Resumo
As medidas de contenção e repressão ao trabalho escravo são fundamentadas principalmente em remédios econômicos. Com efeito, é negligenciado o bem central a ser protegido pelo ordenamento jurídico nessas situações: a dignidade. Dado esse cenário, é por meio da tese de J. M. Bernstein (Torture and Dignity) sobre a possibilidade de uma ética negativa baseada no relato da vítima que este artigo se atém a investigar novos caminhos de observação deste crime, bem como identificar alternativas de reparação da confiança no mundo desses sobreviventes. Para isso, como objetivo geral, busca-se reconstruir a contribuição de Bernstein para a compreensão do relato como uma alternativa de reparo à ofensa à dignidade nos casos de trabalho escravo. Como objetivos específicos, este trabalho perpassa por três eixos de apreciação: analisar a aplicabilidade do conceito de agência de Bernstein à construção teórica basilar ao entendimento do trabalho análogo ao de escravo; compreender como a perda de confiança no mundo se situa na vida dos sobreviventes do trabalho escravo; e, por fim, estabelecer como uma teoria baseada no relato desses sobreviventes pode contribuir para o resgate da dignidade dessas pessoas. Como resultados alcançados, observou-se a necessidade de inserção do relato e da escuta terapêutica como formas de recuperação dignidade humana, bem como a compreensão mais humanizada do procedimento após o resgate a partir dessa teoria.
Palavras-chave: Dignidade; Bernstein; Agência; Relato; Escravidão contemporânea.
Abstract
The measures to contain and repress slave labor are based mainly on economic remedies. Indeed, the central good to be protected by the legal system in these situations is neglected: dignity. Given this scenario, it is through J. M. Bernstein's thesis (Torture and Dignity) on the possibility of a negative ethics based on the victim's report that this article focuses on investigating new ways of observing this crime, as well as identifying alternatives for repairing the crime. confidence in the world of these survivors. For this, as a general objective, we seek to reconstruct Bernstein's contribution to the understanding of the report as an alternative to repair the offense to dignity in cases of work analogous to slavery. As specific objectives, this work runs through three axes of appreciation: to analyze the applicability of Bernstein's concept of agency to the basic theoretical construction to the understanding of slave work; understand how the loss of confidence in the world is situated in the lives of survivors of slavery; and, finally, to establish how a theory based on the reports of these survivors can contribute to the rescue of these people's dignity. As results achieved, it was observed the need to insert the report and therapeutic listening as ways of recovering human dignity, as well as a more humane understanding of the procedure after the rescue based on this theory.
Keywords: Dignity; Bernstein; Agency; Report; Modern slavery.
1. Introdução
Voltando-se para a sua origem etimológica, “trabalho” se vincula ao sofrimento. Advindo do latim tripaliare, é o martirizar e torturar aqueles pelo tripalium, um instrumento formado por três estacas de madeira. Não distante de seu significado original, o trabalho possui em sua história a permanência dessas marcas, expostas na atualidade, principalmente, ao se encarar o trabalho análogo ao de escravo ou o trabalho escravo contemporâneo.1
Assim, pensar a escravidão, por muitas vezes pode falsamente remeter a uma realidade vencida pelos moldes legais, os quais, seja pela Lei Áurea de 1888 ou pelo artigo 149 do Código Penal, objetivaram formalmente abolir, conter e repudiar essa conduta. Todavia, acolher esse ponto de vista simplista significa dar as costas para os impactos que marcam e se perduram na estrutura de países afetados pela colonização, tal qual o Brasil (ALMEIDA, 2010). Desse modo, essa temática requer compreensão a partir de um ponto de vista crítico2, que torne possível evidenciar a multidimensionalidade que carrega e que permita observar como sua permanência ocorre nos tempos atuais.
Parte-se dessa abordagem visto que os elementos econômicos inerentes à temática e à sua estrutura, muitas das vezes, são a única lente utilizada pelos seus intérpretes, dado o fato de o capital global ter se tornado principal vetor para essa conduta (ALMEIDA, 2010). Com isso, a internalização de uma visão que reduz a estrutura da escravidão a uma análise exclusivamente econômica e socialmente simplista.
Como consequência, embora fundamentado no discurso de garantia e preservação da dignidade desses trabalhadores contra abusos e violências, observa-se que as medidas de repressão e contenção desse crime restringem-se a uma esfera econômica. Logo, a tentativa de restituir a dignidade a esses indivíduos passa a vincular-se à reparação financeira do dano sofrido, assim como a repressão à conduta passa a afetar monetariamente aqueles que a praticam.
É possível constatar tal panorama ao observar a Portaria Interministerial nº 4, de 11 de maio de 2016, a qual dispõe sobre a “Lista Suja” de pessoas físicas e jurídicas que tenham sido flagradas em inspeção do Ministério Público do Trabalho, utilizando mão de obra escrava. Ela submete tais empregadores a multas e constante monitoramento a partir de um Cadastro público. A Constituição Federal de 1988, por sua vez, prevê em seu artigo 243, como sanção a essas práticas, a desapropriação de terras que façam uso de trabalho escravo, assim como o confisco de valores econômicos nelas apreendidos.
Ao voltar-se para o trabalhador, o artigo 483 da CLT demonstra a preocupação do legislador em garantir-lhe a rescisão indireta e a possibilidade de pagamento in loco de tais parcelas, no momento do flagrante. No mesmo sentido, encontra-se a garantia ao seguro-desemprego a esses sobreviventes pela Lei n. 10.608, de 20 de dezembro de 2002.
Embora a inegável necessidade de medidas que se adaptem ao modelo capitalista vigente, principalmente no que se refere à garantia de subsistência dos trabalhadores resgatados, percebe-se o afastamento da dimensão moral dessa problemática. Assim, seja como alvo da ofensa causada pelo trabalho análogo ao escravo ou pela motivação por trás do retorno desses trabalhadores a essas condições - o que se dá, de acordo com Almeida (2010, p.137), pela dívida moral em manter seu nome “limpo”, as medidas de reparação ao trabalho escravo acabam por negligenciar um princípio base desse sistema: o prejuízo à dignidade do sobrevivente no sentido de uma ofensa moral (moral injury).
Diante desse cenário, é tal ponto de inflexão que a presente pesquisa considera pertinente e busca se ater. Para isso, sua abordagem se fundamenta no argumento construído por J. M. Bernstein (2015) na obra “Torture and dignity: an essay on moral injury”, que visa vincular tais danos ao reconhecimento da posição ou status do indivíduo, tornados reais pela violência imposta contra seus corpos.
As teorias hegemônicas da dignidade humana no campo dos direitos humanos e do trabalho escravo contemporâneo desenvolvem a ideia de que, e. g., as proibições ao trabalho escravo ou à tortura são decorrentes de uma correta compreensão das condições de agência humana com base no princípio da autonomia. Nesse sentido, buscam explicitar uma lista de características do ser humano com fundamento no princípio da autonomia do indivíduo, das quais direitos e obrigações são decorrentes. No campo de trabalho escravo, essa forma de fundamentação com base na dignidade humana culmina mormente em uma lista de condições para que os sujeitos contratantes possam ter sua autonomia preservada no momento da relação laboral. Foca-se, por conseguinte, nas condições de agência do indivíduo solipsista para justificar proibições e direitos.
As diversas críticas a essa forma de compreender a dignidade são conhecidas no campo da filosofia prática desde a modernidade. Na esteira das críticas hegelianas ao direito natural, esse tipo de pensamento moderno erra ao buscar fundamentar a ordem normativa a partir do nada normativo, fazendo da vontade individual, suposta por existente por si, a condição dessa ordem. “Em outros termos, o homem, o indivíduo humano em sua abstração, é um produto da história, e não o seu substrato a-histórico (...).” (KERVÉGAN, 2022, 55). Ademais, ainda nesse caminho da crítica hegeliana, há um equívoco em partir de uma fundamentação que coloca a agência humana individual em tensão com todos os aspectos relacionados à sociabilidade humana: “Natural, a liberdade o é em certo sentido; porém, sob a condição de perceber que essa ‘natureza’ não é outra coisa senão o movimento de instituição de uma segunda natureza, ética e política, segunda natureza que nunca é precedida de uma primeira natureza de que ela seria, à escolha, ou a consolidação ou a negação.” (KERVÉGAN 2022, 56).
Assim, este estudo parte de uma visão contingente ou social da dignidade (MATOS, 2019), na medida em que compreende que a melhor forma de abranger aquilo que está em jogo no momento da fundamentação de direitos com base no princípio da dignidade é por meio da dimensão relacional ou intersubjetiva e das diversas formas de negação da dignidade, com especial destaque para a corporeidade. A corporeidade, aqui, é pensada com base em dois núcleos: o ser um corpo, marcado pelos seus processos materiais, físicos e involuntários; e o ter um corpo, ao qual a agência pertence. Logo, essa violência estabelecida por Bernstein, a qual finca seu significado no conceito de moral injury ou ofensa moral em livre tradução, consiste na vivência de um sofrimento com potência suficiente para, além da dor, originar uma moralidade baseada em novo significados sobre corpo e dor a partir do ponto de vista da vítima e o seu reconhecimento como tal (BERNSTEIN, 2015).
Em sua obra, o estupro e tortura são abordados como exemplos paradigmáticos da ofensa moral, compreendendo que a sua importância reside no fato de que, além do dano físico causado por sua execução, a dignidade de seus sobreviventes passa a ser um outro bem primordialmente atingido, ao tempo que incabível qualquer justificativas para tal (BERNSTEIN, 2015). Portanto, é com base nessa interpretação sobre os danos que a gravidade das ofensas morais se estabelece, visto que, ao contrário da recuperação do corpo físico, uma ofensa moral repercute em um dano intrínseco e permanente para o sujeito. Em meio a isso, é a partir da separação entre a voluntariedade e a involuntariedade daquele que sofre a ofensa moral que o arbítrio do sobrevivente é tomado pelo Outro, desejando desampará-la e, consequentemente, desapropriando seu status como pessoa e o reduzindo a nada (BERSTEIN, 2015). Surge, assim, uma relação de dependência entre sobrevivente e agressor, na qual reside a persistente perda total de confiança no mundo ao alcançar a devastação (BERSTEIN, 2015).
É sob a lente da referida tese que esta pesquisa busca observar o trabalho escravo, concebendo os sujeitos não apenas como mão de obra indevidamente utilizada para fins econômicos e, por conseguinte, economicamente reparados, mas aproximando os olhos para o dano intrínseco sofrido pelo sujeito, com potência suficiente para retirar o valor de sua própria existência.
Dadas as circunstâncias, constata-se a insuficiência de medidas reparadoras que visem restituir esse vínculo de confiança entre o trabalhador e o mundo por meio, exclusivamente, da reparação econômica. Assim, a partir de tal reflexão sobre a natureza do dano sofrido por esses trabalhadores e a fim de completar tal panorama, é, em consonância ao argumento de Bernstein (2015), que se identifica a carência de um enfrentamento dessa problemática sob a perspectiva do relato do sobrevivente. Em meio a isso, questiona-se: em que medida a ética negativa de Bernstein, baseada no relato do sobrevivente, pode contribuir no processo de resgate da confiança no mundo após a pessoa ter sido submetida à escravidão?
Com o intuito de se debruçar sobre esse questionamento, o presente trabalho possui como objetivo geral reconstruir a contribuição de Bernstein para a compreensão do relato como uma alternativa de reparo à ofensa à dignidade nos casos de escravidão. Ao tempo que, especificamente, objetiva-se: analisar a aplicabilidade do conceito de dignidade de Bernstein à lógica de compreensão teórica do trabalho escravo contemporâneo; compreender como a perda de confiança no mundo ocorre no caso de sobreviventes do trabalho escravo; e por fim, estabelecer como uma teoria baseada no relato do sobrevivente pode contribuir para o resgate da dignidade dessas pessoas.
Portanto, tal pesquisa possui como justificativa de sua realização a urgência em encarar o trabalho escravo a partir de uma investigação moral, para que, consequentemente devolva o aspecto humano invisibilizado por uma concentração exclusiva na dimensão econômica.
Desse modo, por mais que não seja pretendido se ater à totalidade de seu extenso campo conceitual, a motivação da escolha do argumento de Bernstein para trilhar tal caminho reside, para além das correlações realizadas por ele entre o seu argumento e a escravidão, na necessidade de valorização do relato do sobrevivente como ferramenta de garantia de seus direitos humanos, de sua dignidade e da possibilidade de uma vida pós-resgate.
Assim, a hipótese desenvolvida é que o fundamento do combate ao trabalho escravo contemporâneo com base em uma noção social de dignidade humana, que parta da ideia da escravidão como ofensa moral, possibilita uma abertura maior para a compreensão do relato do sobrevivente como ferramenta de garantia dos seus direitos humanos e de uma vida digna após a experiência da devastação.
2. Trabalho escravo e novos caminhos da agência racional
2.1 A estabelecida base racional para o trabalho escravo a partir de Kant
A história do trabalho, assim como a da escravidão, não possui como característica fundamental a uniformidade. Todavia, é a partir da noção do trabalho como elemento capaz de dignificar o homem, tal qual estabelecido por Weber (1967), que se observa um elemento comum em tal heterogeneidade: a centralidade da dignidade nessa discussão. Isso porque, mesmo que a força de trabalho seja cedida ao outro sob o objetivo de aferir lucro, o ordenamento jurídico nacional e internacional intermedeia essas relações visando à primazia de condições dignas de trabalho, ou seja, que não instrumentalizem os indivíduos.
Diante disso, observa-se que as bases da prática jurídica no campo do direito do trabalho tendem a se fincar sob uma versão profana da moralidade kantiana, a qual compreende os sujeitos humanos como possuidores de dignidade, logo, devendo ser tratados a partir de seu valor intrínseco e não, como meros fins (FORMOSA, 2017). É sob a luz da racionalidade capaz de conceder esse status que o tratamento dos indivíduos deve se sustentar sob o respeito e a amabilidade (FORMOSA, 2017).
Expõe-se melhor tal raciocínio e a sua aplicabilidade nas relações trabalhistas a partir da relação fundamental estabelecida por Kant (2008) entre dignidade da natureza humana e autonomia. Nela, a moralidade e a humanidade se apresentam como possuidoras de valor intrínseco, isto é, um valor absoluto e insubstituível. Em virtude disso, não é possível mensurar a dignidade desses sujeitos.
A racionalidade, por sua vez, é elemento essencial ao agir autônomo, ou seja, de forma independente da influência de externalidades à própria vontade e sob preceitos morais (KANT, 2008). A autonomia, portanto, compreende-se como a capacidade de se autodeterminar racionalmente e iniciar sequências de ações motivadas pela razão (SILVA, 2020). É nesse aspecto que o conceito de autonomia é central para a teoria kantiana, concebendo-a sob uma noção de autogoverno, a qual Guyer (2006) explica que ocorre na capacidade de escolher de forma livre os princípios e fins de suas condutas. Para além disso, é sob tal agência racional que se fundamenta os poderes cognitivos, como a compreensão teórica, a razão prática e o poder de julgamento (GUYER, 2006).
Com efeito, infere-se que apenas seres racionais possuem dignidade, haja vista apenas aqueles possuírem capacidade de escolher agir moralmente, ou seja, sob uma autodeterminação de natureza racional (SILVA, 2020). Assim, a autonomia é fundamento para a dignidade humana ao possibilitar o imperativo categórico (KANT, 2008).
É diante desses argumentos que o direito do trabalho concebe os indivíduos nos polos de suas relações, garantindo ao trabalhador, em sua racionalidade e autonomia, o direito à dignidade. Contudo, atenta-se para situações em que tal autonomia é subtraída dessa equação, a exemplo da redução ao trabalho análogo à escravidão. Isso ocorre uma vez que a submissão ilimitada é pilar central do processo de escravidão, levando a instrumentalização do ser humano, transformando-o em mera ferramenta de trabalho capaz de ser apropriada, utilizada, alienada e lesada (REZENDE JÚNIOR, 2020).
Com isso, é na ofensa à autodeterminação do indivíduo que a sua condição de pessoa portadora de dignidade é substituída pelo status de coisa, caracterizando-a como fungível, negociável e possuidora de um preço (REZENDE JÚNIOR, 2020). Logo, a dignidade, como definido por Rezende Júnior (2020, p. 341) é “aquilo que a torna um ser único e exige o seu reconhecimento enquanto tal”.
É com base nessa construção argumentativa que as políticas de combate e repressão ao trabalho escravo se sedimentam e visam à emancipação desses trabalhadores, sendo uma versão profana da teoria kantiana utilizada como base para que esse caminho seja traçado sob a premissa de que o sujeito deve assumir subjetivamente tal agência (MORAES; CHAI, 2020). Ou seja, deve ele se ver como capaz e crer na própria dignidade, percebendo-se como portador de direitos e, com isso, não se submetendo a condições degradantes ou de exploração, como a escravidão (MORAES; CHAI, 2020).
Exposto isso, observa-se que há uma demanda por medidas estatais que geram esse sentimento de autodeterminação, capaz de retirar de forma eficaz o trabalhador dessa desequilibrada e cruel situação. Isso significa apontar não apenas para o reconhecimento de seu valor e consequentemente da situação que está envolto, mas evitar o seu retorno a uma nova condição de exploração. No entanto, ao mesmo tempo, parece ser uma decorrência dessa forma de compreender a teoria kantiana a atribuição de um peso sobre o sobrevivente do trabalho escravo, o qual, em virtude dessas premissas passa a ser agente de sua própria busca e construção por emancipação.
Não obstante, não se deve negar a compreensão de que a lógica do trabalho escravo se insere como um elemento pertencente à estrutura econômica do país (PITZ; SOARES, 2022). Em meio a isso, vinculam-se os processos de autorreconhecimento, emancipação e autonomia à concessão de condições econômicas a esses sobreviventes. A dignidade e a noção de valor intrínseco, por sua vez, tentam ser restaurados sob remédios econômicos no campo da racionalidade jurídica.
Tal panorama, portanto, adequa-se ao entendimento de Fraser (2022) quanto à bivalência de situações de injustiça, as quais, sendo impossível a integral erradicação, dependem de um balanceamento para minimizar os seus prejuízos. Isso ocorre pois, se os remédios para injustiças político-econômicas perpassam por uma lógica de redistribuição, enquanto as injustiças culturais tocam a busca por reconhecimento, aqueles que sofrem de mazelas pertencentes a ambas as categorias necessitam estar sob o manto dessas contrastantes proteções.
É nessa lógica que o dilema quanto às políticas de erradicação do trabalho escravo contemporâneo se encontra, pois, apesar de sua carga sociocultural, marcada pelo debate quanto ao sentido do outro e do próprio ser, é com os olhos voltados para os remédios de natureza redistributiva que se nega o reconhecimento como elemento de centralidade para a dignidade desses sobreviventes. Assim, as previsões legislativas anteriormente expostas visam restaurar os danos causados a esses sujeitos, simplificando a autonomia na possibilidade ou não de trilharem novos caminhos no mundo do trabalho.
Frente a esse panorama, constata-se que, de fato, caminhos que cruzam a educação e a possibilidade de novas oportunidades a esses trabalhadores são de suma importância para a valorização de sua autonomia e efetivação do processo de emancipação, logo, não há a intenção de repudiá-los. Contudo, é na simplificação da forma de restauração dessa agência que se identifica uma lacuna na utilização de uma estrutura baseada na teoria kantiana. Como uma peça ausente entre o momento do resgate e o autorreconhecimento da dignidade, há uma aparentemente negligência quanto ao elemento central a ser tutelado: o reconhecimento do status de portador de dignidade desses trabalhadores.
Assim, observa-se que a aplicação da teoria kantiana como base das políticas de combate ao trabalho escravo gera o entendimento de que a retirada da agência de seres racionais impossibilita o seu autogoverno, sendo esse, portanto, o alvo das medidas reparadoras. Contudo, o que se traz como mote central de análise consiste no significado que essa conduta possui, pois é na mudança entre a percepção do indivíduo como um ser racional para a sua coisificação que há um processo de reconhecimento, o qual, para além de submeter o consentimento de alguém à vontade do Outro, atribui significados aos status de ambos os agentes.
2.2. J.M. Bernstein e uma nova proposta para a dignidade humana
É nesse ponto que o trabalho de J. M. Bernstein (2012) evoca pertinência, pois, embora defina a tortura e o estupro como ofensas morais paradigmáticas, a degradação e desvalorização intrínseca a suas composições são compartilhadas nas relações entre escravos e patrões, implicando no prejuízo da posição do indivíduo como humano. Isso porque a afirmação quanto ao valor intrínseco de algo ou alguém implica necessariamente um tratamento a ele correspondido, conferindo direitos de fazer e não fazer atos que o contradigam (BERNSTEIN, 2015).
Logo, subverter esse tratamento implica o surgimento de uma nova camada componente a essa conduta, a qual, além de não dever ter sido praticada, ao realizar a ação, diminui o valor que o objeto ofendido - neste caso, a pessoa - possui (BERNSTEIN, 2015). Com efeito, reorganiza ou evidencia os objetos que possuem valores assim como expressa um valor daquele que a realiza. (BERNSTEIN, 2015). É em meio a isso que, apesar de ambos serem pessoas e possuidoras de igual valor, o empregador escravagista exerce uma violência marcada por uma carga expressiva, posicionando-o como mais valioso que o trabalhador escravizado.
Diante disso, é nessa desigual relação que as atitudes ganham um aspecto legislativo moral, ou seja, declaram a errônea conduta como universalmente permissível, ao tempo que são expressivas de significados (BERNSTEIN, 2015). Dessa forma, criam-se hierarquias fincadas no valor dos agentes em relação ao significado transmitido em suas ações (BERNSTEIN, 2015).
Frente a isso, o dano intencional ao corpo físico também sustenta uma ofensa moral a ele ligado, a qual afeta o indivíduo em uma dimensão intrínseca, em sua personalidade, com força suficiente para romper esse elo (BERNSTEIN, 2012).3 Desse modo, a negação da agência racional aponta para uma lesão à moral marcada pela violência física, acompanhada da desvalorização ou negação do próprio fim em si mesmo, sendo o seu diferencial a intenção proposital em degradar o indivíduo (BERNSTEIN, 2015). Nessa relação de poder, a perda de controle não é a finalidade central da conduta, embora meio essencial a ela. Seu fim, portanto, é a devastação pela desapropriação radical e proposital pelo outro sobre o corpo que se tem e que se é (BERNSTEIN, 2015).
Somado a isso, a análise da dignidade a partir da percepção do sobrevivente, como elaborado por Bernstein (2015), retrata mais um ponto pertinente à presente análise: a agência é retirada sob um processo de reconhecimento do valor do sujeito, mas também é deturpada como mecanismo de autotraição. Em outras palavras, a perda de controle sobre o corpo e suas emoções possui tamanha dimensão ao ponto de, além da impotência, o sobrevivente passa a sentir-se como cúmplice de seu próprio sofrimento (BERNSTEIN, 2015). Desse modo, como instrumento de controle para o alcance da desapropriação dos corpos, a autotraição revela a seguinte vulnerabilidade: “o que não posso controlar me abre ao controle de outro” (BERNSTEIN, 2015, p.168, tradução nossa)4.
Nesse aspecto, a escravidão contemporânea se adequa por, além de manter traços da violência colonial, como as constantes ameaças, utilização da violência corporal e psicológica, coerção e lesão física, apresentar uma necessária submissão moral a sua execução (ALMEIDA, 2010).
É em consonância a isso que, ao estabelecer os fundamentos básicos que compõem essa conduta, Figueira (2004) aponta para características que, ao contrário do tipo penal, não se direcionam a externalidades e circunstâncias da prática dos serviços, mas aspectos subjetivos e interpessoais presentes nessas relações. Desse modo, são elas o tratamento do sobrevivente como mera mercadoria; o emprego de um poder, mesmo que temporário; a atribuição da posição de outsider; e, por fim, a sujeição física e/ou psicológica (FIGUEIRA, 2004).
Então, é partindo da objetificação do indivíduo, tornando-o espécie de propriedade de seu patrão, que, consequentemente, ele passa a ser passível de ser alienado, cedido ou quebrado. Essa é, para Figueira (2004), a característica mais antiga e basilar dessa violência, diferenciando-se por manter, além da dependência entre escravizado e escravizador, a alteração do valor atribuído ao sobrevivente, vez que este passa a não possuir mais valor humano, mas valor de mercado.
Assim, a escravidão contemporânea distingue-se por não fincar pilares exclusivamente na dominação de povos, raças e etnias - embora, ainda carregue fortes heranças dessa configuração, mas, também, na ânsia pelo lucro que a instrumentalização dos sujeitos estabelece suas dinâmicas (OLIVEIRA; ANJOS, 2019).
A escravidão por dívida, portanto, é um exemplo dessa dominação exercida sobre o sujeito sob a máscara da autonomia e liberdade. Dessa forma, a crueldade desta contemporânea configuração de trabalho escravo reside nas falsas esperanças suplantadas no imaginário desse sujeito, motivando-o a permanecer em tais condições a partir da ilusão de uma futura desvinculação com essa realidade, seja pelo pagamento da dívida ou enriquecimento próprio ou de sua família.
Ao colidir a concepção do trabalhador escravizado a uma noção de outsider, Figueira (2004), inspirado nos escritos de Norbert Elias e John L. Scotson (2000), ilustra que, a partir do aliciamento para o exercício desses trabalhos degradantes, a forma como ocorre o deslocamento entre o local de origem desses indivíduos, marcada principalmente pelo abandono de suas relações sociais e de afeto pretéritas para a complexidade do desconhecido, atravessa-os de forma profunda, afetando no âmago de seu ser a perda de tudo que lhe faz humano.
Esse cenário torna a submissão presente nessas relações ainda mais agressiva, tornando esses trabalhadores mais propícios à coação física e psicológica para o exercício de tais serviços e à permanência neste ciclo de exploração. Desse modo, seja pela responsabilidade moral ou pela coação, a escravidão por dívida, embora cerne da discussão desenvolvida por Figueira (2004) e elemento claro da tipificação penal, é bem classificada pelo autor como mero pretexto que materializa a motivação e obediência desses trabalhadores a essas vis condições, mas que, em realidade, é composto majoritariamente pela estratificação do corpo e da humanidade.
É nesse contexto que, assim como na tortura descrita por Bernstein (2015), no trabalho escravo, o sobrevivente possui sua existência reduzida ao bem querer de seu algoz, tornando-se dependente desse Outro, ao tempo que é fisicamente violada e psicologicamente devastada por ele. Por esse motivo, sendo a dignidade mais bem compreendida a partir de propriedades que levam a um status de existência e, por sua vez, vinculam-se a um comportamento específico e não, a partir de concepções abstratas (MATOS, 2019).
Logo, é nessa conexão entre as ilimitadas dores físicas e metafísicas pelas condições impostas aos trabalhadores que a teoria de Bernstein (2015) se demonstra uma atraente forma de interpretação dos casos envolvendo escravidão. É nessa dor que o sobrevivente é desassociado de sua agência, implicando na expressão de um significado necessário a essa forma de desvalorização. Assim, sob essa leitura, a ofensa moral que advém dessas práticas se volta para uma perspectiva do sobrevivente, pois é no impacto que o seu autorreconhecimento sofre ao se vincular necessariamente à forma com que o Outro o enxerga que a escravidão consegue ultrapassar os limites da mera conduta do escravizador, sendo lida através dos significados que o desamparo gerado por ela acarreta.
3. Da escravidão à perda de confiança no mundo
Dado o caminho argumentativo anteriormente traçado, o presente tópico perpassa pelos conceitos estipulados por Bernstein (2015) ao identificar no relato os efeitos das ofensas morais e a consequente retirada de força do sobrevivente do trabalho escravo frente ao mundo. Isso porque, quando se debruça sobre o poder que as ofensas morais possuem, observa-se o potencial devastador que abarcam, evidenciando que a união entre o dano físico e psicológico possui uma capacidade destrutiva do ser.
Sua diferenciação entre o conceito de instrumentalização do indivíduo, como perseguido pela teoria kantiana, consiste no fato de que a violência imposta ao indivíduo é tão extrema ao ponto de retirar e se apropriar de sua agência e voluntariedade. Nesse cenário, o sobrevivente torna-se uma existência abstrata, carente de limites ou defesas e, acima de tudo, movido apenas pela vontade de seu algoz (BERNSTEIN, 2015).
É a partir disso que nasce uma dependência entre esses sujeitos, a qual não pode ser superada com a mera emancipação econômica ou educacional, mas com medidas que tentem reparar um vínculo invisível e interno capaz de atribuir significados. Isso implica dizer que, assim como há o reconhecimento do ser humano pelo status de coisa, urgem-se medidas que restituam a ele o status de pessoa portadora de dignidade, dentro da limitação possível do trauma.
Pelo raciocínio acima exposto e a partir da leitura de Bernstein (2015), a dignidade se estabelece por uma dupla via composta de valores internos e externos. Isso implica dizer que o respeito à dignidade e, por sua vez, o reconhecimento do ser humano como humano, parte do autorrespeito e do respeito empregado pelos Outros, conciliando, a partir disso, a autonomia do sujeito a sua integridade corporal. Logo, é nesse processo de aplicação e atualização de valores sobre o corpo humano que a agência do sobrevivente é tomada pelo torturador, ou como aqui abordado, pelo seu escravizador. Retirando-se, portanto, qualquer voluntariedade presente em seu ser, restando-lhe apenas o desamparo sob a forma de sofrimento interno (BERNSTEIN, 2015). É nesse contexto que Sussman (2005) especifica que essas relações são compostas por uma assimetria, a qual ratifica a vulnerabilidade do ofendido e a sua impossibilidade de sair ou resistir a essa situação.
Há, dessa forma, a dissociação entre o corpo voluntário e involuntário, transformando o sobrevivente em apenas um “corpo abjeto” (BERNSTEIN, 2015, p.161).5 Assim, o que Bernstein denomina como a separação entre corpo voluntário e involuntário do sobrevivente a tais ofensas morais, gerando uma dependência entre esses dois sujeitos somada a uma condição de perda de confiança no mundo, a qual é elemento central e onde pretende-se chegar neste tópico (BERNSTEIN, 2015).
Isso ocorre, uma vez que o valor intrínseco do ser depende do outro para ser reconhecido, ou seja, a integridade corporal entendida como corpo em suas limitações, de modo intacto e livre de coação é a materialização da autonomia. Dada a necessidade de pensar esses limites conectados a uma corporificação, Larson (1993) vai além e os associa a áreas seguras de coação ou qualquer controle por terceiros.
Nesse sentido, a integridade corporal é por si só um limite humano capaz de evidenciar a sua própria fragilidade e dependência, pois cabendo sempre ao outro reconhecer a dignidade presente na autonomia corporal da vítima, é ele também passível de lesá-la (BERNSTEIN, 2015). Diante desse raciocínio, a vulnerabilidade em que um sobrevivente de trabalho escravo se encontra insere-se em um cenário, no qual as leis jurídicas e normas morais que deveriam protegê-lo são substituídas pela vontade de alguém que deseja devastá-los. Logo, o que se quer evidenciar é que a fragilidade humana é elemento essencial ao processo de reconhecimento do sujeito nas relações de escravidão, afetando não apenas o próprio sujeito em seu autojulgamento de valor intrínseco, mas a sua relação com o mundo.
Dessa forma, parte-se do silenciamento dos ofendidos como elemento primário e central a essa violência, pois é a partir dessa conduta que a vítima se desvincula a tudo que lhe é externo, tolhendo a verbalização e qualquer expressão que confronte a violação sofrida (BERNSTEIN, 2015). Dito isso, no caso da tortura, há a perda da “vontade linguística” do sobrevivente, evidenciando a tomada de controle pelo torturador e seus respectivos fins (BERNSTEIN, 2015, p.118). No estupro, em contrapartida, há a desconsideração do que é verbalizado, desconectando aquele que sofre a violência a partir da negação de sua interferência no mundo (BERNSTEIN, 2015).
Nos casos de trabalho escravo, todavia, as formas de silenciamento são mais dissipadas no cotidiano dessa violência, presentes na ofensa física e psicológica realizadas pelos aliciadores e na normalização do cenário de exploração, as quais são evidentes nas circunstâncias de trabalho forçado e a servidão por dívida. Em ambos os casos, o trabalhador é condicionado a permanecer naquela realidade sob a prática de agressões físicas e psicológicas, as quais são acompanhadas de ferramentas de silenciamento, como a impossibilidade de se comunicar com familiares, a retenção de salários ou dívidas ilegalmente impostas. Assim, as suas manifestações verbais de vontade passam a ser manipuladas e desconsideradas.
O discurso de “quase da família” que permeia o trabalho escravo doméstico também se demonstra como uma ferramenta verbal de manipulação da vontade dos sobreviventes (DUARTE, 2020). Nesses casos, para além das dimensões perpassadas pela discriminação de gênero e raça, tal falácia possui uma dimensão útil para os escravizadores, visando reduzir as custas legais das modalidades de trabalho doméstico, assim como a pacificação e normalização das condições em que essas pessoas são inseridas. Isso ocorre uma vez que, mesmo exploradas, as empregadas podem criar o vínculo com as famílias, o que disfarça a estrutura abusiva e faz com que seja dificultada a denúncia, visto o afeto ou pena de seus patrões (DUARTE, 2020).
Com efeito, o silêncio do trabalhador gera a culpa como um elemento presente nessa realidade, pois são dessas circunstâncias que nasce o sentimento de autotraição. Isso quer dizer que há a forçada perda de confiança no próprio corpo, destacando uma vulnerabilidade latente, visto que a ação do indivíduo deixa de corresponder a sua vontade (BERNSTEIN, 2015). Silenciado, o ofendido se encontra em uma forma particular de autotraição, a qual apenas a tortura e ofensas morais convergentes acabam por gerar o sentimento de cumplicidade com sua própria violação (SUSSMAN, 2005).
Por esse motivo, o longo período de exercício dessa prática é demandado. O sobrevivente substitui a ação de seu algoz pela vulnerabilidade da cumplicidade involuntária, levando não apenas à humilhação corporal, mas à devastação moral e, consequentemente, atingindo a devastação (BERNSTEIN, 2015).
Assim, a culpa se manifesta como o mecanismo de defesa pelo qual o sobrevivente confronta a si mesmo quanto à possibilidade de ter feito algo para evitar o ocorrido, sendo essa uma dor menor do que reconhecer a perda de confiança no mundo (BERNSTEIN, 2015). Por esse motivo, qualifica-os como sobreviventes.
O mesmo cenário se aplica ao sofrimento presente no trabalho escravo, haja vista que a restrição de possíveis ajustes por melhores condições de trabalho derivam da persistente sensação de fracasso, a qual, para Chehab (2020), se divide em negação ou racionalização do ocorrido. Na primeira hipótese, o ofendido não suporta nem admite o seu próprio sofrimento, haja vista ter sido parte ativa dessa mecânica. Por outro lado, racionaliza excessivamente como forma de amenizar sua angústia, medo e insegurança (CHEHAB, 2020).
Diante disso, é com a cada vez maior introversão do sujeito que Bernstein (2015) defende outros momentos como consequências do processo de devastação sofrido pelas vítimas de ofensas morais tão gravosas quanto o estupro e a tortura. A “morte social” ou “morte da alma”, como denomina (BERNSTEIN, 2015, p.119), ilustram a perda de controle do indivíduo em relação ao mundo, evidenciando a vulnerabilidade de seus limites e o abandono de si.
É nesse panorama que a pessoa se encontra em um desamparo existencial permanente, marcado pelo rompimento entre as relações do sujeito, a capacidade de determinar a si mesmo e, portanto, suas relações com o mundo em geral (BERNSTEIN, 2015). Diante disso, é a partir da violência sofrida, seguida da ruína com sua relação com o mundo que nasce uma dependência do outro para conseguir estabelecer uma relação consigo ou com o que lhe é exterior (BERNSTEIN, 2015).
A problemática, contudo, evidencia-se quando o único capaz de restabelecer esse vínculo é o próprio perpetuador de tal sofrimento, levando ao retorno dos sobreviventes à mesma realidade que um dia conseguiram fisicamente se desvincular. Assim, somado com a falta de oportunidades, é situação comum a temática da “reescravização” (CHEHAB, 2020, p.89).6
Perpassar por todas essas etapas oriundas da ofensa moral é necessário pois elas traçam o caminho para o conceito mais emblemático de Bernstein (2015) e que melhor define a violência sofrida por esses sujeitos: a perda de confiança no mundo. Isso porque esse estado do ser significa a incapacidade de sentir a segurança e importância no local moral ocupado no mundo, a sua participação moral no mundo e o formato dele para si (BERNSTEIN, 2015; BERNSTEIN, 2011).
Por isso, é possível afirmar que é nesse panorama que se observa a separação do corpo moral e do corpo físico do ofendido e a elevação do status de seu agressor, destacando a violação dos limites internos e externos ao corpo, carente de consentimento ou autoestima, restando-lhe apenas a vulnerabilidade, dependência e desamparo (BERNSTEIN, 2015). Para Sussman (2005), a perda desse elemento essencial se dá no fato que o sobrevivente é forçado a confiar no seu torturador, estuprador ou, nesse caso, escravizador para cessar tais atos quando suprida a sua necessidade. Assim, somado ao fato de que a fraude é elemento primário do trabalho escravo, a confiança se torna uma ideia absurda de dependência, a qual, uma vez perdida, impede que o ofendido se reconecte com qualquer outro elemento externo. Em decorrência disso, a sua devastação se perpetua em seu ser (BERNSTEIN, 2015).
Alcançar esse ponto possui importância, pois a confiança - ou sua ausência - é componente central ético da vida cotidiana desses indivíduos, sendo tal violência a mais grave a ser concebida contra alguém (BERNSTEIN, 2011). Diante disso, o fardo existencial da constante lembrança da dependência e vulnerabilidade remete o sujeito a uma vida de desconfiança generalizada (BERNSTEIN, 2011).
É a partir dessa ótica que se observa os efeitos do trabalho análogo ao de escravo, o qual a humilhação e constrangimento também se aplicam sob a necessidade de estabelecer a relação de ordem e obediência pelos escravizadores, assim, responsável por provocar os “sentimentos de impotência, frustração, submissão e servidão” (CHEHAB, 2020, p.93). Logo, é sintomático desse cenário o adoecimento psicológico desses trabalhadores, os quais tendem a apresentar patologias como síndrome de Estocolmo, estresse pós-traumático, depressão, síndrome de Burnout e até mesmo levá-los ao suicídio (CHEHAB, 2015).
Desse modo, o que se pretende demonstrar é que ofensas morais que lesam a dignidade, tal qual o trabalho escravo, são compostas por uma gama de relações e efeitos que afetam o autorreconhecimento do trabalhador como merecedor de dignidade. Dessa forma, submetido à devastação e estabelecida uma desconfiança no mundo, formas de contornar essa situação e restabelecer essa confiança não devem exigir uma via de reparação solitária ao sobrevivente. Logo, uma vez reprimidos em seu silêncio, a autonomia econômica ou educativa é medida fundamental, mas não o suficiente para reconectá-los com tudo que é externo. Para isso, o caminho estabelecido por Bernstein (2015) para lidar com as consequências da experiência traumática e a vulnerabilidade na dependência entre os sujeitos coloca sob foco uma nova via de possível recuperação do indivíduo a partir do que a ele é mais interno: o seu relato de sobrevivência.
4. Relatar para sobreviver
A tese de Bernstein permite observar que, para além dos efeitos práticos manifestados na existência dos indivíduos, a dependência gerada pelas relações afeta o direito - assim como o direito a afeta reciprocamente, implicando de forma direta na necessidade do Estado e instituições reconhecerem por quem e quais direitos são reivindicados (BERNSTEIN, 2018). Logo, é a partir da ciência da sua vulnerabilidade e de sua dignidade que as reivindicações por políticas públicas que se atentem aos processos anteriormente abordados sejam consideradas legítimas.
Quando se volta para a escravidão contemporânea, deve-se compreender que o caminho para a perda de confiança do mundo envolve uma ampla gama de fatores negligenciados, tais como gênero, etnia, raça e até mesmo grau de violência empregado para condicionar o indivíduo a tais atividades.
Em convergência a isso, Bernstein (2015) aponta para o papel da verbalização como forma de contornar essas invisibilidades que toma diferentes formas e os danos causados pelas ofensas morais, gerando uma possibilidade de reconexão com o mundo. Assim, busca-se uma forma de reunir o corpo moral e o corpo físico, ora dissociados, simultaneamente que “dizer para viver” (BERNSTEIN, 2015, p.121) se torna premissa essencial para findar a negação do reconhecimento abusivo e silenciamento desses sobreviventes.
Nesse sentido, o caminho apontado por Bernstein (2015) parte justamente da dependência em relação ao Outro para a tentativa de resgatar a confiança no mundo. Isso porque a possibilidade de destruição do ser pelo Outro também implica a preservação do ser por esse (BERNSTEIN, 2015). Desse modo, a recuperação da confiança no mundo pelos sobreviventes requer a externalização de sua experiência, mas também o estabelecimento de relações confiáveis e de mútuo reconhecimento da vulnerabilidade (BERNSTEIN, 2015).
Assim, mesmo se a confiança no mundo não seja restabelecida em sua integridade, é por meio dessas conexões baseadas na confiança que a vida posterior a essas experiências se torna possível (BERNSTEIN, 2015). Logo, o vínculo mútuo, basilar ao argumento de Bernstein, se mantém igualmente nesse momento, sendo possível inferir que se resgata não apenas a verbalização, mas, consequentemente, a escuta terapêutica como medida necessária para a restituição da dignidade do sujeito.
O trauma, portanto, extrapola a esfera psicológica e individual, sendo igualmente perpassada por uma noção coletiva e cruzada pela cultura, política e economia (SANTINHO, 2009). Diante disso, os relatos de trauma dependem de elementos necessários à sua construção, os quais Santinho (2009, p.141) classifica em: “narrativa factual dos eventos; significado cultural de trauma; revelações da experiência do trauma; relacionamento entre o narrador e àquele que escuta”. Somado a isso, a escuta deve se completar pela sensibilidade cultural, o que se entende pela empatia entre aquele que verbaliza e aquele que ouve, assim como a noção da dimensão sociopolítica e institucional que os cerca (SANTINHO, 2009).
Desse modo, confrontar o silenciamento do sobrevivente é o ponto de partida dessa perspectiva de análise, pois, embora coexista uma violência física, é no silenciar da vítima que o dano se volta contra ela, duplamente causada pela ação do agressor e o sentimento de autotraição.
Sem destoar desse raciocínio, não é novidade que campos do saber se fundamentam na verbalização e na escuta como formas de romper com o silenciamento vinculado ao sofrimento psicológico. Na psicanálise, por exemplo, Freud (1914), a partir da sintetização procedimental “recordar, repetir e elaborar”, aborda o processo de verbalização como forma de ultrapassar a resistência inconsciente e o impulso a partir da recordação do fato motivador. Na Psicodinâmica do Trabalho, simultaneamente, o desgaste oriundo do labor e a mutabilidade das relações trabalhistas são percebidos como parte essencial na qualidade de vida do sujeito, reconhecendo o relato sobre o sofrimento psíquico que advém dessas relações objeto de estudo e alvo de atenção (CHEHAB,2015).
Entre os sentimentos de frustração e a “pressão mental” sofrida pelos trabalhadores escravizados, Figueira, Prado e Palmeira (2021, p.29) destacam a necessidade de uma escuta cuidadosa e atenta ao relato dos denunciantes, mas visando estabelecer um vínculo de confiança, a fim de recolher o maior número de informações sobre o caso por eles apresentados. Logo, sem necessariamente fazer uso da visão que busca a recuperação do autovalor daqueles sobreviventes por essa via, aumentando a desconfiança nas instituições (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2021).
Somado a isso, a inexistência de uma forma adequada de acompanhamento desses sobreviventes para a organização e estabelecimento de diálogo, esvazia a aplicação de uma forma efetiva de resgate da dignidade e construção de uma resistência (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2021).
Esse cenário, marcado pela carência de artifícios necessários à aplicação do diálogo como forma de recuperação dos sobreviventes, se dá pela recenticidade da percepção do relato como ponto necessário e sensível à reconstrução da dignidade desses, inicialmente aplicado entre as décadas de 1970 e 1980, a partir da intervenção da Comissão Pastoral da Terra em casos de escravidão contemporânea (FIGUEIRA; PRADO; PALMEIRA, 2021).
Como reflexo, as áreas de abordagem dos planos de erradicação dessas condutas restringem-se principalmente à repressão, prevenção e inserção do sobrevivente na sociedade (MORAES; CHAI, 2020). Assim, o cenário pós-resgate torna-se cíclico, pois, ainda intrinsecamente vulnerabilizado, o trabalhador recai em novas dívidas ou não é devidamente assistido, tornando propenso a ser novamente aliciado (MORAES; CHAI, 2020). Frente a isso, a emancipação e restauro da dignidade não pode ser restabelecida apenas por um viés educativo ou econômico, vez que não abarca o reencontro com seus entes queridos, o enfrentamento ao sentimento de inferioridade e desprestígio social (CHEHAB, 2020).
Portanto, a ausência de reconexão pelo ato de relatar entre os sobreviventes e aqueles que circulam os seus núcleos sociais contribui para a permanência desses sujeitos em estado de desamparo e negação a continuidade de suas vidas. Isso porque a verbalização como ferramenta de sobrevivência, assim como o trauma, possui uma dimensão social. Desse modo, é na negligência com as histórias individuais que se dá a contribuição para o apagamento de uma história macro, que abarca o passado e presente da sociedade.
O que se quer dizer com isso é que as relações de reconhecimento implicam efeitos entre sujeitos, mas, simultaneamente, entre grupos sociais. Logo, uma ofensa ao valor intrínseco de um sujeito implica ofender a coletividade a qual pertence (BERNSTEIN, 2015). A fim de ilustrar esse entendimento, explica-se: quando o empregador julga como inferior a sua empregada doméstica e, por isso a submete a condições de escravidão contemporânea, para além da relação de reconhecimento entre os dois sujeitos, há uma relação de reconhecimento com o grupo, isto é, o sujeito, por seu ato, expressa que reconhece todas as empregadas domésticas como escravizáveis.
Frente a isso, o poder do relato como forma de sobrevivência também possui o papel de restaurar uma confiança coletiva no mundo, rompendo com a transformação dessas pessoas em meros dados estatísticos, números e índices. Relatar, e por consequente registrar o trauma, possui a função dar rostos a essas histórias de violência à dignidade.
Nesse sentido, a tese de Bernstein (2015) converge à ideia de abordar a dignidade humana a partir de contextos específicos e não, a partir de um discurso abstrato, pois é por meio da linguagem que os valores são empregados e modificados (MATOS, 2019). Logo, a dignidade encontra na linguagem um campo moral de necessário vínculo entre os sujeitos, vinculando o reconhecimento mútuo e as ações (MATOS, 2019).
Por outro lado, a dignidade sob a visão de uma moralidade institucional já abarca a seara de direitos, os quais os indivíduos possuem garantia por meio de políticas públicas (MATOS, 2019). Assim, evidenciando a necessidade em pensar políticas de combate ao trabalho escravo que não sejam fundamentadas apenas em coibir a execução individual dessas práticas, mas também voltadas para a recuperação dos sobreviventes e, para isso, englobando o relato dessas experiências traumáticas como ferramenta de mudança social. É a partir desse entendimento que Figueira (2004) identifica o relato como uma forma de resistência realizada por esses trabalhadores escravizados que, embora, coexista desde o momento de início dessas violências, possui sua força de intervenção na realidade ignorada.
Na mesma senda, Silva e Oliveira (2022) discorrem sobre o ensino quanto ao trabalho escravo a partir do relato e inclusão dos sujeitos residentes das comunidades rurais por eles abordadas em pesquisa empírica. Isso porque, para além da construção de uma percepção crítica sobre a temática, fazer uso do relato como mecanismo central de combate ao trabalho escravo permite o reconhecimento da realidade como próxima, seja em uma escala individual ou coletiva, e, consequentemente, a noção de pertencimento (SILVA; OLIVEIRA, 2022).
Com base nisso, medidas que visem à emancipação dos sobreviventes a partir de perspectivas exclusivamente econômicas ou por uma via educacional acrítica e tradicional, para além de não suprirem a perda de confiança individual no mundo do sujeito que passou pela escravidão, corroboram para uma percepção distanciada da problemática, a qual faz a sociedade sentir-se mera espectadora de circunstâncias estruturais a sua formação ou simplesmente ignorar a sua ocorrência. O relato, portanto, é uma forma de gerar o reconhecimento que essas pessoas merecem e tentar devolver a elas a possibilidade de uma vida digna.
5. Considerações finais
A presente pesquisa buscou confrontar a estrutura teórica comumente utilizada pela lógica de contenção e repressão ao trabalho escravo. Para isso, parte-se da obra de J.M. Bernstein (2015) a fim de identificar caminhos que abarque de forma mais completa a relação de reconhecimento entre trabalhador escravizado e escravizador, a ampla dimensão e efeitos da supressão da agência dos sobreviventes, e formas efetivas de recuperação dessa vida digna.
Dessa forma, reconstruiu-se a contribuição de Bernstein, sendo possível observar que a sua tese se apresenta como um degrau além da solidificada teoria kantiana da dignidade, basilar aos estudos sobre trabalho escravo contemporâneo. Nesse sentido, é possível constatar que as políticas públicas adotadas aos sobreviventes direcionam essas pessoas, já em elevado grau de vulnerabilidade, à responsabilidade de se emanciparem pela capacitação ou por uma via econômica. Torna possível observar, portanto, o esquecimento quanto ao dano sofrido por parte dos sujeitos resgatados ou vítimas no sentido proposto por Bernstein.
Destaca-se que esta pesquisa não critica a aplicação de medidas educativas, profissionalizantes, de moradia, previdenciárias ou econômicas, mas contesta a exclusividade dessas abordagens sob o discurso de resgate e emancipação do sobrevivente ao trabalho escravo sob uma via objetiva e procedimental. Logo, o que se almeja desenvolver consiste em uma via de recuperação do indivíduo resgatado, a qual, perpassando pelas noções de redistribuição e reconhecimento, destaque o seu valor intrínseco e o ratifique como objeto central de reparação, visto que dificilmente é capaz de se reestabelecer na ausência de medidas que almejam reconectá-los com o mundo. Dessa forma, o conceito de confiança no mundo, trabalhado neste artigo, é visualizado como um caminho à dignidade, o qual pode ser alcançado a partir da verbalização.
Diante disso, vislumbra-se que uma ética negativa, baseada no relato do sobrevivente, como abordado por Bernstein (2015), é de suma importância para a eficácia de medidas e compreensão adequada dos impactos causados na vida dos trabalhadores escravizados. Isso porque é a partir do entendimento de que a conduta tipificada como trabalho análogo ao de escravo é uma ofensa moral, que não apenas subtrai a agência, mas atribui significados sociais, como o fato de que o silenciamento das vítimas impacta diretamente em como se autovalorizam e como a sociedade as enxergam.
Nesse sentido, compreende-se que a solução proposta por Bernstein (2015), a verbalização, é aquela que toca no ponto primário do processo de devastação do sujeito, haja vista que, respeitando a necessária relação de dependência entre os indivíduos, o relato possui a capacidade de devolver a confiança necessária à vida. Isso ocorre uma vez que esses sujeitos precisam ter a sua posição como seres humanos igualados e, dessa forma, em mesmo patamar de vulnerabilidade, aptos ao reconhecimento mútuo como seres portadores de dignidade.
A partir disso, a presente pesquisa contribui para uma percepção da base principiológica e estrutural do procedimento de resgate de sobreviventes do trabalho escravo, voltando-se não apenas para os efeitos individuais causados por essas condutas, mas às implicações em escala macro, as quais permitem que a socialização do relato se manifeste como resgate histórico e, consequentemente, como uma chave de mudança social. Assim, não se reivindica o relato como mera etapa do amparo concedido a essas pessoas, mas uma nova forma de encarar amplamente a lesão à dignidade desses trabalhadores pelo trabalho escravo.
-
1
Em que pese a terminologia jurídica “trabalho análogo ao de escravo” estar consagrada na doutrina trabalhista e no próprio artigo 149 do Código Penal, acredita-se que se trata, na verdade, de um eufemismo para não reconhecer a existência de escravidão na contemporaneidade. Nesse sentido, não havendo a rigor diferença necessária, mas tão somente contingente, entre o trabalho análogo ao de escravo e a escravidão ou trabalho escravo, não se fará diferença entre esses termos neste estudo (OLIVEIRA; ANJOS, 2019).
-
2
Sem a pretensão entrar na discussão teórica acerca do significado do pensamento crítico, a dimensão da crítica, aqui, consiste na tentativa de justificar os critérios normativos ou princípios das instituições primárias da sociedade com necessária referência a duas dimensões da prática social: (a) experiências históricas de negação de pretensões éticas, morais e políticas no seio da sociedade, como, e. g., negação às mulheres dos direitos políticos, negação aos indígenas e quilombolas do direito à propriedade, negação à parcela da sociedade do direito à educação etc.; e (b) teorias sociais não-moralizadoras, que não apelam para defeitos na sociedade relativos às fraquezas subjetivas dos agentes ou responsabilidade, culpa ou qualquer tipo de sofrimento cristão ou pós-cristão, e oferecem um diagnóstico explicativo acerca das relações sociais injustificadas ou de dominação.
-
3
Lynn Hunt (2007) constrói tal elo na obra “Inventing Human Rights: A History” sob o argumento histórico da individualização dos corpos como paradigma da modernidade, portanto, elemento essencial a uma perspectiva dos direitos humanos baseado na simpatia, empatia e na noção de integridade corporal. Desse modo, a importância desse raciocínio consiste no entendimento dos direitos humanos baseado na corporeidade, ou seja, o meu corpo como meu e, por isso, inviolável por outrem.
-
4
No original: “Strata of involuntariness are at the same time dimensions of vulnerability: what I cannot control opens me to the control of another”.
-
5
As sociedades contemporâneas são formadas por sistemas de privacidade e ocultação capazes de regular a diferença entre voluntariedade e involuntariedade dos corpos, ou seja, os fenômenos corpóreos que possuímos agência ou não (BERNSTEIN, 2015, p.158). Assim, com base em processo civilizatórios, é dado ao que é involuntário e, portanto, socialmente indigno, um lugar fora da vista para ocorrer, ou um lugar adequadamente codificado como privado, não importa o quão público seja de fato (BERNSTEIN, 2015, p.158). Diante disso, Bernstein define “corpo abjeto” como consumação do desamparo existencial, oriundo do esforço do agressor em separar o corpo voluntário e involuntário de sua vítima. É nesse ato que a retirada de agência, poder e voluntariedade ultrapassam os limites corpóreos, levando ao indivíduo a movimentar-se conforme a vontade de seu algoz (BERNSTEIN, 2015, p.161).
-
6
O Observatório Digital do Trabalho Escravo no Brasil, plataforma mantida pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), registrou em seu último levantamento que 1,73% de 35.341 trabalhadores resgatados durante os anos de 2003 a 2017 eram sobreviventes reincidentes do trabalho em condições análogas ao de escravo (OIT, 2018).
Referências bibliográficas
- ALMEIDA, Antonio Alves de. Trabalho escravo: a dignidade dilacerada pelo capital. Revista Filosofazer, Passo Fundo, n. 37, jul./dez, p.115-140, 2010.
- BERNSTEIN, J. M. Trust: on the real but almost always unnoticed, ever-changing foundation of ethical life. Metaphilosophy, Nova Jersey, v.42, p.395-416, 2011.
-
BERNSTEIN, J. M. Torture. Political Concepts: a critical lexicon, v. 1, 2012. Disponível em: https://www.politicalconcepts.org/torture-j-m-bernstein/ Acesso em 18 de junho de 2022.
» https://www.politicalconcepts.org/torture-j-m-bernstein/ - BERNSTEIN, J. M. Torture and Dignity: an essay on moral injury Chicago: Univ. of Chicago Press, 2015.
-
BERNSTEIN, J. M. Rights. Political Concepts: a critical lexicon, vol. 4, 2018. Disponível em: https://www.politicalconcepts.org/rights-bernstein/ Acesso em 14 de junho de 2022.
» https://www.politicalconcepts.org/rights-bernstein/ -
BRASIL. Portaria Interministerial n.º 4, de 11 de maio de 2016 Dispõe sobre as regras relativas ao Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-interministerial-n-4-de-11-de-maio-de-2016-22906025 Acesso em: 20 de junho de 2022.
» https://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-interministerial-n-4-de-11-de-maio-de-2016-22906025 - CHEHAB, Ana Claudia de Jesus Vasconcellos. Mediação do sofrimento em trabalhadores resgatados do trabalho em condições análogas à de escravo Orientação: Profa. Dra. Lêda Gonçalves de Freitas. 2015. 93 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2015.
- CHEHAB, Ana Cláudia de Jesus Vasconcellos. Sofrimento psíquico no trabalho escravo: contribuições da psicodinâmica do trabalho. Revista eletrônica [do] Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, Curitiba, v. 9, n. 88, p. 87-99, maio de 2020.
- DUARTE, Isabella. Empregadas domésticas negras no cenário da pandemia: aspectos sobre a vulnerabilidade. Revista da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, [S.l], v. 24, n. 49, p. 75-92, out. 2020.
- FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.
- FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; PALMEIRA, Rafael Franca. A escravidão na Amazônia: quatro décadas de depoimentos de fugitivos e libertos Rio de Janeiro: Maud X, 2021.
- FORMOSA, Paul. Kantian Ethics, Dignity and Perfection Cambridge University Press, 2017.
- FRASER, Nancy. Da redistribuição ao reconhecimento. Dilemas da Justiça em uma Era “Pós-socialista”. In: FRASER, Nancy. Justiça Interrompida: reflexões críticas sobre a condição “pós-socialista” São Paulo: Boitempo, 2022; pp. 27-57.
- FREUD, Sigmund. Recordar, repetir e elaborar (1914). In: Obras completas - Observações psicanalíticas sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (“O caso Schreber”). Artigos sobre técnica e outros textos (1911-1913). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, v.10, 2010.
- GUYER, Paul. Kant Londres: Routledge, 2006.
- HUNT, Lynn. Inventing human rights: a history Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 2007.
- KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes Tradução: Paulo Quintela. Lisboa: Edições 70, 2008.
- KERVÉGAN, Jean-François. A instituição da liberdade. In: HEGEL, G. W. F. Linhas Fundamentais da Filosofia do Direito Trad. De Marcos Lutz Müller. São Paulo: Editora 34, 2022; pp. 27-105.
- LARSON, Jane. Women Understand So Little, They Call my Good Nature “Deceit”’: A Feminist Rethinking of Seduction. Columbia Law Review, Columbia, v. 93, 374-472, 1993.
- MATOS, Saulo Monteiro Martinho de. Dignidade Humana, Humilhação e Forma de Vida. Rev. Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 10, n.03, 2019, p. 1863-1888.
- MORAES, Vitor Hugo Souza; CHAI, Cássius Guimarães. Pandemia e trabalho escravo contemporâneo: repensando a reinserção do trabalhador resgatado a partir de uma política emancipatória. Revista de Direito Sociais e Políticas Públicas, Florianópolis, v.6, n. 2, p. 76 - 96, jul/dez, 2020.
-
OIT, Organização Internacional do Trabalho. Em 15 anos, 613 trabalhadores foram resgatados pelo menos duas vezes da escravidão 2 de fevereiro de 2018, Disponível em: http://www.ilo.org/brasilia/noticias/WCMS_616812/lang--pt/index.htm Acesso em: 14 de julho de 2022.
» http://www.ilo.org/brasilia/noticias/WCMS_616812/lang--pt/index.htm - OLIVEIRA, Jôyara Maria Silva de; ANJOS, Hildete dos Anjos. Trabalho escravo contemporâneo: a disputa ideológica na produção de um conceito. In: FIGUEIRA, Ricardo; PRADO, Adonia Antunes; GALVÃO, Edna Maria. Escravidão: moinhos de gentes no século XXI Rio de Janeiro: Mauad X, 2019. pp. 83-97.
- PITZ, Daniel Luiz; SOARES, Marcela. A responsabilidade do Estado na erradicação do trabalho escravo contemporâneo no Brasil. In: FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; MOTA, Murilo Peixoto da (Orgs.). Escravidão ilegal: migração, gênero e novas tecnologias em debate Rio de Janeiro: Mauad X, 2022.
- REZENDE JÚNIOR, José. Kant e o direito do trabalho. Revista Dissertatio de Filosofia, Pelotas, v.50, p.337-362, 2020.
- SANTINHO, Cristina. Labirintos do trauma: A verbalização do sofrimento nos refugiados em Portugal. In: PEREIRA, Luís Silva; PUSSETTI, Chiara (Orgs.). Os saberes da cura: antropologia das doenças e práticas terapêuticas Lisboa: Printipo, 2009, p.113-152.
-
SILVA, Thiago Delaíde. Dignidade e autonomia na filosofia moral de Kant Orientação: Prof. Dr. Marcelo Fernandes Aquino. 2020. 181 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) - Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2020. Disponível em: http://www.repositorio.jesuita.org.br/handle/UNISINOS/9164 Acesso em: 20 de junho de 2022.
» http://www.repositorio.jesuita.org.br/handle/UNISINOS/9164 - SILVA, Moisés Pereira da; OLIVEIRA, Jôyara Maria da Silva de. Significar o mundo: a educação histórica como perspectiva de enfrentamento do trabalho escravo. In: FIGUEIRA, Ricardo Rezende; PRADO, Adonia Antunes; MOTA, Murilo Peixoto da. Escravidão ilegal: migração, gênero e novas tecnologias em debate Rio de Janeiro: Maud X, 2022.
- SUSSMAN, David. What’s Wrong with Torture?. Philosophy & Public Affairs, Princeton, v.33, n.1, p.2-33, 2005.
- WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo São Paulo: Pioneira, 1967.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Dez 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
18 Mar 2023 -
Aceito
03 Mar 2024