RESUMO
Este artigo tem por objetivo refletir sobre a presença do tema aquisição da linguagem nos trabalhos de Ferdinand de Saussure, Mikhail Bakhtin e Émile Benveniste, para, a partir de tal reflexão, descrever como essa presença deu origem a perspectivas de trabalho em torno do tema no panorama de pesquisa do Brasil. Focalizam-se três grandes perspectivas de estudo de aquisição da linguagem no país: a partir de pressupostos saussureanos, têm-se os estudos sociointeracionistas; na vertente bakhtiniana, tem-se a abordagem dialógico-discursiva; na esteira benvenistiana, encontra-se a perspectiva aquisicional enunciativa. A reflexão apresenta um quadro resumitivo com a configuração de cada perspectiva derivada da sua filiação aos autores em questão.
PALAVRAS-CHAVE: Aquisição da Linguagem; Perspectiva Sociointeracionista; Perspectiva Dialógico-discursiva; Perspectiva Aquisicional Enunciativa
ABSTRACT
This article aims to reflect upon the presence of the language acquisition theme in the works of Ferdinand de Saussure, Mikhail Bakhtin and Émile Benveniste, in order to, based on such reflection, describe how this presence gave rise to work perspectives around the theme in research panorama in Brazil. Three major perspectives for studying language acquisition in the country are highlighted: based on Saussurean assumptions, there are the social interactionist studies; in the Bakhtinian perspective, the dialogic-discursive approach; from the Benveniste perspective, the enunciative acquisitional perspective. The reflection presents a summary table with the configuration of each perspective derived from its affiliation with the authors in question.
KEYWORDS: Language acquisition; Social interactionist perspective; Dialogical-discursive perspective; Enunciative acquisitional perspective
Introdução
Encontramos em Ferdinand de Saussure, Mikhail Bakhtin e Émile Benveniste referências explícitas à linguagem da criança. São essas referências que nos motivam a refletir sobre a presença, em alguma medida, do tema aquisição da linguagem nos trabalhos desses autores, para, a partir de tal reflexão, descrever como essa presença deu origem a perspectivas de trabalho em torno do tema no panorama de pesquisa do Brasil. Sem dúvida, trata-se de autores com vasta obra reconhecida; não nos propomos, no entanto, a percorrer todas essas produções; pelo contrário, situamos nosso estudo em obras específicas de cada autor, a saber. Saussure comparece em nossa reflexão com o Curso de linguística geral (2000), mais especificamente, com o capítulo “Objeto da linguística”; sobre os estudos de Bakhtin, buscamos, principalmente no texto “O autor e o personagem na atividade estética” da obra Estética da criação verbal (2011) e nas contribuições de Volóchinov em Marxismo e filosofia da linguagem. Problemas fundamentais do método sociológico (2018), os fundamentos sobre os quais discorremos1; Benveniste, por sua vez, comparece em nossa reflexão com conceitos e princípios apresentados em textos da obra Problemas de linguística geral I, com destaque para “Vista d’olhos sobre o desenvolvimento da linguística”, “Da subjetividade da linguagem”; e no texto “Estruturalismo e linguística”, da obra Problemas de linguística geral II. Justificamos esses recortes teóricos pelo fato de encontrarmos, nos textos citados, referências explícitas à linguagem da criança, questão que, para nenhum dos autores, configurou-se como um tema central de pesquisa, mas cuja presença determinou perspectivas para trabalhos futuros.
Sendo assim, organizamos este artigo da seguinte forma: revisitamos o pensamento dos três autores em foco para, então, situarmos as possibilidades de se pensar a linguagem da criança, com enfoque nas perspectivas de estudos de aquisição da linguagem desenvolvidas no Brasil e na filiação a cada um dos pensamentos discutidos. Por fim, apresentamos um quadro resumitivo com as principais contribuições para o tema derivadas do trabalho de cada autor e situadas em cada uma das perspectivas desenvolvidas no país.
1 Saussure, o problema das origens e a linguagem da criança
Iniciamos esta seção dando voz ao Curso de linguística geral, mais especificamente, à referência feita por Ferdinand de Saussure ao estudo da linguagem das crianças:
[...] a cada instante ela [linguagem] é uma instituição atual e um produto do passado. Parece fácil, à primeira vista, distinguir entre esses sistemas e sua história, entre aquilo que ele é e o que foi; na realidade, a relação que une ambas as coisas é tão íntima que se faz difícil separá-las. Seria a questão mais simples se se considerasse o fenômeno linguístico em suas origens; se, por exemplo, começássemos por estudar a linguagem das crianças? Não, pois é uma idéia bastante falsa crer que em matéria de linguagem o problema das origens difira do das condições permanentes; não se sairá mais do círculo vicioso, então (Saussure, 2000, CLG, p. 16).
Ao apresentar tal afirmação em texto dedicado ao tema objeto da Linguística, que dá título ao capítulo em foco, tem-se a impressão de que, para o linguista, na esfera da língua, o estudo da linguagem das crianças, as origens, não poderá apontar questões distintas das condições permanentes da linguagem. Certamente a simples presença dessa ideia não permite que vejamos, em Saussure, a investigação do tema da linguagem da criança ou da aquisição; no entanto, como já afirmamos, a concepção do fenômeno linguístico e sua relação com o tema das origens abre possibilidades para que tal estudo se efetive. Essa possibilidade é assumida, já na década de 1970, mas com impactos maiores na década de 1980, por Claudia De Lemos, autora que levou em consideração a relação proposta pelo mestre entre a linguagem das origens, a língua manifestada pelas crianças, e as condições permanentes da linguagem2. Pautada nessa ideia, a autora (1995) defende uma abordagem do fenômeno aquisicional que se opõe explicitamente à noção desenvolvimentalista assumida por grande parte das teorias de aquisição conhecidas até então. De Lemos faz isso convencida da ideia de que a Linguística oferece espaço acadêmico no qual a pergunta sobre como a criança adquire linguagem faz sentido, embora reconheça a resistência que os dados empíricos da criança possam revelar face às teorias linguísticas. Sua abordagem, já chamada de “interacionista”, atualmente é conhecida no Brasil como “sociointeracionista”.
Segundo a autora (2002), é da concepção da natureza da língua enquanto sistema, tal qual concebida por Saussure, que decorre a impossibilidade de submetê-la a uma série ordenada de apreensões parciais, como apresentado pelas perspectivas desenvolvimentistas. Assim, decorrente do projeto estruturalista de Saussure, a busca da autora por “algo a dizer da língua” na fala da criança se configurou, primeiramente, por uma releitura de Saussure. Nessa releitura, ganha destaque a teoria do valor, segundo a qual o conceito de sistema é visto como sistema de relações e não de unidades regidas pela pura diferença. Elegendo o diálogo como unidade de análise, a autora se voltou para o funcionamento da língua revelado pelos “erros” enquanto produtos de relações entre cadeias que se cruzam produzindo substituições na fala da criança com o outro. Com esse olhar, a autora encontrou nos estudos de Roman Jakobson, principalmente na reflexão do autor sobre metáfora e metonímia (1963), apresentada no ensaio Deux aspects du langage et deux types d’aphasie, a possibilidade de melhor compreensão dos fenômenos da fala da criança:
Na medida em que mantinham o que, em Saussure, tem o estatuto de propriedades mínimas e, ao mesmo tempo, apontavam para um efeito para além dessas propriedades, tais processos permitiriam apreender, a meu ver e como queria Jakobson, a linguagem em seu estado nascente na fala da criança, assim como o movimento que produziria a mudança (De Lemos, 2002, p. 52).3
Dito isso, é importante registrar que a proposta de De Lemos não se vê completa no universo da Linguística. A autora, ao longo dos seus estudos, em especial, a partir de 1992, busca entender que sujeito é esse que se manifesta na aquisição. Assim, a partir de conceitos como autonomia e alteridade da língua, De Lemos (2000) trabalha com a noção de “captura” de processos de subjetivação: concebe a criança como capturada por um funcionamento linguístico-discursivo, o que lhe permite a significação. Nesse funcionamento, ganham relevância fenômenos que, com base na psicanálise lacaniana, a autora trata a partir da noção de “escuta”, pois entende que os processos metafóricos e metonímicos percebidos nas manifestações das crianças estão associados a um sujeito e à emergência desse sujeito na cadeia significante.
Na sequência de seus estudos, a autora (cf. De Lemos, 2000) defende que as mudanças na trajetória da criança de não falante a sujeito-falante são mudanças de posição relativamente à fala do outro, à língua e, em consequência, em relação à sua própria fala. Importante destacar que essa mudança é vista como mudança de posição em uma estrutura, uma vez que, segundo De Lemos (2002), não há superação de nenhuma das três posições, mas um encadeamento que se revela, na primeira posição, pela dominância da fala do outro; enquanto, na segunda posição, há a dominância do funcionamento da língua; e, na terceira posição, destaca-se a dominância da relação do sujeito com sua própria fala.
Na constituição dos seus estudos, a autora (2002) considera fundamental ainda explicitar o modo como as três operações se articulam em diferentes momentos da cronologia da trajetória da criança. Para tanto, suas investigações buscam, sempre, explicar as mudanças de posição a partir do efeito do funcionamento da língua, o que se busca fazer não pela descrição de seus enunciados, mas sim, pelos processos metafóricos e metonímicos. Esses processos, assim, comandam a relação dos enunciados da criança com o enunciado do outro na primeira posição, as relações entre enunciados na segunda posição e as relações entre fala e escuta na terceira posição. A criança falante, portanto, se divide entre o que fala e o que escuta sua própria fala, o que lhe permite retomar, reformular e reconhecer as diferenças entre sua fala e a fala do outro, assim como entre a instância subjetiva que fala e a instância subjetiva que escuta de um lugar outro.
Por fim, o socionteracionismo, como modo de ver a aquisição da linguagem, se vale de uma concepção de linguagem que se sustenta na alteridade radical da língua relativamente ao organismo e na consideração daquilo que, na fala da criança, aponta para um sujeito que, ao se constituir na língua, por ela é dividido. Tal visão se vale da ideia saussuriana de funcionamento sincrônico da língua e, como buscamos explicitar, representa importante oposição à noção de desenvolvimento nos trabalhos de aquisição da linguagem. É com base nessa concepção de base saussuriana que entendemos, com Irani Maldonade (2015, p. 4764), que “a criança entra na linguagem capturada pelo funcionamento linguístico, produzindo enunciados que, submetidos à interpretação do adulto, recortam entidades ou eventos do mundo”.
Registramos que a repercussão dos trabalhos de Claudia De Lemos gerou novas pesquisas, de reconhecimento inegável, como é possível constatar na vasta produção e influência do grupo de pesquisa em Aquisição da Linguagem do Instituto de Estudos Linguísticos da Universidade de Campinas - Unicamp.
2 Bakhtin, o dialogismo e a linguagem da criança
Dedicamos esta seção às contribuições do filósofo da linguagem, Mikhail Bakhtin, o qual, assim como os demais pesquisadores aqui estudados, não se voltou especificamente ao estudo da linguagem da criança; no entanto, suas reflexões possibilitaram abordar o tema sob diferentes facetas, das quais se destaca a abordagem dialógico-discursiva. Nossas reflexões iniciam-se em uma das obras mais controversas do Círculo de Bakhtin, de autoria4 atualmente atribuída à Valentin Volóchinov, Marxismo e filosofia da linguagem. Problemas fundamentais do método sociológico (2018), na qual se apresenta uma crítica à abordagem saussuriana: “a assim chamada ‘escola de Genebra’, de Ferdinand de Saussure (falecido há muito tempo) é a expressão mais clara do objetivismo abstrato” (Volóchinov, 2018, p. 164). Apesar deste diálogo entre Saussure e o Círculo de Bakhtin não ser nosso objeto de estudo, ele nos leva a perceber que há, nas discussões do Círculo, um esforço de leitura da obra saussuriana de modo a estabelecer uma crítica e fundar as bases de um estudo linguístico que se distanciasse do que foi chamado pelos autores de “objetivismo abstrato”.
No entanto, o que mais nos interessa na obra citada é um pequeno trecho em que Volóchinov refere a diferença entre “signo” e “sinal”. De acordo com o autor:
Um sinal puro não existe nem nas fases iniciais da aprendizagem de uma língua. Mesmo nesse caso, a forma é orientada pelo contexto e se constitui em um signo, embora estejam presentes sua natureza de sinal e o momento de seu reconhecimento (Volóchinov, 2018, p. 179).
Apesar de buscar se distanciar de Saussure, Volóchinov (2018) utiliza a noção de “signo” para afirmar que, mesmo nas fases de aprendizagem, o que, em muitos casos, associamos com a aquisição de uma língua, não há “sinal” puro, mas há uma significação do signo sempre orientada pelo contexto. A crítica apresentada centra-se na defesa de que “o pensamento sistemático sobre a língua é incompatível com a sua compreensão viva e histórica” (Volóchinov, 2018, p. 193). Assim, a língua é vista para além do sistema, na relação dialógica entre os sujeitos.
É justamente na troca dialógica que muitas das reflexões do ensaio “O autor e a personagem na atividade estética”, em Estética da criação verbal, (Bakhtin, 2011) se concentram. Nesse texto, encontramos as principais considerações do próprio Mikhail Bakhtin sobre a relação entre a criança e a linguagem. Relação que, como veremos, centra-se na interação dialógica fundamental que dá forma ao eu e ao outro:
De fato, mal a pessoa começa a vivenciar a si mesma de dentro, depara imediatamente com atos de reconhecimento e amor de pessoas íntimas, da mãe, que partem de fora ao encontro dela: dos lábios da mãe e de pessoas íntimas a criança recebe todas as definições iniciais de si mesma. Dos lábios delas, no tom volitivo-emocional do seu amor, a criança ouve e começa a reconhecer o seu nome, a denominação de todos os elementos relacionados ao seu corpo e às vivências e estados interiores; são palavras de pessoa que ama as primeiras palavras sobre ela, as mais autorizadas, que pela primeira vez lhe determinam de fora a personalidade e vão ao encontro da sua própria e obscura autossensação interior, dando-lhe forma e nome em que pela primeira vez ela toma consciência de si e se localiza como algo (Bakhtin, 2011, p. 46).
A relação dialógica entre a criança e as pessoas que a amam, principalmente a mãe, dão forma às primeiras manifestações discursivas da criança que “começa a ver-se pela primeira vez como que pelos olhos da mãe e começa a falar de si mesma nos tons volitivo-emocionais dela, como que se acaricia com sua primeira auto-enunciação” (Bakhtin, 2011, p. 46). Ou seja, é a partir da relação dialógica com o outro que nasce o discurso. Assim, a vertente dialógico-discursiva de aquisição da linguagem centra-se nas diversas obras bakhtinianas que vão definir os conceitos de “relação dialógica” e “dialogismo” para encontrar uma metodologia de estudo da linguagem da criança. Foi Frédéric François, na França, quem primeiro observou que a teoria bakhtiniana poderia oferecer subsídios para um novo olhar sobre a aquisição da linguagem. De acordo com François (2004, p. 25; tradução nossa), a criança “que aprende a falar não vai da língua (como uma espécie de caixa de ferramentas linguísticas) para a fala (como um conjunto de usos da linguagem em contexto), mas dos discursos dos outros para os seus próprios discursos”5.
Ao falar sobre a linguagem da criança, François (2004) apoia-se não só nos estudos do Círculo de Bakhtin, mas estabelece um diálogo entre as concepções teóricas dos estudiosos do Círculo com a teoria vygotskyana, já bastante conhecida pelos pesquisadores na área da educação. Com textos que se centram desde a psicologia relativa à aquisição da linguagem até obras que tratam da construção de narrativas pelas crianças, François é referência quando se fala da perspectiva dialógico-discursiva, seguido de Anne Salazar-Orvig, pesquisadora que deu prosseguimento aos estudos aquisicionais da referida abordagem na França. É com essa configuração que a perspectiva dialógico-discursiva da aquisição da linguagem chega ao Brasil pelas mãos de Alessandra Del Ré, pesquisadora que desenvolveu estudos na França com o próprio Frédéric François, assim como com Anne Salazar-Orvig, entre outros. Del Ré atualmente lidera importantes grupos de pesquisa no Brasil sobre aquisição da linguagem.
Conforme Hilário (2023), com a coordenação de Del Ré, o Grupo de Estudos em Aquisição da Linguagem - GEALin e o Núcleo de Estudos em Aquisição da Linguagem - NALíngua têm, desde 2008, desenvolvido estudos na vertente dialógico-discursiva no Brasil. Essas pesquisas deram origem a diversos textos de referência na área da Aquisição da Linguagem e têm direcionado muitos estudos atuais. Dessa forma, as perspectivas aquisicionistas de Vygotsky e Brunner, levando-se em conta principalmente a questão interacional, são revisitadas em uma aproximação com o que propõem os pesquisadores do Círculo de Bakhtin. Têm-se, assim, a concepção dialógica da linguagem (Hilário, 2012). É Alessandra Jacqueline Vieira (2012, p. 119) quem afirma: “Apesar de Bakhtin não ter falado especificamente da linguagem da criança, o fenômeno do dialogismo pode ser encontrado desde a emergência da fala”. E é, portanto, por meio dessa relação dialógica que a criança é inserida na ideologia de seu mundo social, questão central nos estudos propostos nesta abordagem.
O primeiro livro do grupo NALíngua, sob o título Na língua do outro: estudos interdisciplinares em aquisição de linguagens (Del Ré e Romero, 2012), traz diversos textos de estudiosos da aquisição da linguagem que observam aspectos específicos da linguagem da criança aliando a vertente dialógico-discursiva com diversos autores e teorias. Mas é na obra A linguagem da criança: um olhar bakhtiniano, de Alessandra Del Ré, Luciane de Paula e Marina Célia Mendonça (2014), que a perspectiva dialógico-discursiva de estudo da aquisição da linguagem é definida. De acordo com as autoras (2014, p. 17), ao recorrer às noções teóricas bakhtinianas, não se pretende aplicar uma teoria, “mas vislumbrar, a partir de determinadas concepções, possíveis compreensões dialógicas acerca do fenômeno ocorrido no processo de aquisição da fala das crianças”. Assim, assumir a perspectiva dialógico-discursiva é, de acordo com as autoras, entender a palavra como “signo ideológico colocado em uso por um determinado sujeito (no caso, aqui, a criança), num determinado espaço-tempo (a situação cronotópica da enunciação), com valores e voz sócio-histórico-cultural” (Del Ré, Paula, Mendonça 2014, p. 19). Tal concepção baseia-se especificamente nas reflexões apontadas na já referida obra de Volóchinov (2018) e considera como base a relação eu-outro, fundamento das relações dialógicas bakhtinianas.
A perspectiva dialógico-discursiva, tal qual definida pelas autoras e adotada pelos grupos GEALin e NALíngua, concebe a língua como “organismo vivo, repleto de significações ideológicas e constituído histórica e socialmente” (Del Ré, Paula, Mendonça, 2014, p. 23). Segundo tal concepção, todos os sujeitos, entre eles a criança, são entendidos como sujeitos sociais e em relação. Considera-se, assim, que o discurso da criança é motivado, compreendido, interpretado e valorado pelo outro, na instância do diálogo, sendo este outro, comumente, a mãe e/ou o pai, os mais próximos dela no período de aquisição da linguagem. Além disso, a criança passa a fazer parte do mundo da linguagem por meio da vivência dos gêneros do discurso, uma vez que a criança “adquire enunciados que fazem parte de um cenário: o das conversas em família, das festas de aniversário, da praia etc., o que significa que existe todo um universo linguístico que acompanha essas situações” (Del Ré, Paula, Mendonça, 2014, p. 26). De acordo com Del Ré, Hilário e Vieira (2021, p. 24) esse outro “(inicialmente o pai ou a mãe) é que posiciona a criança como um sujeito discursivo” e é a relação eu-outro “(criança-interlocutor)” que “cria um espaço discursivo onde a cultura é colocada em circulação nas palavras, nos gestos, nas interações, atualizando seus significados”.
Nessa perspectiva, os conceitos de subjetividade, singularidade e identidade são muito relevantes. Enquanto subjetividade e identidade relacionam-se especificamente às concepções bakhtinianas sobre a constituição do sujeito, a singularidade se reflete na irrepetibilidade do ato enunciativo. Dessa forma, deve-se considerar, ao estudar os enunciados das crianças, a irrepetibilidade e a singularidade discursiva. Não há, portanto, “repetições”, no sentido estrito do termo, pois, a cada novo ato enunciativo, a própria língua é atualizada em um novo acontecimento.
Consideramos, neste sentido, que a perspectiva dialógico-discursiva de estudo da linguagem da criança é complexa e compreende uma ampla rede de conceitos e reflexões que estão além do sistema linguístico, buscando compreender a posição sócio-histórica dos sujeitos que enunciam. A contribuição de Bakhtin e dos trabalhos do Círculo de Bakhtin se mostra, portanto, valiosa na configuração dessa perspectiva, representada, no Brasil, pelos grupos de pesquisa já referidos.
3 Benveniste, a faculdade de simbolizar e a linguagem da criança
Nesta seção, voltamos nosso olhar para determinados princípios propostos por Émile Benveniste e que, assim como já visto em relação a Saussure e Bakhtin, são ideias que permitem iluminar a discussão sobre o tema aquisição da linguagem. Assim como ocorre com os dois outros autores, também Benveniste, ao longo dos seus muitos trabalhos sobre língua e linguagem, não apresentou uma teoria voltada para a aquisição, no entanto, reconhece-se em sua obra a existência de conceitos e princípios que possibilitam aos pesquisadores realizar deslocamentos6 para a apresentação de uma perspectiva de estudo da aquisição da linguagem. Na entrevista do autor a Pierre Daix, coletada em 1968 e publicada em Problemas de linguística geral II em capítulo intitulado “Estruturalismo e linguística”, Émile Benveniste (1989), ao discorrer sobre o que é o sentido, afirma que a língua é um consenso coletivo e, para explicar como se dá esse consenso, recorre à linguagem da criança:
A criança nasce em uma comunidade linguística, ela aprende a sua língua, processo que parece instintivo, tão natural quanto o crescimento físico dos seres ou dos vegetais, mas o que ela aprende, na verdade, não é o exercício de uma faculdade “natural”, é o mundo do homem. A apropriação da linguagem pelo homem é a apropriação da linguagem pelo conjunto de dados que se considera que ela traduz, a apropriação da língua por todas as conquistas intelectuais que o manejo da língua permite (Benveniste, 1989, p. 20-21).
Ao apresentar esse raciocínio, o autor permite pensarmos no nascimento da criança na cultura, ao invés de pensarmos nesse nascimento na natureza, pois a criança aprende “necessariamente com a língua os rudimentos de uma cultura” (Benveniste, 1989, p. 23). E é com base nessa ideia que Benveniste (1989, p. 24) entende a experiência da criança na linguagem como a aquisição de “um mundo que a linguagem lhe dá e sobre o qual ela aprende a agir”.
Percorrendo a obra benvenistiana, destacamos o conceito de simbólico da linguagem, presente em outros textos do autor, mas aprofundado em “Vista d’olhos sobre o desenvolvimento da linguística”. No texto em foco, o autor apresenta a linguagem como “um sistema simbólico especial” (2005a, p. 30), organizado em dois planos. O primeiro desses planos é físico, envolvendo a mediação entre aparelho vocal e auditivo; o segundo diz respeito à estrutura imaterial e comunicação de significados. O símbolo linguístico é apresentado, desse modo, como mediatizante, pois é no simbolismo da linguagem que a experiência interior de um sujeito torna-se acessível a outro. Conforme afirma o autor (2005), as relações entre o homem e o mundo e as relações entre os homens são estabelecidas pela capacidade simbólica; e, assim, estabelece-se a sociedade. Ao apresentar esse raciocínio, o autor (2005a, p. 27) afirma:
A sociedade não é possível a não ser pela língua; e, pela língua, também o indivíduo. O despertar da consciência na criança coincide sempre com a aprendizagem da linguagem, que a introduz pouco a pouco como indivíduo na sociedade (Benveniste, 2005a, p. 27).
No mesmo texto, mais adiante, outra referência à criança nos é sublinhada: “A criança nasce e se desenvolve na sociedade dos homens. São homens adultos, seus pais, que lhe inculcam o uso da palavra” (Benveniste, 2005a, p. 31). Ao afirmar que a criança vive na sociedade dos homens e que são os adultos dessa sociedade que lhe inculcam o uso da palavra, Benveniste (2005a, p. 31) destaca o papel do símbolo nessa vivência, a capacidade de simbolizar, de “representar o real por um ‘signo’ e de compreender o ‘signo’ como representante do real, de estabelecer, pois, uma relação de ‘significação’ entre algo e algo diferente”. É essa capacidade que possibilita à criança referir algo concreto ou não no seu discurso. Também nesse texto, o autor salienta que, ao aprender o seu nome e o nome das coisas ao seu redor, a criança vivencia seu meio social via linguagem. A criança, assim, na relação com o outro de seu convívio, aprende a sua língua materna e, na aquisição da língua, estabelece relações simbólicas com o outro, as quais são instituídas pela função própria da linguagem que é simbolizar.
Benveniste (2005b, p. 286), no texto “Da subjetividade na linguagem”, considera a língua e os sujeitos que a mobilizam como elementos da estrutura da enunciação: “A linguagem só é possível porque cada locutor se apresenta como sujeito, remetendo a ele mesmo como eu no seu discurso”. Isso porque, para o autor, é “um homem falando que encontramos no mundo, é um homem falando com outro homem” (Benveniste, 2005b, p. 285). É nessa relação entre eu e o tu que se estabelece a intersubjetividade.
Nesse sentido, para instituir o que se convencionou chamar de uma perspectiva aquisicional enunciativa, Carmem Luci da Costa Silva (2009) propõe um dispositivo teórico-metodológico que busca explicar o ato de aquisição da linguagem. Trata-se do dispositivo trinitário (eu-tu/ele)-ELE, o qual envolve a criança (eu), o outro de seu convívio (tu), a língua (ele) e a cultura (ELE). A perspectiva aquisicional enunciativa, a partir de relações derivadas desse dispositivo, vê o sujeito da aquisição da linguagem como constituído enunciativamente por três instâncias intersubjetivas: a cultural, a da alocução ou dialógica e a linguístico-enunciativa. Para explicar a instauração da criança na língua, a autora (2009) propõe três operações. A primeira operação é a de preenchimento de lugar enunciativo, a qual envolve a mudança de posição da criança de convocada pelo outro (conjunção eu-tu) a convocar o outro (disjunção eu/tu). A segunda operação proposta é a de referência, a qual, no exercício do discurso, permite que os signos, enquanto entidades conceptuais e genéricas, sejam utilizados como palavras para noções sempre particulares; essa operação envolve a passagem vivida pela criança de uma referência mostrada (ancorada na situação de enunciação) para uma referência constituída no discurso (ancorada no próprio discurso). Como terceira operação, temos a de inscrição enunciativa da criança na língua-discurso, para cuja realização concorrem as formas de pessoa, espaço e tempo, no estabelecimento de relações enunciativas mais complexas, envolvendo a retomada de eventos passados, a projeção de acontecimentos futuros, e, principalmente, a simulação de acontecimentos apenas imaginados.
A perspectiva aquisicional enunciativa conduzida pela pesquisadora tem derivado vários trabalhos sobre temas distintos, como o aspecto vocal (cf. Diedrich, 2015), a escuta (cf. Silva e Oliveira, 2021), a narrativa (cf. Diedrich, Golembieski e Boldori, 2023), entre outros. Há de se destacar também que, recentemente, Giovane Fernandes Oliveira (2022) propõe, em sua tese de doutoramento, orientada por Carmem Luci da Costa Silva, um olhar para a aquisição da escrita da criança, também com base em princípios benvenistianos, no entanto, nesse caso, trata-se de uma proposta um tanto distinta da perspectiva aquisicional enunciativa, uma vez que, segundo Silva e Oliveira (2023), trata-se de perspectiva semiológico-enunciativa da aquisição da escrita, a qual não abordaremos neste artigo, mas que também pode ser entendida como uma possibilidade de olhar a aquisição da linguagem a partir do que propõe o pensamento benvenistiano, principalmente, nas notas organizadas em Últimas aulas no Collège de France (1968 e 1969) (Benveniste, 2014).
Frente a todas essas produções, não restam dúvidas, portanto, da potência do tema “aquisição da linguagem” na obra benvenistiana e das possibilidades de investigação da linguagem da criança a partir do pensamento desse autor.
Considerações finais
Ao chegarmos às considerações finais deste artigo, relembramos nosso objetivo perseguido ao longo da investigação, o qual foi refletir sobre a presença do tema aquisição da linguagem nos trabalhos de Ferdinand de Saussure, Mikhail Bakhtin e Émile Benveniste, para, a partir de tal reflexão, descrever como essa presença deu origem a perspectivas de trabalho em torno do tema no panorama de pesquisa brasileira.
Sendo assim, organizamos nossas considerações finais apresentando um quadro resumitivo das principais ideias que confirmam a presença do referido tema, mesmo que apenas como ilustração ou como comentários de caráter secundário, nos trabalhos dos três autores, e como essas ideias se revelaram potentes para a configuração de perspectivas atuais para o estudo do tema no Brasil.
Por fim, consideramos importante registrar que Ferdinand de Saussure, Mikhail Bakhtin e Émile Benveniste, cada um em seu tempo e a seu modo, plantaram sementes investigativas em suas obras, as quais germinaram ao longo da história escrita por pesquisadores da Aquisição da Linguagem. Nessa história, frutíferas pesquisas permitem que se olhe para a relação da criança com a língua a partir do reconhecimento do discurso e do diálogo como elementos fundamentais no estudo da aquisição da linguagem. Nossa reflexão, sem dúvidas, não esgota o tema, uma vez que, acreditamos, muitas outras perspectivas se abrem a cada revisitação dos textos desses grandes pesquisadores.
REFERÊNCIAS
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DEL RÉ, Alessandra; HILÁRIO, Rosângela Nogarini; VIEIRA, Alessandra Jacqueline. A linguagem da criança na concepção dialógico-discursiva: retrospectiva e desafios teórico-metodológicos para o campo de Aquisição da Linguagem. Bakhtiniana, Rev. Estud. Discurso, São Paulo, v. 16, n. 1, p. 12-38, jan./mar. 2021. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2176-457348071 Acesso em: 01 mar. 2024.
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Declaração de disponibilidade de conteúdo
Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no manuscrito.
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Pareceres
Tendo em vista o compromisso assumido por Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso com a Ciência Aberta, a revista publica somente os pareceres autorizados por todas as partes envolvidas.
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1
Apoiamo-nos também nas ideias propostas na citada obra de Volóchinov por entendermos que grande parte dos princípios bakhtinianos se consolidam na confluência dos trabalhos do que se convencionou chamar Círculo de Bakhtin.
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2
Importante registro da história dos trabalhos inaugurados por De Lemos pode ser visto em Castro (2011).
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3
Destacamos importante trabalho de Figueira (2015) sobre a temática da analogia na fala da criança a partir da concepção saussuriana de língua. Embora não nos voltemos a essa discussão neste artigo, reconhecemos sua filiação a Saussure e a sua contribuição para os estudos em aquisição da linguagem.
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4
A primeira tradução brasileira de Marxismo e Filosofia da Linguagem - problemas fundamentais do método sociológico foi baseada, principalmente, na edição francesa da obra e, naquele momento, atribuída a Mikhail Bakhtin (V, N. Volochínov), devido às consultas feitas pelos tradutores na ocasião. No entanto, a autoria da obra sempre foi assunto controverso e discutido, uma vez que outras edições em diversos países atribuíam o mesmo texto à Volóchinov. Na edição mais recente da obra no Brasil (2018), Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo traduzem o texto diretamente da edição russa e, após extensa pesquisa, atribuem a autoria a Valentin Volóchinov, entrando em consenso com outras várias edições da obra pelo mundo.
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5
No original: “qui apprend à parler ne va pas de la langue (comme sorte de boîte à outils linguistiques) à la parole (comme ensemble d’usages de la langue en contexte), mais des discours des autres aux discours de soi” (François, 2004, p. 25).
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6
A noção de “deslocamento” é tema de reflexão de Knack (2020). Segundo a autora (2020, p. 148), “ O deslocamento, formulado a partir daquilo que o leitor entende, envolve não a aplicação de noções teóricas para a descrição de um fenômeno, mas sim a produção de um novo saber teórico e/ou metodológico para explicar um fenômeno”.
Parecer I
Sobre o autor do parecerSCIMAGO INSTITUTIONS RANKINGSParecer I
O texto apresenta um tema relevante para os estudos da linguagem, a saber, as contribuições de Saussure, Bakhtin e Benveniste para o tema da aquisição da linguagem e, mais especificamente, da linguagem da criança. O(a) autor(a) reflete sobre essas contribuições a partir de textos desses autores e de outros pesquisadores que se associam ao problema da relação entre linguagem e aquisição. No final do artigo, apresenta um quadro resumitivo dessas contribuições/reflexões. Apesar da complexidade do problema e da reflexão proposta ser elaborada sobre pequenos excertos e passagens das obras desses autores pioneiros, a publicação do artigo se justifica pelo problema levantado e pelas inferências que extrai desses fundamentos teóricos. Em termos estruturais, o artigo apresenta os objetivos com clareza, uma boa e didática divisão em seções, cada uma dedicada a um dos três autores, e as considerações finais retomam de modo igualmente claro os objetivos iniciais e as implicações retiradas de cada autor comentado. O estilo é mais ensaístico do que propriamente um relatório resultante de investigação, pois não há desenvolvimento empírico ou produção de dados novos. APROVADO
- recomendação: aceitar
Histórico
-
Parecer recebido em
03 Maio 2024
Parecer II
Sobre o autor do parecerSCIMAGO INSTITUTIONS RANKINGSParecer II
Trata-se de um texto muito bem escrito, claro, com uma linguagem totalmente compatível com um artigo científico, com todas as partes bem organizadas e articuladas. Com um olhar voltado para os trabalhos de Ferdinand de Saussure, Mikhail Bakhtin e Émile Benveniste, o artigo se propõe a mostrar de que forma cada um dos autores contribuiu para a construção das perspectivas dos estudos em aquisição da linguagem que temos hoje no Brasil, a saber, os estudos sociointeracionistas, a abordagem dialógico-discursiva e perspectiva aquisicional enunciativa, respectivamente. Ao final, é apresentado um quadro que resume as principais contribuições de cada autor, dentro de cada uma das três perspectivas. A reflexão trazida pelo artigo é totalmente original e de grande relevância para os estudos linguísticos, de um modo geral, na medida em que apresenta como cada um desses três grandes autores contribuiu, ainda que não tivessem esse foco, para se pensar a linguagem da criança, nos estudos desenvolvidos no Brasil. Traz uma grande contribuição, igualmente, para a área de aquisição da linguagem, e para um olhar linguístico-discursivo atribuído à área, ao propor essas reflexões teóricas que ainda não tinham sido feitas. E, por fim, o artigo, ao colocar os holofotes para os estudos desenvolvidos no Brasil, mostra a pungência e a importância dos estudos do próprio país. Dito isto, acredito que seria interessante o artigo mostrar essas contribuições acima citadas, na conclusão do trabalho. APROVADO
- recomendação: aceitar
Histórico
-
Parecer recebido em
14 Jun 2024
Disponibilidade de dados
Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no manuscrito.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
13 Dez 2024 -
Data do Fascículo
Jan-Mar 2025
Histórico
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Recebido
30 Mar 2024 -
Aceito
25 Out 2024