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Colecionando ao longo das rotas de navegação: A Norddeutscher Lloyd e a sua importância para o Museu Municipal de História Natural, Etnologia e Comércio de Bremen, 1896-1914

Collecting along Shipping Lines: The North German Lloyd Shipping Company and its Importance for the Municipal Museum of Natural History, Ethnology and Trade, Bremen, 1896-1914

Resumo

O Übersee-Museum Bremen foi criado em 1896 como Museu Municipal de História Natural, Etnologia e Comércio. O estabelecimento do museu com essas três seções remonta a uma exposição organizada pelos comerciantes da antiga cidade hanseática no ano de 1890 em cooperação com o diretor das coleções etnográficas e de História Natural da cidade. Juntos, propunham-se a mostrar não só as mercadorias que os comerciantes traziam do ultramar, mas também os entornos naturais e culturais dos espaços de origem dessas mercadorias. A exposição levou à fundação do museu, e as relações entre os funcionários do museu e os comerciantes da cidade se estreitaram. Especialmente a companhia marítima mais importante de Bremen, a Norddeutscher Lloyd, deu o seu apoio em termos financeiros e logísticos, mas também influenciava através das suas sucursais e linhas marítimas onde e quando se podiam adquirir objetos para ampliar os acervos do museu. Dessa maneira, a companhia teve um efeito na produção de conhecimento científico que, nessa época, baseava-se na coleta de objetos etnográficos e espécimes botânicos e zoológicos. Esta contribuição, portanto, volta-se para as redes de contato e os agentes interligados ao museu e aos seus acervos.

Palavras-chave:
História do Conhecimento; coletas etnográficas; Museologia

Abstract

The Übersee-Museum Bremen was founded in 1896 as Municipal Museum of Natural History, Ethnology and Trade. Its establishment as a museum composed of these three sections traces back to a commercial exhibition organized by the old Hanseatic city’s merchants in 1890 in cooperation with the director of the city’s ethnographic and natural history collections. Together they intended to display not only the commodities that merchants brought from overseas, but also the natural and cultural spaces from which these products came. The exhibition led to the founding of the museum, and the museum staff and the city’s merchants established close relationships. Bremen’s most important shipping company, the Norddeutscher Lloyd, provided special financial and logistic support to the museum, but it also influenced, through its subsidiaries and shipping lines, where and when objects could be acquired in order to extend the museum’s stocks. The company thus had an effect on scientific knowledge production based upon the collecting of ethnographic objects and botanical and zoological specimens. This article will, therefore, analyze the networks and agents linked to the museum and its holdings.

Keywords:
History of Knowledge; ethnographic collections; Museology

O Übersee-Museum (Museu do Ultramar) da antiga cidade hanseática de Bremen, no norte da Alemanha, como muitos outros museus etnográficos no mundo de língua alemã, foi fundado no final do século XIX e possui uma importante coleção etnográfica. Suas origens remontam à era do colonialismo e do imperialismo, razão pela qual as suas coleções são hoje, cada vez mais, objeto de críticas pós-coloniais. As críticas são dirigidas sobretudo às relações de poder assimétricas sob as quais os objetos foram adquiridos ou mesmo pilhados nas colônias, por vezes com o uso de violência, e também se referem às representações problemáticas dos “outros” nas exposições (MACDONALD; LIDCHI; VON OSWALD, 2017MACDONALD, Sharon; LIDCHI, Henrietta; VON OSWALD, Margareta. Introduction. Engaging Anthropological Legacies toward Cosmo-­optimistic Futures? Museum Worlds: Advances in Research, v. 5, n. 1, p. 95-107, 2017.). Na Alemanha, especialmente desde 2010, debates sobre museus e colonialismo têm ocorrido. Um dos temas mais visíveis no debate público tem sido o design do chamado Humboldt Forum, um museu instalado em um palácio reconstruído na cidade de Berlim, onde estão expostas as coleções do Museu Etnológico e do Museu Asiático de Berlim. O palácio original foi a residência principal dos reis prussianos e, a partir de 1871, dos imperadores alemães, sob cujo domínio a Alemanha se tornou uma potência colonial com territórios em África e no Pacífico. Questionou-se, frente a esses antecedentes, se a reconstrução do palácio destruído na Segunda Guerra Mundial seria o cenário adequado para a exposição de coleções de contextos coloniais, que agora se queria apresentar com espírito pós-colonial. Atualmente, o Humboldt Forum planeja a restituição dos chamados bronzes do Benim, que foram pilhados pelos britânicos em 1897 durante a invasão do Reino de Benim e logo vendidos a muitos museus europeus (KUSHNER, 2020KUSHNER, Jacob. In Germany, a New Museum Stirs up a Colonial Controversy. National Geographic, 16 Dec. 2020. Disponível em: <https://www.nationalgeographic.com/history/article/germany-humboldt-forum-stirs-colonial-controversy>. Acesso em: 26 set. 2021.
https://www.nationalgeographic.com/histo...
).

Diversos estudos sobre as relações entre os museus, a antropologia e o colonialismo no mundo de língua alemã examinaram atores e instituições individuais, correntes da historiografia das ciências e situações específicas de territórios colonizados (PENNY; BUNZL, 2003PENNY, Glenn H.; BUNZL, Matti (Org.). Worldly Provincialism. German Anthropology in the Age of Empire. Ann Arbor: University of Michigan Press, 2003.; BUSCHMANN, 2009BUSCHMANN, Rainer. Anthropology’s Global Histories. The German Ethnographic Frontier in New Guinea, 1870-1935. Honolulu: University of Hawai’i Press, 2009.). Esses estudos oferecem imagens da antropologia como uma das ciências que muitas vezes ajudou a impulsionar a exploração e a ocupação do mundo colonial, beneficiando-se em muito com isso. Ao mesmo tempo em que a antropologia se permitiu ser apropriada para fins políticos, ela disponibilizou os seus conhecimentos para o aparelho colonial. Além disso, estudos antropológicos reproduziram e popularizaram os estereótipos coloniais. Não obstante, devido a suas origens iluministas, houve representantes da disciplina que não se deixaram apropriar por interesses coloniais e/ou mesmo contradisseram publicamente atores coloniais e ideologias racistas (FÖRSTER, 2019FÖRSTER, Larissa. Der Umgang mit der Kolonialzeit: Provenienz und Rückgabe. In: EDENHEISER, Iris; FÖRSTER, Larissa (Org.). Museumsethnologie - Eine Einführung. Theorien Debatten Praktiken. Berlim: Reimer, 2019. p. 78-103.).1 1 A reflexão aprofundada sobre as raízes da antropologia no século XVIII ultrapassa os objetivos deste trabalho. Para pormenores, ver Vermeulen (2015).

Em suas origens como disciplina no mundo de língua alemã, a antropologia trabalhava em particular com objetos dos quais derivava os seus conhecimentos. Por essa razão, especialmente para a antropologia, os museus foram espaços onde a produção de conhecimento teve lugar, mais do que as bibliotecas ou as universidades (ZIMMERMANN, 2004ZIMMERMAN, Andrew. Ethnologie im Kaiserreich. Natur, Kultur und »Rasse« in Deutschland und seinen Kolonien. In: CONRAD, Sebastian; OSTERHAMMEL, Jürgen (Org.). Das Kaiserreich transnational. Deutschland in der Welt 1871-1914. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2004. p. 191-212.). Devido à tradição descentralizada do Império Alemão, surgiram vários museus etnográficos em diferentes cidades.2 2 Antes da fundação do Museu Municipal de História Natural, Etnologia e Comercio em 1896, já existiam museus etnográficos nas seguintes cidades alemãs: Munique (1868), Leipzig (1869), Berlim (1873), Dresden (1876), Hamburgo (1879), Stuttgart (1884), Friburgo (1895). Seguiram-se outras fundações em Colônia (1901) e Frankfurt (1904). Fora do Império Alemão, abriram-se museus etnográficos em Viena (1876) e na Basileia (1893) (VOGES, 2001). Esses museus competiam uns com os outros pela extensão dos seus acervos, em um mercado internacional que influenciava e redefinia, por meio de um discurso de escassez, o que era o que se julgava cientificamente precioso (PENNY, 2002PENNY, Glenn H. Objects of Culture. Ethnology and Ethnographic Museums in Imperial Germany. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 2002.). Nessa situação competitiva, o museu de Bremen, à época da sua fundação denominado Museu Municipal de História Natural, Etnologia e Comércio, apoiava-se mais do que outras instituições nas suas boas relações com os comerciantes e especialmente com a maior companhia de navegação da cidade.

A tese desta contribuição é que a fundação e a expansão desse museu de Bremen, um dos maiores museus da Alemanha, não teriam sido possíveis sem as redes e a infraestrutura da companhia marítima Norddeutscher Lloyd. Por isso, utilizaremos nas próximas páginas fontes publicadas e documentos de arquivo para discutir a história da criação do museu e as duas primeiras décadas da sua existência, bem como alguns casos de cooperações entre o museu e os seus principais patrocinadores. Tal abordagem visa a gerar insights sobre os processos intricados que levaram à formação dos seus acervos - acervos estes que faziam parte da produção do conhecimento colonial à época do imperialismo. Antes, porém, de o artigo se deter na história do Übersee-­Museum em particular, é oportuno explicitar a visão de conhecimento adotada aqui, para explorar como ela repercute nos museus. Dada a complexidade das transferências de conhecimento, convém pensá-las como “entrelaçamentos” (entanglements) (STUCHTEY, 2005STUCHTEY, Benedikt. Science across European Empires, 1800-1950. Oxford: Oxford University Press, 2005.) que ocorrem não exclusivamente nos limites das nações, nem apenas entre as nações e suas respectivas colônias onde o conhecimento foi produzido. Na verdade, o conhecimento também circulava entre as colônias, das colônias às potências coloniais, e também em regiões que não estavam diretamente sujeitas ao controle das potências coloniais, como a China ou a América Latina (COOPER; STOLER, 1997COOPER, Frederick; STOLER, Ann Laura. Between Metropole and Colony. Rethinking a Research Agenda. In: COOPER, Frederick; STOLER, Ann Laura Stoler (Org.). Tensions of Empire. Colonial Cultures in a Bourgeois World. Berkeley: University of California Press, 1997. p. 1-58.). Essas perspectivas já demostraram que as diversas interconexões de conhecimentos, que poderiam diferir em intensidade e extensão temporal, resultavam de interesses coloniais, econômicos, sociais ou religiosos que podiam cooperar, competir ou estar em conflito entre si (HABERMAS; PRZYREMBEL, 2013HABERMAS, Rebekka; PRZYREMBEL, Alexandra. Einleitung. In: HABERMAS, Rebekka; PRZYREMBEL, Alexandra (Org.). Von Käfern, Märkten und Menschen. Kolonialismus und Wissen in der Moderne. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2013. p. 9-24.).

Os museus, como instituições dos Estados nacionais emergentes, nascidos entre a segunda metade do século XVIII e início do século XIX, tornaram-se um dos lugares onde o conhecimento se expressou (BENNETT, 1996BENNETT, Tony. The Birth of the Museum. History, Theory, Politics. Londres; Nova York: Routledge, 1996.). O seu espaço institucional ajudou a articular e a desenvolver novas relações de poder e de conhecimento dirigidas a uma ordem totalizadora das coisas e do homem, através, por exemplo, de conceitos discursivos eficazes como “evolução” ou “estética” (NOACK, 2017NOACK, Karoline. Museum. In: KÜHNHARDT, Ludger; MAYER, Tilman (Org.). Bonner Enzyklopädie der Globalität. Wiesbaden: Springer Fachmedien Wiesbaden, 2017. p. 955-967., p. 956). A essa altura, o desenvolvimento de disciplinas acadê­micas como a arqueologia, a biologia, a antropologia ou a história da arte também estava relacionado à gênese dos diferentes tipos de museus que conhecemos até hoje: o museu de história natural, o museu de arte, o museu etnográfico, etc. (NOACK, 2017NOACK, Karoline. Museum. In: KÜHNHARDT, Ludger; MAYER, Tilman (Org.). Bonner Enzyklopädie der Globalität. Wiesbaden: Springer Fachmedien Wiesbaden, 2017. p. 955-967.). Além dos museus, é conveniente também incluir, nas perspectivas do entrelaçamento do conhecimento, outras instituições, pessoas e objetos. Na Antropologia, o conceito de “objetos entrelaçados” (entangled objects) de Nicholas Thomas (1991)THOMAS, Nicholas. Entangled Objects. Exchange, Material Culture, and Colonialism in the Pacific. Cambridge: Harvard University Press, 1991., bem como variantes da teoria ator-rede, tornaram-se essenciais para a compreensão de coleções museológicas e de seus entrelaçamentos, considerando que são o produto de relações sociais, intercâmbios de objetos e estabelecimento de instituições culturais (BYRNE et al, 2011BYRNE, Sarah et al. Unpacking the Collection. Networks of Material and Social Agency in the Museum. Nova York: Springer, 2011.; LARSON; PETCH; ZEITLYN, 2007LARSON, Frances; PETCH, Alison; ZEITLYN, David. Social Networks and the Creation of the Pitt Rivers Museum. Journal of Material Culture, v. 12, n. 3, p. 211-239, 2007.). Abordaremos, assim, os atores e redes que estiveram envolvidos na fundação do Museu Municipal de Bremen.

Da handels- und kolonialausstellung (exposição comercial e colonial) de 1890 à fundação do museu em 1896

A cidade de Bremen fazia parte do Império Alemão desde a fundação deste em 1871. Em 1888, ela acabara de entrar na união aduaneira do novo Estado. Foi o lugar escolhido para uma grande exposição industrial e comercial, ocorrida entre 31 de maio e 15 de outubro de 1890, organizada pela cidade, pelo Grão-Ducado de Oldenburg e pela província prussiana de Hannover. Seguia o modelo das grandes exposições universais realizadas desde a metade do século XIX e tinha o objetivo de demonstrar que a região do noroeste alemão havia entrado com sucesso na época industrial (RODER, 1995RODER, Hartmut. Die Bremer Gewerbe- und Industrieausstellung. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995. p. 27-32.). No Bürgerpark, um dos grandes parques da cidade, levantaram-se vários pavilhões para os diferentes expositores. Os comerciantes, por sua vez, construíram um pavilhão para a Handels- und Kolonialausstellung (Exposição Comercial e Colonial) (RODER, 1995RODER, Hartmut. Die Bremer Gewerbe- und Industrieausstellung. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995. p. 27-32.). Nas palavras do conselheiro jurídico da câmara do comércio de Bremen, Werner Sombart, projetava-se “uma exposição singular, também e sobretudo para os olhos. Daí o empenho em trazer de cada país tudo o que poderia ilustrar a peculiaridade do clima ou do povo em questão, numa palavra: dar cores locais às amostras de mercadorias”3 3 Trad. livre do autor: “Auch und gerade dem Auge sollte etwas Eigenartiges geboten werden. Daher das Bestreben, aus jedem Lande all’ das herbeizuziehen, was die Eigentümlichkeit des betreffenden Klimas oder Volkes veranschaulichen könnte, mit einem Worte: den Warenproben Lokalfarbe zu verleihen”. (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 60).

Para atingir esse objetivo, o comitê da exposição comercial incluiu geógrafos e especialistas em ciências naturais. Entre eles, Hugo Schauinsland (1857-1937), zoólogo natural da Prússia Oriental que exercia a função de diretor das “Coleções Municipais de História Natural e Etnografia” desde 1887 (LÜDERWALDT, 1995aLÜDERWALDT, Andreas. Die ‘Handels- und Kolonialausstellung’ von 1890. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995a. p. 36-38.). Essa cooperação foi muito importante para Schauinsland porque ele estabeleceu contatos estreitos com os comerciantes, conheceu muito bem o comércio de importação de Bremen e as suas mercadorias e obteve inspiração para a realização do seu trabalho posterior como diretor do Museu Municipal. O pavilhão da exposição comercial estava divido tendo, de um lado, as mercadorias de importação mais importantes como algodão, lã, tabaco e arroz, juntamente com os países fornecedores, e de outro lado, algumas outras mercadorias de países e regiões do mundo que receberam atenção especial como petróleo, café, goma-laca, índigo e fibra de coco. Muitas das paredes de fundo estavam decoradas com pinturas em grande formato, mostrando paisagens das regiões de ultramar. Os objetos foram encenados com imitações da arquitetura “exótica” (por exemplo, um pavilhão chinês), peles de animais e têxteis de todo o mundo, bem como bandeiras, escudos e mapas. Onde possível, ilustravam-se os passos do processamento de diferentes mercadorias, também através de maquetes e figuras (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.). Lá não só se expuseram os objetos etnográficos das Coleções Municipais, como também novas aquisições feitas pelas mesmas companhias e empresas originárias de Bremen que forneciam as amostras de produtos. Por exemplo, a empresa H. Hackfeld & Co., fundada na metade do século XIX pelo capitão Hinrich Hackfeld (1816-1887) em Honolulu e ativa na exportação de lenha, frutos tropicais e também na venda de equipamentos marítimos e vestuários, enviou 115 objetos etnográficos. Da empresa C. Melchers & Co., especializada no mercado asiático, provieram 100 objetos chineses. Duas empresas ligadas à família do senador J. M. Gildemeister (1833-1918), com sedes em Iquique, no Chile, e Lima, no Peru, reuniram 451 objetos, principalmente cerâmicas pré-colombianas, junto às maquetes que explicavam a extração de salitre no Norte do Chile e a produção de açúcar na zona costeira peruana (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.; SCHWARZWÄLDER, 2003SCHWARZWÄLDER, Herbert. Das große Bremen-Lexikon. Bremen: Edition Temmen, 2003.).

Interessante era também o hall de entrada do pavilhão: os visitantes encontravam uma escultura grande de um Atlas que levava nos ombros o globo, no qual estavam marcadas as linhas marítimas mais importantes de Bremen e os territórios do Império Colonial Alemão na África, na Melanésia e no Pacífico. A exposição comercial expressava, dessa maneira, também a autoimagem dos comerciantes, entre o espírito pioneiro colonial do jovem Império Alemão e a ambição de expansão econômica (NIEMANN, 2019aNIEMANN, René P.. Die Handelsausstellung von 1890. In: AHRNDT, Wiebke (Org.). Spurensuche. Geschichte eines Museums. Bremen: Übersee-­Museum Bremen; Bramsche: Rasch, 2019a. p. 27-29.). A Handels- und Kolonialausstellung teve um êxito enorme e ficou aberta, enquanto o resto da exposição comercial e industrial fechou em 15 de outubro de 1890 (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.).

Figura 1
Escultura do Atlas no hall do pavilhão da exposição comercial e colonial, 1890.

Os responsáveis pela exposição comercial e colonial ficaram entusiasmados, logo pensaram na criação de um museu comercial próprio e associaram-se ao diretor das Coleções Municipais de História Natural e Etnografia, já que ele também reivindicava um novo espaço para os seus acervos. Uma associação criada para o novo museu arrecadou 400.000 marcos, dos quais a caixa econômica da cidade doou a metade. A associação ofereceu esse dinheiro juntamente com os objetos da exposição comercial e colonial ao senado da cidade sob a condição de que o senado fornecesse a mesma soma e o local para a construção do museu, ao lado da estação ferroviária central. A proposta foi aceita e, dessa maneira, o museu pôde realizar-se na forma de uma parceria público-privada (AHRNDT, 2013AHRNDT, Wiebke. Faszination Ferne. Museumsführer. Bremen: Carl Schünemann, 2013.). A construção do edifício com um comprido salão e um grande pátio interior demorou quase seis anos e a sua inauguração teve lugar em 15 de janeiro de 1896. O senador Barkhausen, que tinha assumido a diretoria de uma nova autoridade municipal para o museu, fez um discurso que reflete os fins múltiplos atribuídos à nova instituição:

Deixem-me concluir com um desejo: Se queremos que ele prospere, o museu precisa do apoio dos homens da ciência, que o haviam tão generosamente prestado às antigas coleções de História Natural. Que esse apoio lhe fique preservado! O museu também precisa do afeto da população inteira de Bremen: esperemos que seja acolhido no conjunto das crias favoritas da cidade! O museu precisa de ajuda por parte dos filhos de Bremen em terras longínquas, que se lembrem da antiga cidade natal. Mas, acima de tudo, precisa para a sua prosperidade do desenvolvimento continuado e do crescimento de Bremen em sua posição na circulação mundial de mercadorias. Que o museu se torne um salão da fama do comércio de Bremen!4 4 Trad. livre do autor: “Lassen Sie mich mit einem Wunsche schließen: Das Museum bedarf, wenn es gedeihen soll, der Unterstützung der Männer der Wissenschaft, welche dieselbe den früheren naturwissenschaftlichen Sammlungen in so reichem Maße gewährt haben. Möge diese Unterstützung ihm erhalten bleiben! Das Museum bedarf der Zuneigung der gesamten bremischen Bevölkerung; hoffen wir, daß es unter die Zahl ihrer Lieblingskinder aufgenommen werde! Das Museum bedarf der Hülfe seitens der Söhne Bremens in fernen Landen, die mit Liebe der alten Vaterstadt gedenken. Vor allem aber bedarf es zu seinem Gedeihen der ferneren Entwicklung und des Wachstums Bremens in seiner Stellung zum Weltverkehr. Möge das Museum eine Ruhmeshalle des Bremischen Handels werden!”. (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 74).

Fica evidente pela última frase do senador que, além da função de projetar uma imagem cosmopolita da Bremen, o museu deveria representar a interligação da cidade com a economia global.

Figura 2
O pátio interior do “Museu Municipal”, cerca de 1900. Arquivo de imagens históricas do Übersee-Museum.

Schauinsland, como novo diretor do museu, elaborou o conceito para a apresentação das coleções que agora estavam ampliadas pelas mostras do comércio. Ele via um duplo propósito do museu: deveria ser um lugar para manter e promover as ciências, mas também deveria tomar parte na “educação popular” (Volksbildung) e chegar a ser um estabelecimento de ensino público. Por isso, a montagem das coleções na exposição também deveria obedecer a esses fins, quer dizer, satisfazer as necessidades dos cientistas para a investigação e se caracterizar por uma grande clareza e arranjos “de bom gosto” (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 68). No grande pátio interior do museu, expuseram-se, como elementos essenciais da coleção etnográfica, habitações de África, Ásia e outras partes do mundo, junto a figuras realistas em tamanho real - “grupos de amostra” (Schaugruppen) nas palavras de Schauinsland. O equivalente na História Natural eram “comunidades vivas” (Lebensgemeinschaften) de diferentes animais. Dessa maneira, o diretor fixou imagens realistas e ilustrativas no interior do museu - imagens que seguiam o exemplo dos zoológicos e dos zoológicos humanos então muito populares na Europa.5 5 No último quarto do século XIX, na Alemanha, havia empresários como Carl Hagenbeck (1844-1913) que elaboraram o conceito de pequenas exposições etnológicas já conhecidas, transformando-as em espetáculos sofisticados, fáceis de transportar e dramaturgicamente coordenados. Para esse fim, contrataram-se grupos étnicos que seriam levados e apresentados por toda Europa em zoológicos, parques recreativos, feiras ou teatros. Nesses zoológicos humanos, os grupos étnicos tinham de apresentar atividades da sua “vida cotidiana” e danças, música ou lutas (THODE-ARORA, 2008). As culturas não europeias eram consideradas fascinantes, mas a continuidade dessa fascinação e a representação particular também estabeleceram uma distinção e contribuíram para a produção e a consolidação da autoimagem dos europeus como culturalmente superiores (HODEIR, 2002). A exposição deveria ser “de compreensão fácil” e, além disso, “sugestiva para o comerciante, material de referência para o especialista e ensino para o povo”6 6 Trad. livre do autor: “in leicht verständlicher Weise dem Kaufmanne Anregung, dem Fachmann Vergleichsmaterial, dem Volke Belehrung” (citado por AHRNDT, 2013, p. 15). (citado por AHRNDT, 2013AHRNDT, Wiebke. Faszination Ferne. Museumsführer. Bremen: Carl Schünemann, 2013., p. 15). O resultado foi um “museu ilustrado” (Schaumuseum) que ficaria conhecido nacionalmente como o “modelo de Bremen”. Essa forma de apresentação foi criticada pela inspiração em formatos de entretenimento mais populares da época, mas a crítica foi invalidada pelo sucesso medido em números de visitantes - 145.000 em 1903, quando Bremen tinha 200.000 habitantes - e pelo número de trabalhos científicos produzidos nos primeiros dez anos da sua existência (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.). Também foi elogiado por um representante da família do imperador. Henrique da Prússia (1862-1929) visitou o museu em 1900, concluindo: “Aqui, vê-se como Bremen educa os seus filhos para o comércio mundial”7 7 Trad. livre do autor: “Hier sieht man, wie Bremen seine Söhne zum Welthandel erzieht” (citado por ABEL, 1970, p. 74). (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 74).

Figura 3
“Grupo de amostra” dos Xonas no primeiro pátio do museu. Arquivo de imagens históricas do Übersee-Museum.

O aumento das coleções nos primeiros anos depois da fundação

Pelo trabalho realizado, o senado outorgou o título honorífico de Professor (“catedrático”) a Schauinsland. Concedeu-lhe também uma licença de um ano e fundos para uma viagem de investigação e coleta, a qual foi financiada, em parte, pela Academia Real das Ciências em Berlim, pela associação para a fundação do museu comercial, e pela companhia marítima Norddeutscher Lloyd. Uma doação de um patrocinador privado, Carl Schütte (1839-1917), permitiu expandir a viagem a um total de 14 meses (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.). Essa viagem de Schauinsland, e também as posteriores nos anos 1905/1906, 1907/1908 e 1913/1914, foram motivadas pela ampliação das coleções de acordo com o conceito museológico do diretor (DÜNZELMANN, 1995DÜNZELMANN, Anne E.. Hugo Schauinsland und sein Beitrag zur Geschichte des Museums. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995. p. 72-76.).

A Norddeutscher Lloyd desempenhava um papel importante não só para o Museu Municipal, mas também para a economia da cidade. A companhia havia sido organizada em 1857, quando os comerciantes Hermann Henrich Meier (1809-1889) e Eduard Crüsemann (1826-1869) criaram uma sociedade por ações com sede em Bremen para operar uma linha marítima entre Nova Iorque e Bremerhaven com quatro barcos a vapor. Apesar de malogros iniciais, a companhia conseguiu estabelecer-se na década de 1860 nesse setor. Em 1871, já navegavam por essa empresa 28 vapores que transportavam, principalmente pelo Atlântico, emigrantes, outros passageiros e mercadorias. Nesse ano, que também foi o da fundação do Império Alemão, a expansão da companhia seguiu com novos serviços, como, por exemplo, à costa ocidental da Índia e posteriormente à América do Sul, em 1876 (OSTERSEHLTE, 1995OSTERSEHLTE, Christian. Der Norddeutsche Lloyd. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995. p. 177-181.).

Mais importante, em 1885, a Lloyd obteve o contrato para o serviço estatal de correios à Ásia Oriental e à Austrália, que incluía subvenções que faziam parte de uma lei, na qual convergiam os interesses da economia e do Estado alemão: o comércio com a Ásia Oriental havia crescido desde a década do 1870. Também se viam oportunidades no mercado australiano, depois que empresas alemãs tinham participado com sucesso em exposições em Melbourne e Sydney. Para apoiar a indústria alemã e a venda dos seus produtos na região, considerava-se nos ambientes governamentais que o estabelecimento de linhas marítimas regulares era de importância crucial. O Estado, por sua vez, havia entrado no círculo das potências coloniais em 1884 e queria dar impulso ao crescimento econômico nos seus novos territórios na África, mas também na Melanésia e na Micronésia, incluindo o Noroeste da Nova Guiné, as Ilhas Marshall, o Arquipélago das Ilhas Salomão, Samoa e a cidade portuária Qingdao na China.

O contrato entre o Império Alemão e a Lloyd levou ao estabelecimento de duas linhas marítimas de Bremerhaven a Hong Kong e a Sydney, ambas passando primeiro pelo Mar Mediterrâneo e pelo Canal de Suez. Houve também uma linha subsidiária de Sydney a Samoa que foi substituída em 1893 por uma linha de Singapura, passando por Batávia (Jacarta), Nova Guiné, a qual, posteriormente, foi prolongada até Sydney. O primeiro contrato foi renovado em 1898 por mais 15 anos, o que também foi a ocasião para reorganizar e expandir as linhas, de modo que se estabeleceu uma linha entre Austrália e Japão que também passava pela Nova Guiné, e outra que fazia um trajeto pela Nova Guiné alemã a partir de Rabaul, passando por portos de comércio, plantações e postos do governo colonial (KLUDAS, 2001KLUDAS, Arnold. Deutsche Passagierschiffs-Verbindungen in die Südsee 1886-1914. In: HIERY, Hermann J. (Org.). Die deutsche Südsee 1884 - 1914: ein Handbuch. Paderborn: Ferndinand Schöningh, 2001. p. 156-176.). Essa rede de linhas, bem como os outros contatos de Bremen e das suas companhias, tornou-se essencial para a coleta de objetos etnográficos e espécimes zoológicos e botânicos para o Museu Municipal, que enfrentava uma situação de concorrência difícil entre os museus para ampliar as suas coleções.

Adolf Bastian (1826-1905), fundador da Etnologia alemã, conceitualizou a disciplina desde o início como uma ciência que trabalha indutivamente com uma série de métodos inspirados nas ciências naturais para explorar fases anteriores da evolução humana. Considerava a cultura material dos grupos humanos sem escrita como expressões materiais diretas do seu espírito e, portanto, não adulteradas (diferentemente de fontes escritas usadas pelos historiadores, as quais, na sua opinião, eram expressões subjetivas de autores que podiam incluir exageros ou mentiras) (ZIMMERMANN, 2004ZIMMERMAN, Andrew. Ethnologie im Kaiserreich. Natur, Kultur und »Rasse« in Deutschland und seinen Kolonien. In: CONRAD, Sebastian; OSTERHAMMEL, Jürgen (Org.). Das Kaiserreich transnational. Deutschland in der Welt 1871-1914. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2004. p. 191-212.). Assim, uma base empírica ampla lhe permitiria compreender as características universais da mente humana.8 8 Bastian visou a um “arquivo universal da humanidade” e à compreensão dos ditos Völkergedanken, os conceitos mentais que grupos culturais desenvolviam, mantinham e transmitiam sob a influência de suas respectivas condições geográficas e históricas. Ao analisar vários Völkergedanken, Bastian queria extrair conclusões sobre os traços universais da mente humana, que ele chamava de Elementargedanken (“pensamentos elementares”) (FISCHER; BOLZ; KAMEL, 2007). Uma vez que, do seu ponto de vista, os povos indígenas do mundo, expostos à mudança cultural veloz, estavam fadados à extinção cultural, era necessário que as coleções etnográficas fossem criadas e expandidas rápida, sistemática e extensivamente (BASTIAN, 1881BASTIAN, Adolf. Der Völkergedanke im Aufbau einer Wissenschaft vom Menschen und seine Begründung auf ethnologische Sammlungen. Berlim: Ferdinand Dümmler, 1881.).

As escolas teóricas que seguiram Bastian nos países de língua alemã presumiam a prioridade de “círculos culturais” (Kulturkreise) e o estudo da difusão cultural em torno desses círculos através da história, e também deduziam as suas conclusões a partir de objetos (GINGRICH, 2005GINGRICH, Andre. The German-Speaking Countries. In: BARTH, Fredrik et al. One Discipline, Four Ways: British, German, French, and American Anthropology. Chicago; Londres: University of Chicago Press, 2005. p. 59-153.).9 9 Os representantes do difusionismo achavam que a sua disciplina pertencia tanto aos museus quanto às universidades (NOACK, 2015). Em contraste com Bastian, que presumia que o desenvolvimento cultural era universalmente inerente à mente de todas as gentes, a suposição dos difusionistas era de que as pessoas raramente produzem inovações e que a sua difusão acontecia mais através de contatos entre diferentes grupos humanos (BARNARD, 2000). Os colecionadores, geralmente, não eram antropólogos profissionais, mas sim comerciantes, missionários, funcionários coloniais, comandantes de navios, proprietários de plantações, viajantes e outros. A sua motivação consistia muitas vezes não em um interesse pelas culturas indígenas, mas em uma fonte adicional de receitas ou de prestígio (PENNY, 2002PENNY, Glenn H. Objects of Culture. Ethnology and Ethnographic Museums in Imperial Germany. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 2002.).

Na Alemanha, o contexto competitivo entre os museus foi agravado por um monopólio concedido ao Museu Real de Etnologia em Berlim, que devia receber em primeiro lugar as coleções provenientes das colônias alemãs, deixando só as duplicatas para os outros museus etnográficos, mesmo que o processo de repartição destes apresentasse algumas incongruências (LUSTIG, 1988LUSTIG, Wolfgang. “Außer ein paar zerbrochenen Pfeilen nichts zu verteilen …” - Ethnographische Sammlungen aus den deutschen Kolonien und ihre Verteilung an Museen 1889 bis 1914. Mitteilungen aus dem Museum für Völkerkunde Hamburg, n. 18, p. 157-178, 1988.). Por isso, alguns museus, que estavam nos centros das monarquias ainda existentes da Saxônia, da Baviera e de Württemberg, ofereciam condecorações ou medalhas por méritos, que podiam consistir em doações de uma coleção ao museu etnográfico do respectivo reino. Assim, medalhas se tornaram uma possibilidade de promoção social na Alemanha Imperial da época (BUSCHMANN, 2009BUSCHMANN, Rainer. Anthropology’s Global Histories. The German Ethnographic Frontier in New Guinea, 1870-1935. Honolulu: University of Hawai’i Press, 2009.). Bremen, pelo contrário, como cidade hanseática, não podia oferecer esse tipo de condecoração. Suas companhias marítimas e redes de contato foram, por isso, ainda mais importantes.

A primeira viagem de Schauinsland levou-o pelo Atlântico aos Estados Unidos, especialmente à costa do Noroeste do continente, e logo a Havaí, Samoa, Nova Zelândia, Austrália, Colômbia e Egito. Além da coleção de objetos etnográficos e espécimes zoológicos e botânicos, deu prioridade à estadia de vários meses na ilha Laysan para estudos ornitológicos, provavelmente aconselhado pela empresa de H. Hackfeld no Havaí, e a uma viagem curta a Stephens-Island, no Estreito de Cook, para estudar o réptil tuatara. Viajou em companhia da sua mulher Ida, que lhe dava assistência na coleta, na compra e na embalagem de objetos, bem como em atividades de taxidermia e conservação. As pesquisas biológicas realizadas levaram a publicações científicas e ajudaram a estabelecer o nome do museu como instituição de investigação.10 10 Os estudos na ilha Laysan e em Stephens-Island foram publicados, entre outros, em Schauinsland (1899a; 1899b). Muitos dos contatos estabelecidos antes e durante a viagem tornaram-se importantes também depois dela, já que havia vários objetos cuja produção, coleta ou taxidermia Schauinsland deixava encomendada. Dessa maneira, chegaram, entre outros, envios de fósseis e objetos etnográficos do Noroeste norte-americano, enviados pelo coproprietário de uma empresa em Seattle com antepassados de Bremen, Th. F. Basse; peixes, pássaros, corais e fotografias do Havaí chegaram pela empresa Hackfeld; e pássaros, répteis, corais e objetos etnográficos da plantation Vailele na Ilha Upolu de Samoa por K. Hufnagel, que colecionava para diferentes museus (DÜNZELMANN, 1995DÜNZELMANN, Anne E.. Hugo Schauinsland und sein Beitrag zur Geschichte des Museums. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995. p. 72-76.; KÖNIG, 1999KÖNIG, Viola. Hugo Schauinslands Aufenthalt an der pazifischen Nordwestküste Amerikas. In: SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Bremen: Hauschild, 1999. p. 127-150.; SCHAUINSLAND, 1999SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Aus Reisetagebüchern und Dokumenten des früheren Direktors des Bremer Übersee-Museums. Bremen: Hauschild, 1999.).

Os fundos para a aquisição dos objetos etnográficos provinham do patrocinador Carl Schütte. Nascido em uma família de comerciantes de Bremen, ele se dedicava na empresa familiar à importação de petróleo com navios-tanque desde os anos 1880.11 11 O negócio de Schütte e do seu irmão mais velho, Franz Ernst Schütte (1836-1911) ia crescendo e, junto com a Rockefellers Standard Oil Company, levou à fundação da Deutsch-Amerikanische Petroleum-Gesellschaft (SCHWARZWÄLDER, 2003). Esta última passou a chamar-se Esso na metade do século XX e é, hoje em dia, parte da empresa multinacional Exxon-Mobil. Dessa forma, Schauinsland adquiriu, além das coleções etnográficas já referidas, uma coleção valiosa de armas de pedra das ilhas Chatham, uma casa maori da Nova Zelândia entalhada por um indígena para o museu de Bremen, e um poste totem dos indígenas Haida da Colúmbia Britânica.12 12 Estas aquisições também foram objeto de publicações acadêmicas (SCHURTZ, 1900; 1902; WEISSENBORN, 1908). Schütte também foi responsável pela doação, no início de 1900, de uma das coleções mais preciosas do museu: um conjunto de 126 peças de ouro pré-colombiano proveniente da atual Colômbia. Segundo a alegação de Schütte, ele recebera a coleção como presente do erudito colombiano Vicente Restrepo (1837-1899), que possuía uma coleção privada (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.; DE VRIES, 2007DE VRIES, Eike. Der Goldschatz im Überseemuseum Bremen. Inventur und Sammlungsgeschichte. Paideuma, v. 53, p. 181-198, 2007.; RADDATZ, 1980RADDATZ, Corinna. Der kolumbianische Goldschatz des Übersee-Museums Bremen. Wiesbaden: Franz Steiner, 1980.; SCHWARZWÄLDER, 2003SCHWARZWÄLDER, Herbert. Das große Bremen-Lexikon. Bremen: Edition Temmen, 2003.). Já antes da fundação do Museu Municipal, Schütte se empenhara como patrocinador para as Coleções Municipais de História Natural e Etnografia. Em 1879, presidiu um comitê de comerciantes de Bremen para angariar o montante de 10.000 marcos para a compra de uma coleção de 800 objetos pré-colombianos de pedra, cerâmica e ouro da Costa Rica. Essa coleção proveio do cônsul Johann Friedrich Lahmann (1830-1898), nascido em Bremen, mas criado na Costa Rica, onde se dedicava ao cultivo de café, ao comércio de importação e exportação com a Alemanha e, no seu tempo livre, à coleta de objetos arqueológicos, já que estava bem informado sobre escavações planejadas (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.).

Carl Schütte é, assim, um exemplo da relevância que o mundo comercial de Bremen e seus contatos internacionais tinham para o museu. Do mesmo modo, foi a empresa Friedrich M. Vietor Söhne que ajudou a ampliar os acervos da África Ocidental depois que se estabeleceu na Costa dos Escravos em 1856, para começar operações comerciais na zona, por sugestão da Norddeutsche Missionsgesellschaft (Sociedade Missionária do norte da Alemanha), que trabalhava entre os ewés desde 1847. Especialmente Johann Karl Vietor (1861-1934), neto do fundador da empresa, expandiu o negócio na zona com estabelecimentos de uma empresa própria e subsidiárias em Daomé, Nigéria, Togo, Camarões e Libéria. A Norddeutsche Missionsgesellschaft já havia fornecido coleções etnográficas de Togo para a Handels- und Kolonialausstellung em 1890 e continuou a prover o museu até 1914. Atuava na região não só no comércio, mas também na política colonial do Império Alemão. Sendo membro do conselho colonial desde 1901, Vietor trabalhava para entrelaçar as colônias alemãs de Togolândia e Camarões com a Alemanha, principalmente fomentando o cultivo de algodão e tabaco, que eram as mercadorias de importação mais importantes para Bremen. Essa expansão econômica das empresas de Vietor (e de outras de Bremen também) repercutiu nas coleções do museu: enquanto até 1900 as coleções da África Ocidental limitavam-se a objetos das áreas costeiras, posteriormente passaram a chegar também coleções do interior dos continentes (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.; SCHWARZWÄLDER, 2003SCHWARZWÄLDER, Herbert. Das große Bremen-Lexikon. Bremen: Edition Temmen, 2003.).13 13 Nesse âmbito, o museu também adquiriu coleções provenientes de saques realizados em campanhas militares: o major Oltwig von Kamptz (1857-1921) comandava as tropas coloniais em Camarões e, em 1899, dirigiu uma campanha militar contra o governador local de Tibati (nessa altura parte do emirado Adamawa). Em 1902/1903, conseguiu vender o “conteúdo do palácio do sultão de Tibati” ao museu (VON BRISKORN, 2019).

A ampliação estrutural do museu sob pressão concorrencial

Nos primeiros anos depois da primeira viagem de Schauinsland, as aquisições foram incorporadas, pouco a pouco, às instalações do museu. Nos relatórios anuais, o diretor enfatizava que o espaço disponível já não era suficiente. Comentou em 1902 que, se essa situação permanecesse por muito mais tempo, a consequência inevitável seria que o museu de Bremen, pelo menos no que dizia respeito às coleções expostas, perderia a posição de destaque que ocupava entre as instituições europeias semelhantes (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.). O seu objetivo era uma ampliação estrutural do edifício, mas a situação orçamentária da cidade não estava favorável. Schauinsland precisou esperar até 1907 para obter uma autorização do senado e do parlamento, depois que somas elevadas haviam sido angariadas novamente por instituições não estatais e patrocinadores privados, principalmente pela caixa econômica de Bremen, pela Norddeutscher Lloyd e por Carl Schütte. O museu fechou em abril de 1908 para as obras de construção orçadas em 1.300.000 marcos, que acrescentaram ao espaço um segundo pátio interior e alcançaram uma superfície total de cerca de 12.000 m2, sendo aberto ao público em julho de 1911 (LÜDERWALDT, 1995bLÜDERWALDT, Andreas. Die Erweiterung des ‘Städtischen Museums’ nach der Jahrhundertwende. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995b. p. 68-72.).

Antes da ampliação, Schauinsland realizou outras duas viagens nos anos de 1905/1906 e 1907/1908, cujo foco estava claramente na Ásia Oriental e no Pacífico. O Museu Municipal tinha conseguido uma posição destacada pela concepção e pela apresentação das suas coleções, mas o diretor se sentia pressionado pela concorrência, especialmente em Berlim, Hamburgo e Leipzig. Além da ampliação arquitetônica, visava a compensar o déficit que ele via nas coleções provenientes da China, do Japão e do Pacífico. Essas viagens foram planejadas quase completamente para a coleta e não propriamente para a investigação (SCHAUINSLAND, 1999SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Aus Reisetagebüchern und Dokumenten des früheren Direktors des Bremer Übersee-Museums. Bremen: Hauschild, 1999.). Na segunda viagem, realizada entre dezembro de 1905 e setembro de 1906, a Norddeutscher Lloyd concedeu passagens para Schauinsland e sua mulher Ida. Em um percurso ao longo das linhas marítimas da companhia, com estadias em Hong Kong, no arquipélago de Bismarck, em Hankou, Pequim e Qingdao na China, na Coreia, no Japão, em Bornéu e Celebes, a viagem efetivamente contribuiu para o aumento das coleções asiáticas, também porque a Lloyd e outras companhias de Bremen estavam muito presentes na região e a apoiaram (SCHAUINSLAND, 1999SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Aus Reisetagebüchern und Dokumenten des früheren Direktors des Bremer Übersee-Museums. Bremen: Hauschild, 1999.). Nessa viagem, Schauinsland tinha planejado fazer um desvio pelo Arquipélago de Bismarck para recolher objetos etnográficos, mas, chegando ao porto de Rabaul, na Nova Bretanha, descobriu que o Sumatra, barco da Lloyd que oferecia o desvio pelo arquipélago, estava sendo reparado e que sua próxima viagem estava prevista para a Nova Guiné, e não para o arquipélago (SCHAUINSLAND, 1999SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Aus Reisetagebüchern und Dokumenten des früheren Direktors des Bremer Übersee-Museums. Bremen: Hauschild, 1999.).14 14 O Sumatra ligava as ilhas do Arquipélago de Bismarck e do Arquipélago das Ilhas Salomão e devia transportar copra (a polpa seca do coco, usada para preparar o óleo de coco), correios e operários. Além disso, a Lloyd queria abrir a região para o turismo, pensando principalmente nos passageiros que viajavam nos barcos luxuosos da sua linha entre a Austrália e o Japão (MÜLLER, 2002). Para não perder tempo, voltou logo para Hong Kong, mas, no curto período que passou em Rabaul, tentou comprar as coleções já organizadas por agentes, comerciantes, missionários e oficiais locais e os persuadiu a se tornarem colecionadores para o museu de Bremen no futuro. Por isso, encontrou-se algumas vezes em Simpsonhafen (o porto de Rabaul) com o chefe da Agência da Lloyd, Oskar Haesner, e com o capitão do Sumatra, Karl Nauer, para conversar sobre a organização eventual de coleções para o Museu Municipal (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.; SCHAUINSLAND, 1999SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Aus Reisetagebüchern und Dokumenten des früheren Direktors des Bremer Übersee-Museums. Bremen: Hauschild, 1999.). Schauinsland sabia muito bem que os capitães com comandos na região viam no comércio de objetos etnográficos uma fonte de receitas adicionais, razão pela qual assegurou que todos os custos iam ser pagos pelo museu. Para garantir um pagamento mais rápido, deixou dinheiro em Singapura com o agente comercial da Lloyd Behn, Meyer & Co. Também apelou a todos os empregados da companhia para que “os objetos que possam ter algum valor para o nosso museu e que possam adquirir em suas viagens não sejam dados de presente nem vendidos, mas enviados a Bremen”.15 15 Trad. livre do autor: “Gegenstände, die für unser Museum von Wert sind und die sie auf ihren Reisen erlangen können, nicht anderweitig zu verschenken oder zu verkaufen, sondern sie nach Bremen zu senden”. ARCHIV ÜBERSEE-MUSEUM, Bremen. SCHAUINSLAND, Hugo. Carta à Norddeutscher Lloyd, 23 jan. 1907, t. 115. A estratégia de Schauinsland funcionou: nos meses seguintes, chegaram ao museu em Bremen várias coleções da Nova Guiné e da Ásia Oriental reunidas por capitães e empregados da Lloyd (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).

Especialmente o contato com o capitão Karl Nauer (1874-1962) se intensificou. Nauer tinha entrado para o serviço da Lloyd em 1895 e conhecia bem as ilhas e os atóis do Pacífico, porque trabalhou a partir de 1903 como segundo oficial em um barco da Lloyd que estava a serviço da administração colonial alemã, principalmente à disposição do governador Albert Hahl (1868-1945). Também conhecia o interior de algumas ilhas e os seus habitantes, já que a tripulação participava ocasionalmente de expedições. Em 1906, Nauer obteve o primeiro comando como capitão no Sumatra, permanecendo nesse posto até 1913. Paralelamente à navegação, Nauer começou a investir na área, comprando dois terrenos para plantações (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).16 16 Por causa da Primeira Guerra Mundial, Nauer perdeu as suas plantações e teve de esperar até 1923 para poder voltar ao serviço da Lloyd. Ficou no comando de um grande barco a vapor que ia principalmente à América do Sul até 1935, quando se aposentou e passou a se dedicar, com sucesso, às plantações na província de Misiones na Argentina, onde morreu em 1962 (MÜLLER, 2002). O capitão não era um etnógrafo profissional, mas Schauinsland lhe enviava instruções para conseguir os objetos que ele considerava adequados para a reorganização da exposição sobre o Pacífico. Também parece que Schauinsland escreveu várias “listas de pedidos”, que fazia chegar a diferentes lugares do Arquipélago. Assim, Nauer recebeu uma lista de Schauinsland em março de 1907 e prometeu obter os itens que dela constavam (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).

Um pedido importante para Schauinsland era o de uma ou várias casas da Nova Guiné, de preferência com ornamentos, para o novo pátio do museu. Consegui-las não foi um projeto fácil, porque eram um tipo de construção que servia para fins rituais ou religiosos. Diferentes pessoas tentaram satisfazer esse desejo de Schauinsland, mas sem sucesso: o capitão Heinrich Voogdt, no comando de um barco da Neu Guinea Compagnie, era um colecionador bem-sucedido na zona,17 17 As coleções de Voogdt foram compradas, em parte, pelo Field Museum de Chicago em 1909 (MÜLLER, 2002). e tinha em vista uma casa do Golfo de Huon para Bremen, mas não conseguiu comprá-la a tempo, porque um missionário mandou queimá-la antes.18 18 Embora missionários às vezes destruíssem certos objetos como atos de iconoclastia, outros missionários tornaram-se colecionadores da cultura material entre os povos indígenas cuja conversão pretendiam promover (CORBEY; WEENER, 2015). Um agente da Neu Guinea Compagnie tentou comprar uma casa religiosa em outra ilha, mas os nativos resistiram, por temor de que a remoção da casa lhes pudesse trazer má sorte. Karl Nauer, por sua vez, obteve sucesso e conseguiu “uma casa bela, usada e bem defumada em perfeito estado” da Nova Irlanda, ajudado pelo oficial do distrito colonial de Kavieng, Franz Boluminski (1863-1913) (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).

Outro foco do museu deveria ser, segundo Schauinsland, uma coleção de embarcações, e Nauer, sendo marinheiro, soube corresponder às necessidades do museu. Conseguiu várias ubás e canoas da Polinésia com flutuadores, entre elas uma espetacular “canoa de caçadores de cabeças” de Vella Lavella, da parte inglesa do Arquipélago das Ilhas Salomão. A maior parte dessas canoas, que eram muito compridas, tinha sido destruída pela administração britânica que queria impedir a “caça de cabeças” nas ilhas.19 19 A “caça de cabeças” foi uma prática de cortar e preservar a cabeça de uma pessoa como troféu. O objetivo era, com frequência, o de aproveitar magicamente a energia presumida do crânio. Fazia parte de processos de estruturação e defesa de relações hierárquicas entre grupos e indivíduos e, como tal, foi uma expressão de contendas e conflitos violentos que a administração britânica procurou suprimir. Não está claro como Nauer conseguiu uma canoa apesar da concorrência dos colecionadores ingleses. É provável que tenha sido devido ao tamanho da canoa, o que para o capitão alemão não teria sido um problema, tendo em vista a possibilidade de a transportar no convés do Sumatra (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).

Como já foi descrito acima, Schauinsland havia desenvolvido “o modelo de Bremen”, que se caracterizava por representações muito ilustrativas e plásticas. O seu museu conseguiu esse caráter especial também através de peças enormes, e o capitão Karl Nauer contribuiu com pelo menos uma casa e sete grandes embarcações (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.). Embora o Museu Municipal competisse com outros museus nacionais e internacionais, contava com a vantagem de que a Lloyd assumia gratuitamente o transporte da maioria de objetos etnográficos e de todas as embarcações colecionadas (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.). Outros museus não podiam pagar por esse serviço, que era normalmente dispendioso, e precisavam recorrer a objetos menores ou, no caso de embarcações ou casas, a maquetes (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).20 20 Nauer também adquiriu maquetes de embarcações nativas que, posteriormente, foram apresentadas em uma exposição sobre o comércio no segundo andar do museu, e que serviam para ilustrar o desenvolvimento da tecnologia náutica. Pela comparação entre os barcos a vapor modernos e as embarcações pequenas dos povos nativos, estas últimas pareciam primitivas, o que era claramente uma impressão intencional (MÜLLER, 2002). O caso de Karl Nauer mostra claramente as vantagens do Museu Municipal em comparação com outros museus: a companhia de navegação e os seus capitães colecionaram para o museu incluindo o serviço de frete.

Voltando a Schauinsland, a sua segunda viagem levou a um aumento das coleções asiáticas. Não obstante, o diretor ainda via lacunas e escrevia em um informe em 1907: “Eu mesmo me esforcei na China e no Japão para criar a primeira base para uma futura exposição; considerando o tempo e os meios dos quais dispunha, o que alcancei ainda não é suficiente para poder organizar uma coisa digna para Bremen”21 21 Trad. livre do autor: “Ich selbst bemühte mich in China und Japan mit Erfolg, die erste Grundlage für eine künftige Ausstellung zu schaffen; in Anbetracht der mir zur Verfügung stehenden Zeit und Mittel genügt das Erreichte aber noch nicht, um etwas Bremen Würdiges veranstalten zu können” (citado por ABEL, 1970, p. 101). (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 101). Dessa maneira, ele apelava aos patrocinadores privados da cidade em um momento oportuno, porque, no mesmo ano de 1907, a Lloyd festejou o seu aniversário de 50 anos e acabou por oferecer três coleções da Ásia Oriental ao Museu Municipal, cujo valor somava 32.000 marcos. Além disso, a companhia de navegação doou 10.000 marcos em julho e a mesma soma outra vez em agosto de 1907, dinheiro que Schauinsland utilizou para adquirir outra coleção de artes aplicadas chinesas e japonesas, e também para compras na sua terceira viagem, realizada em 1907/08 (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.). Através dessas doações, a Lloyd demostrou um interesse pela arte, bem como o seu sucesso econômico, e promoveu, de maneira indireta, a principal linha da companhia para a Ásia Oriental (DETERMANN, 2007DETERMANN, Eva. “Man soll aber gute Sachen nicht mit halbem Herzen kaufen” - Die Sammlung und das Leben Friedrich Perzynskis. In: BACKMEISTER-COLLACOTT, Ilka; BURCHARDT, Ulrich; DETERMANN, Eva. Schauinsland! Ansichten aus Übersee. Bramsche: Rasch, 2007. p. 35-39.). Com essa terceira viagem, Schauinsland completou ainda mais as coleções para a exposição sobre a Ásia Oriental. Um bom exemplo tanto para a visão museológica, como para as cooperações com os comerciantes da cidade hanseática, é a casa chinesa que Schauinsland comprou em Shanghai, já que os detalhes da decoração e a organização do transporte ficaram sob responsabilidade de Wilhelm Wilshusen, agente da empresa Melchers & Co. (SCHAUINSLAND, 1999SCHAUINSLAND, Hugo. Unterwegs in Übersee. Aus Reisetagebüchern und Dokumenten des früheren Direktors des Bremer Übersee-Museums. Bremen: Hauschild, 1999.).22 22 Com sua montagem e instalação no segundo pátio, a casa ficou integrada à estrutura arquite­tônica do museu.

Outro exemplo da importância dos agentes de empresas no terreno é o do agente da Lloyd Otto Haesner, que Schauinsland havia conhecido na sua segunda viagem à Nova Guiné. Ele se revelou um bom observador do mercado de objetos etnográficos e preocupado com a competitividade do Museu Municipal. Escreveu a Schauinsland em 1907:

O mais razoável seria que se enviasse um estudioso mais jovem por cerca de 6 meses, o qual se interessaria só por isso, i.e. pelas coleções, então você pode obter ainda objetos etnológicos suficientemente bons, contanto que também não faltem os meios financeiros necessários (...) na minha opinião é a única solução razoável, todas as outras medidas não conduzem à meta, i.e. obter uma coleção boa e abundante. O Dr. Thornvall do Museu de Etnologia já está aqui há meses. O senhor Schoede de Berlim coleciona para 3 museus, como informou, e quer sair ao fim do ano, portanto, é preciso ter pressa, se ainda quiser obter coisas boas.23 23 Trad. livre do autor: “Das Richtigste wäre, wenn Sie einen jüngeren Gelehrten heraussenden würden für etwa 6 Monate, der sich nur dafür d.h. für die Sammlungen interessieren würde, dann können Sie noch genügend schöne Ethnologiken erhalten, vorausgesetzt natürlich dass es auch an den nötigen Geldmitteln nicht mangelt (...) meiner Ansicht ist es der einzig rationelle Ausweg, alle anderen Maasregeln führen nicht zum Ziel, d.h. eine gute, reichhaltige Sammlung zu erhalten. Dr. Thornvall vom Museum für Völkerkunde ist bereits seit Monaten hier., Herr Schoede aus Berlin sammelt für 3 Museen, wie er mitteilte u. will Ende d. J. wieder herauskommen, es ist daher Eile nötig, wenn Sie hier noch etwas Gutes erhalten wollen”. ARCHIV ÜBERSEE-MUSEUM, Bremen, HAESNER, Otto. Carta a Hugo Schauinsland, 4 jun. 1907, t. 115.

A citação indica um problema das coleções que o museu de Bremen estava recebendo: normalmente eram coleções feitas por amadores e não por antropólogos profissionais; sendo assim, os objetos serviam para mostras dirigidas a um público leigo, mas, pela falta de documentação, não satisfaziam as exigências científicas. Portanto, segundo o antropólogo Richard Thurnwald, essas coleções eram apenas “lenha”, isto é, um combustível fraco para o museu (MELK-KOCH, 1989MELK-KOCH, Marion. Auf der Suche nach der menschlichen Gesellschaft: Richard Thurnwald. Berlim: Reimer, 1989.). Os outros museus etnográficos encaravam o mesmo problema, por isso eram publicadas na Alemanha instruções para a coleta de dados científicos, especialmente por Adolf Bastian e os seus sucessores em Berlim (BASTIAN, 1875BASTIAN, Adolf. Allgemeine Begriffe der Ethnologie. In: NEUMAYER, Georg (Org.). Anleitung zu wissenschaftlichen Beobachtungen auf Reisen. Mit besonderer Berücksichtigung auf die Bedürfnisse der kaiserlichen Marine. Berlim: Oppenheim, 1875. p. 516-533.; ANKERMANN, 1914ANKERMANN, Bernhard. Anleitung zum ethnologischen Beobachten und Sammeln. Berlim: Reimer, 1914.). O objetivo dessas instruções era criar coleções sistemáticas que representassem a cultura material de um grupo da forma mais exaustiva possível, incluindo todas as áreas da vida. Assim, por exemplo, os objetos utilitários deveriam ser recolhidos em diferentes fases de produção, a fim de se poderem traçar passos tecnológicos, ou objetos com a mesma função em diferentes desenhos.

Dado que a situação não melhorava muito, apesar dessas instruções, logo começaram a se organizar expedições científicas. Quando Schauinsland soube, no início de 1908, que a cidade rival de Hamburgo estava preparando uma expedição, Bremen também autorizou uma viagem de coleta científica, embora muito menor (RENTROP, 2003RENTROP, Gundula. Me Make Him Belong Sell Him white Man. Eine Neuginea-Sammlung für das Bremer Städtische Museum. In: KRAUS, Michael; MÜNZEL, Mark (Org.). Museum und Universität in der Ethnologie. Marburg: Curupira, 2003. p. 207-225.).24 24 Para a história da expedição de Hamburgo ao Pacífico nos anos 1908-1910, ver Fischer (1981). O Museu Municipal enviou Ludwig Cohn (1873-1935), empregado científico da instituição, que viajou com o capitão Karl Nauer, que obteve uma licença de dispensa da Lloyd para que acompanhasse Cohn à Nova Guiné Alemã. Cohn trabalhava no departamento de História Natural do museu, para o qual deveria recolher espécimes botânicos e zoológicos e aconselhar cientificamente a Nauer, que se dedicaria à coleta de objetos etnográficos. O seu destino preciso eram as ilhas do Almirantado que eram consideradas inseguras, mas por isso também promissoras para a etnografia. Ao chegarem à Nova Guiné, tiveram que improvisar, porque perderam o navio que os levaria às ilhas, de maneira que foram à costa oriental de Bougainville, onde permaneceram por três meses fazendo coletas zoológicas, botânicas e etnográficas. Na prática, Cohn também recolhia objetos etnográficos e o resultado reflete a sua formação acadêmica, porque ele adquiriu uma ampla gama de objetos utilitários e decorativos, enquanto Nauer seguia as suas afinidades: armas, ferramentas de pesca e instrumentos musicais (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.; RENTROP, 2003RENTROP, Gundula. Me Make Him Belong Sell Him white Man. Eine Neuginea-Sammlung für das Bremer Städtische Museum. In: KRAUS, Michael; MÜNZEL, Mark (Org.). Museum und Universität in der Ethnologie. Marburg: Curupira, 2003. p. 207-225.). Mesmo assim, os frutos dessa viagem ainda não foram suficientes para competir com as coleções científicas melanésias de outros museus alemães. Eles empreenderam, por isso, uma segunda expedição, que teve lugar no verão de 1912. Sob recomendação de Nauer, Cohn passou seis semanas em Eitape, na costa norte de Nova Guiné, e quase três meses em Manus e nas outras ilhas do Almirantado. Trabalhava sempre com cinco a seis assistentes indígenas e também contou com o apoio do chefe da nova esquadra de polícia em Manus, Georg Zwanzger. Nauer organizou alojamento, embalagem e transporte dos objetos colecionados. Dessa maneira, o Museu Municipal finalmente conseguiu uma coleção de Manus com a qual podia competir com os demais museus alemães (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.; RENTROP, 2003RENTROP, Gundula. Me Make Him Belong Sell Him white Man. Eine Neuginea-Sammlung für das Bremer Städtische Museum. In: KRAUS, Michael; MÜNZEL, Mark (Org.). Museum und Universität in der Ethnologie. Marburg: Curupira, 2003. p. 207-225.).

Em retrospectiva, as notas de Cohn se revelaram significativas quanto ao processo de coleta e à participação dos indígenas. Cohn conseguiu muitos objetos em troca de mercadorias que eram escassas nas economias de subsistência indígenas, normalmente ferramentas, pregos, equipamento de pesca, produtos de consumo ou de luxo, como tabaco americano ou joias. Mas nem sempre Cohn obtinha o que desejava. Procurava artefatos como expressões materiais da cultura autóctone, mas teve de constatar que alguns objetos oferecidos pelos indígenas já eram o resultado de uma demanda que eles haviam identificado pelo contato com os europeus, e que os levava a criar coisas novas especialmente para os colecionadores ocidentais. Perguntando por um objeto que ele não pôde interpretar, Cohn obteve a resposta “o faço para vendê-lo aos brancos”25 25 Trad. livre do autor: “me make him belong sell him white men”. (RENTROP, 2003RENTROP, Gundula. Me Make Him Belong Sell Him white Man. Eine Neuginea-Sammlung für das Bremer Städtische Museum. In: KRAUS, Michael; MÜNZEL, Mark (Org.). Museum und Universität in der Ethnologie. Marburg: Curupira, 2003. p. 207-225., p. 214-217). Seja como for, as viagens empreendidas por Schauinsland e Cohn, e as aquisições feitas com o apoio da Lloyd e de outras companhias de Bremen repercutiram na exposição: as áreas geográficas representadas correspondiam às áreas de maior interesse de comércio das companhias da cidade: Ásia Oriental, o Pacífico e África Ocidental (ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970.).

Histórias de coleta pelos mares

A história de cooperações entre o Museu Municipal, a Lloyd e outras companhias da cidade não terminou com a Primeira Guerra Mundial, mesmo que tenha havido uma ruptura, especialmente para a Lloyd, que perdeu muitos barcos. Apesar das condições difíceis, a Lloyd conseguiu retomar seus negócios com sucesso, o que também ocorreu após a Segunda Guerra Mundial. Foram a concorrência entre as companhias aéreas no transporte de passageiros e as alterações estruturais tornadas necessárias pela implementação de contêineres para mercadorias que levaram a Lloyd à fusão com sua antiga competidora de Hamburgo, a HAPAG, em 1970 (OSTERSEHLTE, 1995OSTERSEHLTE, Christian. Der Norddeutsche Lloyd. In: RODER, Hartmut (Org.). Bremen. Handelsstadt am Fluß. Bremen: Hauschild, 1995. p. 177-181.). Na década de 1970, o museu - que já tinha adotado o nome de Übersee-Museum - foi redesenhado. Sob a pressão das crises econômicas e ecológicas da época e dos protestos de 1968, o museu decidiu não só explicar o homem e a natureza em termos descritivos, mas também chamar atenção para os problemas globais atuais e apontar opções de ação. Em novas exposições, as questões econômicas eram agora também tratadas sob o aspecto da exploração e do colonialismo, o que levou ao confronto e, por fim, a uma ruptura com os comerciantes. A Câmara de Comércio retirou o seu apoio ao museu. Foram fundadas junto ao museu organizações dedicadas à ajuda ao desenvolvimento e à informação sobre países em desenvolvimento e direitos humanos (STILLER, 2019STILLER, Michael. Wilde Jahre. In: AHRNDT, Wiebke (Org.). Spurensuche. Geschichte eines Museums. Bremen: Übersee-Museum Bremen; Bramsche: Rasch, 2019. p. 100-105.; NIEMANN, 2019bNIEMANN, René P.. BORDA - Bremen Overseas Research and Development Association. In: AHRNDT, Wiebke (Org.). Spurensuche. Geschichte eines Museums. Bremen: Übersee-Museum Bremen; Bramsche: Rasch, 2019b. p. 118-119.; 2019cNIEMANN, René P.. BIZ - Bremer Informationszentrum für Menschenrechte und Entwicklung. In: AHRNDT, Wiebke (Org.). Spurensuche. Geschichte eines Museums. Bremen: Übersee-Museum Bremen; Bramsche: Rasch, 2019c. p. 120-121.). O diretor entre os anos 1975 e 1991, Herbert Ganslmayr, foi também um defensor e precursor de restituições (GANSLMAYR; PACZENSKY, 1984GANSLMAYR, Herbert; PACZENSKY, Gert von. Nofretete will nach Hause. Europa - Schatzhaus der Dritten Welt. Munique: Bertelsmann, 1984.).

Após o mandato de Ganslmayr, os comerciantes e o museu voltaram a se aproximar, e o museu dedicou em seu 100° aniversário uma exposição inteira ao desenvolvimento histórico da economia da cidade, em uma perspectiva historicista. Desde a virada do milênio, por outro lado, as áreas de coleção foram integradas em exposições interdisciplinares, de modo que temas econômicos como os das empresas de Bremen estão agora espalhados por todo o museu.26 26 Inauguraram-se “Ozeanien” em 2003, “Asien” em 2006, “Erleben was die Welt bewegt” (“Experimentar o que move o mundo”) em 2010, “Afrika” em 2013 e “Amerika” em 2016. A consideração da crítica pós-colonial levou desde então não só ao regresso de restos humanos, tais como esqueletos e crânios Maori ao Museu Te Papa, na Nova Zelândia, em 2016,27 27 A diretora atual do museu, Wiebke Ahrndt, é a chefe de um grupo de trabalho da Associação Alemã de Museus sobre a questão do tratamento de restos humanos em acervos de museus e contribuiu para o desenvolvimento de uma diretriz correspondente (DEUTSCHER MUSEUMSBUND, 2013). como também à exposição “Spurensuche - Geschichte eines Museums” (“Procura de pistas - história de um museu”) em 2019, na qual um olhar crítico também revela casos exemplares da coleta de objetos no início da sua história.

No início da história do museu, Schauinsland viajava pessoalmente para obter coleções, mas, devido às estadias relativamente curtas nas paradas das viagens, muitas vezes foi obrigado a encomendar a outras pessoas a aquisição ou a produção e o envio de objetos etnográficos. Em Bremen, conseguiu criar exposições que apelaram a um vasto público. No entanto, cada vez mais teve de se ocupar da competitividade científica da sua casa, o que levou à organização de duas viagens de coleta, que foram realizadas pelo seu colega Cohn com o apoio do capitão Nauer, da Lloyd, e alcançaram o resultado desejado. É uma história que evidencia os entrelaçamentos que existiam entre a ciência ocidental, o Estado e, especialmente, os empreendedores do setor privado, bem como o papel de todos eles como atores na era do imperialismo, cujas ações se estenderam a muito mais áreas do que às colônias formalmente controladas.

Estudar e analisar essa história mostra que as coleções que serviam para apresentar as culturas indígenas eram menos suas expressões originais, do que o resultado do contato cultural com os colecionadores ocidentais e que a objetividade científica dos antropólogos nos museus se baseava em coleções cuja constituição passava por vários processos seletivos que eles, por vezes, não controlavam de maneira alguma. Esses processos de seleção começaram entre os indígenas e, no caso do Museu Municipal de História Natural, Etnologia e Comércio, foram influenciados significativamente pela rede de linhas da Norddeutscher Lloyd, bem como de outras companhias de Bremen, pelo tamanho e pelo número dos seus barcos e pela vontade dos seus capitães e agentes. A produção de conhecimento dependeu, portanto, consideravelmente de quem pôde realizar coletas, por tempo e com dinheiro limitados, e também das rotas marítimas disponíveis e acessíveis.

  • 1
    A reflexão aprofundada sobre as raízes da antropologia no século XVIII ultrapassa os objetivos deste trabalho. Para pormenores, ver Vermeulen (2015)VERMEULEN, Han F. Before Boas. The Genesis of Ethnography and Ethnology in the German Enlightenment. Lincoln: University of Nebraska Press, 2015..
  • 2
    Antes da fundação do Museu Municipal de História Natural, Etnologia e Comercio em 1896, já existiam museus etnográficos nas seguintes cidades alemãs: Munique (1868), Leipzig (1869), Berlim (1873), Dresden (1876), Hamburgo (1879), Stuttgart (1884), Friburgo (1895). Seguiram-se outras fundações em Colônia (1901) e Frankfurt (1904). Fora do Império Alemão, abriram-se museus etnográficos em Viena (1876) e na Basileia (1893) (VOGES, 2001VOGES, Hans. Das Völkerkundemuseum. In: FRANÇOIS, Etienne; SCHULZE, Hagen (Org.). Deutsche Erinnerungsorte I. Munique: Beck, 2001. p. 305-321.).
  • 3
    Trad. livre do autor: “Auch und gerade dem Auge sollte etwas Eigenartiges geboten werden. Daher das Bestreben, aus jedem Lande all’ das herbeizuziehen, was die Eigentümlichkeit des betreffenden Klimas oder Volkes veranschaulichen könnte, mit einem Worte: den Warenproben Lokalfarbe zu verleihen”.
  • 4
    Trad. livre do autor: “Lassen Sie mich mit einem Wunsche schließen: Das Museum bedarf, wenn es gedeihen soll, der Unterstützung der Männer der Wissenschaft, welche dieselbe den früheren naturwissenschaftlichen Sammlungen in so reichem Maße gewährt haben. Möge diese Unterstützung ihm erhalten bleiben! Das Museum bedarf der Zuneigung der gesamten bremischen Bevölkerung; hoffen wir, daß es unter die Zahl ihrer Lieblingskinder aufgenommen werde! Das Museum bedarf der Hülfe seitens der Söhne Bremens in fernen Landen, die mit Liebe der alten Vaterstadt gedenken. Vor allem aber bedarf es zu seinem Gedeihen der ferneren Entwicklung und des Wachstums Bremens in seiner Stellung zum Weltverkehr. Möge das Museum eine Ruhmeshalle des Bremischen Handels werden!”.
  • 5
    No último quarto do século XIX, na Alemanha, havia empresários como Carl Hagenbeck (1844-1913) que elaboraram o conceito de pequenas exposições etnológicas já conhecidas, transformando-as em espetáculos sofisticados, fáceis de transportar e dramaturgicamente coordenados. Para esse fim, contrataram-se grupos étnicos que seriam levados e apresentados por toda Europa em zoológicos, parques recreativos, feiras ou teatros. Nesses zoológicos humanos, os grupos étnicos tinham de apresentar atividades da sua “vida cotidiana” e danças, música ou lutas (THODE-ARORA, 2008THODE-ARORA, Hilke. Commercial Ethnographic Exhibitions: Völkerschauen. In: PODDAR, Prem; PATKE, Rajeev S.; JENSEN, Lars (Org.). A Historical Companion to Postcolonial Literatures. Continental Europe and its Empires. Edimburgo: Edinburgh University Press, 2008. p. 227-228.). As culturas não europeias eram consideradas fascinantes, mas a continuidade dessa fascinação e a representação particular também estabeleceram uma distinção e contribuíram para a produção e a consolidação da autoimagem dos europeus como culturalmente superiores (HODEIR, 2002HODEIR, Catherine. Decentring the Gaze at French Colonial Exhibitions. In: LANDAU, Paul S.; KASPIN, Deborah D. (Org.). Images and Empires. Visuality in Colonial and Postcolonial Africa. Berkeley: University of California Press, 2002. p. 233-252.).
  • 6
    Trad. livre do autor: “in leicht verständlicher Weise dem Kaufmanne Anregung, dem Fachmann Vergleichsmaterial, dem Volke Belehrung” (citado por AHRNDT, 2013AHRNDT, Wiebke. Faszination Ferne. Museumsführer. Bremen: Carl Schünemann, 2013., p. 15).
  • 7
    Trad. livre do autor: “Hier sieht man, wie Bremen seine Söhne zum Welthandel erzieht” (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 74).
  • 8
    Bastian visou a um “arquivo universal da humanidade” e à compreensão dos ditos Völkergedanken, os conceitos mentais que grupos culturais desenvolviam, mantinham e transmitiam sob a influência de suas respectivas condições geográficas e históricas. Ao analisar vários Völkergedanken, Bastian queria extrair conclusões sobre os traços universais da mente humana, que ele chamava de Elementargedanken (“pensamentos elementares”) (FISCHER; BOLZ; KAMEL, 2007FISCHER, Manuela; BOLZ, Peter; KAMEL, Susan (Org.). Adolf Bastian and His Universal Archive of Humanity. The Origins of German Anthropology. Hildesheim: Olms, 2007.).
  • 9
    Os representantes do difusionismo achavam que a sua disciplina pertencia tanto aos museus quanto às universidades (NOACK, 2015NOACK, Karoline. Museum und Universität: Institutionen der Ethnologie und Authentizität der Objekte. Rückblicke, gegenwärtige Tendenzen und zukünftige Möglichkeiten. In: NOACK, Karoline; KRAUS, Michael (Org.). Quo vadis, Völkerkundemuseum? Aktuelle Debatten zu ethnologischen Sammlungen in Museen und Universitäten. Bielefeld: Transcript, 2015. p. 41-67.). Em contraste com Bastian, que presumia que o desenvolvimento cultural era universalmente inerente à mente de todas as gentes, a suposição dos difusionistas era de que as pessoas raramente produzem inovações e que a sua difusão acontecia mais através de contatos entre diferentes grupos humanos (BARNARD, 2000BARNARD, Alan. History and Theory in Anthropology. Cambridge: Cambridge University Press, 2000.).
  • 10
    Os estudos na ilha Laysan e em Stephens-Island foram publicados, entre outros, em Schauinsland (1899aSCHAUINSLAND, Hugo. Beiträge zur Biologie und Entwickelung der Hatteria nebst Bemerkungen über die Entwickelung der Sauropsiden. Anatomischer Anzeiger, v. XV, n. 17-18, p. 309-334, Feb. 1899a.; 1899bSCHAUINSLAND, Hugo. Drei Monate auf einer Koralleninsel (Laysan). Bremen, 1899b.).
  • 11
    O negócio de Schütte e do seu irmão mais velho, Franz Ernst Schütte (1836-1911) ia crescendo e, junto com a Rockefellers Standard Oil Company, levou à fundação da Deutsch-Amerikanische Petroleum-Gesellschaft (SCHWARZWÄLDER, 2003SCHWARZWÄLDER, Herbert. Das große Bremen-Lexikon. Bremen: Edition Temmen, 2003.). Esta última passou a chamar-se Esso na metade do século XX e é, hoje em dia, parte da empresa multinacional Exxon-Mobil.
  • 12
    Estas aquisições também foram objeto de publicações acadêmicas (SCHURTZ, 1900SCHURTZ, Heinrich. Schnitzereien der Maori. Globus, v. 77, n. 4, p. 53-58, 1900.; 1902SCHURTZ, Heinrich. Stein- und Knochengeräthe der Chatham-Insulaner (Moriori). Zeitschrift für Ethnologie, v. 34, p. 1-24, 1902.; WEISSENBORN, 1908WEISSENBORN, Johannes. Der Totempfahl der Haida im Städt. Museum für Natur-, Völker- und Handelskunde. Jahrbuch der bremischen Sammlungen, v. I, n. 1, p. 20-25, 1908.).
  • 13
    Nesse âmbito, o museu também adquiriu coleções provenientes de saques realizados em campanhas militares: o major Oltwig von Kamptz (1857-1921) comandava as tropas coloniais em Camarões e, em 1899, dirigiu uma campanha militar contra o governador local de Tibati (nessa altura parte do emirado Adamawa). Em 1902/1903, conseguiu vender o “conteúdo do palácio do sultão de Tibati” ao museu (VON BRISKORN, 2019VON BRISKORN, Bettina. Oltwig von Kamptz undder Inhalt des Sultanspalastes von Tibati. In: AHRNDT, Wiebke (Org.). Spurensuche. Geschichte eines Museums. Bremen: Übersee-Museum Bremen; Bramsche: Rasch, 2019. p. 40-43.).
  • 14
    O Sumatra ligava as ilhas do Arquipélago de Bismarck e do Arquipélago das Ilhas Salomão e devia transportar copra (a polpa seca do coco, usada para preparar o óleo de coco), correios e operários. Além disso, a Lloyd queria abrir a região para o turismo, pensando principalmente nos passageiros que viajavam nos barcos luxuosos da sua linha entre a Austrália e o Japão (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).
  • 15
    Trad. livre do autor: “Gegenstände, die für unser Museum von Wert sind und die sie auf ihren Reisen erlangen können, nicht anderweitig zu verschenken oder zu verkaufen, sondern sie nach Bremen zu senden”. ARCHIV ÜBERSEE-MUSEUM, Bremen. SCHAUINSLAND, Hugo. Carta à Norddeutscher Lloyd, 23 jan. 1907, t. 115.
  • 16
    Por causa da Primeira Guerra Mundial, Nauer perdeu as suas plantações e teve de esperar até 1923 para poder voltar ao serviço da Lloyd. Ficou no comando de um grande barco a vapor que ia principalmente à América do Sul até 1935, quando se aposentou e passou a se dedicar, com sucesso, às plantações na província de Misiones na Argentina, onde morreu em 1962 (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).
  • 17
    As coleções de Voogdt foram compradas, em parte, pelo Field Museum de Chicago em 1909 (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).
  • 18
    Embora missionários às vezes destruíssem certos objetos como atos de iconoclastia, outros missionários tornaram-se colecionadores da cultura material entre os povos indígenas cuja conversão pretendiam promover (CORBEY; WEENER, 2015CORBEY, Raymond; WEENER, Frans Karel. Collecting While Converting: Missionaries and Ethnographics. Journal of Art Historiography, v. 12, p. 1-14, June 2015.).
  • 19
    A “caça de cabeças” foi uma prática de cortar e preservar a cabeça de uma pessoa como troféu. O objetivo era, com frequência, o de aproveitar magicamente a energia presumida do crânio. Fazia parte de processos de estruturação e defesa de relações hierárquicas entre grupos e indivíduos e, como tal, foi uma expressão de contendas e conflitos violentos que a administração britânica procurou suprimir.
  • 20
    Nauer também adquiriu maquetes de embarcações nativas que, posteriormente, foram apresentadas em uma exposição sobre o comércio no segundo andar do museu, e que serviam para ilustrar o desenvolvimento da tecnologia náutica. Pela comparação entre os barcos a vapor modernos e as embarcações pequenas dos povos nativos, estas últimas pareciam primitivas, o que era claramente uma impressão intencional (MÜLLER, 2002MÜLLER, Andrea. Der Lloyd-Kapitän Karl Nauer als Sammler in der Südsee für das Überseemuseum. Arbeiterbewegung und Sozialgeschichte, n. 10, p. 32-56, 2002.).
  • 21
    Trad. livre do autor: “Ich selbst bemühte mich in China und Japan mit Erfolg, die erste Grundlage für eine künftige Ausstellung zu schaffen; in Anbetracht der mir zur Verfügung stehenden Zeit und Mittel genügt das Erreichte aber noch nicht, um etwas Bremen Würdiges veranstalten zu können” (citado por ABEL, 1970ABEL, Herbert. Vom Raritätenkabinett zum Bremer Überseemuseum. Die Geschichte einer hanseatischen Sammlung aus Übersee anläßlich ihres 75jährigen Bestehens. Bremen: Friedrich Röver, 1970., p. 101).
  • 22
    Com sua montagem e instalação no segundo pátio, a casa ficou integrada à estrutura arquite­tônica do museu.
  • 23
    Trad. livre do autor: “Das Richtigste wäre, wenn Sie einen jüngeren Gelehrten heraussenden würden für etwa 6 Monate, der sich nur dafür d.h. für die Sammlungen interessieren würde, dann können Sie noch genügend schöne Ethnologiken erhalten, vorausgesetzt natürlich dass es auch an den nötigen Geldmitteln nicht mangelt (...) meiner Ansicht ist es der einzig rationelle Ausweg, alle anderen Maasregeln führen nicht zum Ziel, d.h. eine gute, reichhaltige Sammlung zu erhalten. Dr. Thornvall vom Museum für Völkerkunde ist bereits seit Monaten hier., Herr Schoede aus Berlin sammelt für 3 Museen, wie er mitteilte u. will Ende d. J. wieder herauskommen, es ist daher Eile nötig, wenn Sie hier noch etwas Gutes erhalten wollen”. ARCHIV ÜBERSEE-MUSEUM, Bremen, HAESNER, Otto. Carta a Hugo Schauinsland, 4 jun. 1907, t. 115.
  • 24
    Para a história da expedição de Hamburgo ao Pacífico nos anos 1908-1910, ver Fischer (1981)FISCHER, Hans. Die Hamburger Südsee-Expedition. Über Ethnographie und Kolonialismus. Frankfurt am Main: Syndikat, 1981..
  • 25
    Trad. livre do autor: “me make him belong sell him white men”.
  • 26
    Inauguraram-se “Ozeanien” em 2003, “Asien” em 2006, “Erleben was die Welt bewegt” (“Experimentar o que move o mundo”) em 2010, “Afrika” em 2013 e “Amerika” em 2016.
  • 27
    A diretora atual do museu, Wiebke Ahrndt, é a chefe de um grupo de trabalho da Associação Alemã de Museus sobre a questão do tratamento de restos humanos em acervos de museus e contribuiu para o desenvolvimento de uma diretriz correspondente (DEUTSCHER MUSEUMSBUND, 2013DEUTSCHER MUSEUMSBUND (Org.). Empfehlungen zum Umgang mit menschlichen Überresten in Museen und Sammlungen, 2013. Disponível em: <https://www.museumsbund.de/wp-content/uploads/2017/04/2013-empfehlungen-zum-umgang-mit-menschl-ueberresten.pdf>. Acesso em: 6 jul. 2021.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2021
  • Revisado
    13 Out 2021
  • Aceito
    01 Nov 2021
Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos, 6627 , Pampulha, Cidade Universitária, Caixa Postal 253 - CEP 31270-901, Tel./Fax: (55 31) 3409-5045, Belo Horizonte - MG, Brasil - Belo Horizonte - MG - Brazil
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