FATORES ASSOCIADOS AO USO DE ÁLCOOL EM UMA AMOSTRA REPRESENTATIVA DE ADOLESCENTES DO BRASIL

RESUMO

Objetivo:

analisar os fatores associados ao uso do álcool entre adolescentes escolares brasileiros.

Método:

trata-se de um estudo transversal analítico utilizando dados secundários da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar edição 2019, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. A pesquisa avaliou 125.123 adolescentes por meio da aplicação de um questionário. Para o modelo final foi utilizada a regressão logística múltipla.

Resultados:

o uso de cigarro na vida foi fortemente associado ao uso de álcool (Odds Ratio=3,25; Intervalo de Confiança 95% 2,28-4,62), seguido do uso de álcool por amigos nos últimos 30 dias (Odds Ratio=2,15; Intervalo de Confiança 95% 1,52-3,05) e ter pai e mãe que fumam (Odds Ratio=1,29; Intervalo de Confiança 95%1,13-148).

Conclusão:

são importantes ações integradas e políticas públicas envolvendo jovens e adolescentes para garantir a saúde e o bem-estar de adultos saudáveis.

DESCRITORES:
Adolescente; Estudantes; Alcoolismo; Consumo de Álcool por Menores; Estudos Transversais.

ABSTRACT

Objective:

To analyze the factors associated with alcohol use among Brazilian school adolescents.

Method:

This analytical cross-sectional study uses secondary data from the 2019 National School Health Survey edition conducted by the Brazilian Institute of Geography and Statistics. The research evaluated 125,123 adolescents through the application of a questionnaire. For the final model, multiple logistic regression was used.

Results:

Lifetime cigarette use was strongly associated with alcohol use (Odds Ratio=3.25; 95% Confidence Interval 2.28-4.62), followed by friends’ alcohol use in the last 30 days (Odds Ratio=2.15; 95% Confidence Interval 1.52-3.05) and having parents who smoke (Odds Ratio=1.29; 95% Confidence Interval 1.13-1.48).

Conclusion:

Integrated actions and public policies involving young people and adolescents are important to ensure the health and well-being of healthy adults.

KEYWORDS:
Adolescent; Students; Alcoholism; Underage Drinking; Cross-Sectional Studies.

RESUMEN

Objetivo:

analizar los factores asociados con el consumo de alcohol entre adolescentes escolares brasileños.

Método:

se trata de un estudio transversal analítico utilizando datos secundarios de la Encuesta Nacional de Salud del Escolar edición 2019, conducida por el Instituto Brasileño de Geografía y Estadística. La investigación evaluó a 125.123 adolescentes mediante la aplicación de un cuestionario. Para el modelo final se utilizó la regresión logística múltiple.

Resultados:

el uso de cigarrillo en la vida estuvo fuertemente asociado al uso de alcohol (Odds Ratio=3,25; Intervalo de Confianza 95% 2,28-4,62), seguido del uso de alcohol por amigos en los últimos 30 días (Odds Ratio=2,15; Intervalo de Confianza 95% 1,52-3,05) y tener padre y madre que fuman (Odds Ratio=1,29; Intervalo de Confianza 95%1,13-148).

Conclusión:

son importantes acciones integradas y políticas públicas que involucren a jóvenes y adolescentes para garantizar la salud y el bienestar de adultos saludables.

DESCRIPTORES:
Adolescente; Estudiantes; Alcoholismo; Consumo de Alcohol por Menores; Estudios Transversales.

HIGHLIGHTS

Adolescentes fumantes foram associados ao uso de álcool.

Adolescentes com pais fumantes têm mais chance de consumir álcool.

Ter amigos que bebem foi associado ao uso de álcool.

Ser homem foi protetor para o consumo do álcool.

INTRODUÇÃO

A adolescência é um período vulnerável do desenvolvimento humano que compreende a faixa etária entre 10 e 19 anos¹. É marcado pelo aumento da experimentação e de comportamentos de risco, como o uso de álcool².

Os resultados de pesquisas escolares apontam que o uso de álcool se inicia antes dos 15 anos e estima-se que mais de um quarto de adolescentes entre 15 e 19 anos (155 milhões) são consumidores de bebidas alcoólicas. Nessa faixa etária, as taxas de prevalência do consumo de álcool são mais elevadas nos países da Europa (43,8%) e das Américas (38,2%), respectivamente³.

No Brasil, o III Levantamento Nacional Sobre o Uso de Drogas pela População Brasileira identificou que cerca de 2,3 milhões de participantes apresentaram dependência de álcool nos últimos 12 meses que antecederam a pesquisa. Dentre esses, 119 mil dependentes eram adolescentes de 12 a 17 anos⁴.

Na cultura brasileira, o álcool é amplamente associado a lazer, eventos e patrocínios esportivos. Além disso, há uma superexposição de bebidas alcoólicas nas redes sociais, tornando-as desejáveis e ligadas à inclusão social⁵.

O álcool é a droga mais utilizada pelos adolescentes pelo fácil acesso, constituindo um importante problema de saúde pública, variando do uso baixo ao uso pesado⁶. Outros aspectos também podem influenciar no consumo de bebidas alcoólicas nesse período da vida, como a permissividade social, hábitos de consumo entre familiares e condição socioeconômica ruim⁷-⁸.

Durante a adolescência, as estruturas cerebrais responsáveis pela percepção temporal e pelo controle da impulsividade ainda estão em amadurecimento⁹. Por outro lado, nesta fase do desenvolvimento há uma maior sensibilidade à recompensa, busca por sensações e redução do autocontrole, o que aproxima o adolescente ao consumo de substâncias psicoativas¹⁰.

O consumo precoce de bebidas alcoólicas pode aumentar o risco de dependência na vida adulta e influencia na experimentação de outras substâncias psicoativas como maconha, cocaína e inalantes¹¹-¹². Esse comportamento de risco também pode afetar a saúde mental, com sentimentos de solidão, tristeza, insônia e ideação suicida, podendo contribuir para a ocorrência de doenças associadas ao abuso de álcool¹¹. Ademais, é considerado um preditor de agravos evitáveis como os acidentes e violências¹³.

O Brasil tem buscado atenuar os efeitos nocivos do uso de álcool por meio de políticas públicas¹⁴. Em 2019, foi regulamentada a Política Nacional sobre Drogas, tendo como uma de suas pautas o uso do álcool e de outras drogas como um problema concernente à infância, à adolescência e à juventude. Esta política considera evitar o início do uso, além de garantir o tratamento, a assistência e o cuidado aos usuários de substâncias psicoativas¹⁵. Neste contexto, é necessário aprofundar o conhecimento sobre essa temática com o intuito de contribuir cientificamente com dados analíticos que possam ser norteadores das políticas públicas.

Os fatores associados ao uso do álcool entre adolescentes configuram um importante indicador estratégico para melhorias na saúde desse segmento populacional¹⁶, e na literatura ainda são poucos os estudos que abordam sobre essa temática. O objetivo deste estudo foi analisar os fatores associados ao uso do álcool entre adolescentes escolares brasileiros.

MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal analítico utilizando dados secundários da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) provenientes da quarta edição realizada em 2019. A PeNSE é um inquérito realizado com escolares adolescentes de escolas públicas e privadas que compõem a Vigilância dos Fatores de Risco e Proteção à saúde em escolares do Brasil. Foi conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde e apoio do Ministério da Educação. Todas as informações coletadas são anônimas e estão disponíveis gratuitamente ao público¹⁷.

A amostra de alunos foi formada pelos estudantes das turmas selecionadas com idade entre 13 e 17 anos, matriculados e que frequentavam regularmente a escola, para os seguintes níveis geográficos: Brasil, grandes regiões, unidades da Federação (UF), municípios das capitais e Distrito Federal. Mais informações sobre o processo de amostragem são fornecidas na publicação da PeNSE¹⁷.

Entre abril e setembro de 2019 ocorreu a coleta de dados por meio de questionário autoaplicável e os escolares recebiam orientações para o preenchimento. Foram coletados os dados de 4.242 escolas, 6.612 turmas, com 189.857 alunos matriculados e 183.264 alunos frequentes, no qual 159.245 questionários foram válidos e 125.123 questionários analisados¹⁷.

Para este estudo, foram analisadas as variáveis do uso de álcool. A variável dependente, uso de álcool na vida, foi definida como o consumo de álcool alguma vez na vida e foi medida perguntando aos alunos se eles alguma vez na vida tomaram bebida alcoólica. As opções de resposta eram sim ou não.

As variáveis independentes foram: sexo (homem e mulher); idade (< 13; 13 a 15; 16 a 17; > 18); raça autorreferida (branca; preta; amarela; parda; indígena); ano escolar (ensino fundamental; ensino médio); mora com a mãe (sim; não); mora com o pai (sim; não); uso de cigarro na vida (sim; não); uso de narguilé na vida (sim; não); uso de cigarro eletrônico na vida (sim; não); mãe, pai ou responsável fuma (sim; não); nos últimos 30 dias, algum amigo fumou na sua presença (sim; não); mãe, pai ou responsável bebe bebida alcoólica (sim; não); nos últimos 30 dias, algum amigo bebeu bebida alcoólica na sua presença (sim; não); uso de droga na vida (sim; não); idade do primeiro uso de droga (10 a 14 anos; ≥ 15 anos); nos últimos 30 dias, algum amigo usou drogas na sua presença (sim; não).

Os dados da PeNSE 2019 foram extraídos do site oficial do IBGE e posteriormente para a análise foram exportados para o software estatístico Statistical Package for the Social Sciences versão 29.0 (SPSS ©). Foi calculada a distribuição das frequências (frequência absoluta e frequência relativa) e o respectivo intervalo de confiança 95% (IC 95%) de todas as variáveis. Para verificar a diferença entre as proporções foi utilizado o Teste do χ2 de Pearson, onde os valores de p ≤ 0,20 foram incluídos no modelo de regressão logística e posteriormente as magnitudes foram medidas pelo Odds Ratio (OR) com IC 95%.

Participaram da pesquisa os alunos que concordaram com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que estava disponível na primeira página do questionário. A PeNSE foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa para Seres Humanos do Ministério da Saúde (Parecer no 3.249.268, de 8 de abril de 2019).

RESULTADOS

No ano de 2019, a PeNSE avaliou 125.123 adolescentes. A Tabela 1 apresenta a prevalência do uso de substâncias entre escolares em 2019. Foi observado que 31.331 (58,9 %) referiram uso de álcool e 5.637 (10,6%) o uso de drogas na vida. Quanto ao cigarro e narguilé, a prevalência de uso alguma vez na vida foi de 11.049 (20,7%) e 8.518 (16%) respectivamente. Em relação à experimentação de cigarro eletrônico, 7.718 (14,5%) escolares brasileiros referiram o uso.

Tabela 1
Prevalência do uso de substâncias entre escolares, segundo dados da PeNSE. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021

Variáveis	n	%	IC (95%)
Uso de álcool na vida
Não	21.896	41,1	40,7-41,6
Sim	31.331	58,9	58,4-59,3
Uso de droga na vida*
Não	47.566	89,4	89,1-89,7
Sim	5.637	10,6	10,3-10,9
Uso de cigarro na vida
Não	42.235	79,3	78,9-79,6
Sim	11.049	20,7	20,4-21,0
Uso de narguilé na vida
Não	44.731	84	83,7-84,3
Sim	8.518	16	15,7-16,3
Uso de cigarro eletrônico na vida
Não	45.527	85,5	85,2-85,8
Sim	7.718	14,5	14,2-14,8

• ^*
  maconha, cocaína, crack, loló, lança-perfume, ecstasy, oxi, MD, skank e outras.
Fonte: Autores (2023).

As características sociodemográficas e comportamentais para o uso de álcool e de outras drogas estão descritas na Tabela 2. Verifica-se uma grande proporção do uso de álcool no sexo feminino, 16.356 (61,1%); p = <0,001, entre indivíduos de 13 a 15 anos, 16.337 (50,1%); p = < 0,001, com raça/cor preta, 3.355 (61,4%); p = <0,001, estudantes do ensino fundamental, 11.801 (46,6%); p = <0,001 e aqueles que não residem com a mãe, 5.095 (68,6%).

Tabela 2
Características sociodemográficas para o uso de álcool, segundo dados da PeNSE. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021

Uso de álcool na vida
	Total	Sim	Não
	(n =53.227)	(n =31.331)	(n =21.896)
Variáveis	N	n (%)	n (%)	p
Sexo
Masculino	26.278	14.865 (56,6)	11.413 (43,4)	<0,001
Feminino	26.773	16.356 (61,1)	10.417 (38,9)
Faixa etária
13 a 15 anos	32.668	16.337 (50,1)	16.291 (49,9)	<0,001
16 ou 17 anos	16.734	12.083 (72,2)	46.51 (27,8)
18 anos ou mais	3.645	2.759 (75,7)	886 (24,3)
Raça/cor
Branca	15.011	8.543 (56,9)	6.468 (43,1)	<0,001
Preta	5.464	3.355 (61,4)	2.109 (38,6)
Amarela	1.847	1.103 (59,7)	744 (40,3)
Parda	27.741	16.531 (59,6)	11.210 (40,4)
Indígena	1.715	882 (51,4)	833 (48,6)
Ano escolar
Ensino Fundamental	25.350	11.801 (46,6)	13.549 (53,4)	<0,001
Ensino Médio	27.858	19.524 (70,1)	8.334 (29,9)
Mora com a mãe
Não	7.431	5.095 (68,6)	2.336 (31,4)	<0,001
Sim	45.777	26.227 (57,3)	19.550 (3,0)

Fonte: Autores (2023).

Entre os aspectos comportamentais para o uso de álcool apresentados na Tabela 3, destaca-se o uso de droga na vida, 5.457 (97,0%); p = <0,001, a idade para o primeiro uso de drogas entre a faixa etária de 10 a 14 anos, 2.724 (95,8%); p = <0,001, o uso de droga pelo amigo na presença do escolar nos últimos 30 dias, 6.286 (87,3%); p = <0,001, uso de cigarro na vida, 10.333 (93,8%); p = <0,001, uso de narguilé na vida, 7.790 (91,6%); p = <0,001, uso de cigarro eletrônico na vida, 7.143 (92,7%); p = <0,001, o uso de cigarro pelo amigo na presença do escolar nos últimos 30 dias, 10.134 (79,5%); p = <0,001 e o uso de cigarro pelos responsáveis, 927 (72,5%); p = <0,001.

Tabela 3
Características comportamentais para o uso de álcool, segundo dados da PeNSE. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021

Uso de álcool na vida
	Total	Sim	Não
	(n =53.227)	(n =31.331)	(n =21.896)
Variáveis	n	n (%)	n (%)	p
Uso de droga na vida*
Não	47.505	25.804 (54,3)	21.701 (45,7)	<0,001
Sim	5.628	5.457 (97)	171 (3,0)
Idade do primeiro uso de drogas
10 a 14 anos	2.843	2.724 (95,8)	119 (4,2)	< 0,001
≥ 15 anos	2.737	2.694 (98,4)	43 (1,6)
Amigo usou droga na presença do escolar nos últimos 30 dias
Não	45.926	24.982 (54,4)	20.944 (45,6)	<0,001
Sim	7.197	6.286 (87,3)	911 (12,7)
Uso de cigarro na vida
Não	42.171	20.975 (49,7)	21.196 (50,3)	<0,001
Sim	11.021	10.333 (93,8)	688 (6,2)
Uso de narguilé na vida
Não	44.661	23.506 (52,6)	21.155 (47,4)	<0,001
Sim	8.500	7.790 (91,6)	710 (8,4)
Uso de cigarro eletrônico na vida
Não	45.463	24.156 (53,1)	21.307 (46,9)	<0,001
Sim	7.702	7.143 (92,7)	559 (7,3)
Algum amigo fumou na presença do escolar nos últimos 30 dias
Não	40.425	21.167 (52,4)	19.258 (47,6)	<0,001
Sim	12.745	10.134 (79,5)	2.611 (20,5)
Pai e mãe que fumam
Nenhum deles	42.572	24.224 (56,9)	18.348 (43,1)	<0,001
Pai ou responsável do sexo masculino	5.685	3.781 (66,5)	1.904 (33,5)
Mãe ou responsável do sexo feminino	2.567	1.800 (70,1)	767 (29,9)
Os dois (ambos)	1.279	927 (72,5)	352 (27,5)
Não sei	1.063	572 (53,8)	491 (46,2)

• ^*
  maconha, cocaína, crack, cola, loló, lança-perfume, esctasy, oxi, MD, skank e outras.
Fonte: Autores (2023).

A Tabela 4 mostra que o uso de cigarro na vida foi a variável mais fortemente associada ao uso de álcool, visto que o adolescente que fazia uso de cigarro tinha três vezes mais chances de usar álcool. Ainda, o uso de álcool por amigos na presença do escolar nos últimos 30 dias, como também ter pai e mãe que fumam tiveram associação significativa ao uso de álcool.

Tabela 4
Fatores associados ao uso de álcool em adolescentes brasileiros. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021

Variáveis	OR ajustado	IC 95%	β	p-valor
Sexo
Masculino	0,55	0,39-0,78	-0,6	0,001
Idade do primeiro uso de droga
≥ 15 anos	1,86	1,21-2,86	0,62	0,004
Uso de cigarro na vida	3,25	2,28-4,62	1,18	<0,001
Uso de narguilé na vida	1,8	1,21-2,67	0,59	0,003
Uso de cigarro eletrônico na vida	1,6	1,07-2,37	0,47	0,021
Algum amigo bebeu bebida alcoólica na presença do escolar nos últimos 30 dias	2,15	1,52-3,05	0,77	<0,001
Pai e mãe que fumam	1,29	1,13-148	0,26	<0,001

Fonte: Autores (2023).

DISCUSSÃO

Este estudo investigou a associação ao uso de álcool em uma amostra populacional de escolares brasileiros com idade entre 13 e 17 anos. Na análise, no modelo ajustado, os resultados da PeNSE 2019 apontou que os escolares mais velhos (≥ 15 anos), que usam cigarro, narguilé ou cigarro eletrônico, com pais que fumam e amigos que beberam nos últimos 30 dias tiveram mais chance de usarem álcool. Ser do sexo masculino foi fator de proteção para a experimentação de álcool entre os escolares brasileiros.

Dentre os determinantes associados ao consumo de álcool pelos adolescentes estão os laços com amigos que bebem. Outros estudos fornecem fortes evidências que apoiam que o grupo de pares (amigos) é um fator importante na probabilidade do uso de álcool por adolescentes¹⁸. Portanto, qualquer estratégia de prevenção primária sobre o uso de álcool pelos escolares brasileiros deve considerar as redes de pares.

A diferença na proporção entre escolares que moravam com a mãe não foi estatisticamente significativa no modelo final em comparação com os que não moravam com a família. Cabe destacar que outras pesquisas têm encontrado resultados diferentes, confirmando a hipótese da influência da família como um papel protetor no uso do álcool na adolescência¹⁹-²⁰. Pois, viver com ambos os pais ou apenas com a mãe, num ambiente acolhedor e seguro poderia desempenhar um papel protetor. Contudo, esses estudos também evidenciaram que a existência de conflitos familiares foi associada ao aumento do consumo de álcool entre jovens²⁰.

Os resultados deste estudo corroboraram que ser estudante do sexo masculino foi protetor para o consumo do álcool. Ao longo da história, houve diferença nos padrões de consumo de bebidas alcoólicas entre adolescentes do sexo masculino e feminino, uma vez que previamente prevalecia no sexo masculino. Entretanto, nos últimos anos, tanto no Brasil quanto em outros países, observa-se um significativo aumento no consumo pesado de álcool (binge drinking - ≥ 60ml de álcool puro em pelo menos uma ocasião mensal) entre as mulheres jovens²¹-²². Uma possível explicação para esse fenômeno pode estar relacionada às mudanças das últimas décadas como a independência feminina, a busca pela igualdade e as conquistas sociais impulsionadas pela participação no mercado de trabalho contribuindo para a cultura do uso social de bebidas. Por outro lado, existe uma preocupação adicional, uma vez que as mulheres são mais susceptíveis aos efeitos do álcool pela menor tolerância, maior quantidade de gordura, menor quantidade de água corporal e a pouca quantidade de enzimas responsáveis pelo metabolismo do álcool²³.

Os achados deste estudo apontam que a experimentação do cigarro, narguilé e o uso do cigarro eletrônico pelos escolares brasileiros foram associados ao uso do álcool, destacando também que os adolescentes cujos pais fumam tiveram maior chance de experimentação e consumo nos últimos 30 dias. Outro estudo que comparou os dados da PeNSE dos anos de 2015 a 2019 identificou que os indicadores de tabaco fumado ficaram estáveis neste período. No entanto, constatou elevadas prevalências de experimentação de produtos como narguilé e cigarro eletrônico²⁴. Dados de pesquisas globais evidenciaram que em países de baixa e média renda pelo menos 50 milhões de fumadores adultos começaram a fumar antes dos 15 anos de idade configurando maior risco subsequente de morte e um importante problema de saúde pública²⁵.

Deve-se considerar algumas limitações dos resultados deste estudo. Dentre estas, destaca-se a impossibilidade de fazer inferências causais pelo delineamento transversal do estudo. Contudo, os dados da PeNSE 2019 não representam todos os adolescentes brasileiros, uma vez que foram obtidos apenas de escolares. Ademais, por ter utilizado um questionário autorreferido pelos estudantes pode ocorrer viés de informação levando à subnotificação ou superestimação dos dados. No entanto, o questionário aplicado foi baseado em inquéritos internacionais validados, como o Health Behaviour in School-Aged Children, o Youth Risk Behavior Surveillance System e o Global School-Based Student Health Survey. Uma potencialidade do estudo é utilizar dados representativos dos escolares brasileiros de 13 a 17 anos, incluindo as escolas de áreas indígenas e em locais de difícil acesso.

CONCLUSÃO OU CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir deste estudo, foi possível identificar os fatores associados ao uso de álcool por adolescentes. Assim, o uso de cigarro na vida, o uso de álcool por amigos na presença do escolar e ter pai e mãe que fumam foram as variáveis mais fortemente associadas ao consumo de álcool.

Estes achados mostram que as intervenções sobre esse problema de saúde pública não podem se restringir aos adolescentes, sendo necessário abranger os seus grupos sociais e os ambientes de convívio.

Por fim, cabe destacar que uma das metas pactuadas na Agenda 2030 da OMS é a redução do consumo do álcool em 10%. Entretanto, foi observado neste estudo que o uso de álcool está cada vez mais precoce e influente entre os adolescentes. Neste sentido, são importantes ações integradas e políticas públicas envolvendo jovens e adolescentes para garantir a saúde e o bem-estar de adultos saudáveis.

• COMO REFERENCIAR ESTE ARTIGO:
  Magalhães LS, Caetano JBC, Martins BZ, Santos SRM dos, Vieira MA da S. Factors associated with alcohol use in a representative sample of adolescents in Brazil. Cogitare Enferm. [Internet]. 2024 [cited “insert year, month and day”]; 29. Available from: https://doi.org/10.1590/ce.v29i0.96220.

AGRADECIMENTOS

Ao apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001 e do auxílio recebido por meio do processo nº88881.710662/2022-01.

REFERÊNCIAS

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Editora associada:

Dra. Claudia Palombo

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  04 Nov 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  30 Dez 2023
• Aceito
  25 Jun 2024