Open-access O Método de Nikiforov-Uvarov aplicado ao potencial de Kratzer-Fues em sistemas moleculares diatômicos

The Nikiforov-Uvarov Method applied to the Kratzer-Fues potential in diatomic molecular systems

Resumos

Este trabalho investiga a aplicação do método de Nikiforov-Uvarov na resolução da equação de Schrödinger para o potencial de Kratzer-Fues unidimensional, um modelo amplamente utilizado na descrição de interações e estruturas moleculares. O referido método demonstrou ser eficiente na obtenção do espectro de energia e das autofunções radiais normalizadas de estados ligados. Os resultados numéricos obtidos para as moléculas diatômicas NO e O2 foram consistentes e precisos, especialmente quando comparados ao método de iteração assintótica e à regra de quantização exata. Assim, o estudo reforça a eficácia desse método para análises avançadas de sistemas moleculares, contribuindo para a compreensão de fenômenos químicos e físicos.

Palavras-chave: Equação de Schrödinger; método de Nikiforov-Uvarov; moléculas diatômicas; potencial de Kratzer; potencial de Kratzer-Fues


This work investigates the application of the Nikiforov-Uvarov method in solving the Schrödinger equation for the one-dimensional Kratzer-Fues potential, a model widely used in the description of molecular interactions and structures. The method has proven to be efficient in obtaining the energy spectrum and normalized radial wavefunctions of bound states. The numerical results obtained for the diatomic molecules NO e O2 were consistent and precise, especially when compared to the asymptotic iteration method and the exact quantization rule. Thus, the study reinforces the effectiveness of this method for advanced analyses of molecular systems, contributing to the understanding of chemical and physical phenomena.

Keywords Schrödinger equation; Nikiforov-Uvarov method; diatomic molecules; Kratzer potential; Kratzer-Fues potential


1. Introdução

A pesquisa sobre as soluções exatas da equação de Schrödinger para diferentes potenciais é tema de grande relevância nas áreas de Física Atômica e Molecular, Física Nuclear e Física da Matéria Condensada [1, 2]. A referida equação, que descreve o comportamento quântico de sistemas físicos, é fundamental para entender diversos fenômenos, relacionados à estrutura eletrônica de átomos e moléculas até as interações complexas em sólidos. Ademais, a compreensão desses fenômenos permite avanços significativos no desenvolvimento de novas tecnologias e materiais com propriedadesespecíficas [3].

No entanto, resolver a equação de Schrödinger (ES) apresenta desafios, pois soluções analíticas exatas são viáveis apenas para um conjunto específico de potenciais [4], como o potencial generalizado de Coulomb [5], os potenciais do oscilador harmônico e pseudo-harmônico [6], e os do tipo Mie [7]. Além disso, soluções analíticas exatas da ES são possíveis quando o momento angular é zero, especialmente para modelos de potenciais exponenciais [8, 9, 10].

O método analítico usual para resolver a ES envolve a expansão da solução em série de potências da variável independente, seguida da obtenção de relações de recorrência para todos os coeficientes da expansão [11]. No entanto, a convergência da série para uma função que satisfaça a ES pode ser bastante complexa e trabalhosa, resultando frequentemente em relações que dificultam obter a função de onda. Por isso, diferentes técnicas são utilizadas, como os métodos algébricos baseados na álgebra de Lie [12, 13], que incluem o método da fatoração [14] e a abordagem da supersimetria (SUSY) [15], a regra de quantização exata (RQE) [16], além do método da iteração assintótica (MIA) [17, 18].

Nessa perspectiva, o método de Nikiforov-Uvarov (MNU) tem se mostrado eficaz na resolução analítica da equação de Schrödinger para diversos potenciais de interesse físico [19, 20, 21, 22, 23]. Proposto originalmente pelos matemáticos russos Vasily Borisovich Uvarov e Arnold Fedorovich Nikiforov em 1988 [24], o MNU baseia-se no trabalho de Szego [25].

Um exemplo importante de potencial cuja ES pode ser resolvida pelo MNU é o potencial de Kratzer [26, 27]. Introduzido pela primeira vez em 1920 pelo físico alemão B. Adolf Kratzer, foi desenvolvido para descrever os espectros de vibração-rotação de moléculas diatômicas. Desde então, tem sido amplamente utilizado em várias áreas, como Física Atômica e Molecular [28], Física Nuclear [29], Interfaces Líquido-Sólido e Termodinâmica [30], e também na Físico-Química [31]. Além disso, o potencial de Kratzer desempenhou um papel importante na história da Química Quântica e Molecular [32]. Consequentemente, a solução da ES para o potencial de Kratzer e seus casos particulares é relevante para a compreensão de diversos fenômenos físicos e químicos.

O potencial de Kratzer tem sido extensivamente explorado através de métodos como fatoração [33, 34], iteração assintótica [32, 35], transformada de Laplace [36] e outras técnicas. Neste trabalho, o método de Nikiforov-Uvarov [24] é aplicado para obter soluções analíticas da equação de Schrödinger para o potencial de Kratzer. A técnica apresentada aborda as equações diferenciais singulares e o comportamento assintótico de suas soluções, incluindo funções hipergeométricas generalizadas e polinômios ortogonais especiais [25]. Ademais, o trabalho também investiga sistemas diatômicos, como O2 e NO, utilizando um caso particular do potencial de Kratzer, conhecido como potencial de Kratzer-Fues [37].

A estrutura do artigo é a seguinte: na Seção 2, o método de Nikiforov-Uvarov é apresentado; na Seção 3, os autovalores exatos de energia para os estados ligados e as respectivas autofunções radiais normalizadas para o potencial de Kratzer são obtidos. Na Seção 4, utilizando o potencial de Kratzer-Fues, são realizados cálculos numéricos para determinar os níveis de energia rovibracional para as moléculas diatômicas NO e O2. Por fim, na Seção 5, a conclusão é apresentada.

2. O Método de Nikiforov-Uvarov

Ao resolver problemas com a equação de Schrödinger, utiliza-se recorrentemente diferentes funções especiais [38]. Na prática, as funções especiais constituem as soluções de equações diferenciais [39]. Uma abordagem apropriada em Física Matemática é estudar as propriedades dessas funções diretamente das equações diferenciais que surgem na formulação matemática dos problemas físicos [40, 41]. Portanto, o MNU foi desenvolvido com o objetivo de sistematizar a teoria subjacente às funções especiais no contexto da equação diferencial hipergeométrica.

As séries hipergeométricas foram abordadas inicialmente por Leonhard Euler. Anos depois, Carl Friedrich Gauss investigou as funções hipergeométricas no plano complexo [42, 43]. Em 1857, Bernhard Riemann fez uma importante contribuição ao caracterizar o comportamento da continuação analítica das soluções da equação diferencial linear no plano complexo, utilizando o conceito de grupo de monodromia [43]. As ideais de B. Riemann sobre as funções hipergeométricas de Gauss foram amplamente discutidas em palestras proferidas por Felix Klein em 1893, as quais foram compiladas no volume 39 das “Noções Básicas das Ciências Matemáticas” (Grundlehren der Mathematischen Wissenschaften) [44].

O MNU é fundamentado na solução de equações diferenciais hipergeométricas generalizadas de segunda ordem representadas por

(1) u ( s ) + τ ˜ ( s ) σ ( s ) u ( s ) + σ ˜ ( s ) σ 2 ( s ) u ( s ) = 0 ,

em que σ(s) e σ˜(s) são polinômios de, no máximo, segundo grau, τ˜(s) é um polinômio de, no máximo, primeiro grau, e u(s) é uma função do tipo hipergeométrica. Tanto a variável s quanto os polinômios σ(s), σ˜(s) e τ˜(s) podem assumir valores reais ou complexos [24]. As condições de contorno do MNU são estabelecidas com base nos critérios relacionados aos graus dos coeficientes polinomiais mencionados [45].

A primeira etapa do MNU consiste em aplicar uma classe de transformações que reduza a equação (1) a uma equação mais simples, mantendo sua forma inalterada [9]. Essa transformação é dada por u(s) = ϕ(s)y(s), em que y(s) é uma nova função a ser determinada através da escolha de uma função ϕ(s) apropriada, ou seja,

(2) y ( s ) + 2 ϕ ( s ) ϕ ( s ) + τ ˜ ( s ) σ ( s ) y ( s ) + ϕ ( s ) ϕ ( s ) + ϕ ( s ) ϕ ( s ) τ ˜ ( s ) σ ( s ) + σ ˜ ( s ) σ 2 ( s ) y ( s ) = 0.

É apropriado reorganizar os coeficientes de y(s) e y′(s) utilizando polinômios escolhidos de forma a simplificar a solução do problema. Para tanto, exige-se que o coeficiente de y′(s) tenha a forma do coeficiente de y′(s) na equação (1). Este raciocínio conduz a

(3) 2 ϕ ( s ) ϕ ( s ) + τ ˜ ( s ) σ ( s ) : = τ ( s ) σ ( s ) ,

sendo τ (s) um polinômio de, no máximo, grau um. Com essa imposição, obtém-se que

(4) ϕ ( s ) ϕ ( s ) : = r ( s ) σ ( s ) ,

em que r(s) é um polinômio cujo grau máximo é um. Consequentemente, a forma mais regular da equação eq tau é escrita como

(5) r ( s ) = 1 2 ( τ ( s ) τ ˜ ( s ) ) .

O coeficiente de y(s) na equação (2) pode ser reformulado adequadamente usando a definição a seguir:

(6) ϕ ( s ) ϕ ( s ) + ϕ ( s ) ϕ ( s ) τ ˜ ( s ) σ ( s ) + σ ˜ ( s ) σ 2 ( s ) : = σ ( s ) σ 2 ( s ) ,

em que σ¯(s) um polinômio cujo grau máximo é 2. Utilizando a equação (4), verifica-se que

(7) ϕ ( s ) ϕ ( s ) = ϕ ( s ) ϕ ( s ) + ϕ ( s ) ϕ ( s ) 2 = r ( s ) σ ( s ) + r ( s ) σ ( s ) 2 .

Portanto, a equação (6) pode ser reescrita da seguinte forma:

(8) σ ¯ ( s ) = σ ˜ ( s ) + r 2 ( s ) + r ( s ) [ τ ˜ ( s ) σ ( s ) ] + r ( s ) σ ( s ) .

Substituindo os membros direitos das equações (3) e (6) na equação (2), obtém-se a equação diferencial do tipo hipergeométrica, ou seja,

(9) y ( s ) + τ ( s ) σ ( s ) y ( s ) + σ ( s ) σ 2 ( s ) y ( s ) = 0.

A função ϕ(s), resultante da mudança de variável u(s) = ϕ(s)y(s), deve satisfazer a equação (4), que depende de um polinômio linear arbitrário r(s). A escolha do polinômio r(s) deve ser feita de modo a permitir que a equação (9) assuma uma forma que facilite o estudo das propriedades de suas soluções. Nessa etapa, utilizou-se um método de tentativa e erro (veja a referência [24]). Portanto, o procedimento consiste em escolher os coeficientes de r(s) de modo que o polinômio σ¯(s) seja divisível por σ(s), isto é,

(10) σ ¯ ( s ) = λ σ ( s ) ,

sendo λ uma constante. Consequentemente, a forma reduzida da equação (9) é

(11) σ ( s ) y ( s ) + τ ( s ) y ( s ) + λ y = 0 ,

que é uma equação hipergeométrica, cujas soluções também são funções hipergeométricas.

Para determinar o polinômio r(s), a equação (8) é comparada com a equação (10). Logo,

(12) r 2 ( s ) + r ( s ) [ τ ˜ ( s ) σ ( s ) ] + σ ˜ ( s ) k σ ( s ) = 0 ,

em que o parâmetro k é dado por

(13) k = λ r ( s ) .

Supondo que k seja conhecido, é possível resolver a equação quadrática (12) para r(s), ou seja,

(14) r ( s ) = σ ( s ) τ ˜ ( s ) 2 ± τ ˜ ( s ) σ ( s ) 2 2 σ ˜ ( s ) + k σ ( s ) .

Para a continuidade do desenvolvimento acima, o parâmetro k deve ser explicitamente conhecido, o que implica que a expressão sob o sinal de raiz quadrada na equação (14) deve ser o quadrado de um polinômio, uma vez que r(s) é um polinômio de grau 1, no máximo. Assim, obtém-se uma equação quadrática para a constante k e seus valores serão determinados quando o discriminante, (b2 − 4ac), for igualado a zero. Por conseguinte, o radicando da equação (14) deve ser uma equação quadrática, cuja raiz tem multiplicidade 2. Uma vez conhecida a constante k, o polinômio r(s) é determinado a partir da equação (14). O próximo passo é encontrar os coeficientes τ (s) e λ utilizando as equações (5) e (13), respectivamente.

É importante destacar que a redução da equação (1) a uma equação do tipo hipergeométrica (11) pode ser realizada de diferentes maneiras, dependendo de k e do sinal de r(s) na equação (14). A generalidade do método de Nikiforov-Uvarov reside neste ponto. É válido mencionar que nem todos os valores de k resultarão em soluções fisicamente aceitáveis. O critério de seleção de k e a avaliação das soluções serão abordado na Seção 3 3. Aplicação do Método de Nikiforov-Uvarov ao Potencial de Kratzer O potencial de Kratzer [26] combina o potencial atrativo de Coulomb, predominante em grandes distâncias, com uma barreira repulsiva proveniente do potencial centrífugo que se manifesta em distâncias reduzidas. Sua expressão tem a forma (32) V ( r ) = A − B r + C r 2 , em que os parâmetros A, B e C são constantes. A junção dessas características resulta em um poço de potencial efetivo, que serve como um modelo de potencial na investigação das estruturas moleculares, dos espectros energéticos moleculares, das interações químicas e das vibrações nucleares nas moléculas diatômicas [47, 48]. Ademais, o potencial de Coulomb é um caso particular do potencial de Kratzer quando A = C = 0 e B = Ze′ 2, ou seja, (33) V ( r ) = − Z e ′ 2 r , sendo e′=e/4πϵ0, a carga efetiva, e = 1, 6 × 10−19 C, a carga elétrica elementar, e ϵ0 = 8,854187817 × 10−12C2N−1m−2, a permissividade do espaço livre. Para encontrar a função de onda radial Rnℓ(r) e o autovalor de energia Enℓ para o potencial de Kratzer (32) por meio do MNU, deve-se resolver a seguinte ES radial: (34) d 2 R n l ( r ) d r 2 + 2 r d R n l ( r ) d r + R n l ( r ) r 2 2 μ ( E n ℓ − A ) ℏ 2 r 2 + 2 μ B ℏ 2 r − 2 μ C ℏ 2 + ℓ ( ℓ + 1 ) = 0 , em que μ é a massa reduzida, ℓ é o número quântico do momento angular orbital, e n é o número quântico vibracional. Para simplificar a escrita e auxiliar na análise, são introduzidos os três parâmetros a seguir, cada um relacionado a uma constante do potencial de Kratzer: (35) α : = − 2 μ ( E n ℓ − A ) ℏ 2 , (36) β : = 2 μ B ℏ 2 , (37) γ : = 2 μ C ℏ 2 + ℓ ( ℓ + 1 ) . Para α > 0 e assumindo que A > |Enℓ|, β > 0 e γ > 0, tem-se as soluções de energia para os estados ligados. Utilizando os parâmetros α, β e γ, a equação (34) é reescrita em termos da função u(s), ou seja, (38) d 2 u ( s ) d s 2 + 2 s d u ( s ) d s + 1 s 2 ( − α s 2 + β s − γ ) u ( s ) = 0 , em que u(s) ≡ Rnℓ(r), sendo s a nova variável (r → s). Assim, comparando as equações (1) e (38), determinam-se os polinômios τ˜(s), σ(s) e σ˜(s). De fato, (39) τ ˜ ( s ) = 2 , (40) σ ( s ) = s , (41) σ ˜ ( s ) = − α s 2 + β s − γ . Logo, substituindo τ˜(s), σ(s) e σ˜(s) em (14), o polinômio r(s) é dado por (42) r ( s ) = − 1 2 ± 1 2 4 α s 2 + 4 ( k − β ) s + 1 + 4 γ . A equação quadrática sob o sinal de raiz quadrada na equação (42) deve ser resolvida definindo o discriminante com zero, ou seja, (43) k 2 − 2 β k + β 2 − α ( 1 + 4 γ ) = 0. Por conseguinte, as raízes de k são (44) k ± = β ± α ( 1 + 4 γ ) . Substituindo as raízes de k na equação (42), obtém-se que (45) r ( s ) = − 1 2 + 1 2 ( 2 α s + 1 + 4 γ ) , para k + − 1 2 − 1 2 ( 2 α s + 1 + 4 γ ) , para k + − 1 2 + 1 2 ( 2 α s − 1 + 4 γ ) , para k − − 1 2 − 1 2 ( 2 α s − 1 + 4 γ ) , para k − . Das quatro possibilidades obtidas para r(s), apenas uma é adequada para determinar a solução dos estados ligados. Nesta etapa, o ponto mais significativo diz respeito a τ ′(s) a partir da equação (5), pois para fornecer valores fisicamente aceitáveis para E a desigualdade a seguir deve ser satisfeita (46) τ ′ ˜ ( s ) + 2 r ′ ( s ) < 0. A condição (46) define um aparente limite na aplicabilidade do MNU conforme demonstrado por Gönül1 e Köksal (veja a referência [22] para maiores detalhes). Com isso, a expressão mais adequada para r(s) é (47) r ( s ) = − 1 2 − 1 2 ( 2 α s − 1 + 4 γ ) , para k − = β − α ( 1 + 4 γ ) , porque usando a expressão (47) e fazendo τ˜(s)=2, tem-se que (48) τ ( s ) = 1 + 1 + 4 γ − 2 α s , que satisfaz a desigualdade (46). A partir de k−, r(s) e τ (s), pode-se obter o espectro de energia Enℓ, com λ = λn, em que λ e λn são dados pelas equações (13) e (20), respectivamente. Assim, (49) λ = β − α ( 1 + 4 γ ) − α , (50) λ n = 2 n α . Reescrevendo o parâmetro α em termo da energia Enℓ, chega-se à relação (51) α = β 2 ( 1 + 2 n + 1 + 4 γ ) 2 . Finalmente, a substituição das expressões de α, β e γ nas equações (35), (36) e (37) conduz a (52) E n ℓ = A − μ B 2 2 ℏ 2 n + 1 2 + 2 μ C ℏ 2 + ℓ + 1 2 2 − 2 , n = 0 , 1 , 2 , 3 … , ℓ = 0 , 1 , 2 , 3 , … , n . A equação (52) descreve o espectro de energia dos estados ligados do potencial de Kratzer. Ao ajustar corretamente os parâmetros A, B e C, é possível calcular o espectro de energia de uma partícula submetida ao citado potencial. Por exemplo, ajustando-se os parâmetros A = 0 B = Ze′e2 C = 0, mostra-se que a equação (52) reduz-se ao espectro de energia de estado ligado de uma partícula no potencial de Coulomb, ou seja, E n p = − Z 2 μ e ′ 4 2 n p 2 ℏ 2 , sendo np ≡ n + ℓ + 1. O número quântico principal np varia de 1 ao infinito. Assim, a partícula que está no potencial de Coulomb terá níveis de energia quantizados devido a np. Numericamente, a energia do estado fundamental (np = 1) do átomo de hidrogênio (Z = 1) é −13, 6 eV. Como afirmado anteriormente, no contexto do MNU, tem-se que u(s) ≡ Rnℓ(r) e u(s) = ϕ(s)y(s). Portanto, para encontrar as autofunções Rnℓ(r) correspondentes aos autovalores de energia Enℓ(r) para o potencial de Kratzer, é necessário obter ϕ(s) e y(s) separadamente. Desso modo, é possível encontrar ϕ(s) substituindo os polinômios σ(s) = s e r(s), dado por (47), na equação (4). Logo, (53) d ϕ ( s ) d s 1 ϕ ( s ) = − 1 + 1 + 4 γ 2 s − α . Integrando a equação (53), resulta em (54) ϕ ( s ) = N n ℓ s ω − 1 2 e − α s , em que ω é dado por (55) ω = 1 + 4 γ , e Nnℓ é a constante de normalização. A solução polinomial da função hipergeométrica y(s) depende da determinação da função peso ρ(s), que deve satisfazer a condição estabelecida na equação (21). Portanto, (56) d ρ ( s ) d s 1 ρ ( s ) = 1 + 4 γ − 2 α s s , de modo que (57) ρ ( s ) = s 1 + 4 γ e − 2 α s . Substituindo ρ(s) na equação (31), chega-se à seguinte forma para o polinômio yn(s): (58) y n ( s ) = B n e 2 α s s − 1 + 4 γ d n d s n ( e − 2 α s s n + 1 + 4 γ ) . Usando a fórmula de Rodrigues para os polinômios de Laguerre associados [49] e identificando yn(s)≡Ln1+4γ(2αs) com 1/n!= Bn, a função de onda radial Rnℓ(r) pode ser escrita como (59) R n ℓ ( r ) = N n ℓ s − 1 + ω 2 e − α s L n 1 + 4 γ ( 2 α r ) . A constante Nnℓ é encontrada a partir da condição de normalização de Rnℓ(r), ou seja, ∫ 0 ∞ r 2 ( R n ℓ ( r ) ) 2 d r = 1. Com base no resultado 8.980 mencionado na referência [49], nota-se que ∫ 0 ∞ t α + β e − t ( L n α ( t ) ) 2 d t = ∑ r = 0 n β n − r 2 Γ ( α + β + r + 1 ) r ! . Consequentemente, a constante Nnℓ é dada por (60) N n ℓ = δ ω + 2 2 n ! ( 2 n + ω + 1 ) Γ ( n + ω + 1 ) , em que o parâmetro δ é dado pela expressão δ = 2 α . Por fim, substituindo (60) na equação (59), obtém-se (61) R n ℓ ( r ) = δ ω + 2 2 n ! ( 2 n + ω + 1 ) Γ ( n + ω + 1 ) s ω − 1 2 e − δ s 2 L n 1 + 4 γ ( δ r ) , que é a solução radial procurada. 3.1. Aplicação do potencial de Kratzer-Fues às moléculas O2 e NO O potencial de Kratzer-Fues [37] é um caso particular do potencial de Kratzer (32) quando A = 0. Portanto, tem-se que (62) V ( r ) = − B r + C r 2 , com os parâmetros B e C sendo escolhidos como B = 2Dere e C = Dere2, em que De é a energia de dissociação, e re é a distância internuclear. A Figura 1 mostra a representação gráfica do potencial de Kratzer-Fues para as moléculas diatômicas O2 e NO. Como pode ser verificado, o potencial se torna infinito à medida que a distância internuclear se aproxima de zero devido à repulsão entre os núcleos. Em contrapartida, à medida que a molécula se dissocia, a distância internuclear aumenta, e o potencial tende a zero. Figura 1 O potencial de Kratzer-Fues para as moléculas diatômicas NO e O2. As linhas tracejadas indicam as distâncias internucleares (re) e os respectivos mínimos de energia para as moléculas diatômicas NO e O2. O potencial de Kratzer-Fues desempenha um papel importante na modelagem do espectro roto-vibracional de moléculas diatômicas, como também na modificação do espectro de energia pelo confinamento por fluxo Aharanov-Bohm na presença de defeitos topológicos [50, 51, 52]. Da equação (52), segue que o espectro de energia dos estados ligados do potencial de Kratzer-Fues é dado por (63) E n ℓ = μ B 2 2 ℏ 2 n + 1 2 + 2 μ C ℏ 2 + ℓ + 1 2 2 − 2 . A equação (63) coincide com a equação de autovalor energético do potencial de Kratzer-Fues N-dimensional fornecida pela equação (28) da referência [34], quando N = 3. Por sua vez, substituindo os valores dos parâmetros B e C, chega-se a (64) E n ℓ = − 2 μ D e 2 r e 2 ℏ 2 n + 1 2 + 2 μ D e r e 2 ℏ 2 + ℓ + 1 2 2 − 2 . O resultado acima está em conformidade com os obtidos por O. Bayrak, I. Boztosun e H. Ciftci [35] através do método de iteração assintótica (MIA); e por Ikhdair e Sever, utilizando a regra de quantização exata (RQE) [16]. Os níveis de energia para as moléculas diatômicas NO e O2 são computados numericamente para determinados números quânticos selecionados n e ℓ, com os valores dos parâmetros dados pela Tabela 1 [35, 53, 54, 55, 56]. As tabelas 2 e 3 mostram os valores obtidos para os níveis de energia de Kratzer-Fues utilizando o MNU e os valores obtidos pelo RQE e MIA. Tabela 1 Parâmetros espectroscópicos para as moléculas diatômicas O2 e NO no estado fundamental. MD De (eV) re (Å) μ (amu) O 2 5.156658828 1.2080 7.997457504 NO 8.043782568 1.1508 7.468441000 Tabela 2 Autovalores de energia (em eV) do potencial molecular Kratzer-Fues para diferentes valores de n e ℓ para a molécula diatômica O2 no estado fundamental, com ħc = 1973.29 Å eV. n ℓ O2 (MNU) O2 (RQE) O2 (MIA) 0 0 −5.126358490795 −5.126358620071 −5.126358490 1 0 −5.066640766392 −5.066641146718 −5.066640766 1 1 −5.066291938130 −5.066292321402 −5.066291936 2 0 −5.007960487581 −5.007961110233 −5.007960488 2 1 −5.007617701669 −5.007618327191 −5.007617702 2 2 −5.006932271122 −5.006932902380 −5.006932272 3 0 −4.950293762100 −4.950294618656 −4.950293764 3 1 −4.949956879787 −4.949957739138 −4.949956880 3 2 −4.949283253405 −4.949284118344 −4.949283254 3 3 −4.948273159303 −4.948274032620 −4.948273160 4 0 −4.893617381542 −4.893618463868 −4.893617382 4 1 −4.893286268037 −4.893287353086 −4.893286268 4 2 −4.892624176321 −4.892625266816 −4.892624178 4 3 −4.891631376849 −4.891632475505 −4.891631378 4 4 −4.890308274954 −4.890309384483 −4.890308272 5 0 −4.837908798004 −4.837910098245 −4.837908798 5 1 −4.837583322339 −4.837584625235 −4.837583322 5 2 −4.836932503438 −4.836933811639 −4.836932504 5 3 −4.835956606018 −4.835957922172 −4.835956606 5 4 −4.834656026819 −4.834657353568 −4.834656026 5 5 −4.833031294198 −4.833032634174 −4.833031292 Analisando as Tabelas 2 e 3 e a Figura 1, observa-se que os autovalores de NO são menores que os de O2, pois a profundidade do potencial no primeiro caso é mais acentuada, ou seja, quanto maior a profundidade do potencial molecular, menores são os autovalores de energia associados. Diante disso, vale ressaltar que os resultados apresentados são consistentes com os relatados nas referências [16, 35]. Tabela 3 Autovalores de energia (em eV) do potencial molecular Kratzer-Fues para diferentes valores de n e ℓ para a molécula diatômica NO no estado fundamental, com ħc = 1973.29Å eV. n ℓ NO (MNU) NO (RQE) NO (MIA) 0 0 −8.002659243972 −8.002659419493 −8.002659248 1 0 −7.921456323005 −7.921456840689 −7.921456326 1 1 −7.921043308747 −7.921043829925 −7.921043312 2 0 −7.841483108610 −7.841483958093 −7.841483114 2 1 −7.841076333005 −7.841077185904 −7.841076336 2 2 −7.840262908797 −7.840263768523 −7.840262914 3 0 −7.762714895928 −7.762716067159 −7.762714900 3 1 −7.762314233959 −7.762315408528 −7.762314236 3 2 −7.761513034641 −7.761514215884 −7.761513040 3 3 −7.760311547121 −7.760312738370 −7.760311552 4 0 −7.685127597398 −7.685129080626 −7.685127602 4 1 −7.684732927162 −7.684734413653 −7.684732928 4 2 −7.683943708988 −7.683945202003 −7.683943714 4 3 −7.682760187378 −7.682761690175 −7.682760192 4 4 −7.681182728848 −7.681184244677 −7.681182728 5 0 −7.608697724344 −7.608699510108 −7.608697730 5 1 −7.608308926962 −7.608310715917 −7.608308928 5 2 −7.607531452229 −7.607533247563 −7.607531456 5 3 −7.606365540115 −7.606367345012 −7.606365544 5 4 −7.604811550338 −7.604813367976 −7.604811550 5 5 −7.602869962094 −7.602871795644 −7.602869968 .

Outro ponto relevante da discussão é a possível generalização das soluções da equação (11). Nesse caso, é suficiente mostrar que todas as derivadas de funções hipergeométricas também são funções hipergeométricas. Além disso, observa-se que a equação (11) é uma equação diferencial homogênea de segunda ordem, com coeficientes polinomiais, cujo grau não excede a ordem correspondente da diferenciação. De fato, ao diferenciar a equação (11) usando a representação v1(s) = y′(s), obtém-se

(15) σ v 1 ( s ) + τ 1 v 1 ( s ) + μ 1 v 1 ( s ) = 0 ,

em que

τ 1 ( s ) = τ ( s ) + σ ( s ) e μ 1 = τ ( s ) + λ .

Derivando novamente a equação (11) e introduzindo v2(s) = y″(s), tem-se

(16) σ ( s ) v 2 ( s ) + τ 2 ( s ) v 2 ( s ) + μ 2 v 2 ( s ) = 0 ,

que também é uma equação hipergeométrica, pois

τ 2 ( s ) = 2 σ ( s ) + τ ( s ) e μ 2 = σ ( s ) + λ + 2 τ ( s ) .

Derivando a equação (11) n vezes e definindo vn(s) = y(n)(s), chega-se à expressão

(17) σ ( s ) v n ( s ) + τ n ( s ) v n ( s ) + μ n v n ( s ) = 0.

Por indução, é possível encontrar as seguintes relações para τn(s) e μn:

(18) τ n ( s ) = n σ ( s ) + τ ( s ) ,
(19) μ n = n ( n 1 ) 2 σ ( s ) + λ + n τ ( s ) ,

em que τn(s) é um polinômio de grau 1, no máximo, e μn é um parâmetro que independe de s, ou seja, as soluções da equação (17) para μm ≠ 0 (m = 0, 1, . . . , n−1) podem ser representadas na forma vn(s) = y(n)(s), em que y(s) é solução da equação reduzida (11).

Como as derivadas de funções hipergeométricas também são hipergeométricas, é possível construir uma família de soluções particulares da equação (11) associada a um dado λ. De fato, tomando μn = 0, a equação (19) torna-se

(20) λ = λ n = n τ ( s ) n ( n 1 ) 2 σ ( s ) , ( n = 0 , 1 , 2 , ) .

Além disso, verifica-se que vn = cte é uma solução particular. Isto implica em um polinômio hipergeométrico de grau n para a solução y(s) = yn(s); os polinômios yn(s) são as soluções mais simples da equação (11). Para encontrar yn(s) explicitamente, multiplica-se as equações (11) e (17) pelas funções apropriadas ρ(s) e ρn(s), juntamente com suas derivadas. Assim sendo, as seguintes expressões são obtidas:

σ ( s ) ρ ( s ) y ( s ) + [ σ ( s ) ρ ( s ) + σ ( s ) ρ ( s ) ] y ( s ) + λ ρ ( s ) y ( s ) = 0 , σ ( s ) ρ n ( s ) v n ( s ) + [ σ ( s ) ρ n ( s ) + σ ( s ) ρ n ( s ) ] v n ( s ) + μ n ρ n ( s ) v n ( s ) = 0.

Impondo que ρ(s) e ρn(s) satisfaçam as equações diferenciais

(21) ( σ ( s ) ρ ( s ) ) = τ ( s ) ρ ( s ) ,
(22) ( σ ( s ) ρ n ( s ) ) = τ n ( s ) ρ n ( s ) ,

chega-se às formas autoadjuntas dadas a seguir:

(23) ( σ ( s ) ρ ( s ) y ( s ) ) + λ ρ ( s ) y ( s ) = 0 , ( σ ( s ) ρ n ( s ) v n ( s ) ) + μ n ρ n ( s ) v n ( s ) = 0.

A forma explícita de τn(s) em (18) pode ser usada para estabelecer a relação entre ρn(s) e ρ(s) ≡ ρ0(s). Logo, substituindo (18) nas equações (21) e (22), resulta em

(24) ρ n ( s ) ρ n ( s ) = n σ ( s ) σ ( s ) + ρ ( s ) ρ ( s ) .

Consequentemente, obtém-se que

(25) ρ n ( s ) = ρ ( s ) σ n ( s ) , ( n = 0 , 1 , 2 , ) .

Portanto, como ρn+1(s) = σ(s)ρn(s) e vn(s)=vn+1(s), é possível reescrever a equação (23) na forma

(26) ρ n ( s ) v n ( s ) = 1 μ n ( ρ n + 1 ( s ) v n + 1 ( s ) ) .

Logo, quando mn, resulta que

ρ m ( s ) v m ( s ) = 1 μ m ( ρ m + 1 ( s ) v m + 1 ( s ) ) , = 1 μ m 1 μ m + 1 ( ρ m + 2 ( s ) v m + 2 ( s ) ) , = , = ( 1 ) m n μ m μ m + 1 μ n 1 ( ρ n ( s ) v n ( s ) ) ( n m )

ou, de forma geral,

(27) ρ m ( s ) v m ( s ) = A m A n ( ρ n ( s ) v n ( s ) ) ( n m ) ,

com os coeficientes An dados por

A n = ( 1 ) n k = 0 n 1 μ k , A 0 = 1.

Para obter a expressão explícita dos polinômios do tipo hipergeométrico, considera-se que y(s) = yn(s). Então,

v m ( s ) = y n ( m ) ( s ) e v n ( s ) = y n ( n ) ( s ) = cte .

Utilizando a equação (27), pode-se obter uma expressão compacta para yn(m)(s), isto é,

(28) ρ m ( s ) y n ( m ) ( s ) = A m A n ρ n ( s ) ( n m ) y n ( n ) ( s ) + ρ n ( s ) ( y n ( n ) ( s ) ) ( n m ) .

Como o fator (yn(n)(s))(nm) é nulo, a equação (28) simplifica-se da seguinte forma:

(29) y n ( m ) ( s ) = A m n B n ρ m ( s ) ρ n ( s ) ( n m ) ,

em que

(30) A m n = A m ( λ ) | λ = λ n e B n = 1 A n n y n ( n ) ( s ) .

Por fim, considerando a forma de ρn(s) dada em (25) e m = 0, obtém-se uma representação explícita para os polinômios yn(s) do tipo hipergeométrico. Consequentemente, tem-se

(31) y n ( s ) = B n ρ ( s ) ( ρ ( s ) σ n ( s ) ) ( n ) , ( n = 0 , 1 , 2 , ) ,

em que Bn é o fator de normalização. Assim, as soluções polinomiais da equação (11), definidas por (31), a menos de um fator de normalização Bn, correspondem aos valores μn = 0 para λ = λn. Além disso, é importante ressaltar que a função ρ(s) deve satisfazer a condição (21).

A equação (31), conhecida como fórmula de Rodrigues (anteriormente nomeada de fórmula de Ivory-Jacobi), foi estabelecida em 1814 por Benjamin Rodrigues [46]. Utilizando uma representação integral para funções hipergeométricas, é possível generalizar a fórmula de Rodrigues (31) para encontrar soluções particulares da equação (11) para valores arbitrários de λ. Desse forma, é possível obter propriedades básicas dessas funções, como expansões em séries de potências, representações assintóticas, relações de recursão e equações funcionais [24].

3. Aplicação do Método de Nikiforov-Uvarov ao Potencial de Kratzer

O potencial de Kratzer [26] combina o potencial atrativo de Coulomb, predominante em grandes distâncias, com uma barreira repulsiva proveniente do potencial centrífugo que se manifesta em distâncias reduzidas. Sua expressão tem a forma

(32) V ( r ) = A B r + C r 2 ,

em que os parâmetros A, B e C são constantes. A junção dessas características resulta em um poço de potencial efetivo, que serve como um modelo de potencial na investigação das estruturas moleculares, dos espectros energéticos moleculares, das interações químicas e das vibrações nucleares nas moléculas diatômicas [47, 48]. Ademais, o potencial de Coulomb é um caso particular do potencial de Kratzer quando A = C = 0 e B = Ze′ 2, ou seja,

(33) V ( r ) = Z e 2 r ,

sendo e=e/4πϵ0, a carga efetiva, e = 1, 6 × 10−19 C, a carga elétrica elementar, e ϵ0 = 8,854187817 × 10−12C2N−1m−2, a permissividade do espaço livre.

Para encontrar a função de onda radial Rnℓ(r) e o autovalor de energia Enℓ para o potencial de Kratzer (32) por meio do MNU, deve-se resolver a seguinte ES radial:

(34) d 2 R n l ( r ) d r 2 + 2 r d R n l ( r ) d r + R n l ( r ) r 2 2 μ ( E n A ) 2 r 2 + 2 μ B 2 r 2 μ C 2 + ( + 1 ) = 0 ,

em que μ é a massa reduzida, é o número quântico do momento angular orbital, e n é o número quântico vibracional. Para simplificar a escrita e auxiliar na análise, são introduzidos os três parâmetros a seguir, cada um relacionado a uma constante do potencial de Kratzer:

(35) α : = 2 μ ( E n A ) 2 ,
(36) β : = 2 μ B 2 ,
(37) γ : = 2 μ C 2 + ( + 1 ) .

Para α > 0 e assumindo que A > |Enℓ|, β > 0 e γ > 0, tem-se as soluções de energia para os estados ligados.

Utilizando os parâmetros α, β e γ, a equação (34) é reescrita em termos da função u(s), ou seja,

(38) d 2 u ( s ) d s 2 + 2 s d u ( s ) d s + 1 s 2 ( α s 2 + β s γ ) u ( s ) = 0 ,

em que u(s) ≡ Rnℓ(r), sendo s a nova variável (rs). Assim, comparando as equações (1) e (38), determinam-se os polinômios τ˜(s), σ(s) e σ˜(s). De fato,

(39) τ ˜ ( s ) = 2 ,
(40) σ ( s ) = s ,
(41) σ ˜ ( s ) = α s 2 + β s γ .

Logo, substituindo τ˜(s), σ(s) e σ˜(s) em (14), o polinômio r(s) é dado por

(42) r ( s ) = 1 2 ± 1 2 4 α s 2 + 4 ( k β ) s + 1 + 4 γ .

A equação quadrática sob o sinal de raiz quadrada na equação (42) deve ser resolvida definindo o discriminante com zero, ou seja,

(43) k 2 2 β k + β 2 α ( 1 + 4 γ ) = 0.

Por conseguinte, as raízes de k são

(44) k ± = β ± α ( 1 + 4 γ ) .

Substituindo as raízes de k na equação (42), obtém-se que

(45) r ( s ) = 1 2 + 1 2 ( 2 α s + 1 + 4 γ ) , para k + 1 2 1 2 ( 2 α s + 1 + 4 γ ) , para k + 1 2 + 1 2 ( 2 α s 1 + 4 γ ) , para k 1 2 1 2 ( 2 α s 1 + 4 γ ) , para k .

Das quatro possibilidades obtidas para r(s), apenas uma é adequada para determinar a solução dos estados ligados. Nesta etapa, o ponto mais significativo diz respeito a τ ′(s) a partir da equação (5), pois para fornecer valores fisicamente aceitáveis para E a desigualdade a seguir deve ser satisfeita

(46) τ ˜ ( s ) + 2 r ( s ) < 0.

A condição (46) define um aparente limite na aplicabilidade do MNU conforme demonstrado por Gönül1 e Köksal (veja a referência [22] para maiores detalhes). Com isso, a expressão mais adequada para r(s) é

(47) r ( s ) = 1 2 1 2 ( 2 α s 1 + 4 γ ) , para k = β α ( 1 + 4 γ ) ,

porque usando a expressão (47) e fazendo τ˜(s)=2, tem-se que

(48) τ ( s ) = 1 + 1 + 4 γ 2 α s ,

que satisfaz a desigualdade (46).

A partir de k, r(s) e τ (s), pode-se obter o espectro de energia Enℓ, com λ = λn, em que λ e λn são dados pelas equações (13) e (20), respectivamente. Assim,

(49) λ = β α ( 1 + 4 γ ) α ,
(50) λ n = 2 n α .

Reescrevendo o parâmetro α em termo da energia Enℓ, chega-se à relação

(51) α = β 2 ( 1 + 2 n + 1 + 4 γ ) 2 .

Finalmente, a substituição das expressões de α, β e γ nas equações (35), (36) e (37) conduz a

(52) E n = A μ B 2 2 2 n + 1 2 + 2 μ C 2 + + 1 2 2 2 , n = 0 , 1 , 2 , 3 , = 0 , 1 , 2 , 3 , , n .

A equação (52) descreve o espectro de energia dos estados ligados do potencial de Kratzer. Ao ajustar corretamente os parâmetros A, B e C, é possível calcular o espectro de energia de uma partícula submetida ao citado potencial.

Por exemplo, ajustando-se os parâmetros A = 0 B = Ze′e2 C = 0, mostra-se que a equação (52) reduz-se ao espectro de energia de estado ligado de uma partícula no potencial de Coulomb, ou seja,

E n p = Z 2 μ e 4 2 n p 2 2 ,

sendo npn + + 1. O número quântico principal np varia de 1 ao infinito. Assim, a partícula que está no potencial de Coulomb terá níveis de energia quantizados devido a np. Numericamente, a energia do estado fundamental (np = 1) do átomo de hidrogênio (Z = 1) é −13, 6 eV.

Como afirmado anteriormente, no contexto do MNU, tem-se que u(s) ≡ Rnℓ(r) e u(s) = ϕ(s)y(s). Portanto, para encontrar as autofunções Rnℓ(r) correspondentes aos autovalores de energia Enℓ(r) para o potencial de Kratzer, é necessário obter ϕ(s) e y(s) separadamente. Desso modo, é possível encontrar ϕ(s) substituindo os polinômios σ(s) = s e r(s), dado por (47), na equação (4). Logo,

(53) d ϕ ( s ) d s 1 ϕ ( s ) = 1 + 1 + 4 γ 2 s α .

Integrando a equação (53), resulta em

(54) ϕ ( s ) = N n s ω 1 2 e α s ,

em que ω é dado por

(55) ω = 1 + 4 γ ,

e Nnℓ é a constante de normalização.

A solução polinomial da função hipergeométrica y(s) depende da determinação da função peso ρ(s), que deve satisfazer a condição estabelecida na equação (21). Portanto,

(56) d ρ ( s ) d s 1 ρ ( s ) = 1 + 4 γ 2 α s s ,

de modo que

(57) ρ ( s ) = s 1 + 4 γ e 2 α s .

Substituindo ρ(s) na equação (31), chega-se à seguinte forma para o polinômio yn(s):

(58) y n ( s ) = B n e 2 α s s 1 + 4 γ d n d s n ( e 2 α s s n + 1 + 4 γ ) .

Usando a fórmula de Rodrigues para os polinômios de Laguerre associados [49] e identificando yn(s)Ln1+4γ(2αs) com 1/n!= Bn, a função de onda radial Rnℓ(r) pode ser escrita como

(59) R n ( r ) = N n s 1 + ω 2 e α s L n 1 + 4 γ ( 2 α r ) .

A constante Nnℓ é encontrada a partir da condição de normalização de Rnℓ(r), ou seja,

0 r 2 ( R n ( r ) ) 2 d r = 1.

Com base no resultado 8.980 mencionado na referência [49], nota-se que

0 t α + β e t ( L n α ( t ) ) 2 d t = r = 0 n β n r 2 Γ ( α + β + r + 1 ) r ! .

Consequentemente, a constante Nnℓ é dada por

(60) N n = δ ω + 2 2 n ! ( 2 n + ω + 1 ) Γ ( n + ω + 1 ) ,

em que o parâmetro δ é dado pela expressão

δ = 2 α .

Por fim, substituindo (60) na equação (59), obtém-se

(61) R n ( r ) = δ ω + 2 2 n ! ( 2 n + ω + 1 ) Γ ( n + ω + 1 ) s ω 1 2 e δ s 2 L n 1 + 4 γ ( δ r ) ,

que é a solução radial procurada.

3.1. Aplicação do potencial de Kratzer-Fues às moléculas O2 e NO

O potencial de Kratzer-Fues [37] é um caso particular do potencial de Kratzer (32) quando A = 0. Portanto, tem-se que

(62) V ( r ) = B r + C r 2 ,

com os parâmetros B e C sendo escolhidos como B = 2Dere e C = Dere2, em que De é a energia de dissociação, e re é a distância internuclear.

A Figura 1 mostra a representação gráfica do potencial de Kratzer-Fues para as moléculas diatômicas O2 e NO. Como pode ser verificado, o potencial se torna infinito à medida que a distância internuclear se aproxima de zero devido à repulsão entre os núcleos. Em contrapartida, à medida que a molécula se dissocia, a distância internuclear aumenta, e o potencial tende a zero.

Figura 1
O potencial de Kratzer-Fues para as moléculas diatômicas NO e O2. As linhas tracejadas indicam as distâncias internucleares (re) e os respectivos mínimos de energia para as moléculas diatômicas NO e O2.

O potencial de Kratzer-Fues desempenha um papel importante na modelagem do espectro roto-vibracional de moléculas diatômicas, como também na modificação do espectro de energia pelo confinamento por fluxo Aharanov-Bohm na presença de defeitos topológicos [50, 51, 52]. Da equação (52), segue que o espectro de energia dos estados ligados do potencial de Kratzer-Fues é dado por

(63) E n = μ B 2 2 2 n + 1 2 + 2 μ C 2 + + 1 2 2 2 .

A equação (63) coincide com a equação de autovalor energético do potencial de Kratzer-Fues N-dimensional fornecida pela equação (28) da referência [34], quando N = 3. Por sua vez, substituindo os valores dos parâmetros B e C, chega-se a

(64) E n = 2 μ D e 2 r e 2 2 n + 1 2 + 2 μ D e r e 2 2 + + 1 2 2 2 .

O resultado acima está em conformidade com os obtidos por O. Bayrak, I. Boztosun e H. Ciftci [35] através do método de iteração assintótica (MIA); e por Ikhdair e Sever, utilizando a regra de quantização exata (RQE) [16].

Os níveis de energia para as moléculas diatômicas NO e O2 são computados numericamente para determinados números quânticos selecionados n e , com os valores dos parâmetros dados pela Tabela 1 [35, 53, 54, 55, 56]. As tabelas 2 e 3 mostram os valores obtidos para os níveis de energia de Kratzer-Fues utilizando o MNU e os valores obtidos pelo RQE e MIA.

Tabela 1
Parâmetros espectroscópicos para as moléculas diatômicas O2 e NO no estado fundamental.
Tabela 2
Autovalores de energia (em eV) do potencial molecular Kratzer-Fues para diferentes valores de n e para a molécula diatômica O2 no estado fundamental, com ħc = 1973.29 Å eV.

Analisando as Tabelas 2 e 3 e a Figura 1, observa-se que os autovalores de NO são menores que os de O2, pois a profundidade do potencial no primeiro caso é mais acentuada, ou seja, quanto maior a profundidade do potencial molecular, menores são os autovalores de energia associados. Diante disso, vale ressaltar que os resultados apresentados são consistentes com os relatados nas referências [16, 35].

Tabela 3
Autovalores de energia (em eV) do potencial molecular Kratzer-Fues para diferentes valores de n e para a molécula diatômica NO no estado fundamental, com ħc = 1973.29Å eV.

4. Conclusão

Neste estudo, o método de Nikiforov-Uvarov foi utilizado para obter a solução analítica da equação de Schrödinger para o potencial de Kratzer-Fues. A aplicação do método demonstrou eficiência na determinação do espectro de energia e das autofunções correspondentes, em comparação com outros métodos analíticos encontrados na literatura. Além disso, a precisão comparativa do método, quando aplicado às moléculas diatômicas NO e O2, revelou resultados numericamente consistentes com o método de iteração assintótica (MIA) e a regra de quantização exata (RQE). A consistência observada reforça a adequação do potencial de Kratzer-Fues para modelar estruturas moleculares diatômicas e quantificar com precisão os níveis de energia de estados ligados. Os resultados obtidos não apenas validam a eficácia do método, mas também abrem caminhos para futuras investigações sobre sistemas moleculares mais complexos.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Nov 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    01 Ago 2024
  • Aceito
    06 Set 2024
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