Resumo
Este trabalho objetiva analisar a decisão majoritária no julgamento do caso Obergefell v. Hodges à luz dos referenciais teóricos desenvolvidos por Axel Honneth e Nancy Fraser e seus reflexos na interpretação e na crítica de posturas proativas do Poder Judiciário. Sustenta-se que o voto de Justice Kennedy contempla um conjunto de discursos implícitos que não apenas estabelecem a subordinação de status de casais homossexuais não casados - que é tão criticada por Fraser - mas essencializam a identidade gay. Utiliza-se o método de indução analítica e a análise crítica do discurso feminista. Outrossim, o trabalho também emprega a documentação indireta.
Palavras-chave:
Casamento Gay; Minorias Gays; Reconhecimento; Direitos Fundamentais.
Abstract
This work aims to assay the majority decision in the trial of the case Obergefell v. Hodges in light of the theoretical framework developed by Axel Honneth and Nancy Fraser and its impact on the interpretation and criticism of proactive attitudes of the judiciary. It is argued that the vote of Justice Kennedy includes a set of implicit discourse that not only establish the subordination status of homosexual unmarried couples - often so criticized by Fraser - but essentializes the gay identity. It uses the analytic induction method and the analysis of critical feminist discourse. Moreover, it also uses the indirect documentation.
Keywords:
Marriage Gay; Gays Minorities; Recognition; Fundamental Rights.
1 Introdução
Neste trabalho tenciona-se analisar o julgamento do caso Obergefell v. Hodges, especificamente a decisão majoritária prolatada pelo Justice Kennedy à luz dos referenciais teóricos desenvolvidos por Axel Honneth e Nancy Fraser e seus reflexos na interpretação e na crítica de formas de judicialização do Poder Judiciário que resguardam os direitos das minorias Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros (LGBT). De início, embora o presente trabalho não propugne investigar a legitimação democrática da judicialização, é premente distinguir os conceitos de judicialização e de ativismo judicial. Para Luís Roberto Barroso (2012BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Synthesis, Cadernos do Centro de Ciências Sociais - UERJ, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 23-32, 2012., p. 6), a judicialização, "[...] no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional que adotou, e não um exercício deliberado de vontade política". Diferentemente, o ativismo judicial "[...] é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance." (BARROSO, 2012BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Synthesis, Cadernos do Centro de Ciências Sociais - UERJ, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 23-32, 2012., p. 6).
Portanto, esta pesquisa se apoia na necessidade de legitimar filosoficamente e ao mesmo tempo criticar discursos implícitos ao voto essencialista do Justice Kennedy, para que as decisões sejam efetivamente capazes de desestabilizar o caráter patriarcal do casamento. Primeiramente, pretende-se investigar os aportes teóricos de Honneth e de Fraser, para que se possa elucidar como, a partir de fundamentações diversas, delineiam o tema do reconhecimento. Propugna-se constatar os reflexos filosóficos na investigação da temática da efetivação dos direitos fundamentais de minorias gays e lésbicas na Suprema Corte, especificamente no tocante ao voto de Justice Kennedy em Obergefell. Para tanto, objetiva-se compreender a perspectiva tridimensional de Fraser e o paradigma da autorrealização estabelecido por Honneth, assim como sua concepção de liberdade social, com o intuito de verificar qual dessas teorias revela maior alcance para potencializar a efetivação dos direitos de minorias LGBT na Suprema Corte, desestabilizando o caráter patriarcal e excludente do casamento.
Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.), em Luta por Reconhecimento, desenvolve seus estudos sobre o reconhecimento com base nos primeiros escritos do jovem Hegel e resgata também as contribuições da Psicologia Social de Herbert Mead. Já em El Derecho de la Libertad, o autor preconiza que uma sociedade justa é aquela em que as diferentes esferas sociais - esfera íntima, mercado e Estado Democrático - efetivam a liberdade individual (HONNETH, 2012HONNETH, Axel. El Derecho de La Libertad. Madrid: Katz, 2012.).
Por sua vez, Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.), em sua estrutura conceitual, teoriza duas esferas do conflito: a esfera do reconhecimento, que seria determinada pelo status social, e a esfera da redistribuição, que contemplaria os conflitos de classe. Posteriormente, em Scales of Justice, abarca a terceira esfera da justiça - a representação relativa ao plano político - em que se desenvolvem as lutas pela distribuição e pelo reconhecimento. Portanto, o principal problema enfrentado por este trabalho questiona: em que medida o referencial teórico dos estudiosos pode elucidar - ou criticar - a estratégia argumentativa implícita ao voto de Justice Kennedy? O segundo problema indaga: à luz da distinção estabelecida por Fraser entre remédios afirmativos e transformativos, o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo nos EUA pode transgredir o caráter patriarcal do matrimônio, desafiando a heteronormatividade ou os casais gays serão transformados pela instituição do casamento com a perda de suas autonomias?
Com efeito, seu objetivo geral consiste em analisar, à luz do debate Honneth-Fraser, em que perspectiva tais instrumentais teóricos se mostram coerentes com os desafios capazes de encarar formas de judicialização expressas no julgamento do caso Obergefell v. Hodges (ESTADOS UNIDOS, 2015) pela Suprema Corte, criticando discursos implícitos insuscetíveis de desestabilizar o caráter patriarcal do casamento. Assume-se então como primeiro objetivo específico, a estratégia de confrontar criticamente os subsídios teóricos de Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.; 2003bFRASER, Nancy. Distorted Beyound all Recognition: A Rejoinder to Axel Honneth. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange. London: Verso, 2003b. p. 198-236.) e de Honneth (2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197.; 2003cHONNETH, Axel. The Point of Recognition: A rejoinder to the rejoinder. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition . Londres; New York: Verso , 2003c. p. 237-277.; 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), constatando a relevância da dimensão deontológica do reconhecimento.
De outro lado, incorpora-se como segundo objetivo específico a perspectiva de analisar o raciocínio essencialista do voto de Justice Kennedy à luz dos referenciais de Honneth (2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197.; 2003cHONNETH, Axel. The Point of Recognition: A rejoinder to the rejoinder. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition . Londres; New York: Verso , 2003c. p. 237-277.; 2015) e Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.; 2003bFRASER, Nancy. Distorted Beyound all Recognition: A Rejoinder to Axel Honneth. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange. London: Verso, 2003b. p. 198-236.). Por fim, tem-se como terceiro objetivo específico contextualizar o diálogo Honneth-Fraser à luz das críticas radicais do feminismo de segunda onda ao caráter patriarcal do casamento - que foram sistematizadas por Barker (2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013.).
Para tanto, a pesquisa se estrutura pela análise do discurso crítico-feminista, que propugna desmascarar ideologias de gênero e relações de poder assimétricas que são produzidas, sustentadas e negociadas em diferentes contextos (LAZAR, 2007LAZAR, Michelle. Feminist Critical Discourse Analyses. Critical Discourse, London, v. 4, n. 2, p. 141-164, 2007., p. 141-142). Indubitavelmente, essas ideologias são pressupostas nas estratégias argumentativas do Justices Kennedy no julgado supracitado.
Neste trabalho o método de indução analítica (método de abordagem) foi utilizado. Deslauriers (2008DESLAURIERS, Jean-Pierre. A Indução Analítica. In: POUPART, Jean. A Pesquisa Qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 337-354., p. 339) leciona que se trata de um procedimento lógico, que consiste em partir do concreto para chegar ao abstrato, delimitando as características essenciais de um fenômeno. Nesse ponto, aproxima-se do procedimento indutivo propriamente dito. Dessa feita, seguindo a indução analítica, a pesquisa trabalha de baixo para cima, iniciando-se pela análise contínua e aprofundada do conteúdo dos votos dos Ministros para estabelecer conceitos e proposições teóricas que se articularão ao caso estudado. As construções explicativas são desenvolvidas pela articulação entre o quadro de referência e o conteúdo dos votos.
A pesquisa envolve ainda a documentação indireta, por meio da consulta bibliográfica ao referencial teórico construído por Fraser e por Honneth. Outrossim, também empregaram-se a pesquisa documental (documentação indireta), por meio de coleta de dados atinentes à investigação jurisprudencial do conteúdo da argumentação desenvolvida pelo Justice Kennedy, e o método de procedimento monográfico, o qual presume que o estudo de um caso de maneira profunda pode ser considerado como referência para muitos outros ou mesmo para todos os casos semelhantes (MARCONI; LAKATOS, 2010LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo: Saraiva, 2010., p. 90).
Parte-se, portanto, da hipótese segundo a qual o voto contempla um conjunto de discursos implícitos que não apenas estabelecem a subordinação de status de casais homossexuais não casados - que é tão criticada por Fraser - mas terminam por essencializar a identidade gay. Nesse prisma, propõe-se que somente a ideia de remédios desconstrutivos em relação à oposição binária entre homo/hétero pode desconstruir o rol de status sexuais exclusivos (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 72-78).
Como segunda hipótese, atenta-se para o pressuposto suscitado por Barker de que, embora a estratégia argumentativa centrada na igualdade formal como base para o reconhecimento do casamento gay seja um avanço em direção à sua legitimação, ela é insuscetível de desconstruir a estrutura assimétrica inerente ao matrimônio, o qual, sem alterações profundas, permanecerá patriarcal e assimétrico (BARKER, 2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013., p. 111). Não obstante, adota-se como terceira hipótese a tese de acordo com a qual o voto do Justice Kennedy (apesar de seu conteúdo progressista para o momento histórico em que foi proferido), não supera um conjunto de discursos que estabelecem padrões heteronormativos e patriarcais capazes de inviabilizar a paridade de participação de casais homossexuais.
Finalmente, tem-se como quarta hipótese a ideia de que o referencial de Fraser (1992FRASER, Nancy. Rethinking the Public Sphere: a Contribution to the Critique of Actually Existing Democracy. In: CALHOUN, Craig. Habermas and the Public Sphere. Cambridge: Mit Press, 1992. p. 109-142.) revela maior alcance teórico para potencializar a efetivação judicial dos direitos de casais homossexuais, porquanto, por meio de remédios afirmativos com efeitos transformativos, o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo e seu debate nas esferas públicas concorrentes podem assumir impacto positivo sobre a discussão atinente ao casamento como um todo, desconstruindo assim a dicotomia homo/hétero e confrontando estruturas de poder patriarcais.
1.1 O Diálogo Honneth Fraser
A proposta de Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.) visa renovar a teoria crítica por meio do giro teórico do reconhecimento. Nesse sentido, deseja formular uma nova Teoria da Justiça por meio da categoria conceitual do reconhecimento, o que poderia atribuir maior alcance e pertinência às formulações da Teoria Crítica, ao compreender a base motivacional das lutas sociais. Na pretensão de explicar as experiências sociais de injustiça na sociedade, recorre aos escritos do jovem Hegel e sua contraposição à perspectiva estratégico-instrumental da realidade sociopolítica. Contudo, em contraposição a Hobbes, para Honneth, o conceito de luta social não encontra fundamento somente na luta entre interesses materiais em oposição. Distintamente, o conceito de luta social está atrelado também aos sentimentos morais de injustiça que surgem das experiências de ausência de reconhecimento nas esferas do direito e da estima social (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 253-268).
Não ser reconhecido contempla uma experiência de injustiça que pode se converter na base motivacional da luta social. Em consonância com Fascioli (2011FASCIOLI, Ana. Justicia Social em clave de capacidades y reconocimiento. Areté - Revista de Filosofia, [S.l.], v. 33, n. 1, p. 53-77, 2011., p. 56), as mudanças sociais (boa parte delas) são inspiradas por "[...] lutas moralmente motivadas de grupos sociais que pretendem coletivamente obter um maior reconhecimento mútuo institucional e cultural". Entretanto, para ter a capacidade de inspirar a mobilização dos movimentos sociais, é essencial que a ofensa que atinge um indivíduo seja passível de universalização em uma linguagem comum, suscitando a efetiva mobilização política. Honneth assume as ideias de Dewey, para o qual os sentimentos são percebidos como "[...] a repercussão afetiva do sucesso ou insucesso de nossas intenções práticas." (DEWEY apud HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 221).
Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.), em Luta por Reconhecimento, estabelece três formas de reconhecimento - a dedicação emotiva (o amor), o autorrespeito (o direito) e a estima social (solidariedade) - as quais podem inspirar três formas de desrespeito, que resumem o pressuposto para os conflitos sociais.
A criança, nos primeiros meses de vida, se autocompreende de maneira simbiótica como parte da mãe, e progressivamente aprende a ver-se como ser independente. Quando a mãe vai paulatinamente retornando às suas atividades cotidianas, como reação, o bebê, para rebelar-se contra tal independência, dirige atos agressivos contra a genitora. Surge assim uma luta por reconhecimento, pois "[...] só na tentativa de destruição da mãe, ou seja, na forma de uma luta, a criança vivencia o fato de que ela depende da atenção amorosa de uma pessoa, existindo independentemente dela, como um ser com pretensões próprias." (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 170).
Nessa esfera, determina-se "[...] a medida de autoconfiança individual, que é a base indispensável para a participação autônoma na vida pública." (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 178). De acordo com Bunchaft, Honneth pondera que, após a evolução nos estudos psicanalíticos sobre o desenvolvimento da personalidade humana, "[...] seria intrínseco às relações afetivas entre mãe e filho uma articulação entre autonomia e ligação, porquanto, como leciona Hegel, o amor deve ser compreendido como 'um ser-si-mesmo em um outro'." (BUNCHAFT, 2015BUNCHAFT, Maria Eugênia. Ativismo judicial grupos estigmatizados: Filosofia Constitucional do Reconhecimento . Curitiba: Juruá , 2015., p. 76).
Assumindo o pensamento de Winicott, Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.) desvincula-se das linhas psicanalíticas que concebem a criança como objeto de investigação independente. Honneth, baseando-se em pressupostos intersubjetivos, leciona que o amor é uma forma de reconhecimento que surge em razão do modo específico pelo qual o sucesso "[...] das ligações afetivas se torna dependente da capacidade, adquirida na primeira infância, para o equilíbrio entre a simbiose e a auto-afirmação." (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 163).
Todavia, apenas na medida em que os direitos universais não são atribuídos aos membros dos grupos sociais em razão do status - mas de maneira isonômica a todos os seres humanos - que é viável mensurar a ideia de autorrespeito. A partir do reconhecimento jurídico, surge a oportunidade de delinear a autocompreensão positiva em relação a si mesmo. Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 198) remete à luta do movimento negro por direitos civis nas décadas de 1950 e de 1960 como expressão do "[...] significado psíquico que o reconhecimento jurídico possui para o autorrespeito dos grupos excluídos".
Já a estima social vincula-se ao que diferencia o sujeito dos demais, possibilitando referir-se de forma positiva a suas propriedades e suas capacidades concretas. Em suma, "[...] a estima social se aplica às propriedades particulares que caracterizam os seres humanos em suas diferenças pessoais." (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 199). A estima representa um medium social que expressa as diferenças de atributos entre os seres humanos de forma intersubjetivamente vinculante. A estima assim se vincula a uma forma de integração social que analisa as contribuições positivas dos indivíduos para a efetivação de metas sociais em uma comunidade de valores.
[...] sob condições das sociedades modernas, a solidariedade está ligada ao pressuposto das relações sociais de estima simétrica entre sujeitos individualizados (e autônomos); estimar-se simetricamente nesse sentido significa considerar-se reciprocamente à luz de valores que fazem as capacidades e as propriedades do respectivo outro aparecer como significativas para a práxis comum. (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 210)
Destarte, nos dizeres de Honneth, a base motivacional das lutas por reconhecimento são os sentimentos de vergonha e de desprezo. Entretanto, isso dependerá também da esfera social na qual os indivíduos estão inseridos. Portanto,
Para chegar a uma auto-relação bem-sucedida, ele depende do reconhecimento intersubjetivo de suas capacidades e de suas realizações; se uma tal forma de assentimento social não ocorre em alguma etapa de seu desenvolvimento, abre-se na personalidade como que uma lacuna psíquica, na qual entram as reações emocionais negativas como a vergonha ou a ira. Daí a experiência do desrespeito estar sempre acompanhada de sentimentos afetivos que, em princípio, podem revelar ao indivíduo que determinadas formas de reconhecimento lhe são socialmente denegadas. (HONNETH, 2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a., p. 220)
Nessa trajetória teórica, o modelo de status de Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.) pretende contrapor-se ao paradigma da autorrealização delineado por Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.; 2003b), dado que este negligencia os padrões institucionalizados de valores culturais que impedem os indivíduos de se tornarem parceiros plenos na esfera da paridade de participação. A estratégia se concentra em desconstruir
[...] leis matrimoniais que excluem parceiros do mesmo sexo como ilegítimos e perversos, políticas de bem-estar social que estigmatizam mães-solteiras como parasitas sexualmente irresponsáveis, e práticas policiais tais como os perfis raciais que associam pessoas racializadas à criminalidade. (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 29-30)
Sob esse prisma, Fraser afirma a centralidade não das concepções de vida boa, mas da desinstitucionalização dos padrões de valores culturais que inviabilizam a paridade de participação de gays e de lésbicas, enquanto parceiros plenos da vida social, independentemente de considerações psicológicas (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 32). Segundo Honneth (2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197.), a privação de direitos às minorias sexuais reflete uma experiência de injustiça que instiga a perda do autorrespeito e da capacidade de referir-se a si mesmo como igual, dentro da interação social (HONNETH, 2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197., p. 157). Fraser (2003a)FRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., por sua vez, postula que a questão fundamental não é ater-se às experiências de sofrimento decorrentes de contextos de vulnerabilidade moral - como pretende Honneth (2003b)HONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197. - mas mensurar o efetivo impacto do não reconhecimento na esfera da paridade de participação (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 32).
Em síntese, para Fraser, o modelo de status "[...] permite a cada um justificar alegações por reconhecimento como moralmente vinculantes sob as condições modernas de pluralismo valorativo" (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 30). Para a filósofa, tentar justificar reivindicações de reconhecimento identitárias relacionadas a concepções de autorrealização suscita a perspectiva sectária. Nas palavras da teórica feminista, "[...] o modelo de status é deontológico e não sectário [...]", pois "[...] não apela para uma concepção de autorrealização ou bem. Diferentemente, apela para uma concepção de justiça que pode - e deve - ser aceita por aqueles com concepções divergentes de bem". (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 31)
Desse modo, distanciar-se de reivindicações de reconhecimento identitárias relativas a concepções de autorrealização inspirariam a postura sectária. O presente trabalho sustenta que, para Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.), a questão central é o desenvolvimento intacto de relações de reconhecimento. Já o referencial de Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.; 2008) parte da indagação: o que fazer com nossa identidade autônoma? Criar uma sociedade justa na qual todos possam ter a possibilidade de participar.
As injustiças decorrentes da subordinação de status só podem ser desestabilizadas pela política de reconhecimento que conduza não à essencialização identitária, mas à sua desconstrução (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 72-78). Em Scales of Justice, reformula-se sua estrutura bidimensional, introduzindo o político como uma terceira dimensão da justiça. Obstáculos políticos à paridade de participação produzem efeitos nos processos políticos decisórios que discriminam pessoas independentemente de surgirem problemas de má distribuição ou de falso reconhecimento. O remédio para essa forma de injustiça é a democratização (FRASER, 2009aFRASER, Nancy. Scales of Justice: Reimagining political space in a globalizing world. New York: Columbia University Press, 2009a., p. 16-18).
A terceira dimensão da justiça também engloba a estratégia de explicar as injustiças no plano metapolítico/global, que surgem quando se marca a divisão do espaço político em sociedades delimitadas territorialmente. Como então limitar o enquadramento pertinente para que a justiça seja efetivamente justa? Trata-se das injustiças de mau enquadramento, que surgem quando não membros são excluídos do universo daqueles merecedores de reconhecimento dentro da entidade política no que tange a questões de distribuição, reconhecimento e representação política ordinária (FRASER, 2009aFRASER, Nancy. Scales of Justice: Reimagining political space in a globalizing world. New York: Columbia University Press, 2009a., p. 17). Pontualmente, exemplifica-se como injustiça de enquadramento, em nível transnacional, a globalização da pobreza que transcende as fronteiras territoriais.
Com efeito, o político é a arena em que as lutas por redistribuição ou por reconhecimento são estabelecidas. Tal dimensão diz respeito ao procedimento e à demarcação de fronteiras no espaço político. Quando as delimitações de fronteiras no espaço político ou as regras do procedimento decisório impedem que algumas pessoas participem das interações sociais em pé de igualdade com outros indivíduos, ocorre a injustiça política.
A divergência teórica entre os doutrinadores pode ser sintetizada no seguinte questionamento: para que se forma a identidade? Honneth (2014, p. 67) defende que a possibilidade de desenvolvimento da identidade autônoma seria um fim em si mesmo, e que a participação na esfera pública assume dimensão instrumental; para Fraser, configura um meio para alcançar o fim superior da participação.
Sustenta-se que Honneth (2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197.; 2003cHONNETH, Axel. The Point of Recognition: A rejoinder to the rejoinder. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition . Londres; New York: Verso , 2003c. p. 237-277.) e Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.; 2003bFRASER, Nancy. Distorted Beyound all Recognition: A Rejoinder to Axel Honneth. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange. London: Verso, 2003b. p. 198-236.) formulam uma visão instrumental do reconhecimento, e esse seria um meio para atingir fins: a identidade pessoal intacta ou a paridade de participação plena. Trata-se de algo do qual cada um poderia dispor através de um ato de declaração ou de vontade individual. A crítica de Kompridis (2008KOMPRIDIS, Nikolas. Struggling over the Meaning of Recognition. In: OLSON, Kevin. Adding Insult to Injury: Nancy Fraser debates her critics . London: New York: Verso, 2008. p. 295-309.) a Fraser (2003a)FRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109. relaciona-se à compreensão da filosofa sobre o reconhecimento construído como um remédio para injustiça.
Nesse contexto, Fraser pressupõe uma estrutura deontológica baseada no ideal da paridade de participação, o que não significa conceber o reconhecimento como instrumental para a autorrealização individual, mas como instrumental para atingir o status como parceiro pleno na interação social (FRASER, 2003, p. 7-10). Em Honneth (2003cHONNETH, Axel. The Point of Recognition: A rejoinder to the rejoinder. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition . Londres; New York: Verso , 2003c. p. 237-277., p. 246-247), o ponto principal é interpretar o reconhecimento como constante antropológica que funciona como pressuposto necessário para a formação de uma identidade pessoal intacta. À vista disso, a estratégia de Fraser problematiza se os arranjos sociais possibilitam a todos indivíduos participarem como pares, desconstruindo impedimentos estruturais à liberdade igual, incluindo aqueles intrínsecos às relações institucionalizadas de reconhecimento. A perspectiva do reconhecimento como liberdade mantém seu posicionamento crítico "[...] somente na medida em que pressupõe a visão do reconhecimento como uma dimensão da justiça no sentido da paridade de participação" (FRASER, 2008, p. 333).
Honneth (2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197.), em "Redistribution as Recognition", direciona sua estratégia argumentativa contra Fraser no sentido de que uma Teoria Crítica que se apoia somente em objetivos normativos que já foram publicamente articulados pelos movimentos sociais termina afirmando o nível prevalecente dos conflitos políticos e não contempla experiências de sofrimento inarticulado, reproduzindo exclusões políticas. De outro lado, Honneth sustenta que questões redistributivas são melhores compreendidas como reflexo de lutas intersubjetivas por reconhecimento. Outrossim, segundo Honneth (2003bHONNETH, Axel. Redistribution as Recognition: a Response to Nancy Fraser. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition. Londres; New York: Verso, 2003b. p. 110-197., p. 179), o princípio da paridade participativa deveria pressupor não apenas eliminação da desigualdade econômica e da humilhação cultural mas também a ideia de autorrespeito como pressuposto da autorrealização individual.
Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.), a seu turno pondera que não há como isolar as experiências de sofrimento inarticulado teorizadas por Honneth do escrutínio público. Nas ponderações da filósofa, o papel da Teoria Crítica deveria ser o de teorizar sobre o que realmente merece o título de injustiça e não sobre aquilo que é vivenciado subjetivamente como injustiça (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 226). Segundo Fraser, os princípios da estima e do autorrespeito não fornecem uma base suficiente para distinguir reivindicações justificáveis das reivindicações não justificáveis moralmente. O padrão normativo honnethiano, ao tentar evitar o sectarismo, estabelece a indeterminação (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 226).
A autora arremata ainda que Honneth negligencia situações nas quais a estima das contribuições laborativas de determinados indivíduos negam a igual cidadania a outros indivíduos. O resultado é a indeterminação. Portanto, uma teoria da justiça para efetivamente satisfazer as exigências de determinação e de não sectarismo deve pressupor o princípio da paridade participativa, que é deontológico e não sectário. Tal princípio parte do igual valor moral dos parceiros nas interações sociais, sendo compatível com todas as concepções de vida boa que respeitam a autonomia igual. A ideia de justiça como paridade participativa assegura aos participantes a chance de decidir livre de relações de dominação removendo obstáculos na política, mercado trabalho e sociedade civil, viabilizando que os atores sociais participem como pares em todas as interações sociais (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 228-230).
Porém, em Direito da Liberdade, Honneth passou a sustentar que as três esferas de reconhecimento descritas em Luta são as expressões da liberdade, sendo esta hierarquicamente superior àquelas (SOBOTTKA, 2013SOBOTTKA, Emil. Liberdade, reconhecimento e emancipação. Sociologias, Porto Alegre, ano 15, n. 33, p. 142- 168, 2013., p. 145). Desde Sofrimento de Indeterminação, Honneth (2007)HONNETH, Axel. Between Aristotle and Kant. In: HONNETH, Axel. Disrespect: The Normative Foundations of Critical Theory . Cambridge: Polity Press , 2007. p. 129-143. fundamenta-se nos Princípios da Filosofia do Direito de Hegel, reformulando seu posicionamento em relação às suas obras e assumindo como principal inspiração a filosofia Hegeliana da maturidade. Como se sabe, algumas teorias da justiça puramente normativas estabelecem princípios de justiça abstratos independentemente e de forma transcendente ao contexto. Outros teóricos de inspiração Hegeliana procuram estabelecer a ideia de justo de forma imanente ao contexto social.
Segundo Honneth, após a morte de Hegel, sua proposta de reconstrução normativa a partir de instituições racionais que garantissem a liberdade foi interpretada como uma filosofia conservadora de restauração pela direita Hegeliana ou como uma teoria da revolução pela esquerda Hegeliana. Consequentemente, houve predomínio das Teorias de Justiça associadas à tradição Kantiana e à ideia de que os princípios normativos não podiam se desenvolver a partir das estruturas institucionais existentes, manifestando-se de forma independente da eticidade (HONNETH, 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., p. 15-20).
Feitas essas considerações, passa-se à análise do caso Obergefell v. Hodges.
2 A Estratégia Argumentativa do Voto de Justice Kennedy em Obergefell V. Hodges à Luz do Diálogo Honneth-Fraser
No julgamento histórico de Obergefell v. Hodges (ESTADOS UNIDOS, 2015), Justice Kennedy sublinhou que a Corte, em diversos casos, expressou princípios constitucionais de alcances amplos que servem para identificar o direito ao casamento como fundamental, através da história, da tradição e das outras liberdades constitucionais.
Na concepção de Justice Kennedy, assim como as escolhas relativas aos contraceptivos, às relações familiares e à procriação são protegidas pela Constituição, as decisões concernentes ao casamento situam-se entre as mais íntimas que o indivíduo pode fazer (ESTADOS UNIDOS, 2015aESTADOS UNIDOS. Suprema Corte. Petition for the Writ of Certiorari. Obergefell v. Hodges. 576 U.S. James Obergefell, et al., Petitioners v. Richard Hodges, et al. Voto de Justice Kennedy. Opinião Majoritária: Justice Kennedy. Washington D.C. Decidido em 26 de junho de 2015a., p. 12). Seria então contraditório reconhecer o direito à privacidade com respeito a outras questões da vida familiar e não reconhecer em relação a outros relacionamentos que são a base da família e da sociedade.
A cláusula do Devido Processo e Décima Quarta emenda são conectadas de uma maneira profunda, embora eles estabeleçam princípios independentes. Direitos implícitos na liberdade e direitos assegurados pela Equal Protection podem se basear em diferentes preceitos e não são sempre coextensivos, mas cada qual pode ser instrutivo para o significado e alcance do outro. (ESTADOS UNIDOS, 2015aESTADOS UNIDOS. Suprema Corte. Petition for the Writ of Certiorari. Obergefell v. Hodges. 576 U.S. James Obergefell, et al., Petitioners v. Richard Hodges, et al. Voto de Justice Kennedy. Opinião Majoritária: Justice Kennedy. Washington D.C. Decidido em 26 de junho de 2015a., p. 19)
Em conformidade com a decisão majoritária, quatro princípios e tradições demonstram porque o casamento sintetiza um direito fundamental que se aplica com igual intensidade aos casais do mesmo sexo. A primeira premissa dos precedentes relevantes da Corte é a de que "o direito da escolha pessoal quanto ao casamento é inerente ao conceito de autonomia individual", e as liberdades fundamentais protegidas pela Due Process Clause alcançam certas escolhas pessoais centrais, incluindo as íntimas de definir identidade pessoal. (ESTADOS UNIDOS, 2015aESTADOS UNIDOS. Suprema Corte. Petition for the Writ of Certiorari. Obergefell v. Hodges. 576 U.S. James Obergefell, et al., Petitioners v. Richard Hodges, et al. Voto de Justice Kennedy. Opinião Majoritária: Justice Kennedy. Washington D.C. Decidido em 26 de junho de 2015a., p. 12). Essa conexão entre casamento e liberdade fez com que a Suprema Corte invalidasse a proibição ao casamento inter-racial em Loving v. Virginia (ESTADOS UNIDOS, 1967), à luz da Due Process Clause.
Para Kennedy, o segundo princípio extraído da jurisprudência da Corte é o de que o direito ao casamento é imprescindível porque apoia a união de duas pessoas que assume importância para indivíduos comprometidos (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 13). As instituições simbolizam o medium por meio do qual florescem relações intersubjetivas de reconhecimento. Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.) conta que somente no final do século XVIII surgiram os primeiros processos de institucionalização social da relação amorosa moderna baseada no afeto. Com as mudanças profundas através de transformações culturais de reconhecimento começou a nascer a ideia de que somente o afeto pode ser uma base legítima para o vínculo matrimonial entre homem e mulher.
Por conseguinte, nasce uma nova concepção de sexualidade em decorrência da transformação na forma de se compreender a liberdade individual. Nas palavras de Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., p. 259), "A relação de livre escolha entre homem e mulher, ela própria, é tornada um arranjo social no qual se realiza uma forma especial de liberdade". Emerge assim a ideia de que o amor se realiza totalmente na liberdade humana, na medida em que "[...] um oferece ao outro a oportunidade de uma autorrealização sem impedimentos." (HONNETH, 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., p. 259).
Nesse ponto, da mesma forma como Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.) reafirma o valor do amor como esfera de concretização da liberdade humana, Kennedy postula que foi a conexão entre casamento e liberdade o motivo em razão do qual a Corte invalidou a proibição ao casamento inter-racial à luz da Due Process Clause, em Loving v. Virginia. (ESTADOS UNIDOS, 1967). O direito à privacidade foi essencial em Griswold v. Connecticut (ESTADOS UNIDOS, 1965), no qual a Corte sustentou a inconstitucionalidade da lei que proibia o direito de casais casados ao uso de contraceptivos.
2.1 O Raciocínio Essencialista do Voto da Decisão Majoritária Prolatada pelo Justice Kennedy à Luz das Perspectivas de Honneth e Fraser
Para Justice Kennedy, o direito ao casamento atribui dignidade a casais que "[...] desejam definir-se a si como comprometidos uns com outros" (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 13). Kennedy recuperou estratégia argumentativa semelhante a seu voto em Windsor v. United States (ESTADOS UNIDOS, 2013), quando enfatizou a importância do papel do Estado em conferir dignidade e status aos casais do mesmo sexo:
A decisão do Estado de atribuir a uma classe de pessoas o direito de casar, confere-lhes dignidade e status de imensa importância. Quando o Estado usa sua autoridade histórica e essencial para definir a relação matrimonial de uma maneira, seu papel e poder na tomada de decisão elevam o reconhecimento, dignidade e proteção da classe na sua própria comunidade. The Defense of Marriage Act, devido ao seu alcance e extensão, afasta essa história e tradição de confiança na lei do Estado para definir o matrimônio. (ESTADOS UNIDOS, 2013, p. 18-19)
Justice Kennedy compreende que casais do mesmo sexo têm o mesmo direito de desfrutar de associações íntimas como direito amplo que vai além da mera liberdade decorrente do reconhecimento do direito à intimidade como fundamento para invalidação de leis criminalizando a sodomia - tal como ocorreu em Lawrence v. Texas (ESTADOS UNIDOS, 2003).
Kennedy, entretanto, ressalvou que Lawrence v. Texas - que confirmou a dimensão da liberdade no sentido de permitir aos indivíduos se engajarem em associações íntimas, sem persecução criminal - pode ser um passo, "mas não alcança a dimensão plena da liberdade." (ESTADOS UNIDOS, 2015a, p. 3). A dimensão plena da liberdade, para Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), cristaliza-se não apenas na esfera da família (que integra a liberdade social) como também na esfera do Estado. Daí a necessidade do reconhecimento entre pessoas do mesmo sexo como direito que pressupõe a efetivação da liberdade social.
A terceira base que justifica o casamento entre pessoas do mesmo sexo, segundo Justice Kennedy, é a que protege crianças e famílias, atribuindo sentido aos direitos relacionados à procriação e à educação. Retoma-se aqui a linha argumentativa de Pierce Society v. Sisters (ESTADOS UNIDOS, 1925ESTADOS UNIDOS. Suprema Corte. Petition for the Writ of Certiorari. Pierce v. Society of Sisters. 268 U.S. 510. Pierce v. Society of Sisters of the Holy Names of Jesus and Mary.Opinião Majoritária: Justice McReynolds. Washington D.C. Decidido em 1o de junho de 1925.), quando Justice Clark McReynolds afirmou a liberdade de pais e de responsáveis de dirigirem a educação das crianças.
Justice Kennedy também resgatou o raciocínio usado em Zablocki (ESTADOS UNIDOS, 1978ESTADOS UNIDOS. Suprema Corte. Petition for the Writ of Certiorari. Zablocki v. Redhail. 434 U.S. 374. Thomas Zablocki v. Roger Redhail Opinião Majoritária: Justice Marshall. Washington D.C. Decidido em 18 de janeiro de 1978.), quando a Corte assentou que o direito de casar e de estabelecer um lar e de educar crianças envolve parte central da liberdade protegida pela Due Process of Law (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 14). Como é de conhecimento, diversos Estados conferiam proteções matrimoniais materiais para crianças e famílias. No entanto, segundo Justice Kennedy, o casamento também confere benefícios mais profundos. Na sua interpretação, na medida em que o Estado atribui reconhecimento e estrutura legal ao relacionamento dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, as crianças - filhos de tais uniões - compreendem a integridade de sua própria família (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 15). Mas será que, na teoria de Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), as crianças necessitam do reconhecimento institucional para se sentirem reconhecidas, como proclama Justice Kennedy?
De início, cumpre elucidar inicialmente que, para Justice Kennedy, "[...] sem o reconhecimento, estabilidade e previsibilidade que o casamento oferece, crianças sofrem o estigma de perceber suas famílias como sendo de certo modo inferiores." (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 15). Elas também sofrem com os custos materiais de serem filhos de pais não casados, relegados a uma vida familiar incerta e difícil. As leis de casamento que proíbem a união entre pessoas do mesmo sexo assim causam danos e humilham as crianças - os filhos desses casais (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 15).
Nesse ponto, quando Kennedy refere-se à estabilidade conferida pelo casamento e ao benefício simbólico para as crianças, percebe-se a abordagem aparentemente próxima da ideia de liberdade social pressuposta por Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), para quem os indivíduos constatam que integram uma sociedade na qual seus anseios e suas finalidades complementam intersubjetivamente os de seus parceiros de interação social.
É no interior de instituições que pais e filhos notam suas dependências recíprocas e aprendem a formular objetivos gerais que precisam de complementariedade. A perspectiva de Honneth (2007HONNETH, Axel. Between Aristotle and Kant. In: HONNETH, Axel. Disrespect: The Normative Foundations of Critical Theory . Cambridge: Polity Press , 2007. p. 129-143.; 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.) parte de insights Hegelianos - mas vai além destes. De um lado, Hegel não admitiria o casamento entre pessoas do mesmo sexo, porquanto isso seria considerado como patologia. Em verdade, para Hegel, o casamento, a língua e o comércio conglobam instituições nas quais a vida ganha plenitude.
Quando Honneth (2007HONNETH, Axel. Between Aristotle and Kant. In: HONNETH, Axel. Disrespect: The Normative Foundations of Critical Theory . Cambridge: Polity Press , 2007. p. 129-143.) investiga as esferas de eticidade que Hegel restringe à dimensão da família, excluindo formas de interação que não sejam reconhecidas como instituições pelo Estado. Relações como as de amizade não seriam contempladas pelo Estado e não integrariam a esfera da eticidade. Assim, essa necessidade de institucionalização necessária para embasar a esfera da eticidade acarreta a perda do "[...] caráter ético das condições de liberdade socialmente existentes." (HONNETH, 2007HONNETH, Axel. Between Aristotle and Kant. In: HONNETH, Axel. Disrespect: The Normative Foundations of Critical Theory . Cambridge: Polity Press , 2007. p. 129-143., p. 133-134).
É por esse motivo que, em uma análise inicial, a liberdade dos casais homossexuais (que pretendem se casar) e das crianças se efetiva no interior de práticas institucionalizadas que orientam seus objetivos. O indivíduo reconhece o outro porque seus anseios refletem na sua vida, e é reconhecido porque suas finalidades complementam as escolhas de seus parceiros. Contudo, isso não implica em excluir formas de interação que não sejam objeto de reconhecimento pelas instituições pelo Estado. Portanto, interpreta-se que, em Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), as crianças não necessitam do reconhecimento institucional do Estado para se sentirem reconhecidas, como afirma Justice Kennedy.
Na perspectiva de Honneth, a família moderna encontra-se em uma via de desenvolvimento normativo que permite a efetivação de formas de interação democrática. Com a desvinculação dos membros da família dos modelos baseados em rígidos papéis de gêneros, a relação entre pais - se heterossexuais ou homossexuais - gira em torno do bem-estar dos filhos, cuja felicidade plena é o verdadeiro objetivo da família (HONNETH, 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., p. 282-323).
A modificação na autocompreensão institucional da família inspirou modelos de comunicação e de educação infantis renovados que se desvincularam do estabelecimento de papéis rígidos, evoluindo para uma forma de organização comunicativa. As obrigações intrafamiliares também se modificaram em face dessa democratização (HONNETH, 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., p. 282-323). Não obstante, a referência no voto do Justice Kennedy ao possível dano e humilhação às crianças pressupõe a abordagem psicológica baseada na má formulação do paradigma da autorrealização - delineado por Honneth (2003aHONNETH, Axel. Luta por reconhecimento. A gramática moral dos conflitos sociais.São Paulo: Ed. 34, 2003a.; 2003bFRASER, Nancy. Distorted Beyound all Recognition: A Rejoinder to Axel Honneth. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange. London: Verso, 2003b. p. 198-236.; 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.) - e de reduzido alcance teórico para legitimar formas de protagonismo judicial voltadas à proteção de grupos vulneráveis. Em verdade, supõe um tipo de institucionalismo Hegeliano forte que exclui formas não integradas de interação social ao conceito de família e que não são reconhecidas institucionalmente pelo Estado.
Dentro da perspectiva de Fraser, o casamento gay atende aos padrões de justiça porque atribui aos casais do mesmo sexo o mesmo valor moral que o casamento heterossexual, desinstitucionalizando padrões de valores culturais que impedem a paridade de participação apenas para aqueles homossexuais que pretendem se casar (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 39). No entanto, interpreta-se à luz de Fraser, que tal perspectiva não significa que os filhos de casais do mesmo sexo que não são casados e nem pretendem se casar não sejam capazes de perceber a dignidade dos relacionamentos de seus pais, pois tal distinção de status é opressiva.
Indubitavelmente, o voto do Justice Kennedy contém um conjunto de discursos implícitos que reforçam e que essencializam a identidade gay, estabelecendo ainda a subordinação de status de casais homossexuais não casados (tão criticada por Fraser). A referência na estratégia argumentativa para a possibilidade de um suposto dano e humilhação às crianças essencializa a identidade das uniões homossexuais supostamente legitimadas pelo matrimônio. Nesse sentido, ao atribuir valor positivo à identidade destes casais, desqualifica a identidade dos casais homossexuais não casados, reproduzindo determinadas exclusões políticas dentro do grupo LGBT e estabelecendo um impacto negativo sobre uniões que permanecem fora do matrimônio.
Nesse ponto, como salienta Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.), o reconhecimento não deve ser considerado como uma categoria da psicologia. Para Fraser, a norma da paridade participativa atende às reivindicações de gays e lésbicas deontologicamente, desvinculando-se de uma avaliação ética ou de uma atribuição de valor positivo às uniões homossexuais (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 41). O paradigma da autorrealização inspira a reificação identitária, o sectarismo e a indeterminação. A ideia de um suposto dano e humilhação invocada no voto de Justice Kennedy reflete o paradigma da autorrealização proposto por Honneth, que pressupõe o não reconhecimento como uma subjetividade distorcida - e não uma forma de subordinação de status. O paradigma teleológico do Honneth (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.; 2003bFRASER, Nancy. Distorted Beyound all Recognition: A Rejoinder to Axel Honneth. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange. London: Verso, 2003b. p. 198-236.) de Luta por Reconhecimento e Redistribution or Recognition era insuscetível de solucionar problemas nos quais o sentido de autorrespeito a determinados indivíduos inviabilizava a cidadania de outros. O efeito prático era o sectarismo ou a indeterminação.
Como salienta Fraser, em uma sociedade pluralista, é necessário estabelecer uma concepção de justiça deontológica que possa ser aceita por indivíduos que defendem diferentes concepções de bem (FRASER, 2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109., p. 28-30). Portanto, a estratégia argumentativa do voto, para concretizar efetivamente os pressupostos de determinação e de não sectarismo, deveria ter considerado um ponto de vista mais deontológico e radicalmente discursivo vinculado ao igual valor moral dos casais homossexuais proposto por Fraser.
Não obstante, o próprio Honneth (2012HONNETH, Axel. El Derecho de La Libertad. Madrid: Katz, 2012., p. 195) de Direito da Liberdade, embora ainda vinculado ao paradigma da autorrealização, é claro: "[...] hoje, nas relações íntimas, vale como forma legitima de sexualidade tudo aquilo que ambas as partes tenham consentido, no marco de sua autonomia moral". Arremata, lembrando certas práticas sexuais que não são mais consideradas como perversão ou como desvio de norma.
Todavia, mesmo em Direito da Liberdade, o autor permanece preso ao paradigma da autorrealização que, não apenas inspira uma certa indeterminação, mas também desvela o déficit político apontado por Werle e Melo (WERLE; MELO, 2011, p. 329 ). Nessa linha de raciocínio, inexiste em sua estrutura conceitual qualquer esforço teórico em delinear uma estratégia teórica democraticamente informada que trate os casais homossexuais como pessoas morais livres e iguais capazes de decidir discursivamente - por meio do exercício crítico da paridade participativa - sobre quais formas de reconhecimento são moralmente justificáveis e quais não são. Sob essa ótica, a estrutura conceitual de Honneth, ainda que recorra a uma reconstrução normativa, não possui recursos teóricos necessários para confrontar estruturas de poder patriarcais e heteronormativas ou para desestabilizar categorizações binárias.
Nesse prisma, assume relevância a proposta de Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.), baseada em remédios afirmativos com efeitos transformativos, que pode ser atualizada por meio das críticas radicais das feministas de segunda onda ao caráter patriarcal do matrimônio. Tais críticas foram sistematizadas por Nicola Barker, uma ilustre comentadora do referencial teórico de Fraser.
2.2 Contextualizando as Perspectivas de Fraser e Honneth à Luz das Críticas Feministas Radicais de Segunda Onda ao Caráter Patriarcal do Matrimônio
O raciocínio essencialista contido na estratégia argumentativa ínsita ao voto de Justice Kennedy motiva a reflexão sobre o caráter patriarcal do matrimonio e o triunfo da heteronormatividade compulsória. Kennedy resgatou implicitamente o argumento frequentemente invocado por parte do movimento LGBT, segundo o qual o reconhecimento simbólico do casamento entre pessoas do mesmo sexo ataca o background histórico de homofobia por parte do Estado e atenua a discriminação contra lésbicas e gays, ainda que tenha vinculado tal argumento a uma perspectiva de base psicológica1 De fato, parte do movimento LGBT ressalta que o casamento desconstruiria o simbolismo negativo da ausência do casamento e afirmaria positivamente o igual valor dos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo. Nesse ponto, haveria a desconstrução gradual do preconceito e da discriminação contra gays e lésbicas e a construção de uma trajetória progressiva em direção à justiça social. .
Ao enfatizar o casamento como um bem normativo, a argumentatividade implícita ao voto do Justice Kennedy minimiza as próprias estruturas de poder vinculadas ao patriarcado que estabelecem a heteronormatividade. Como se sabe, as relações de gênero não podem ser desvinculadas de relações de poder assimétricas que estabelecem hierarquias entre homens e mulheres.
Nas ponderações de Fraser sobre o patriarcado, a cultura política do capitalismo organizado pelo Estado pressupunha como cidadão o trabalhador masculino, estabelecendo que o seu trabalho deveria ser o principal sustento da família. (FRASER, 2009bFRASER, Nancy. O Feminismo, o capitalismo e a astúcia da história. Mediações, Londrina, v. 14, n. 2, p. 11-33, 2009b., p. 16). Profundamente marcada pelo gênero, esta construção do salário-família "[...] serviu para definir normas de gênero e para disciplinar aqueles que as infringiriam, reforçando a autoridade dos homens em assuntos domésticos e canalizando aspirações ao consumo doméstico privatizado." (FRASER, 2009bFRASER, Nancy. O Feminismo, o capitalismo e a astúcia da história. Mediações, Londrina, v. 14, n. 2, p. 11-33, 2009b., p. 16). O capitalismo de Estado, ao estabelecer concepções patriarcais e androcêntricas de família e de matrimônio, potencializou injustiças de gênero.
O raciocínio essencialista de Justice Kennedy denota que, embora o argumento da igualdade formal em direção ao reconhecimento do casamento gay seja um passo, ele é incapaz de desestabilizar a estrutura assimétrica subjacente ao matrimônio - que, consoante Barker (2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013.), sem mudanças estruturais, continuará injusto, patriarcal e excludente mesmo com o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Portanto, a ideologia patriarcal pressupõe o estabelecimento de um poder desigual e opressivo não somente entre homens e mulheres, manifestando-se também nas relações homossexuais, posto que determinados papéis de gênero e certas categorizações binárias também se desvelam nessas uniões.
E, de fato, sustenta-se neste trabalho a tese de que a ideia de reconstrução normativa proposta por Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.) revela-se insuscetível de superar e desestabiliza estruturas de poder inerentes ao patriarcado institucionalizado que estabelecem papéis de gênero, concepções binárias e formas sutis de subordinação de status - mesmo no casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Analisando o tema, de acordo com Feldblum (2005FELDBLUM, C. R. Gay is Good: the Moral case for Marriage Equality and More. Yale Journal of Law and Feminism, [S.l.], v. 17, p. 139-184, 2005. Disponível em: <http://scholarship.law.georgetown.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2098&context=facpub>. Acesso em: 2 jan. 2016.
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), determinadas feministas vislumbram como problemática a perspectiva da defesa do argumento baseado na igualdade formal, pois tal estratégia pode inspirar a aceitação do status quo e a reificação do casamento tradicional como um bem normativo. Feldblum assevera que, para alguns oponentes da estratégia argumentativa vinculada à moralidade liberal "[...] privilegia o casamento sobre outras formas de arranjos sociais e, portanto, levará a resultados substantivamente negativos." (FELDBLUM, 2005FELDBLUM, C. R. Gay is Good: the Moral case for Marriage Equality and More. Yale Journal of Law and Feminism, [S.l.], v. 17, p. 139-184, 2005. Disponível em: <http://scholarship.law.georgetown.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2098&context=facpub>. Acesso em: 2 jan. 2016.
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, p. 153).
Por isso, muitos defensores liberais do casamento gay não sustentam explicitamente a superioridade do casamento sobre outras formas familiares de uniões, assumindo cuidadosamente o posicionamento de que a legalização do casamento gay não inspire um impacto negativo sobre formas alternativas de reconhecimento familiar. Indubitavelmente, segundo Barker, o argumento liberal pode contribuir para manter intactas as estruturas sociais subjacentes e afirmar ordem social existente (BARKER, 2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013., p. 111).
Outrossim, Barker postula que, para alguns defensores, o efeito colateral do argumento da igualdade formal é a assimilação e a desconsideração das diferenças, uma vez que há presença de minorias dentro do próprio grupo (BARKER, 2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013., p. 111). Por fim, para algumas feministas, a igualdade formal não exige mudança na estrutura do matrimônio, mas uma postura de tolerância reflexiva em relação ao comportamento anormal ou desviante (BARKER, 2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013., p. 111). Barker, entretanto, ressalva que a igualdade formal é uma estratégia política que tem se desvelado útil e não pode ser minimizada. Não obstante, mesmo pressupondo que haja um elo entre igualdade formal e reconhecimento simbólico, Barker defende ser necessário resgatar argumentos mais radicais que viabilizem a transgressão do patriarcado e da heteronormatividade (BARKER, 2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013., p. 127).
Sob esse prisma, sustenta-se que a ideia de remédios afirmativos com efeitos transformativos - proposta por Fraser - pode sofrer uma releitura à luz dos argumentos radicais das feministas de segunda onda. Nesse ponto, Wintemute (2004WINTEMUTE, R. Sexual Orientation and the Charter: the Achievement of Formal Legal Equality and its limits. McGill Law Journal, [S.l.], v. 49, p. 11-43, 2004. Disponível em: <http://lawjournal.mcgill.ca/userfiles/other/129246-4winte.pdf>. Acesso em: 2 jan. 2016.
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, p. 1.173) menciona que é necessário estabelecer argumentos baseados na igualdade formal como um primeiro passo para desafiar a homofobia, e, uma vez estabelecida a igualdade formal, deve-se caminhar para o reconhecimento da diferença por meio da discriminação indireta e igualdade substantiva.
Por sua vez, Fraser (2007FRASER, Nancy. Reconhecimento sem ética? In: SOUZA, Jessé; MATTOS, Patrícia. Teoria Crítica no Século XXI. São Paulo: Annablume, 2007. p. 113-140.) deslinda que a desconstrução dos padrões de valores culturais heteronormativos exige a legalização do casamento gay ou a desinstitucionalização do casamento heterossexual, desvinculando benefícios como saúde do status marital e atribuindo-os com base em outros fundamentos, como cidadania e/ou residência territorial. A seu turno, Barker (2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013.) ressalta que muitas teóricas queer aduzem que o casamento entre pessoas do mesmo sexo seria assimilacionista, pois reconheceria somente os relacionamentos que se enquadrariam na estrutura do casamento heteronormativo, estabelecendo a invisibilidade das uniões que permaneceriam à margem dessa estrutura. Portanto, o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo inspiraria o triunfo da heterossexualidade compulsória.
A autora ressalva que, embora as críticas feministas ao matrimônio tenham surgido no feminismo de segunda onda, a instituição legal do casamento não demonstrou mudanças significativas para minimizar a relevância dessas críticas ao modelo contemporâneo de casamento. Portanto, assevera que existem muitas maneiras por meio das quais o casamento entre pessoas do mesmo sexo poderia criar oportunidades para resistência na forma da transformação ou da transgressão do casamento heteronormativo, inspirando formas de desobediência civil por meio da resistência à invisibilidade do relacionamento entre pessoas do mesmo sexo (BARKER, 2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013., p. 127).
Como assinala Barker (2013BARKER, Nicola. Not the marriage Kind: a Feminist Critique of Same-Sex Marriage. Kent Law School, University of Kent, UK; Palgrave Macmillan, 2013.), não há como prever os reais efeitos da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. A questão proposta por esse trabalho é: ao invés de transformar e transgredir o casamento, essas uniões entre pessoas do mesmo sexo serão transformadas pelo casamento, sofrendo redução de suas autonomias? Ou o casamento entre pessoas do mesmo sexo irá desafiar a heteronormatividade e o patriarcado?
Para Fraser, enquanto a política de identidade gay objetiva revalorizar a sexualidade gay e lésbica, a política queer propugna desconstruir a oposição binária entre homo/hétero, desestabilizando o rol vigente de status sexuais exclusivos (FRASER, 2001aFRASER, Nancy. Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da justiça na era pós-socialista. In: SOUZA, Jessé (Org.). Democracia Hoje: novos desafios para a teoria democrática contemporânea. Brasília, DF: Editora UNB, 2001a. p. 245-282., p. 245-282). Com efeito, embora Fraser defenda a legalização do casamento gay ou a desvinculação do casamento heterossexual de benefícios como saúde, a ideia de remédios afirmativos com efeitos transformativos - a longo prazo - revela alcance teórico para ser aplicada à temática do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Assumindo a proposta de Fraser relativa à ideia de remédios afirmativos com efeitos transformativos, mas incorporando uma estratégia teórica com Fraser, mas para além de Fraser, parte-se do pressuposto de que a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo pode funcionar como um remédio afirmativo com efeitos transformativos, subvertendo e transgredindo a longo prazo o patriarcado e a heteronormatividade.
Não obstante, sustenta-se que as ideias de liberdade social e de autorrealização não revelam alcance teórico para transgredir as estruturas de poder que determinam o patriarcado e a heteronormatividade. Para Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), a juridificação do matrimônio inspirou a situação paradoxal de que, embora casais do mesmo sexo sejam tolerados, eles se encontram desequiparados frente aos casais heterossexuais, posto que não têm a possibilidade jurídica do matrimônio. Segundo Honneth (2015)HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., essa discriminação afeta minorias sexuais, inclusive com a exclusão do direito a adoção. No mesmo sentido, de acordo com Justice Kennedy, são negados diversos benefícios a casais do mesmo sexo, que se veem impedidos de exercer direitos fundamentais. Na perspectiva de Kennedy, tais minorias sofrem longa história de reprovação de seus relacionamentos, de forma que essa negação causa dano grave e contínuo (ESTADOS UNIDOS, 2015, p. 22).
Honneth sublinha que, a partir da Segunda Guerra, a prosperidade econômica do Ocidente incrementou o processo de individualização. No início da década de 1970, por meio de lutas, inúmeras mudanças jurídicas e éticas inspiraram a transformação de atitude diante do matrimônio, da família e da sexualidade, legalizando-se o controle de natalidade, que foi democratizado por meio da introdução das pílulas anticoncepcionais. Na maioria dos países do Ocidente, as relações entre homossexuais foram toleradas. Ocorreu a equiparação jurídica das mulheres aos homens e elas foram integradas ao mercado de trabalho. Percebe-se que se flexibilizou o divórcio e passou-se a amenizar o tabu ético das relações pré-matrimoniais e extramatrimoniais com maior tolerância. Modificou-se o estilo da educação nas famílias e nas escolas. A revolução sexual desencadeou a progressiva desinstitucionalização da pequena família burguesa, desvinculando-a da relação íntima ou amorosa. Aos poucos, as relações homossexuais começaram a ser aceitas na esfera pública (HONNETH, 2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015., p. 256-281).
No entanto, enquanto a teoria de Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.) revela um déficit político, a estrutura conceitual de Fraser desvela-se democraticamente informada, consagrando a ideia de contrapúblicos subalternos. Fraser teoriza que, por meio de contrapúblicos de resistência que os movimentos sociais ampliam a gama de conhecimento de injustiças publicamente articuladas, expandindo o universo da razão pública (BUNCHAFT, 2014BUNCHAFT, Maria Eugenia. O Julgamento da ADPF n. 186: uma reflexão à luz do debate Honneth-Fraser. Pensar, Fortaleza, v. 19, n. 2, p. 453-490, 2014., p. 72-77). Na verdade, haveria, para Fraser, uma multiplicidade de formas críticas de comunicação expressas em termos de "contrapúblicos". Estes constituem "[...] arenas discursivas paralelas nas quais os membros dos grupos socialmente subordinados inventam e circulam contradiscursos para formular interpretações opostas de suas identidades, interesses e necessidades." (FRASER, 1992FRASER, Nancy. Rethinking the Public Sphere: a Contribution to the Critique of Actually Existing Democracy. In: CALHOUN, Craig. Habermas and the Public Sphere. Cambridge: Mit Press, 1992. p. 109-142. p. 123).
Indubitavelmente, a concepção de contrapúblicos subalternos - proposta por Fraser (1992FRASER, Nancy. Rethinking the Public Sphere: a Contribution to the Critique of Actually Existing Democracy. In: CALHOUN, Craig. Habermas and the Public Sphere. Cambridge: Mit Press, 1992. p. 109-142.) - pode ser vislumbrada com a formação de uma multiplicidade de esferas públicas contra-hegemônicas e alternativas que surgiram com a luta política pelos direitos civis na década de 1970, oportunizando a circulação de discursos de oposição de grupos LGBT excluídos da esfera pública oficial. A ideia de contrapublicidade demonstra pertinência para desestabilizar autocompreensões binárias e patriarcais, confrontando estruturas de poder normalizadoras atreladas à heteronormatividade.
Mas o embate político potencializado por essas esferas públicas transversais alcançou relevância em 1993, na decisão da Suprema Corte do Havaí em Baehr v. Lewin (ESTADOS UNIDOS, 1993), que declarou inconstitucional a proibição ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. O ideal da contrapublicidade foi se ampliando no embate político-democrático de 2003 a 2015, refletindo-se em várias decisões de cortes inferiores, leis estaduais e referendos populares que levaram ao reconhecimento legal do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Em novembro de 2012, Maine, Maryland e Washington tornam-se os primeiros estados a legalizar o casamento gay pelo voto popular.
No entanto, o avanço na conquista de direitos também inspirou ações federais e ações de estados limitando os direitos dos casais homossexuais, o que se refletiu em The Defence of Marriage Act (DOMA). Nessa linha de raciocínio, em Windsor v. United States (ESTADOS UNIDOS, 2013), a Suprema Corte, por 5 a 4, declarou a inconstitucionalidade da seção 3 do The Defence of Marriage Act (DOMA). Este definia o casamento como uma união legal entre homem e mulher, restringindo os benefícios da seguridade social e questões relativas a benefícios para funcionários públicos, imigração e declarações fiscais conjuntas ao casamento heterossexual, não se aplicando a uniões homossexuais.
Em 2011, a Administração de Obama declarou que a seção 3 do DOMA seria inconstitucional e, embora continuasse aplicando a lei, não iria defendê-la no tribunal. A luta política dos casais gays foi conquistando parcela da opinião pública, de forma que, antes de Obergefell, 38 estados mais o Distrito de Columbia haviam legalizado o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Com Donald Trump na presidência norte-americana, não obstante algumas declarações públicas contraditórias em sua campanha, há possibilidade de reversão de muitas conquistas políticas da comunidade LGBT, o que requer desse movimento uma estratégia política renovada de luta via contrapublicidade para garantir que Obergefell seja preservado - o que demonstra o alcance teórico do referencial de Fraser.
3 Conclusão
Diante do que aqui se expôs, o referencial de Fraser (2003aFRASER, Nancy. Justice Social in the Age of Identity Politics. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange . London: Verso , 2003a, p. 7-109.; 2003bFRASER, Nancy. Distorted Beyound all Recognition: A Rejoinder to Axel Honneth. In: FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political Philosophical Exchange. London: Verso, 2003b. p. 198-236.; 2010) demonstrou maior alcance teórico para legitimar filosoficamente formas de judicialização voltadas para a proteção de minorias sexuais vulneráveis.
Para Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), Hegel pressupôs não apenas formas de eticidade existentes, mas também potenciais de transformação das práticas e das instituições sociais. Portanto, quando Kennedy (2015) trata da necessidade de um método que respeita a história - contudo, sem estar preso ao referencial das práticas do passado para a delimitação e a identificação das injustiças - tal reflexão remete ao pensamento de Honneth, ao elucidar que o procedimento Hegeliano pressupõe a reconstrução não apenas das práticas existentes, mas também das práticas em vias de desenvolvimento ainda não esgotadas.
Como já se salientou, em Honneth (2015HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015.), as crianças não demandam o reconhecimento institucional do Estado para serem efetivamente reconhecidas, como afirma Justice Kennedy. Embora o subsídio teórico de Honneth (2015)HONNETH, Axel. O direito da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2015. seja essencial para expressar um conjunto de discursos implícitos ao voto de Justice Kennedy - seja para legitimá-los ou para criticá-los - mostra-se insuscetível de superar a dicotomia homo/hétero e o caráter patriarcal do casamento, posto que ainda encontra-se atrelado ao paradigma da autorrealização. Mesmo em Direito da Liberdade, o paradigma da autorrealização não resolve dilemas nos quais o incremento da liberdade social ou a atribuição de valor positivo à identidade intacta de determinados indivíduos inviabiliza a igual cidadania de outros grupos. Tal dilema reflete-se na estratégia argumentativa do voto de Justice Kennedy, que termina por afirmar implicitamente a invisibilidade de uniões homossexuais estabelecidas fora do matrimônio. O resultado é o sectarismo ou a indeterminação. Diferentemente, a perspectiva de Fraser é deontológica e não sectária, revelando-se mais compatível com uma sociedade plural.
Sustenta-se que as reivindicações por justiça em uma sociedade pluralista relativas à crítica ao binarismo e ao patriarcado devem pressupor o insight crítico-reflexivo da norma da paridade de participação por meio da qual se torna possível avaliar quais demandas por reconhecimento são efetivamente legítimas, confrontando-se estruturas de poder heteronormativas. Como enfatizam Werle e Melo (2011, p. 329), em Honneth, "[...] a tarefa de uma teoria da justiça parece ficar reduzida ao realizar ou proporcionar o bem ético da formação bem-sucedida da identidade pessoal, entendido como uma necessidade básica dos indivíduos". Sob esse prisma, desvela-se o déficit político da teoria de Axel Honneth. Nessa linha de raciocínio, não há em seu referencial filosófico qualquer estratégia fundamentada em uma teoria democraticamente estruturada suscetível de conceber os casais homossexuais como sujeitos ao igual valor moral. Somente a ideia de pessoas morais, desvinculada de uma concepção teleológica, viabiliza um empoderamento discursivo inerente ao exercício da paridade participativa que oportunize para as minorias sexuais debater e justificar quais as formas de reconhecimento devem ser defendidas. Outrossim, tal déficit político inviabiliza a desestabilização efetiva das estruturas de poder patriarcais, heteronormativas e as categorizações binárias.
Por sua vez, Fraser (2001aFRASER, Nancy. Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da justiça na era pós-socialista. In: SOUZA, Jessé (Org.). Democracia Hoje: novos desafios para a teoria democrática contemporânea. Brasília, DF: Editora UNB, 2001a. p. 245-282.), por meio da crítica aos remédios afirmativos, se contrapõe ao binarismo homem-mulher (ou homo/hétero), procurando desestabilizar o sistema binário de diferenciação sexual que foi expresso, por exemplo, no discurso implícito ao voto de Justice Kennedy - o qual continha a estratégia argumentativa que essencializa a identidade gay, institucionalizando a subordinação de status de casais homossexuais não casados, que é objeto de crítica por Fraser. Propugna-se, por meio da estratégia que resgata Fraser contra Fraser, que o reconhecimento legal do casamento entre pessoas do mesmo sexo é um remédio afirmativo, mas que pode produzir efeitos transformativos a longo prazo, desestabilizando os papéis de gênero tanto nas uniões homossexuais como heterossexuais.
Assim, o referencial de Fraser (2010) expressa maior alcance teórico para potencializar a concretização dos direitos de casais homossexuais. Por meio de contrapúblicos subalternos, o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo e seu debate nas esferas públicas concorrentes podem assumir impacto positivo sobre a discussão atinente ao casamento de forma geral, desconstruindo a dicotomia hétero-homo. Portanto, o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo, ao ser tematizado em esferas públicas transversais desde a década de 1970, assumiu um impacto transgressivo sobre o caráter patriarcal do casamento, desestabilizando assim a dicotomia homo/hétero. Como já mencionado, a ideia de contrapublicidade é democraticamente informada e pode ser desvelada no debate democrático em torno do casamento gay nos Estados Unidos de 2003 a 2015, com reflexo em diversas decisões de cortes inferiores, leis estaduais e referendos populares, que culminaram na decisão da Suprema Corte em Obergefell.
O reconhecimento afirmativo, voltado para reparar a injustiça contra homossexuais e transexuais na cultura, engloba a valorização da cultura LGBT, e inspira a reificação identitária, enquanto deixa intacto o código binário homem-mulher que atribui sentido à relação. A decisão de Kennedy congloba implicitamente discursos que refletem remédios afirmativos - tão criticados por Fraser.
Com efeito, salienta-se que Honneth, embora resgate o método de reconstrução normativa como mecanismo para analisar a evolução histórica do conceito de família, defendendo a legitimidade das relações familiares compostas por parceiros homossexuais, não analisa suficientemente os obstáculos inerentes às estruturas de poder nas sociedades contemporâneas, no que se refere às estratégias de superação dos padrões androcêntricos e heteronormativos, assim como da estrutura sexual binária que marca tanto as instituições como os dispositivos legais. O filósofo, ao pretender sanar o déficit sociológico da Teoria Crítica, termina por suscitar o que Werle e Melo (2013) denominam como déficit político da Teoria Crítica, no sentido de inexistir em sua teoria qualquer preocupação em "[...] explicitar um princípio de justificação recíproca e universal em que os próprios cidadãos pudessem decidir quais formas de reconhecimento e princípios de justiça são legítimos ou ilegítimos" (WERLE; MELO, 2013, p. 329).
A linha argumentativa essencialista inerente ao voto de Justice Kennedy inspira a problematização sobre a estrutura patriarcal do matrimonio, demonstrando que, não obstante o argumento da igualdade formal como fundamento para legalização do casamento gay seja um passo inicial, ele é insuscetível de desestabilizar o caráter assimétrico inerente ao matrimônio - que, sem mudanças profundas, continuará injusto e excludente. Em suma, o casamento constitui uma instituição opressiva para mulheres heterossexuais, e precisamente tal exclusão configura elemento central para mulheres lésbicas e homens gays. Ainda assim, seu reconhecimento entre pessoas do mesmo sexo pode ter impacto positivo - e ao mesmo tempo, transgressivo - sobre a discussão que o permeia como um todo, desafiando não apenas a dicotomia homo/hétero, mas também a estrutura patriarcal, desestabilizando os papéis de gênero também na união heterossexual.
A decisão da Suprema Corte norte-americana em Obergefell foi concretizada não apenas em decorrência da mudança de parte da opinião pública - inspirada por uma articulação entre contrapúblicos de resistência que encontraram respostas nas jurisdições inferiores - mas também porque a batalha nas Cortes ajudou a fortalecer a capacidade de luta dessas minorias sexuais. Forjaram-se novas esferas públicas contra-hegemônicas que, ao se apropriarem do discurso dos princípios constitucionais, ajudaram a transformar parcela da opinião pública nacional.
Indubitavelmente, a partir do novo resultado da eleição norte-americana em novembro de 2016, a configuração política da Suprema Corte dos Estados Unidos poderá será alterada, resultando em possibilidade de reversão para o precedente de Obergefell, embora não se possa afirmar com certeza absoluta se a Corte romperá efetivamente com a referida decisão. Não obstante, a luta política pelos direitos da comunidade LGBT deve se intensificar via contrapublicidade, contrapondo-se à possibilidade de reversão dos direitos de minorias LGBT, mesmo que o contexto político-institucional norte-americano tenha se modificado radicalmente. É precisamente o ideal da contrapublicidade, articulado a uma perspectiva deontológica, que revela potencial para transgredir o caráter patriarcal do casamento vinculado à imposição de doutrinas religiosas conservadoras no cenário político norte-americano.
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Maria Eugenia Bunchaft é professora do Programa de Pós-Graduação em Direito da UNISINOS e de Direito Constitucional na Graduação em Direito da UNISINOS, orientadora de mestrado e doutorado, pós-doutora em Filosofia pela UFSC, doutora e mestre em Direito pela PUC-Rio, coordenadora do projeto de pesquisa Judicialização, Constitucionalismo Democrático e direitos fundamentais de minorias LGBT: uma reflexão à luz dos contextos brasileiro e norte-americano, aprovado pelo CNPq (referente à Chamada Universal/MCTI/CNPq n. 14/2014), e coordenadora de um segundo projeto aprovado pela FAPERGS (relativo ao edital Pesquisador Gaúcho 2014) intitulado Judicialização, Deliberação e Minorias LGBT uma reflexão sobre os contextos brasileiro e norte-americano.
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De fato, parte do movimento LGBT ressalta que o casamento desconstruiria o simbolismo negativo da ausência do casamento e afirmaria positivamente o igual valor dos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo. Nesse ponto, haveria a desconstrução gradual do preconceito e da discriminação contra gays e lésbicas e a construção de uma trajetória progressiva em direção à justiça social.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Dez 2016
Histórico
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Recebido
18 Mar 2016 -
Revisado
27 Out 2016 -
Aceito
06 Nov 2016