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POR UMA ESTÉTICA DO EXÍLIO: HERCULE FLORENCE INVENTOR DE SI MESMO

HERCULE FLORENCE: INVENTION OF HIMSELF BY AN AESTHETIC OF EXILE

Resumo

Conhecido como um dos inventores simultâneos da fotografia, Hercule Florence (1804-1878) tornou-se uma personagem familiar à historiografia brasileira. O objetivo deste artigo é tratar da forma como Florence construiu um relato autobiográfico centrado na figura do exílio e da emigração a partir de seu manuscrito, publicado em fac-símile, L’Ami des arts livré à lui même ou Recherches et découvertes sur différents sujets nouveaux, dando destaque à sua narrativa da viagem fluvial empreendida no contexto da expedição Langsdorff entre 1825 e 1829. Minha hipótese é que Florence cria nesse manuscrito um roteiro e leitura de sua vida que recompõe um lugar de destaque ao artista, inventor, cientista e esteta perdido no interior do Brasil sem acesso ao reconhecimento que merecia. A lamentação pelo exílio justifica a posteriori a falta de reconhecimento, destacando a inovação e a qualidade de suas invenções no campo das artes e das ciências.

Palavras-chave:
Viagens; literatura de viagem; Hercule Florence

Abstract

Known as one of the simultaneous inventors of photography Hercule Florence (1804-1878) became a familiar character in Brazilian historiography. The purpose of this article is to discuss how Florence constructed an autobiographical account centered on the figure of exile and emigration from his manuscript, published in facsimile, L’Ami des arts livré à lui même ou Recherches et découvertes sur différents sujets nouveaux, highlighting his narrative of the river journey undertaken in the context of the Baron de Langsdorff expedition between 1825 and 1829. My hypothesis is that Florence creates in this manuscript a script and reading of his life that restores a prominent place to the artist, inventor, scientist and esthete lost in the interior of Brazil without access to the recognition he deserved. The lamentation for exile justifies, a posteriori, the lack of recognition, highlighting the innovation and quality of his inventions in the field of arts and sciences.

Keywords:
Travels; Travel Literature; Hercule Florence

1. Um esteta no exílio

O Brasil parece, às vezes, um país das Mil e uma noites 3 3 Voyage fluvial, In Florence, 2015, p. 330. .

Hercule Florence (1804-1878)4 4 Para dados biográficos de Florence cf.: Bourroul, 1901; Thomas, 2016; Vangelista, 2022. tornou-se atualmente conhecido no Brasil e no mundo pela descoberta simultânea da fotografia em princípios do século XIX, período em que viveu na recôndita Campinas5 5 Kossoy, 2006. , e por suas diversas invenções, como a poligrafia e a zoofonia, graças ao trabalho de Boris Kossoy. No entanto, a fortuna crítica de Florence como viajante não é muito extensa, embora as imagens que realizou no contexto da expedição Langsdorff tenham chamado a atenção de diversos pesquisadores6 6 Para as imagens de Florence remeto a: Borrego, 2021; Schiavinatto, 2017; 2021. . Entretanto, a experiência do deslocamento, da viagem e de sua constante migração até assentar-se em Campinas, processo de sedentarizarão que ele considerava um exílio, são imprescindíveis para a compreensão de sua trajetória7 7 Para uma das poucas abordagens de Florence viajante cf.: Carelli, 1994. . Meu objetivo aqui é recuperar a narrativa de viagem de Florence, a Voyage Fluvial, que ele compôs junto com outras narrativas autobiográficas, para compreender como a experiência da viagem e da emigração ao Brasil serviu para que ele se considerasse um artista inventor exilado. Esse conjunto de textos autobiográficos se intitula L’Ami des arts livré à lui même ou Recherches et découvertes sur différents sujets nouveaux, escrito e reescrito ao longo de sua vida8 8 Florence, 2015. . Este manuscrito é formado por uma diversidade grande de textos autobiográficos, científicos, relato de viagem, aparentemente desconexos, mas que constituem “um conjunto coerente, no sentido de traçar paisagens das regiões visitadas que não se limitam ao mundo natural como objeto, nem ao olhar como sentido. Paisagens naturais, sonoras e humanas - eis o traçado de Florence9 9 Hardman; Kury, 2004, p. 395. ”. O título define uma personagem e uma personalidade: a do amigo das artes, solitário, deixado à própria sorte no deserto de homens e ideias do interior paulista; e revela um investigador e inventor diversificado, descobridor de diferentes obras novas e interessantes às artes e às ciências.

Chiara Vangelista afirma na recente biografia sobre Florence que é difícil defini-lo, catalogá-lo e situá-lo geograficamente10 10 Vangelista, 2022, posição 4366. . Ele nasce num momento convulso da história no qual as fronteiras se movem continuamente e as nações se formam e desaparecem com velocidade. Sua cidade natal Nice pertence ao Ducado de Saboia, mas torna-se parte da França entre 1792 e 1815, quando é devolvida ao Reino da Sardenha, que sucede ao antigo Ducado de Saboia, e novamente cai em mãos francesas a partir de 1860. O pai de Florence é originário de Toulouse, na França, e a mãe de Mônaco, protetorado do Reino da Sardenha a partir de 1815, o que faz a nacionalidade de Florence oscilar entre a francesa, a monegasca, a sarda e a italiana depois da unificação11 11 Ibid., posição 318. . Como recorda Vangelista, Florence é produto “- podemos até dizer o filho - de uma sociedade em movimento”12 12 Ibid., posição 126. . A família viveu em Ventimiglia, na fronteira com a Itália, sob ocupação napoleônica, entre 1806 e 1807. Seu pai morre em outubro de 1807, em Mônaco, pátria de sua esposa, onde Florence mora por quase vinte anos, em um “pequeno principado em declínio”, uma monarquia de fronteira “abrangendo França e Itália e que articulava diferentes línguas, culturas e povos”13 13 Ibid., posição 4197. . Devido ao fato de que seu era pai francês e por escrever na língua de Racine, Florence foi considerado francês14 14 Estevam Leão Bourroul não deixa dúvidas em relação à nacionalidade francesa de Florence: “Em Nice, capital (chef-lieu) do departamento dos Alpes-Màritimos, a 29 de Fevereiro de 1804, no mesmo anno em que Napoleão foi proclamado Imperador dos Francezes, corôado e sagrado pelo Papa Pio VII, e creada a Ordem da Legião de Honra - nasceu Hercules Florence, a quem, dedicamos este singelo escripto, cuja memoria perdura na lembrança de seus contemporaneos, e cujo nome honrado e saudoso passará á posteridade, como o de um homem que relevantes serviços prestou á Patria, ás Sciencias, ás Letras, nobilitando a França, que lhe foi berço, e o Brazil, ao qual adoptára e servira, durante 54 annos, como filho dedicado, leal e ilustre (...)”. Bourroul, Op. Cit., p. 3. Mesmo o Principado de Mônaco é, para o autor, um território francês, não sendo mais “do que um prolongamento de Nice”. Ibid., p. 6. , embora em diversas ocasiões, recorda Vangelista, se declare sardo, sendo italiano para seus filhos15 15 Vangelista, Op. Cit., posição 427. . Segundo essa autora:

na época da anexação de Nice e Saboia à França, Florence solicitou a cidadania sarda no consulado do Rio de Janeiro e a obteve em poucos meses, em setembro de 1860. Assim, a partir da proclamação do Reino da Itália (17 de março de 1861), Florence tornou-se italiano.16 16 Ibid., posição 318. A autora tem a hipótese de que Florence não desejava ser súdito de Napoleão III, que era muito impopular entre os liberais como ele. Ibid., posição 329. Curiosamente, portanto, quando sua cidade natal se torna definitivamente francesa, ele pede a nacionalidade sarda, lembrando que até 1860 Mônaco, sua pátria materna e onde passa a infância e juventude, era um protetorado do Reino da Sardenha.

A partir de 1820 o jovem Florence dá vazão à sua pulsão pelo deslocamento, com uma malograda viagem a Antuérpia, onde vai buscar trabalho e fracassa, retornando a pé a Mônaco. O jovem Robinson Crusoé, como ele se autodefinia, personagem do livro que declara ter lido e ter sido uma inspiração para a sua paixão por viagens, não desiste e parte para uma segunda viagem. Embarca como marinheiro no Marie-Thérèse, em outubro de 1823, aos 19 anos, e chega ao Rio de Janeiro em 24 de maio de 182417 17 Thomas, Op. Cit., p. 24-26. . Ao fracassar como marinheiro, consegue trabalho na comunidade francesa da capital, como comerciante e tipógrafo, até se engajar na expedição Langsdorff em 1825. Durante a expedição, na passagem por Porto Feliz, conhece aquele que seria o seu sogro, Francisco Álvares Machado e Vasconcellos, pai de Maria Angélica. Na volta da expedição se casa com ela e acaba assentando-se até o fim de sua vida na cidade de São Carlos, futura Campinas, ilha deserta onde naufraga o decepcionado Crusoé. O casamento com Maria Angélica durou de 1830 até a morte desta em 1850. Em 1854 se casa com a imigrante alemã Carolina Krug, com quem funda, em 1863, o Colégio Florence, uma escola para meninas que foi referência de educação moderna em Campinas. Teve treze filhos no primeiro casamento e sete no segundo.

A sedentarizarão em Campinas nos remete a outro elemento da biografia de Florence, sua emigração ao Brasil. Para Komissarov, a resolução de deixar a França (em realidade ele deixa Mônaco e não a França) estaria ligada tanto “ao seu descontentamento com a Restauração como ao desejo de conhecer o Novo Mundo, que a mocidade europeia daquela época aureolava ao romantismo”18 18 Komissarov, 1994, p. 32. . Nessa leitura a emigração de Florence se dá por um desejo de aventura romântico, um impulso robinsoniano de busca de exotismo e emoção. No entanto, sua primeira emigração do pequeno rochedo monegasco se dá em direção à Bélgica, não às terras exóticas da América. Devido a que não é exatamente miserável e a ter alguma instrução e talento para o desenho, Florence não entra no cômputo da imigração dos miseráveis e famintos, aqueles que vinham lavrar como colonos ou parceiros as terras de café, podendo identificar-se, portanto, à aventura e à exploração; no entanto, é o filho menor de uma família empobrecida, que com a morte do pai e dos tios maternos não tem mais uma rede social que desse base a suas aspirações19 19 Vangelista, Op. Cit., posição 637. . Embora tenha emigrado em condições melhores do que os camponeses, Florence vem em busca de oportunidades que o pequeno país materno não lhe proporcionava e a grande nação paterna tampouco lhe oferecia. O seu primeiro casamento representou o enraizamento no Brasil e na elite política paulista, mediante a figura de seu sogro, líder local do Partido Liberal20 20 Marquese, 2016. . Dessa forma, o aventureiro republicano e abolicionista se entranha no mundo do escravismo monárquico brasileiro e o que era enraizamento se transforma num exílio. Exílio de um inventor e artista perdido em terras longínquas onde suas obras e invenções não são reconhecidas; e exílio de um antiescravagista que para sobreviver em sua nova pátria deve explorar o trabalho dos cativos para alimentar a sua numerosa prole.

2. O sepulcro do inventor

Em um século onde o talento é recompensado, a Providência me levou a um país onde ele é ignorado. Sofro os horrores da miséria e minha imaginação está repleta de descobertas. Nenhuma alma me ouve e não me entenderia. Aqui só valorizamos ouro, só lidamos com política, comércio, açúcar, café e carne humana. 21 21 L’inventeur en exil, In: Florence, 2015, p. 221.

Consciente da importância de sua descoberta depois que Daguerre assombra ao mundo com o mesmo invento que Florence havia desenvolvido nas remotas Campinas paulistas, ele era consciente também de sua invisibilidade ao não estar em um centro importante da Europa, perdido na periferia do capitalismo22 22 Ferreira, 2014. . Ele se percebe como um gênio, não apenas incompreendido, mas oculto em seu exílio americano; o sentimento de exílio perpassa toda a sua narrativa, como indica o título de um de seus textos, L’inventeur en exil, inicialmente pela distância da família e de seu país natal em seguida, pela invisibilidade de suas invenções e sua produção artística, desconhecidas por não serem produzidas num centro de civilização como Paris ou Turim23 23 Para uma análise de suas invenções cf. Rizzutto; Lee; Thomas, 2019. . Ao tratar de seu invento de uma técnica de impressão intitulada Poligrafia, ele reconhece que a distância da Europa impede a sua divulgação: “Exilado em uma terra cruelmente ingrata para as artes, minha descoberta ainda não atingiu a perfeição que ela promete”24 24 Florence, Op. Cit., p. 85. . Seu manuscrito autobiográfico descreve suas investigações e invenções, como a fotografia, técnicas de impressão, de papel-moeda, observação do céu para a pintura de paisagem, bem como sua narrativa de viagem fluvial do Tietê ao Amazonas, acompanhando a expedição Langsdorff, realizada entre setembro de 1825 e março de 182925 25 Sobre a participação de Florence na expedição Langsdorff cf.: Costa; Diener; Strauss, 1995; França, 2013; Komissarov, Op. Cit.; Manizer, 1967; Momeso, 2016. . Aparentemente desconexos esses diversos textos compõem uma narrativa com unidade e muito peculiar, tanto do ponto de vista da autobiografia quanto da narrativa viática. São uma mescla de memórias científicas, iconografia, escrita de si e literatura de viagem que compõem um mosaico narrativo coerente e estruturado, que elabora uma memória estética do exílio ou, como diz o autor, de “meu sepulcro de trinta anos26 26 Florence, Op. Cit., p. 361. ”.

Uma memória tanto estética quanto científica na medida em que Florence se compreende como artista inventor, cujos destinos foram a deambulação de navegante pelo mundo, em viagens marítimas ou fluviais, e a invenção de instrumentos de aperfeiçoamento artístico e estético. Os dois destinos estão intimamente intrincados: o viajante desejando um constante deslocamento e o desterro da emigração, chamado incessantemente pelo alhures, pelo mar, produz sua arte por meio de uma estética do exílio, de um não-estar no mundo que lhe permite ver realidades alternativas, territórios desconhecidos que produzem estímulos novos e inéditos, ao custo de tornar-se uma personagem encoberta. A identificação com Robinson Crusoé e as frequentes alusões ao exílio27 27 Ferreira, Op. Cit., p. 154. demonstram como Florence situa sua experiência na solidão do autor “livré à lui même”, deslocado em relação a sua pátria e criador de uma obra solitária, um amigo das artes que se sacrifica pelas musas. Um self made artist, interlocutor entre dois mundos, o da paisagem brasileira, rústica, virgem, inexplorada e um campo aberto de possibilidades, ao qual ele não deixa “de se arrepender de ter vindo (...) onde não encontro mais do que uma indiferença completa pelas artes28 28 Florence, Op. Cit., p. 117. ”, e o mundo civilizado da velha Europa que ele abandona em fastio. Sua solidão é o sacrifício necessário para ser o mediador entre esses dois mundos ainda não totalmente conectados. Diferentemente da maioria dos viajantes, Florence ao viajar pelo interior do Brasil já estava estabelecido no país de forma mais ou menos permanente. O Brasil é um espelho de alteridade para o viajante, e Florence constrói sua identidade como europeu e artista, por isso o sentimento de exílio, de inadequação, de enterro em vida que transparece em seus escritos iniciais. Com o tempo, Florence já estava assentado no Brasil, a narrativa abandona o sentido do exótico para construir uma personagem mediadora, um sábio especialista que oferece o conhecimento de um mundo distante produzido por um estrangeiro adaptado à paisagem desse mundo a ser contado e explicado. O exílio, portanto, deixa de ser uma sepultura para tornar-se uma possibilidade de reconstrução do eu do viajante.

A partir do século XIX uma nova personagem aparece na literatura de viagem, o escritor de profissão, um literato que viaja para escrever a partir de experiências estéticas ou interiores29 29 Antoine, 2011, p. 15. . A subjetividade compõe a descrição do mundo e sua compreensão, dessa maneira, decorre a relação da literatura de viagem com a autobiografia e a autoficção30 30 Ibid., p. 29-30. . Este viajante literato inocula no gênero, mesmo nos cientistas, burocratas e negociantes que viajam pelo mundo e traduzem sua alteridade por meio da narrativa, o complicador da literatura e do ficcional ou, se quisermos chamar de outra forma, da interioridade como instrumento de produção de conhecimento do mundo. Dessa forma, “a função do discurso não desaloja, mas sim se impõe à função referencial31 31 Depetris, 2007, p. 93. ”. Ou seja, essa intromissão do poético na narrativa referencial do espaço e da sociedade, da compreensão do Outro, produz uma mímesis já não referencial, mas poética, que “registra a realidade na ficção. Assim, frente à mímesis referencial, esta mímesis poética define uma nova verdade32 32 Ibid., p. 95. ”. Florence não é um literato nem se apresenta como tal, mas sim como um esteta, um inventor artista que utiliza os instrumentos da literatura e da ficção para construir uma personagem que dá sentido à sua trajetória de vida. Uma vida que narrativamente se constrói entre a ciência e as artes, ou melhor dizendo, uma ciência voltada para as artes. Essa narrativa coloca em perspectiva a história do sábio e do esteta isolado na América; embora revele ressentimento pela ausência de reconhecimento de suas descobertas e de sua obra, Florence constrói um lugar próprio como esteta da paisagem brasileira, revelando-a por meio de suas invenções, descrições e desenhos, um guia do mundo exótico e um testemunho de primeira mão do sábio que adotou, com sacrifício, essa terra distante como morada.

Mesmo na descrição da paisagem o poético e o subjetivo são elementos constitutivos da narrativa; dessa forma, a paisagem brasileira é parte e cenário desse exílio, ao mesmo tempo que oferece uma compensação estética a Florence. Por isso, ele pode propor um impressionante e belo “atlas pitoresco dos céus” para uso dos pintores paisagistas que mesmo das grandes cidades, sem terem que deslocar-se ao campo, podem ter à mão uma paleta de céus pitorescos e inéditos do Brasil central disponível para seu uso33 33 Florence, 2010. ou suas conhecidas experiências sobre a voz dos animais, cuja ideia afirma “foi-me sugerido pela impressão do que vi quando cruzei vastos desertos, imensas florestas e quando naveguei pelos maiores rios da América meridional34 34 Id., 2015, p. 82. ”. Sua experiência pelos desertos sul-americanos, que é como ele define o Brasil central e suas florestas, permite torná-lo um especialista útil às artes e às ciências, já que ele é um espectador privilegiado de um mundo desconhecido: “eu era um espectador de uma natureza mais majestosa que me apresentava a realidade do belo ideal35 35 Ibid., p. 160. ”. Uma experiência compartilhada por muitos viajantes que superam limitações de riqueza, origem social ou gênero ao se apresentarem como especialistas de um território desconhecido, como Ferdinand Denis, especialista numa literatura tropical a partir de sua experiência no Brasil36 36 Rouanet, 1991. , Frédérick de Waldeck, tornado sábio conhecedor das antiguidades maias no Iucatã37 37 Depetris, 2014. ou Isabelle Eberhardt que se apresenta como autoridade em relação ao deserto argelino e ao sufismo38 38 Chouiten, 2015. . Deslocados em sua Europa natal, premidos pela pobreza, escassez, limitações de gênero ou simplesmente atraídos pelo desconhecido, muitos viajantes são impelidos a viajar para escrever narrativas de viagem e para reescrever suas biografias, revelando mundos desconhecidos e tornando-se autoridades em determinados territórios.

Diante da invisibilidade do interior paulista na primeira metade do século XIX, Florence transforma o exílio em possibilidade, em descoberta, e a paisagem brasileira em um campo de possibilidades técnicas e artísticas que o tornam um gênio em potência em busca de visibilidade. O exílio é um grande indutor de narrativas e tem uma relação estreita com a literatura e a escrita; ele produz “conhecimentos mais vastos e significativos”39 39 Guillén, 2007, p. 50. . Para Ovídio, Dante, Camões, Rousseau, Mme. de Staël, Chateaubriand, Conrad, o exílio promoveu diversas obras literárias e narrativas de viagem, e não é apenas uma adversidade, mas “uma forma de ver o mundo e sua relação com a pessoa” que faz com que “uma espécie de experiência humana se tenha incorporado no devir da literatura”40 40 Ibid., p. 59. . A grande mudança da literatura e das narrativas de viagem do século XIX será, como vimos anteriormente, a intromissão da subjetividade do autor na descrição do mundo, processo que para muitos se inicia com Chateaubriand e que será provocado justamente por sua emigração e exílio41 41 Ibid., p. 71. “Os emigrados e outros proscritos, como se lhes vêm chamando, contribuem significativamente a tudo o que o Romanticismo terá de descontinuidade, diante das tradições da literatura europeia e, ainda mais, diante do conceito de cultura como conservação, incremento ou aprazível enriquecimento de si mesma. ‘A mudança da literatura de que se vangloria o século XIX’, escrevia o próprio Chateaubriand, manejando com toda naturalidade a ideia de mudança nesse contexto, ‘lhe veio da emigração e do exílio’”. Sobre o papel de Chateaubriand e suas viagens na constituição da literatura de viagem do século XIX, cf.: Guyot; Le Huenen, 2006. . Chateaubriand inicia, com Mme. de Staël, ambos exilados e viajantes, a literatura do intelectual dissidente, deslocado, político, reivindicativo e insatisfeito que utiliza a viagem como ato iniciático de rebeldia e como instrumento de crítica do mundo, de analogia e comparação, que permite dar densidade a seus julgamentos. A experiência do exílio e da emigração, as duas experimentadas por Florence, compõem o que Claudio Guillén chama de “estranhar-se, este extrangeirizar-se, este alienar-se’” que experimentam muitos desterrados que descobrem em terras estrangeiras “um mundo novo, surpreendente e talvez estimulante”42 42 Guillén, Op. Cit., p. 91. . Seja um estímulo de descoberta do novo e do desconhecido, seja uma elaboração da nostalgia da pátria perdida, seja ela qual for no caso de Florence, ou das ilusões perdidas de um envelhecido Crusoé, o L’ami des arts, esse mosaico de experiências científicas, de viagem e autobiografia, é o laboratório no qual o artista exilado produz os remédios de sua melancolia.

3. A paisagem cultural do Brasil no olhar do exilado: os céus, os rios, as cidades

Um pintor pode estar infeliz, isolado, mas a visão do céu acompanha-o mesmo no exílio mais ingrato para a pintura (…)43 43 Etudes de ciels, à l’usage des jeunes paysagistes, In : Florence, Op. Cit., p. 80. .

Em seu nono estudo sobre os céus do paisagista, o Céu de Tempestade (Ciel d’orage), Florence ressalta a sublimidade das paisagens montanhosas, dos picos perdidos entre nuvens, gargantas e precipícios profundos e obscuros, rochedos escarpados como se fossem habitados por gigantes. Semelhantes aos Alpes, aos Pirineus, ao Piemonte, as montanhas de Cuiabá lhe recordam “ruínas de uma grande cidade onde gostava de ver túmulos, colunas, urnas, muros coroados de jardins, arcos de triunfo, fortalezas etc.44 44 Florence, Op. Cit., p. 168. ”. Há uma teatralização da paisagem, uma noção de assombro que a natureza oferece ao homem e que é revelada pelo artista. “A natureza se configura como um esplêndido espetáculo; os céus, que se modificam continuamente, oferecem uma contemplação superior e conduzem ao belo ideal revelado45 45 Coli, 2010, p. 144. ”. A paisagem dos arredores naturais de Cuiabá é descrita entre um lócus mitológico, povoado por gigantes e heróis, e uma natureza descrita por meio da alegoria de ruínas clássicas em meio ao Brasil central. Nessa paisagem cultural elaborada por Florence não são os acontecimentos históricos, as civilizações que transformaram a paisagem o que determina a qualidade desse espaço, mas é a ligação entre dois mundos elaborada pelo viajante mediador: o pitoresco das ruínas europeias transportadas pictoricamente à América e o Sublime das tempestades tropicais que “se apresentam sob [um] aspecto ameaçador46 46 Florence, 2015, p. 169. ”. Como diria Michelet47 47 Histoire de La France, Apud FEBVRE, 1995, p. 203. é o milagre de dois mundos que colidem, representados por uma proposta estética nascida do exílio e do deslocamento do pintor que une a imagem mental e cultural da Europa abandonada e a grandiosidade da natureza intocada apreendida pela viagem. Cuiabá lhe permite, não enquanto cidade, mas enquanto paisagem cultural, estabelecer um vínculo entre o mundo descrito, o Brasil central, e o mundo a quem descreve, o leitor culto e/ou europeu.

Em sua zoofonia, o estudo dos sons dos animais baseado na notação musical, à paisagem se agregam os sons da natureza, numa perspectiva útil à história natural, mas sobretudo, à composição estética de seu exílio. Trata-se de uma leitura da paisagem que está atenta a suas diversas nuanças, pertencendo “à linhagem dos estudos de paisagens de Humboldt, que buscava apreender a especificidade e o caráter próprio de cada lugar48 48 Kury, 2014, p. 194. ”, recuperando pelos sons da natureza a interação entre os seres vivos49 49 Ibid., p. 178. . A paisagem no manuscrito de Florence está desenhada, descrita, sonorizada, os céus estão mapeados num atlas pitoresco e as montanhas se transformam em uma arquitetura onírica. À vista de um palácio ou arco de triunfo, a alma “se preenche com a nobreza do homem”. Apesar disso, o errante navegante não se sente menos transportado em meio às montanhas de Cuiabá: “Pensei ter visto ruínas de tumbas, urnas enormemente grandes, colunas, pedestais e entablamentos. Colinas inteiras me pareciam cobertas de ruínas antigas, e a sombra das florestas parecia preservar o luto sobre essas ruínas”. E se numa paisagem culta a música transporta a alma para um lugar de elevação, “o concerto dos pássaros, os gritos dos animais, me trazem de volta às belezas da natureza50 50 Florence, 2015, p. 176. ”. O homem europeu só pode conceber o espaço histórico das ruínas e da arquitetura clássica, com colunas, pedestais e estátuas; o homem da América meridional só pode conhecer as grandezas da natureza e os sons incontroláveis que ela produz; já o viajante mediador nessa zona de contato entre dois mundos compõe sua própria canção do exílio, com sons da natureza, da sinfonia e das montanhas travestidas de classicismo, com um catálogo de céus ao uso dos pintores, narrando um mundo novo, uma síntese cultural representada por uma paisagem sinfônica.

Esse exílio não lhe foi totalmente imposto, já que a leitura de Robinson Crusoé deu-lhe o gosto pela geografia e pelo mar, o que trouxe-o ao país das ruínas de não mais de duzentos anos, próprias de um país que se ocupa da mineração “no qual não se encontra nada que seja duradouro51 51 Ibid., p. 408. ”, e florestas virgens que datam da criação do mundo52 52 Ibid., p. 251-253. . Esse desejo de alhures faz com que Florence aceite participar da expedição Langsdorff ao interior do Brasil em 1825 para navegar pelos mares interiores da América do Sul até a Amazônia, abandonando o trabalho sedentário que tinha no Rio de Janeiro. “Quantas sensações experimentamos quando viajamos!53 53 Ibid., p. 340. ”, exclama o esteta em alusão ao deslocamento e à descoberta da paisagem como um remédio para os males de seu desterro. O esteta em exílio era também um marinheiro em exílio, assim a navegação fluvial com Langsdorff recupera a experiência do oceano de sua juventude: o rio Paraguai será para ele um Mediterrâneo fluvial54 54 Ibid., p. 376. ; no rio Paraná, na embocadura do Tietê, a “vista desta planície de água e desta costa distante, lembrou-me a sensação que se experimenta no mar, ao avistar uma costa onde se deve aportar”. Nesse momento o exilado se permite uma digressão sobre a margem, sobre o abordar uma costa, que lhe desloca do Brasil central às margens mediterrâneas de sua pátria distante, que lhe faz sonhar estar “em meio a esse povo espiritual”. Sentimento de saudades da pátria que ele afirma, anos mais tarde ao revisar seu diário, não ter experimentado naquele momento, quando se contenta por encontrar, em pleno século XIX, “o homem primitivo, como ele deve ter sido após sua queda fatal, nas primeiras eras do mundo55 55 Ibid., p. 315-316. ”. Aqui convergem o leitor de Rousseau e o homem devoto, espiritual, que encontra na natureza brasileira um conforto pela distância da pátria e da família que o exílio brasileiro impõe ao proporcionar-lhe uma confirmação da teoria do bom selvagem e, portanto, uma promessa de felicidade nos rincões da América do Sul. E em 21 de abril de 1828, depois de dez dias entre os Apiacá, na confluência dos rios Juruena e Arinos, conclui “esse homem ainda pode ser feliz no estado selvagem56 56 Ibid., p. 454. ”. Isso talvez o conforte pela distância em relação à civilização que ele abandonou ao cruzar o oceano.

Além de um grande observador da natureza primordial do Brasil, Florence é sempre atento à paisagem cultural e social perceptível em suas vilas, cidades e nas relações sociais que se estabelecem nesses espaços, como a escravidão. Para ele, a cidade é um elemento fundamental para compreender uma civilização, é um lócus da convivência social e política, não é apenas uma ville, no sentido de um espaço construído e um artefato arquitetônico, mas uma cité, uma organização social e política na qual os homens vivem em sociedade, na qual constroem um pacto social. Na literatura de viagem a cidade é sinônimo de civilização, e sua ausência, junto com o domínio da natureza, implica uma determinada leitura da sociedade brasileira57 57 Cf. Torrão Filho, 2019. . Algumas informações e lugares comuns da literatura de viagem estão presentes em suas descrições, como a observação de que o Brasil estava formado por deportados e aventureiros ou de que os paulistanos eram inimigos jurados do ângulo reto ao construírem todas as suas ruas tortas58 58 Florence, 2015, p. 277-278. . Mas sua observação também lhe permite defender suas ideias sociais ao fazer o elogio do mutirão, trabalho coletivo feito por trabalhadores que não tinham escravos, “um exemplo de trabalho atrativo59 59 Ibid., p. 280. ”, sobretudo para um autor que, nesse momento, é um crítico ferrenho da escravidão. O trabalho constrói uma sociedade e para um abolicionista como Florence o trabalho, no caso do Brasil, seja livre ou escravo, é a forma como essa sociedade se organiza e produz desigualdade. Uma desigualdade que ele acaba assumindo ao se tornar um fazendeiro em Campinas e não manifestar publicamente suas opiniões antiescravistas. “O exílio escravista no Império do Brasil moldara por completo o artista-inventor antiescravista60 60 Marquese, Op. Cit., p. 16. ”.

É possível acompanhar o desenvolvimento da civilização brasileira a partir do roteiro de sua viagem, saindo das ruas tortas de São Paulo, passando pelo trabalho comunitário de Jundiaí, a sociedade nascente em São Carlos, ou Campinas, as belas igrejas de Itu, a hospitalidade aberta de Porto Feliz, onde seu futuro no Brasil se decidirá. Saindo da Província de São Paulo as águas e terras virgens cobertas de floresta tomam conta da paisagem, e a sociedade civil, organizada, se torna mais rara. E ao chegar ao sítio de Pederneiras, depois de Pirapora, passada a última casa “começa o deserto”, território dos selvagens, das onças61 61 Florence, 2015, p. 291. , onde estão ausentes a civilização e a paisagem humana. Nessa zona de transição entre São Paulo e o “deserto”, Florence distingue entre a hospitalidade e a Civilização; a primeira não tem a mesma importância na história dos povos que tem a segunda, “mas é uma virtude, e uma virtude dos velhos paulistas, que ainda conserva seu vigor às margens do Tietê62 62 Ibid., p. 293. ”. Uma virtude de povos em formação, ainda canhestros em sua civilização, mas que é uma promessa contra a violência que engendra uma sociedade formada pela aventura e pela cobiça, como dirão mais tarde os sábios paulistas Paulo Prado e Sérgio Buarque de Holanda, cada um à sua maneira, ambos informados por esses viajantes curiosos.

Adentrando o deserto verde da floresta, a paisagem natural faz as vezes de ruínas, da monumentalidade das velhas cidades e da arquitetura e da arte; a descrição pitoresca que preza tanto a beleza dos monumentos antigos e das ruínas de velhas civilizações tomadas pela natureza circundante, indicando a passagem do tempo e a permanência dos vestígios da passagem do homem pela Terra, não encontra no Brasil esses restos solenes pela juventude de sua cultura. Na ausência dessas antigas civilizações, Florence utiliza a particularidade da natureza brasileira para pensar numa sexta ordem da Arquitetura intitulada Ordem Brasileira ou Ordem Palmeana, baseada na vegetação brasileira, como a palmeira Guacuri63 63 Ibid., p. 310-311; p. 400. . Diante da catarata de Itapura, Florence se deleita com sua beleza e descreve-a como se fosse uma vista de cidade portuária: “podemos descrever a entrada de um belo porto, uma colunata circular, uma arena, bacias, parques arredondados”. No caminho da vila de Guimarães à mina do Quilombo, um conjunto de rochedos, semelhantes a torres quadradas, lhe recordará a cidade de Eza, perto de Nice, “situado como um ninho de águia, no cimo de uma montanha escarpada, com a diferença que em vez de casas, cremos ver um conjunto de pequenas torres64 64 Ibid., p. 401. ”. Se em Roma ou Atenas um viajante pode nos falar do Coliseu ou do Partenon, Itapura é uma maravilha indescritível, “um circo encantador de patamares de cristal e neve em movimento que teria inspirado a Camões a ideia de um Ateneu das suas Divindades fluviais65 65 Ibid., p. 313. ”. No acampamento em meio à floresta às margens do rio Coxim, “nossas barracas, nossas redes e nossas canoas, formam na terra e na água uma cena de movimento, enfeitada com uma floresta arquitetônica66 66 Ibid., p. 340. ”. Nos arredores da vila de Guimarães, diante de uma natureza que fala uma língua até então desconhecida, os rochedos nos fazem pensar em ruínas de “monumentos e bastiões erguidos por uma raça de arquitetos gigantes. Palmira e Balbek, aparecendo de repente para o viajante que acabou de cruzar desertos arenosos, naturalmente vêm à mente67 67 Ibid., p. 388. ”. Essa natureza arquitetônica constrói no coração do Brasil uma paisagem cultural produzida não apenas pelas mãos do homem, mas por uma potência criadora, que o sábio viajante revela por meio de sua pena a um público leitor que não reagiria com menos do que assombro diante dessa novidade sublime. A cidade está presente mesmo em sua ausência, a natureza se transforma em paisagem cultural ao ser transformada em arquitetura, torres, bastiões, uma “floresta arquitetônica” que humaniza, culturaliza e transforma em arte a paisagem.

Há uma culturalização da natureza brasileira nas descrições e imagens de Florence, a construção de uma paisagem cultural que antropomorfiza o mundo natural e torna a floresta um grande cenário arquitetônico; o tempo histórico é substituído pelo tempo natural, geológico, as formas artísticas são substituídas pelas formas naturais e a paisagem prefigura uma civilização cujo tempo é natural, mas que antecipa uma cultura embrionária, em construção. A natureza propicia também ao esteta em exílio uma matéria artística a ser desenvolvida e reconhecida pelo seu olhar agudo de artista, um espaço que ele elabora retirando dessa natureza primigênia um objeto de arte. Dessa forma, Florence representa as jovens cidades brasileiras de forma pitoresca, mas emolduradas pela natureza sublime. Na sociedade em formação a pequenez das vilas e cidades é compensada, para o artista, pela situação pitoresca de uma natureza luxuriante que se torna um motivo pictórico que destaca e dá importância às pequenas vilas e cidades brasileiras circundadas por uma floresta arquitetônica. Um bom exemplo é a descrição que ele faz, em 30 de abril de 1828, da cachoeira de São João da Barra:

um vasto abismo branco onde o rio cai com um estrondo, onde a espuma borbulha e ruge em massas vivas que colidem como se se devorassem, produzindo um denso vapor que sobe em seis colunas de alvura deslumbrante, e se dissipa no ar”. Assim ocorre com mais duas outras quedas. A cachoeira é ladeada por uma ilha fluvial “[c]ercada por precipícios líquidos, ondas tão grandes quanto as do oceano

Inabordável e quase submergida pela espuma branca da cachoeira, coroada por uma floresta de grandes árvores68 68 Ibid., p. 463. . Abismo, espuma caudalosa, massas vibrantes de colunas deslumbrantes, tão poderosas como as ondas do mar. O frustrado marinheiro retorna à experiência da navegação marítima, ao mesmo tempo revela um mundo admiravelmente novo, ainda não pisado pelo homem, mas a ponto de ser conquistado pela civilização que o espreita. A experiência sublime se completa com uma inesperada cruz de vinte pés de altura às margens do rio onde estão a cachoeira e a ilha, que recorda quarenta pessoas enterradas ali, vítimas das Sezões, as febres do sertão, “a fim de cobrir estes mortos e esta terra, com um respeito religioso”. A cruz recorda o perigo grandioso dessa natureza virgem, um sentimento que “aumenta aqui com o barulho e as convulsões da catarata; e a presença da morte não é um dos traços menores desta imponente natureza69 69 Ibid., p. 464. ”. Diante dessa natureza tão imensa, assombrosa e extraordinária, o esteta parece sentir-se menos exilado do que estará em Campinas.

No caminho fluvial em meio à floresta, os portos e as cidades são sempre uma esperança de alívio das agruras da viagem e um espaço para usufruir dos confortos da civilização. Entretanto, a chegada a Cuiabá em 30 de janeiro de 182770 70 Sobre a descrição de Cuiabá cf.: Martins, 2022, p. 32-59. , que prometia oferecer o movimento de uma cidade não lhe revela mais do que um punhado de casas e um pequeno porto. Uma igreja e a caserna de São Gonçalo não estavam acabados e já se encontravam em ruínas, “antes de terem sido usados”. Ainda assim a rua do porto com pequenas casas térreas é circundada de tamarineiros e laranjeiras nos jardins, e “a cidade se apresenta sob um aspecto sorridente”. Os edifícios públicos, como a catedral, a casa de fundição, a prisão, a casa da câmara e o palácio do governo não têm nada de admirável. O movimento que o viajante esperava encontrar numa cidade é inexistente, não há quase pessoas nas ruas, “o que não é surpreendente em uma cidade cercada por imensos desertos71 71 Florence, 2015, p. 372-373. ”. No entanto, o viajante apresenta ao leitor uma promessa de futuro, uma informação inédita e única: “Eu vim para ver uma cidade menos conhecida na França e na Inglaterra do que Tombuctu e Irkutsk, mas que se tornará um centro de seu comércio”. Florence vê uma civilização em formação, um mundo sendo construído, uma “cidade fundada por paulistas, descendentes de portugueses; onde reinam as leis, os costumes, as superstições, os hábitos, os vícios e as virtudes dos portugueses, mouros, brasileiros, selvagens, negros africanos (...).72 72 Ibid., p. 377. Uma terra quase virgem com um povo em sua infância, vivendo os primeiros balbucios de uma civilização em meio a uma natureza primordial e edênica, uma terra em que se plantando tudo dá, mas um clima propício à violência e à concupiscência, dominada pela luxúria, pela cobiça e pela tristeza, três capítulos de um ensaio sobre a tristeza brasileira73 73 Prado, 2012. . Uma civilização em construção em busca de suas virtudes, enfraquecidas pelo pecado de origem da colonização portuguesa, aventureira e luxuriosa, e pela escravidão que corrompe os costumes. Em meio a esse processo, o exílio do sábio esteta que buscará o consolo da incompreensão em meio à natureza primigênia do Brasil central. Na cidade a meio construir, capital incompleta que é Cuiabá, o esteta não encontra espaço para sua criatividade, mas ele pode ser ao menos a testemunha da criação do Brasil, da conquista da natureza, da formação de uma nação jovem demais para o coração precocemente envelhecido do artista.

Em 11 de setembro de 1827 a expedição chega à fronteira com a Bolívia, onde para surpresa de Florence, ele encontra um monumento de mármore branco, “arquitetura regular que de repente se apresenta no meio dessas vastas regiões onde a natureza reina soberana”. Trata-se de uma pirâmide quadrangular, um marco divisório dos territórios espanhóis e portugueses do século XVIII, com as armas das duas coroas. O viajante ressalta que as coroas de Espanha e Portugal foram apagadas do monumento, o que revive o jovem revolucionário: “Eu vi na minha infância, as armas dos reis apagadas pelos revolucionários de 92, inclino-me a acreditar que o mesmo sentimento levou os americanos a mutilar os sinais de sua antiga servidão”, diz o leitor do Abade Raynal. O esteta é também abolicionista, anticolonialista e republicano, por isso seu prazer em caminhar em território boliviano, uma terra “que não está sob o jugo de um rei74 74 Florence, 2015, p. 428-429. ”. A única arquitetura regular, civilizada encontrada pelo caminho representa o Antigo Regime, o mundo pré-revolucionário vigente ainda no Brasil, onde o jovem republicano se sente um desterrado.

Depois do périplo fluvial pelo interior do Brasil, Florence descreve sem grande entusiasmo a cidade do Pará, e de volta ao Rio de Janeiro ele afirma que a cidade é mais bela e pitoresca do que Nápoles, Constantinopla ou Lisboa, única cidade desse continente descoberto por Colombo a ter uma Academia de Belas Artes, “feita para formar os pintores e poetas”. Apesar desse entusiasmo com a paisagem do Rio, Florence se dá conta de que ainda assim é uma cidade americana “e, por conseguinte, comerciante”. Nenhum pintor de talento pode fazer nada mais do que “se restringir à parte material da arte”. O que anima ao esteta exilado não são as cidades buliçosas, mas “uma lembrança do deserto que nunca havia sido escrita75 75 Ibid., p. 495-496. ”, representado por sua zoofonia e pela voz da natureza, a base para uma nova ciência. Decepcionado pelo pitoresco das cidades americanas, ele vai desejar retornar aos desertos Sublimes do Brasil central. Dessa experiência só lhe restará a memória, seu diário e os desenhos feitos durante a viagem. Não tinha ainda um meio mecânico para reproduzir as imagens dessas paisagens fantásticas das mil e uma noites.

4. Por uma estética da vida

Onde encontrarei expressões para descrever o que vi? Sei que sou apenas um autor iletrado cujos escritos não verão a luz do dia; mas se todos os dons do gênio e da fortuna me devem ser recusados, por que recebi o dom de sentir, de saber, de inventar assim como tantos grandes gênios com os quais a humanidade é honrada? Para pintar o que vi na chapada, só me faltam as expressões; se eu as encontrasse, mesmo que tivesse que dizer a mesma coisa vinte vezes, as pessoas me leriam até o fim, sem se cansar do meu entusiasmo. 76 76 Voyage fluvial, In: Florence, 2015, p. 386.

As viagens acabaram77 77 Vangelista, 2022, posição 2107. .

Sara Mills afirma que a literatura de viagem é um artefato78 78 Mills, 2005. , ou seja, um texto que não necessariamente deve ter uma continuidade com o referente ao qual pertence, no sentido de ser um relato idêntico ao vivido. O que é vivido, rememorado na narrativa, é transformado pelo esquecimento, pela reelaboração, pela reinvenção muitas vezes literária da experiência. A autobiografia e a escrita de si que são o relato de viagem e os textos científicos e autobiográficos de Florence também se constituem como um artefato; ela “transforma fatos empíricos em artefatos [artifacts]79 79 Renza, 1980, p. 269. ”, ou seja, uma reelaboração da concretude da experiência do mundo por meio da arte da narrativa ou da imagem, no caso de Florence. A experiência de vida ou as peripécias da viagem, ao serem transformadas em narrativa se artealizam, como afirma Alain Roger em relação à paisagem, uma operação artística de intervir no objeto natural pela mediação do olhar, uma percepção estética que elabora um processo de artealização80 80 Roger, 2009, p. 22. , de transformação da experiência do espaço numa experiência estética que transforma um lugar em paisagem ou, como prefere Roger, em paisarte81 81 Ibid., p. 53. . Autobiografia, literatura de viagem ou paisagem, texto científico e viagem romântica em Florence não estão desconectados do referente e da realidade pelo processo de artealização, mas chegam a nós por meio da mediação de elementos artísticos e de linguagem, por meio de uma performance discursiva. Seu relato de viagem, suas invenções de reprodução de imagens, seus desenhos, seu atlas dos céus ilustram à perfeição o que Augustin Berque chama de pensamento paisagístico, “um pensamento que tem por objeto a paisagem. Uma reflexão sobre a paisagem82 82 Berque, 2009, p. 20. ”. Florence representa a paisagem e ao mesmo tempo a transforma em um objeto de pensamento. Pela paisagem brasileira Florence escuta, literalmente, a voz da natureza; ela revela ruínas, afinidades imprevistas, situa-se entre natureza, arte e cultura, e nos “fala uma língua até então desconhecida83 83 Florence, 2015, p. 388. ”; desconhecida pelo menos até a mediação tradutora do esteta inventor. É preciso decifrar essa linguagem, que não é evidente; e pelo pensamento Florence interpreta a paisagem, um pensamento que inclui história, poética, imagem, som, uma miríade de olhares e das mil vozes da natureza.

As pessoas no ato de narrarem suas vidas “podem mudar as histórias que contam, podem ter acesso a outros roteiros culturais, podem entender a si mesmos de maneira diferente, ou seja, podem exercer uma agência84 84 Smith; Watson, 2001. p. 45. ”. A obra escrita de Florence, que é científica, técnica, viática é, acima de tudo, autobiográfica, mostra-nos uma figura multifacetada, que elabora uma narrativa na qual estão descritas a natureza, a sociedade, a técnica, o trabalho, os núcleos urbanos, os tipos humanos, sociais e étnicos do Brasil, revelando um desejo de representação e compreensão da paisagem natural, humana e artística do Brasil. Seu relato é uma ação, uma potência e uma agência, como destacam Smith e Watson, uma operação de interferência na leitura futura de sua vida. Sem grandes esperanças no presente Florence apostou no futuro como seu redentor, como libertação dos grilhões de seu exílio. No relato de viagem a autobiografia além de ser um mergulho na interioridade tem a particularidade de que a identidade se elabora a partir da relação com o Outro, com a alteridade, sendo um relato de si que é construído em perspectiva, em relação a uma diferença. O autor depende do Outro, do espaço exótico, de um mundo diferente para poder construir uma autoimagem e dar sentido a uma trajetória de vida; muitas vezes a viagem justifica um passado e abre caminho para a construção de um futuro desejado. No caso de Florence, desde que ele se encontra integrado à vida brasileira há uma ambiguidade do homem que se apresenta como exilado, solitário, “livré à lui même” ao mesmo tempo que se torna um intérprete da paisagem brasileira.

O ressentimento do sábio exilado num mundo inculto, no qual suas potencialidades não têm cabida ou ressonância, é acompanhado pelo inventor de uma técnica de descrição e representação de um mundo exótico, revelado por esse observador plenamente assimilado à zona de contato, construindo uma imagem dúbia, de homem integrado à paisagem, mas exilado e incompreendido, como um mediador desse mundo que não encontra interlocutores para seu entusiasmo. Uma integração que se dá por meio de sua obra, de recompor a natureza e construir uma paisagem artealizada, seja pela fotografia, seja por seus cadernos de notas, desenhos, diários de viagem ou textos técnicos de suas invenções. O artista se torna inventor, rendido à materialidade da ciência e à grandiosidade do deserto verde e úmido do Brasil central. No Novo Mundo o exilado se torna um especialista na pesquisa e descoberta de novos temas e novas descobertas como a poligrafia, a zoofonia e a fotografia. Nessas técnicas de retenção da natureza, por meio da recuperação de seus sons e da imagem enquadrada do espaço, Florence parece querer ordenar e preservar a paisagem, regulando o caos primordial por meio da técnica e da arte, aquelas atividades com as quais constrói sua identidade e sua autoimagem, diferente do fazendeiro escravocrata ou professor de desenho que ele se tornou. A tecnologia é um instrumento para situar-se no mundo, ao mesmo tempo que seu exílio nos desertos da América do Sul impedia cumprir sua vocação. Adormece assim o pintor, o viajante, o marinheiro e nasce o inventor, igualmente coberto pelo véu de invisibilidade que cobria os sonhos do jovem aventureiro que acabou acomodado na Província de São Paulo como fazendeiro, administrador de escola feminina, sendo descoberto como o inventor que desejava ser mais de um século depois.

A sua escrita dá evidência e concretude ao gênio em exílio nas campinas paulistas. Mais do que uma escrita de si, sua obra é uma reinvenção de si que tenta situar a sua trajetória de vida no campo da estética e da ciência, tornando visível o que estava oculto pelo exílio, por isso a constante reescritura do manuscrito, redigido e trabalhado entre 1825 e 185985 85 Cf. Komissarov, 1994, p. 34. Komissarov conta a primeira realização do manuscrito com a redação do diário de viagem. Thierry Thomas, na introdução da edição facsimilar data o manuscrito publicado entre a data da capa, 1837, e a última interferência em 1859, cf. Florence, 2015, p. 68. , toda uma vida escrevendo e burilando a própria história. Sua intenção era compor um corpus documental que provasse a originalidade de suas invenções e, com isso, conseguir reconhecimento e uma recompensa financeira de algum governo europeu, sobretudo o francês, do Reino da Sardenha ou o italiano depois da unificação. Se essa empreitada fracassa e a maior parte de seus manuscritos permanece inédita em sua vida, ela permitiu “que os registros documentais de suas experiências chegassem à posteridade, às mãos dos historiadores e às formas contemporâneas de reconhecimento social dos inventores e seus inventos, através de artigos, livros, sítios virtuais e exposições86 86 Turazzi, 2008, p. 24-25. ”. Além disso, deixou uma longa descendência de netos e bisnetos que custodiaram a enorme documentação produzida por seu antepassado, contribuindo hoje para sua divulgação e mantendo vivo o seu sobrenome. Apesar da obsessão pela escrita e pela documentação de sua vida, Florence fracassou em conseguir todo o reconhecimento que desejava em vida, mas conseguiu deixar registrada a sua biografia futura. O “autor iletrado”, cujos escritos jamais veriam a luz, segundo ele mesmo, sobreviveu justamente pela qualidade e pelo caráter documental desses escritos. O Florence construído pelos historiadores tem como principal fonte a imagem de si elaborada pelo inventor no exílio. Hercule Florence foi a maior invenção de Hercule Florence.

Se em vida ele foi marinheiro frustrado, inventor sem reconhecimento, modesto fazendeiro nas terras de sua primeira esposa Maria Angélica, professor e administrador na escola fundada por sua segunda esposa, Carolina Krug, liberal e amante da natureza perdido num país que estava sendo “construído com base na dilapidação [de seus] recursos naturais e na compulsão em massa do trabalho escravo87 87 Marquese, 2016, p. 26. ”, sem que ele pudesse resistir a isso, sem que tivesse visto a abolição da escravidão, no futuro reescrevemos a sua vida tal como ele desejou, utilizando o itinerário proposto por ele. A aparente diversidade de registros de seu manuscrito, no qual aparecem diversas personagens, o emigrante, o viajante, o inventor, o artista, o criador da fotografia, o cientista amador, o exilado melancólico, é na verdade uma narrativa de si que ressalta o que o autor nos quer fazer ver, a multiplicidade de registros de suas capacidades desaproveitadas em seu naufrágio campineiro. Para Florence sua vida concreta em Campinas e sua biografia não coincidiam, era preciso documentar o que ele realmente era, que não tinha contiguidade com o que ele vivia, por isso o fazendeiro e o administrador de escola praticamente não aparecem em seu manuscrito. Esse traço ambivalente “reforça, no limite, sua singularidade histórica e ecoa em nossa sensibilidade contemporânea afeita ao pluralismo de sentidos de uma determinada experiência histórica88 88 Schiavinatto, 2017, p. 412. ”. Um pluralismo ainda mais trágico pelas dificuldades financeiras, pela viuvez, pela morte de diversos de seus filhos, pelo desdém da ciência europeia em relação a suas invenções. Esse percurso fatídico nos compele a recuperar sua memória e restituir o lugar que ele almejou em vida. Depois de um século de sua morte, a mensagem na garrafa89 89 Carelli, 1994, p. 99. lançada ao futuro por Florence foi finalmente lida e seu sepulcro de silêncio e esquecimento foi definitivamente aberto. Aberto o ataúde encontramos o corpo intacto, tal como ele nos deixou, pronto para o retrato.

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  • TORRÃO FILHO, Amilcar. A Arquitetura da Alteridade: a Cidade Luso-brasileira na Literatura de Viagem (1783-1845). 2. ed.Curitiba: Appris, 2019.
  • TURAZZI, Maria Inês. O “homem de invenções” e as “recompensas nacionais”. Notas sobre H. Florence e L. J. M. Daguerre. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 16. n. 2, p. 11-46, jul.-dez. 2008.
  • VANGELISTA, Chiara. Cartografia migrante: Hercule Florence da Nizza al Brasile (1804-1879). Ogliastro Cilento, Salerno: Licosia, 2022. E-book
  • 3
    Voyage fluvial, In Florence, 2015, p. 330.
  • 4
    Para dados biográficos de Florence cf.: Bourroul, 1901; Thomas, 2016; Vangelista, 2022.
  • 5
    Kossoy, 2006.
  • 6
    Para as imagens de Florence remeto a: Borrego, 2021; Schiavinatto, 2017; 2021.
  • 7
    Para uma das poucas abordagens de Florence viajante cf.: Carelli, 1994.
  • 8
    Florence, 2015.
  • 9
    Hardman; Kury, 2004, p. 395.
  • 10
    Vangelista, 2022, posição 4366.
  • 11
    Ibid., posição 318.
  • 12
    Ibid., posição 126.
  • 13
    Ibid., posição 4197.
  • 14
    Estevam Leão Bourroul não deixa dúvidas em relação à nacionalidade francesa de Florence: “Em Nice, capital (chef-lieu) do departamento dos Alpes-Màritimos, a 29 de Fevereiro de 1804, no mesmo anno em que Napoleão foi proclamado Imperador dos Francezes, corôado e sagrado pelo Papa Pio VII, e creada a Ordem da Legião de Honra - nasceu Hercules Florence, a quem, dedicamos este singelo escripto, cuja memoria perdura na lembrança de seus contemporaneos, e cujo nome honrado e saudoso passará á posteridade, como o de um homem que relevantes serviços prestou á Patria, ás Sciencias, ás Letras, nobilitando a França, que lhe foi berço, e o Brazil, ao qual adoptára e servira, durante 54 annos, como filho dedicado, leal e ilustre (...)”. Bourroul, Op. Cit., p. 3. Mesmo o Principado de Mônaco é, para o autor, um território francês, não sendo mais “do que um prolongamento de Nice”. Ibid., p. 6.
  • 15
    Vangelista, Op. Cit., posição 427.
  • 16
    Ibid., posição 318. A autora tem a hipótese de que Florence não desejava ser súdito de Napoleão III, que era muito impopular entre os liberais como ele. Ibid., posição 329.
  • 17
    Thomas, Op. Cit., p. 24-26.
  • 18
    Komissarov, 1994, p. 32.
  • 19
    Vangelista, Op. Cit., posição 637.
  • 20
    Marquese, 2016.
  • 21
    L’inventeur en exil, In: Florence, 2015, p. 221.
  • 22
    Ferreira, 2014.
  • 23
    Para uma análise de suas invenções cf. Rizzutto; Lee; Thomas, 2019.
  • 24
    Florence, Op. Cit., p. 85.
  • 25
    Sobre a participação de Florence na expedição Langsdorff cf.: Costa; Diener; Strauss, 1995; França, 2013; Komissarov, Op. Cit.; Manizer, 1967; Momeso, 2016.
  • 26
    Florence, Op. Cit., p. 361.
  • 27
    Ferreira, Op. Cit., p. 154.
  • 28
    Florence, Op. Cit., p. 117.
  • 29
    Antoine, 2011ANTOINE, Philippe. Quand le Voyage devient promenade. Écritures du voyage au temps du romantisme. Paris: Presses de l’Université de Paris-Sorbonne, 2011., p. 15.
  • 30
    Ibid., p. 29-30.
  • 31
    Depetris, 2007, p. 93.
  • 32
    Ibid., p. 95.
  • 33
    Florence, 2010.
  • 34
    Id., 2015, p. 82.
  • 35
    Ibid., p. 160.
  • 36
    Rouanet, 1991.
  • 37
    Depetris, 2014.
  • 38
    Chouiten, 2015.
  • 39
    Guillén, 2007, p. 50.
  • 40
    Ibid., p. 59.
  • 41
    Ibid., p. 71. “Os emigrados e outros proscritos, como se lhes vêm chamando, contribuem significativamente a tudo o que o Romanticismo terá de descontinuidade, diante das tradições da literatura europeia e, ainda mais, diante do conceito de cultura como conservação, incremento ou aprazível enriquecimento de si mesma. ‘A mudança da literatura de que se vangloria o século XIX’, escrevia o próprio Chateaubriand, manejando com toda naturalidade a ideia de mudança nesse contexto, ‘lhe veio da emigração e do exílio’”. Sobre o papel de Chateaubriand e suas viagens na constituição da literatura de viagem do século XIX, cf.: Guyot; Le Huenen, 2006.
  • 42
    Guillén, Op. Cit., p. 91.
  • 43
    Etudes de ciels, à l’usage des jeunes paysagistes, In : Florence, Op. Cit., p. 80.
  • 44
    Florence, Op. Cit., p. 168.
  • 45
    Coli, 2010, p. 144.
  • 46
    Florence, 2015, p. 169.
  • 47
    Histoire de La France, Apud FEBVRE, 1995, p. 203.
  • 48
    Kury, 2014, p. 194.
  • 49
    Ibid., p. 178.
  • 50
    Florence, 2015, p. 176.
  • 51
    Ibid., p. 408.
  • 52
    Ibid., p. 251-253.
  • 53
    Ibid., p. 340.
  • 54
    Ibid., p. 376.
  • 55
    Ibid., p. 315-316.
  • 56
    Ibid., p. 454.
  • 57
    Cf. Torrão Filho, 2019.
  • 58
    Florence, 2015, p. 277-278.
  • 59
    Ibid., p. 280.
  • 60
    Marquese, Op. Cit., p. 16.
  • 61
    Florence, 2015, p. 291.
  • 62
    Ibid., p. 293.
  • 63
    Ibid., p. 310-311; p. 400.
  • 64
    Ibid., p. 401.
  • 65
    Ibid., p. 313.
  • 66
    Ibid., p. 340.
  • 67
    Ibid., p. 388.
  • 68
    Ibid., p. 463.
  • 69
    Ibid., p. 464.
  • 70
    Sobre a descrição de Cuiabá cf.: Martins, 2022, p. 32-59.
  • 71
    Florence, 2015, p. 372-373.
  • 72
    Ibid., p. 377.
  • 73
    Prado, 2012.
  • 74
    Florence, 2015, p. 428-429.
  • 75
    Ibid., p. 495-496.
  • 76
    Voyage fluvial, In: Florence, 2015, p. 386.
  • 77
    Vangelista, 2022, posição 2107.
  • 78
    Mills, 2005.
  • 79
    Renza, 1980, p. 269.
  • 80
    Roger, 2009, p. 22.
  • 81
    Ibid., p. 53.
  • 82
    Berque, 2009, p. 20.
  • 83
    Florence, 2015, p. 388.
  • 84
    Smith; Watson, 2001. p. 45.
  • 85
    Cf. Komissarov, 1994, p. 34. Komissarov conta a primeira realização do manuscrito com a redação do diário de viagem. Thierry Thomas, na introdução da edição facsimilar data o manuscrito publicado entre a data da capa, 1837, e a última interferência em 1859, cf. Florence, 2015, p. 68.
  • 86
    Turazzi, 2008, p. 24-25.
  • 87
    Marquese, 2016, p. 26.
  • 88
    Schiavinatto, 2017, p. 412.
  • 89
    Carelli, 1994, p. 99.
  • 2
    Graduado em História pela USP, Mestre e Doutor em História pela Unicamp. Realizou vários estágios pós-doutorais na Universitat Politècnica de Catalunya e na Universitat de Barcelona, com financiamento da FAPESP. É líder de grupo de pesquisa CNPq Núcleo de Estudos da Alteridade (NEA). Trabalha com História Moderna e Contemporânea, História do Brasil, Teoria da História, literatura de viagem, historiografia, história urbana e questões de gênero e alteridade. Professor do Programa de Estudos Pós-graduados em História da PUC-SP e coordenador da pós-graduação no biênio 2023-2025. amilcartorrao@gmail.com

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2023
  • Aceito
    20 Jul 2023
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