob o registro dos “efeitos colaterais” - “casualities”, ocorrências negativas, mas justificáveis quando não necessárias no combate ao “inimigo interno”. É a logica da guerra, “guerra urbana”, incorporada no ordenamento jurídico no país.23

Em um ambiente político tomado por pautas conservadoras e punitivistas, e por um crescente protagonismo de agrupamentos de extrema direita, essa armadura legal-jurídica opera como um aval para toda sorte de violências e ações arbitrárias das forças policiais em vários domínios da vida social. São traços de uma conjuntura política que já vinha se compondo desde o início do 2º mandato da presidente Dilma Roussef (2014) sob o impacto das movimentações que culminaram em seu impeachment (2016) e se tornaram especialmente agressivos no processo eleitoral que deu a vitória ao capitão de reserva Jair Bolsonaro, em 2018. Por certo, traços autoritários e forças políticas de (extrema) direita deitam raízes em uma história de longa duração e circunstâncias políticas anteriores aos eventos aqui citados. Porém, não se trata apenas de reposição e continuidade de uma história mais antiga. Há um ponto de inflexão que merece uma reflexão mais detida e que diz respeito às dimensões simbólicas, políticas e societárias de um poder governamental e de um aparato institucional-jurídico que corporifica, dá ressonância e legitima, quando não promove, uma concepção policial-militar de gestão da ordem e seus conflitos.

Para retomar a questão que nos interessa neste artigo, as relações entre violência e mercados, o uso da força, a violência como tecnologia de poder vai pontuando os limiares do mercado legais e ilegais, formais ou ilícitos, como descrito para o caso da incitação ao empresariamento popular, dos mercados de terras urbanos e suas complexas relações com os grupos armados, dos mercados de roubo ou de trafico, da própria indústria da segurança pública, como também no direcionamento do uso da força para a circulação de certas mercadorias durante a crise socioeconômica. Em todos esses casos, o uso da força em situações de ocupação militarizada foi fundamental para que a produção e circulação de mercadorias e serviços fossem possíveis. Situações recorrentes em nossa história. Porém, nesses últimos anos, mais ainda durante o governo Bolsonaro (2019), essas dinâmicas adquiriram um ritmo mais acelerado, conjugado com efeitos de criminalização da pobreza e uso expansivo da violência policial direta e bruta - e letal - no controle de seus territórios, elementos constitutivos da construção social e política dos mercados urbanos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Jun 2022
  • Aceito
    07 Nov 2022
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