Open-access Os fornos quentes, de Reinaldo Guarany Simões: sobrevivência, exílio e melancolia

Os fornos quentes, by Reinaldo Guarany Simões: survival, exile and melancholy

RESUMO

Este artigo é um estudo sobre Os fornos quentes, romance autobiográfico do ex-guerrilheiro Reinaldo Guarany Simões, que cobre seu exílio na Alemanha Ocidental nos anos 1970 ao lado de sua companheira, a também ex-guerrilheira Maria Auxiliadora Lara Barcelos, que ali veio a falecer. Articulam-se aqui as noções de sobrevivência (AGAMBEN, 2008) e melancolia (AGAMBEN, 2007; FREUD, 1992), objetivando entrever, na escritura do livro, certo esforço de apagamento do sobrevivente, o próprio Guarany Simões, e a correspondente iluminação de Maria Auxiliadora, vítima das mazelas inerentes ao exílio (BOYM, 2017; SAID, 2003).

PALAVRAS-CHAVE Reinaldo Guarany Simões; sobrevivência; exílio

ABSTRACT

This article is a study on Os fornos quentes by the ex-guerrilla fighter Reinaldo Guarany Simões, an autobiographical novel about his experience in West Germany in the 1970s, where he lived with his companion, Maria Auxiliadora Lara Barcelos, also a former guerrilla fighter who died there. We articulated notions of survival (AGAMBEN, 2008) and melancholy (AGAMBEN 2007; FREUD, 1992), trying to capture the writer’s effort to erase the survivor, Guarany Simões himself, and the corresponding illumination of Maria Auxiliadora, victim of the toils of the exile (BOYM, 2017; SAID, 2003).

KEYWORDS Reinaldo Guarany Simões; survival; exile

Ihre Klage sind Anklagen

[Queixar-se é dar queixa].

(Sigmund Freud, “Luto e melancolia”).3

Glória, a todas as lutas inglórias que,

através da nossa história,

não esquecemos jamais.

(Aldir Blanc e João Bosco,

“O mestre-sala dos mares”, 1977).

Romance de única edição, Os fornos quentes (OFQ)4, de 1978, de Reinaldo Guarany Simões, é pioneiro do chamado “memorialismo dos jovens”, os já conhecidos relatos das experiências de ex-guerrilheiros sobre a luta contra a ditadura militar (1964-1985), “que na primeira mocidade já têm experiências terríveis para contar [...] sobre tortura, cárcere e exílio” (GALVÃO, 2005, p. 352).

O romance aborda parte do período do exílio do autor. No enredo, predominam eventos transcorridos na República Federal Alemã (RFA), a Alemanha Ocidental dos tempos da Guerra Fria, anterior à queda do muro de Berlim (1989), lugar de exílio do autor (1974-1976). Nesse país também se inicia a escrita do livro, finalizado em Estocolmo, Suécia, para onde o autor se muda em 1976.

É publicado no Brasil, dois anos antes do regresso de Guarany Simões (1980) - que, mesmo com a decretação da Lei de Anistia (1979), retarda seu retorno ao país. A obra tem repercussão internacional, sendo finalista do prêmio Casa de Las Américas (Cuba) na categoria “testemunho”, também em 1978.

Uma cronologia sumária ajuda a situá-la dentro da produção de então. Em 1977, aparece Em câmara lenta (ECL)5, de Renato Tapajós, pela editora Alfa-Omega, inaugurando a safra memorialística dos ex-guerrilheiros. ECL é a “primeira obra de ficção nacional a trabalhar o tema da luta guerrilheira dos anos 60 e 70 por um dos seus participantes”(GORENDER, 1987, p. 205 - grifos nossos), sendo, pois, a “primeira autobiografia sobre a luta armada” (ROLLEMBERG, 2006, p. 191). Publicado em 1978, OFQ aparece como o segundo livro dessa safra.

No ano seguinte, publica-se um dos livros mais exemplares do gênero, dentre os vindos a lume na sequência: O que é isso companheiro (1979), de Fernando Gabeira, que é uma espécie de centro da constelação desse memorialismo que, como se aludiu, foi produzido por ex-guerrilheiros retornados - beneficiados que foram pelos processos de abertura dos anos Geisel (1974-1979), incluídos o fim da censura institucional (1978) e a Lei de Anistia (1979).

Tomem-se, contudo, as obras de Tapajós e Guarany em conjunto, o que ajuda a situar certo pioneirismo de OFQ - em qualquer caso, útil aqui. Destaque-se, inicialmente, que ambos abordam trajetórias de duas mulheres, ex-guerrilheiras, presas e torturadas. No caso de ECL, trata-se de Aurora Maria Nascimento Furtado (1946-1972), morta sob tortura. Já em OFQ, trata-se de Maria Auxiliadora Lara Barcelos (1945-1976), morta no exílio na RFA. Mas há outras convergências. Primeiro: os dois livros foram publicados pela Alfa-Omega, iniciativa do editor de livros de esquerda Fernando Mangarielo (MAUÉS, 2015). Ambos, além disso, se declaram ficção. ECL traz em subtítulo a palavra “romance”. OFQ, também na capa, se diz “ficção política”. Antonio Candido destaca no livro de Tapajós o aspecto ficcional (apud MAUÉS, 2008, p. 35-37). A leitura rápida dessas obras não deixa dúvidas sobre sua ficcionalidade, alicerçada, sobretudo, em narradores que, muitas vezes, se articulam como se estivessem, na falta de melhor definição, em delírio ou alucinando. Tais narradores são produtos emblemáticos de uma ficção experimental, como muitos dos romances brasileiros dos anos 1960 e 1970 (DALCASTAGNÈ, 1996). Estruturando-se assim, OFQ compõe-se com enredo fragmentado, deliberadamente construído por certa desarticulação, o que se pode dizer também de ECL. De fato, o livro de Guarany Simões aproxima-se deste último, “embora não realize os recursos formais propostos por Renato Tapajós com o mesmo sucesso, ainda que igualmente os utilize: repetição de cenas, fluxo de consciência, flashbacks, desenrolar progressivo de um mesmo fato repetido, histórias paralelas etc.” (SILVA, 2006, p. 176). Ambos são, além disso, obras híbridas que, por assim dizer, se constroem na fronteira entre autobiografia e ficção. Com efeito, alguns críticos chegam a tratá-los como “ficção autobiográfica” e mesmo puramente “autobiografia” (ROLLEMBERG, 2006, p. 190 ss.; SILVA, 2006, p. 90).

Outras afinidades surgem quando se relacionam as duas obras dentro de seu contexto político-legal específico - que, como se sabe, é comum. Ambas, com efeito, se fazem editar num momento em que a chamada “abertura” do regime militar ainda estava vacilante. Em ambas, os rótulos de capa (“ficção” e “romance”) enunciam algo mais que simples indicações de gênero e de estilo dos escritores. São cautela de editor e autores ante a censura ditatorial: os livros se fizeram publicar num período de indefinição quanto à censura e à repressão, submetidos a ameaça de confisco, processo e prisão. É, de fato, o que padecem Tapajós e o editor Mangarielo quando da publicação de ECL (MAUÉS, 2008) - ficando Guarany Simões, entretanto, poupado disso.

Assim, os romances devem ser vistos como experimentos de forma escritural e editorial. No momento de sua publicação, dado o assunto espinhoso e a condição de ex-guerrilheiros de seus autores, não se teria ainda à disposição códigos consagrados com que se configurar; com que se comunicar com o público; e com que se haver com a censura. Pode-se especular que esse aludido amálgama entre ficção e autobiografia que os define desemboca nessa imprecisão de forma. Trata-se de experimentação artística, mas também de experimentação editorial. E não é ilícito dizer que, após tais experimentos, outros ex-guerrilheiros escritores e as empresas editoriais ficaram mais à vontade quanto a consolidar suas estratégias de publicação de textos, para os quais, já se sabia, havia forte demanda - num contexto, ainda, de intensa censura oficial.

É notável, por exemplo, que, com a Lei de Anistia (de agosto de 1979), Fernando Gabeira ostente nas primeiras edições do seu O que é isso companheiro? o subtítulo de “depoimento”. Seu livro se inscreve sem receio no terreno dos gêneros não ficcionais. A relação é válida: as tentativas de Tapajós e Guarany Simões, textos que nascem de um esforço memorialístico, disfarçando-se, porém, de ficção, foram plataforma de lançamento para o impulso francamente não ficcional dos que vieram em seguida - Gabeira incluído.

Até aqui, por conveniência, os textos de Tapajós e Guarany Simões foram colocados lado a lado. Mas é preciso singularizar o texto de Guarany Simões. OFQ, em seu aspecto experimental, vai além de ECL. Este último se fixa na sua própria luta guerrilheira, num detalhismo realista mesclado a uma dicção por vezes delirante/alucinatória (como dito), a serviço de importante autocrítica quanto a sua participação na guerrilha (CURY; PEREIRA, 2018). Guarany Simões, diferentemente, passa ao largo de qualquer autocrítica, mal tangencia sua própria luta como guerrilheiro, indo fundo na experiência traumática do exílio. E mais: sua opção é por radicalizar certo viés onírico, com pouco compromisso realista.O resultado estético é fortemente solipsista, onde o leitor patina. O livro “se assemelha a um sonho [...] onde lugares distantes se aproximam” (ROLLEMBERG, 2006, 192 - grifo nosso).

Um sonho? Trata-se, com efeito, de algo aparentado a pesadelo. No entrecho, isso aparece como consequência da já mencionada morte da companheira de Guarany Simões, a ex-guerrilheira Maria Auxiliadora Lara Barcelos, a Dora, que se joga sob um trem, em Berlim Ocidental.

Na narrativa, a fria Berlim, onde Dora e Guarany Simões estão exilados, é verdadeiro inferno. Ali transcorre a maior parte da ação, até seu epílogo trágico. O título, “Os fornos quentes”, dá o tom geral. Recorrente no texto, a fórmula do título alude aos campos de concentração nazistas, com seus fornos e câmaras de gás. É analogia com a vida dos exilados: peregrinos com documentação provisória, meros números (SIMÕES, 1978, p. 177). Emblemas disso são os esforços sempre inúteis do casal diante da lei de imigração alemã, por vezes kafkianas (SIMÕES, 1978, p. 166 ss. e 175 ss.).

SOBREVIVENTE

Eis então a companheira morta sob os olhos. Surge mais uma vez, pois, a faceta que caracteriza parte considerável dos narradores que tematizam suas respectivas participações na guerrilha contra a ditadura: a condição de sobrevivente. Como nos casos de Renato Tapajós, Alfredo Sirkis, Frei Betto, dentre outros, tal condição parece inescapável.

O filósofo Giorgio Agamben (2008) define bem, para os fins aqui propostos, a figura do sobrevivente, valendo-se da realidade dos campos de concentração nazistas. Sobreviventes dos campos, como o judeu italiano Primo Levi (1919-1987), prestaram testemunho sobre sua experiência ali. As reflexões de Levi, sobrevivente de Auschwitz, são usadas por Agamben para propor a referida conceituação. O filósofo identifica forte solidariedade entre a fala da testemunha sobrevivente e o silêncio dos mortos e dos sem fala, desumanizados nos campos - por definição, seus companheiros de infortúnio. “O sobrevivente dá testemunho não sobre a câmara de gás ou sobre Auschwitz, [...] ele fala apenas sobre uma impossibilidade de falar” (AGAMBEN, 2008, p. 163).

Proposto para pensar a situação singular dos campos de concentração nazistas, o conceito de Agamben pode ser usado como construto crítico para a compreensão de certos textos memorialísticos brasileiros relativos aos anos de chumbo, em particular o romance de Guarany Simões, resguardadas, contudo, as muitas diferenças quanto às situações históricas distintas.

Agamben relaciona sobrevivente e testemunha. O termo superstes (“testemunha”, em latim) define a testemunha como aquele que viveu algo do começo ao fim; aquele que atravessou até o fim um ou mais eventos e pode assim dar testemunho daquele momento (AGAMBEN, 2008, p. 27). O termo expressa a disposição da testemunha para narrar não só seu destino pessoal, mas também o destino daqueles que, com essa testemunha, compartilharam aqueles eventos. Na categorização de Agamben, não basta, entretanto, ao sobrevivente a mera sobrevivência, ele precisa ser capaz de se recordar. Um destaque: o termo mastis, “testemunha”, em grego, deriva de um verbo que significa “recordar”. Assim, pensado como testemunha, “o sobrevivente tem a vocação da memória, não pode deixar de recordar” (AGAMBEN, 2008, p. 35). Há, além disso, um afeto preponderante na condição do sobrevivente: a culpa. A testemunha carrega consigo o sentimento de ser, como sobrevivente, um privilegiado em relação àqueles que “tocaram o fundo”, os que morreram ou foram silenciados (AGAMBEN, 2008, p. 42). Por fim, dentre as muitas características que o sobrevivente (ainda segundo Agamben) traz em si, mencione-se uma - já aludida -, que é decisiva: trata-se da condição daquele que testemunha sobre a impossibilidade de testemunhar de outrem (AGAMBEN, 2008, p. 42-43), como se a testemunha se colocasse como espécie de delegado6, falando por quem se encontra incapaz de, por morto ou silenciado, falar por si.

Guarany Simões viveu alguns fatos decisivos da vida de Dora, do início ao fim. O livro é o relato daquele que testemunhou parte importante da vida da companheira e se crê, por isso, credenciado para falar sobre sua morte e suas causas. O autor é sobrevivente e testemunha sempre em relação a Dora. Ambos vivenciaram os mesmos perigos, tendo apenas ele sobrevivido. O que sobressai, pois, é um destino pessoal que não se escreve sem se vincular, passo a passo, ao destino da companheira morta.

A memória é quase sempre o conteúdo dessa escritura. Como dito acima, o sobrevivente “não pode deixar de recordar” (AGAMBEN, 2008, p. 35). Em OFQ, a fórmula não é só um imperativo categórico, não diz respeito apenas a uma ética, é constatação de uma patologia. Como se verá, a memória que o texto do livro dá a ver não é pacífica. Ao contrário, é rebelde, impondo-se a todo tempo, como certas doenças persistentes. Além disso, sendo uma memória sobre Dora, é também um esforço de ser a própria memória de Dora, que não teve chance de fazer o próprio relato das mazelas que viveu.

Há também a culpa. Algo que parece ser constituinte do texto. Guarany Simões (1984, p. 144), desde a publicação de OFQ, tem expressado publicamente em alguns momentos esse sentimento em relação ao suicídio de Dora, sobretudo por ter subestimado, segundo se infere do enredo, a gravidade do quadro psiquiátrico da companheira - que a teria levado ao suicídio.

No limite, pode-se falar de um esforço duplo de Guarany Simões, o de não só falar sobre Dora, mas também por ela, aludindo sobre seu silêncio e silenciamento. Nesse sentido, há um esforço de falar por delegação - como se verá nas análises das próximas seções.

EXÍLIO E NOSTALGIA

We’re not that strong, my Lord,

You know we ain’t that strong.

I hear my voice among others.

(Caetano Veloso, “London, London”, 1971).

O exílio em OFQ é representado como situação dolorosa. Dentre os muitos padecimentos que o exilado confronta, está a angústia de se perceber, despreparado e desamparado, submetido a um suplício injusto. Par a par com alguns poucos companheiros, o exilado não está, entretanto, acompanhado - está tão sozinho, tão isolado, quanto os que o cercam.

Em tal quadro, o exílio aparece sem qualquer idealização. Fica longe a visão de que o humanismo e a literatura teriam dívidas com o exílio - de que talvez haja nele alguma positividade (SAID, 2003, p. 46 ss.). O “banimento como um modo de vida” positivo, caso de James Joyce (SAID, 2003, p. 55), passa ao largo da narrativa.

O narrador vive o exílio como suplício. Mais que exilado, Guarany Simões é fugitivo das ditaduras brasileira e chilena. Fugitivo também do México, que não o acolhe e lhe impõe prazo para partir. Tendo passado por esses países e, também, por França e Bélgica, o narrador é, involuntariamente, um peregrino que vive precariamente e quase que ilegalmente na RFA. Pobreza, xenofobia e burocracia dão o tom do seu desterro naquele país. O romance permite entrever o exílio como “uma condição criada para negar a dignidade - e a identidade às pessoas” (SAID, 2003, p. 48), “uma forma contemporânea de punição política” (SAID, 2003, p. 49).

Exílio que também pode ser pensado segundo o frequente vínculo que estabelece com o nacionalismo (SAID, 2003, p. 49). Se, de fato, “os nacionalismos dizem respeito a grupos”, o exílio deve ser pensado como “uma solidão vivida fora do grupo: a privação sentida por não estar com os outros na habitação comunal” (SAID, 2003, p. 50). Em outras palavras, fora ou longe da própria terra, dos seus e de sua língua. De fato, “o nacionalismo é uma declaração de pertencer a um lugar, a um povo, a uma herança cultural. Afirma uma pátria criada por uma comunidade de língua, cultura e costumes e, ao fazê-lo, rechaça o exílio, luta para evitar seus estragos” (SAID, 2003, p. 49). Assim, o romance de Guarany Simões, se visto pelo ângulo de Said, representaria, pois, o exílio como algo vivido dolorosamente longe da pátria. Daí ressalta o sentimento de desamparo inerente.

Mas é um exílio crítico com relação a essa pátria. O autor não quer ficar na Alemanha, não pode voltar ao Brasil - e, ao mesmo tempo, ele não quer voltar para o Brasil. Com efeito, há no livro imagens de uma pátria idealizada, o que deixa entrever certa “nostalgia restauradora” (BOYM, 2017), atravessada pelos signos óbvios da saudade da pátria. Por vezes, é a própria visão do paraíso com sua dose de exuberante “país tropical” (SIMÕES, 1978, p. 115; 158). Na maioria das vezes, contudo, a pátria é a terra dos generais latino-americanos, o “Brasil, ame-o ou deixe-o”. O texto de Simões oscila entre esses dois polos. Perguntaria Said (2003, p. 50): “Como alguém supera a solidão do exílio sem cair na linguagem abrangente e latejante do orgulho nacional?”. Não é casual que o Brasil seja recorrentemente tratado, no livro, como o “Curral del Rey”, na verdade o curral dos generais. Se o exílio é experiência terrível, a nação real que os generais constroem também o é: “No fundo, a grande lição que tiramos disso tudo é que a pátria não existe” (SIMÕES, 1978, p. 187). Certa nostalgia, se existe no livro, passa a ser crítica e reflexiva (BOYM, 2017). E de ingênuo “país tropical”, o Brasil é figurado pela metade, como triste “patropi”. Como um supliciado que não entende os motivos de seu crescente suplício, o exilado tem os olhos estáticos olhando para o vazio, como se verá.

LUTO E MELANCOLIA

OFQ é texto lutuoso em certo sentido, se aproximando, assim, das postulações de Freud (1992, p. 132) sobre o tema. Há ali, verdadeiro “trabalho de luto” em torno da aceitação de que Dora está morta. Em que pesem as diferenças entre autor empírico e narrador, é plausível dizer que o próprio livro componha esforço geral de Guarany Simões para elaborar a perda da companheira. O texto, aliás, se realiza no transcurso de ao menos dois anos, de 1976 a 1978, subsequentes à morte de Dora. Ali, certos elementos do convívio entre a personagem e o protagonista são retomados laboriosamente, como se servissem para que, aos poucos, a libido correspondente ao objeto perdido fosse desviada (FREUD, 1992, p.132). O livro, assim, se escreveria com a pena do luto. Mas também com a tinta da melancolia.

Se o luto é instituição social, por assim dizer aceito e estimulado, a melancolia surgirá em Freud como doença. Ela “se caracteriza por um desânimo profundamente doloroso, uma suspensão do interesse pelo mundo externo, perda da capacidade de amar, inibição de toda atividade e um rebaixamento do sentimento de autoestima” (FREUD, 1992, p. 131). Notável no melancólico é o “empobrecimento do ego”. De fato, se no luto o “mundo [...] se tornou pobre e vazio; na melancolia é o próprio ego” a instância empobrecida (FREUD, 1992, p. 133). Pode-se dizer que esse empobrecimento do eu é uma das tônicas do texto.

Deter-se nas palavras talvez não seja luta vã. O protagonista-narrador se esforça por figurar o referido empobrecimento. Já na primeira linha, o leitor ouve o acorde inicial do livro que lhe dá o tom - e a partir do qual sua narrativa será desenvolvida. Nele encontram-se notas de melancolia: “[Nós] Ficamos horas seguidas com o olhar fixo num ponto do horizonte, sentados” (SIMÕES, 1978, p. 11 - grifos nossos). A ausência de pronome não é gratuita: tem-se já aí aquele empobrecimento aludido. O “ficamos” indicia um sujeito elíptico, “nós”. E há nesse “nós” um “eu” que também se oculta, que, por assim dizer, se dilui nessa pluralidade. Na narrativa, esse “nós” refere-se a um grupo de quatro pessoas, dentre elas o protagonista-narrador. Tem-se, então, já na primeira frase do texto, o protagonista-narrador representando-se em auto-ocultação: como sujeito elíptico da forma verbal “ficamos” e deslocando-se da condição pronominal de singularidade para certa pluralidade difusa. No tumulto do retrato em grupo, lá está ele, nas sombras. Eis o acorde que anuncia a estratégia do texto de tirar do “eu” muito de seu protagonismo, deslocando-o para uma consonância indistinta. Complementa esse processo de apagamento o próprio sentido de “ficamos”7. “Ficar”, na frase, tem ali papel de verbo de ligação, denotando mais um estado do que uma ação - consonante, pois, com a maioria das acepções nos dicionários. Esse “eu”, que se esconde, abre o texto com um verbo (o “ficamos”) que denota imobilidade e desistência (com efeito, “ficar” acarreta, também, a ideia de “não ir”). Ressalte-se, ao lado disso, a hipérbole contida no trecho. Parece exagero ficar “horas seguidas” olhando fixamente qualquer ponto8. Mas na narrativa faz sentido. O exagero alude ao modo extensivamente contemplativo do texto. Nesses termos, a palavra “sentados”, que fecha o trecho, vibra consoante a “ficamos”, que o abre. Ambas falam muito sobre a referida imobilidade e a persistente autodiluição que, como se verá, é inerente ao protagonista-narrador.

De onde viria essa imobilidade melancólica?

A perda de Dora se põe como ponto de partida da narrativa - espécie de deflagradora do amplo quadro de melancolia que atravessa o texto. A personagem havia sofrido um surto psicótico algum tempo antes do suicídio, sendo internada num hospital psiquiátrico. Mata-se uma semana depois de liberada da internação. “Seus nervos haviam chegado ao fim: foram sendo destroçados, sem que percebêssemos” (SIMÕES, 1978, p. 184). Em A fuga, outro livro do autor sobre o tema, o fato é retomado: “Dois meses antes de matar-se, Dora tivera uma pane psíquica. Foi internada em uma clínica em Spandau [RFA] [...] Teve alta uma semana antes de matar-se, mas seus pesadelos eram constantes [...]. Na manhã em que se matou, Dora avisou: - Sabe, tenho pensado em me matar” (GUARANY, 1984, p. 141-142).

Sendo elemento central da narrativa, o suicídio, contudo, não é explicitamente referido no texto senão na última linha. É quase tabu. Em razão disso, sucedem-se frequentes eufemismos - figuras que indicam o esforço para evitar que algo como uma blasfêmia adentre o texto. Com efeito, as referências ao suicídio estão por toda parte, porém cifradas. Exemplos: “as pessoas dizem palavras de consolo com o olhar entristecido pelos acontecimentos” (SIMÕES, 1978, p. 11 - grifo nosso). Fala-se em certa “tarde de desgraça”; fala-se também de certa “notícia” (SIMÕES, 1978, p. 54). “Acontecimentos”, “desgraça”, “notícia”: eufemismos aludem ao suicídio, só referido, como dito, ao final da narrativa.

Há uma cena-padrão9 no livro que se repete como consequência desse aludido trauma (SIMÕES, 1978, p. 17, 53, 54, 67 e 139 passim). Nessa cena, quatro companheiros - os personagens Guará (o próprio Guarany Simões), Sabaneiro, Jura e Luís - reúnem-se depois da notícia do suicídio. Os companheiros prestam “camaradagem” e “atenção constante” ao narrador-protagonista pela morte de Dora (SIMÕES, 1978, p. 89). Estão em Berlim, à beira de um lago (quase sempre), num parque público, provavelmente aquele que rodeia o palácio de Charlottenburg. Bebem pisco, aguardente peruana feita de uva. A referência à bebida é recorrente na narrativa: “Aninhamos a garrafa nas pedras” (SIMÕES, 1978, p. 54; Cf. também p. 53, 67, 71 e 139). Vez ou outra, transeuntes cortam-lhes a atenção: crianças, seus pais, dentre outros. Talvez seja um final de tarde que se prolonga. Com alguma variação, essa passagem repete-se ao longo da narrativa.

Assim como nessa cena, é frequente a menção a velhas senhoras vestidas de preto. Estão entre os transeuntes que se dão ao olhar do narrador enquanto este perambula por Berlim com os amigos. As mulheres não surgem ali, note-se, como elementos realistas. Antes, parecem certos espectros que abrem algumas tragédias de Shakespeare, com seu teor sobrenatural. Em certo momento, aviltam o narrador e seus companheiros: “Scheissausländer, ihr habt’s gekriegt” (SIMÕES, 1978, p. 55), algo como “Estrangeiros de merda, vocês se juntaram”. Vestidas de preto, dizendo tais palavras, as mulheres são signos, ao mesmo tempo, do luto e da xenofobia. Em outra passagem, elas retornam: “Vi que algumas velhas vestidas de preto [...] faziam comentários sobre a nossa presença, fazendo o sinal da cruz” (SIMÕES, 1978, p. 71 - grifos nossos). Aqui, os comentários referidos não são explicitados, mas, supõe-se, são as mesmas ofensas xenofóbicas, como se viu anteriormente. O sinal da cruz pode ser tanto um esconjuro (repulsa xenofóbica ao narrador e seus companheiros, estrangeiros que são) quanto (passe como conjectura) gesto de solidariedade pelo luto.

A cena é reiteração do que já se sabe sobre o livro que é, como visto acima, o retrato da “perseguição implacável movida contra os exilados latino-americanos, em quase todos os recantos do mundo” (SIMÕES, 1978) - como diz o autor na contracapa da primeira edição. De passagem, anote-se: aguardente peruana, amigos latino-americanos, luto, xenofobia ostensiva. Elementos que conformam uma micropátria de exilados latino-americanos nas ruas da fria Berlim.

Nas cenas aludidas, há outra repetição - ponto que merece destaque. O esforço do grupo de companheiros em não falar da morte de Dora. O trecho a seguir deixa entrever isso. Trata-se de parte do esforço dos amigos de consolar o protagonista-narrador:

  • - Estás más calmo? Perguntou-me.

  • - Mira, por lo menos anestesiado.

  • - Ya luego habremos olvidado todo.

  • - No lo creo.

  • - Sabes cómo se pasó la cosa?

  • - Cambiemos el asunto - adverti-o rispidamente. Tinha começado a falar para esquecer. Fiquei com raiva. Reclamei que desviara nossa conversa. (SIMÕES, 1978, p. 17 - grifos nossos).

Atente-se para as palavras “coisa” (cosa) e “assunto” (asunto). São dois eufemismos usados para se referir à morte de Dora. Em outros momentos, cenas semelhantes se repetem (SIMÕES, 1978, p. 131 e 146). “Mudar de assunto”, não falar da morte da companheira, eis um procedimento que parece gerar a profusão de outros assuntos - que será, afinal, a própria narrativa.

A partir dessa lógica de “mudar de assunto”, chega ao leitor um emaranhado de textos que aparentemente pouco se conectam. Os eventos imediatos e os passados, os reais e os imaginários, os pensamentos e as falas; o Brasil, o Chile, o México e a Alemanha - tudo se apresenta aos olhos perplexos do leitor, que corre o risco de se perder, num texto cujo narrador melancólico não consegue fixar-se num único assunto (exceto pela repetição metódica de algumas cenas). A melancolia começa a ganhar seus contornos mais definidos. Apresenta-se aqui como a evatio mentis, sintoma presente no melancólico, identificado por teólogos medievais. Na melancolia, segundo esses autores, a mente vaga de fantasia em fantasia e aparenta uma “petulante incapacidade de estabelecer uma ordem e um ritmo para o próprio pensamento” (AGAMBEN, 2007, p. 25).

MEMÓRIA REBELDE

O leitor vivencia intensamente essa desordem - e o fluxo de leitura claudica. O narrador até dá ao leitor algumas pistas sobre seus assuntos e fatos; ínfimas, contudo. Assim, com frequência é preciso pesquisar certo idioma, uma localização, um personagem histórico - para não se perder, como parece perdido o narrador. Um exemplo, dentre muitos: em certo momento, o narrador conta suas idas e vindas, em Santiago do Chile, nas horas posteriores ao golpe militar de Estado (em 11 de setembro de 1973). Ali, verdadeiro terror se instala, com execuções sumárias e públicas, num ambiente de princípio de guerra civil. Dentre as primeiras medidas do governo ditatorial, estão o estado de sítio e o toque de recolher a partir de 17 horas. Num daqueles dias, o narrador-protagonista sai de casa à noite displicentemente, alheio às medidas de exceção. É parado por uma patrulha e escapa por pouco de um fuzilamento sumário depois de subornar um oficial - evento detalhado em seu outro livro, A fuga (GUARANY, 1984, p. 120). Em OFQ, contudo, não há descrição objetiva da cena, nem mesmo menção ao suborno.

Quando o tenente, com laço branco no braço direito, encostou-me na parede, tive a mesma sensação que teve o Marechal, um século antes, durante o cerco de Cerro Corá, enquanto o cabo Chico Diabo o perseguia entre os ramos de goiabeira, atravessando o rio Aquidaban. Lembrei-me que ele mantivera os mesmos hábitos até a hora da morte, que acordou às sete da manhã, como de costume tomou sua xícara de chocolate, fumou um charuto [...] presidiu a sessão do estado-maior enquanto murmurava nos ouvidos de seu filho que morria com a pátria. Mais tarde, correndo por entre os seixos do rio, caiu para ser destripado como um porco. Olhei para cima, entendi que o tenente me dizia qualquer coisa e me empurrava para casa (SIMÕES, 1978, p. 128 - grifo nosso).

O trecho até traz alguma informação sobre a abordagem policial, mas pouca. Diz que certo tenente encosta o protagonista numa parede e, pouco depois, o empurra para casa - liberando-o de uma provável execução sumária por quebra do toque de recolher. Nada se diz sobre um referido suborno (a compra da própria vida), ou sobre a iminente execução, que acaba não acontecendo. Só alhures ficará o leitor sabendo disso. Notável é que, durante a abordagem, o narrador se recorde de certo “Marechal”, cuja história se intromete, sem maior motivo, no fluxo narrativo. Trata-se de um militar do alto escalão, o marechal Francisco Solano López (1827-1870), o general e presidente paraguaio, morto ao fim da Guerra do Paraguai, na batalha de Cerro Corá. Relembre-se que a abordagem do protagonista de OFQ pela patrulha se passa no Chile, nos dias ao redor do 11 de setembro, dia do golpe militar, em 1973. O leitor talvez se pergunte: por que terá vindo à mente do narrador-protagonista (à superfície do texto) justamente o dia da morte de um marechal paraguaio, acontecida em outro século? Há, com efeito, alguma correlação entre os dois fatos, pois se trata de situações de risco de morte. Mas impressiona que a narrativa prefira interpor ao texto uma digressão, cujo conteúdo, além disso, é pouco claro, deixando somente aludida a cena principal em que o narrador está com a vida em jogo. Pouco se fala ali sobre a situação histórica do Chile àquela altura. Nas páginas em que há ambientação e situações relativas ao golpe militar, o principal é oferecido dentro de lógica alusiva e surrealista. Menos, ainda, é dito sobre a guerra do Paraguai, sobre Solano López e a batalha de Cerro Corá10.

É a melancolia e um de seus sinais, a evatio mentis, agindo - mas segundo propósitos bem específicos. Com efeito, parece haver uma lógica narrativa que submete o presente aos caprichos de uma memória que se manifesta à revelia dos personagens e do narrador - e do presumido interesse em simplesmente comunicar. Há, por assim dizer, uma re-hierarquização: a memória se interpõe no presente da consciência, da percepção e do fluxo narrativo, turvando esse mesmo presente, deixando-o numa espécie de segundo plano mal iluminado. Assim, diante do risco de morte, simplesmente muda-se de assunto. Evoquem-se, pois, aqueles diálogos acima referidos em que o protagonista pede a seus companheiros que evitem falar da morte de Dora: “Cambiemos el asunto”. O texto obedece a ordem à risca.

Uma diferença importante, contudo. Se nos referidos diálogos é a vontade do protagonista que se realiza, aqui, parece se dar algo diverso. Ainda que o assunto seja outro, ele não é mudado em função da vontade consciente do narrador - ao contrário. Aqui se impõe o ethos do sobrevivente. Recorde-se Agamben (2008, p. 35 ss.): “o sobrevivente tem a vocação da memória, não pode deixar de recordar”. “Não pode deixar de recordar” aparece aqui querendo dizer “não lhe é dado o direito” ou, mais ainda: “ele perdeu a faculdade de esquecer”. A rigor, o protagonista-narrador pouco controla a narrativa que enuncia; muito menos a consciência ali representada parece ser a de uma instância que controla alguma coisa. Narrador e texto são a representação de uma consciência em descontrole, assombrada pela memória e pelo passado, os quais surgem na narrativa sem que sejam convidados. E o narrador tem consciência disso. Ele fala das lembranças como “visitas inoportunas” (SIMÕES, 1978, p. 69), às vezes vingativas. O trecho seguinte é elucidativo: “Seguimos o vento, preocupados com a lembrança das coisas passadas, […] sentimos que as lembranças nos excruciavam, apesar de que em nenhum momento tivéssemos execrado o passado” (SIMÕES, 1978, p. 71 - grifos nossos). A melancolia aqui se manifesta como essa memória que não deixa em sossego a consciência do narrador.

As lembranças excruciantes, que chegam até o narrador como visitantes indesejados, assemelham-se às imagens do passado de que fala Benjamin em “Sobre o conceito da história” (1994, p. 222-232). Essas memórias são lampejos de um passado que não pode ser esquecido sob pena de uma insuspeita solidariedade com os vencedores do presente. E, para o narrador-personagem, esses vencedores são os generais da ditadura e seus asseclas. Se o “diagnóstico” de Benjamin está correto, então a melancolia entrevista em OFQ faz sentido. O livro surge como uma interação não pacífica entre um passado que exige ser lembrado e um presente que, entretanto, parece querer seguir adiante, sem olhar para trás. A frase inicial do livro reverbera aqui: “Ficamos horas seguidas com o olhar fixo num ponto do horizonte”. Parece que o texto elabora deliberadamente esse estado de espírito, preenchendo-se com elementos que atestam certa condição de sonambulismo. Um sonambulismo comedido11 - por assim dizer -, proposto em chave negativa; aparecendo persistentemente na narrativa (SIMÕES, 1978, p. 115 e 182).

A persistente evasão face ao momento presente, o assédio da memória inclemente e o sonambulismo remontam à experiência brutal do golpe de estado chileno, já aludido, que se passa antes da fuga do protagonista e de Dora para a Alemanha. Uma cena é decisiva. Trata-se dos dias posteriores ao golpe militar e da destruição do palácio presidencial de La Moneda, consequência do golpe. Ali a evatio mentis já se ensaia. Numa cena cotidiana de visita à casa de conhecidos chilenos, o protagonista conversa com alguns deles, no entorno de uma mesa. Porém não consegue fixar-se na conversa presente, e divaga: “O que estava me chegando à vista era aquela visão dos buracos nas paredes do palácio. Meu pensamento voava longe…” (SIMÕES, 1978, p. 122 - grifos nossos). Com efeito, o palácio referido no trecho é o mesmo há pouco mencionado, após ter sido bombardeado por canhões e aviões durante o ataque em que morreu o presidente Salvador Allende (1908-1973). Pouco antes, o narrador havia descrito seu estado e o de Dora ao verem a ruína: “Mudos ficamos na contemplação passiva daquele terremoto humano, obra faraônica da destruição: os escombros do palácio presidencial. Durante horas mantivemos o olhar triste naquela paisagem desoladora, como planícies lunares, como crateras vietnamitas” (SIMÕES, 1978, p. 118 - grifos nossos). Mais uma vez, aquela imobilidade que se vê nas palavras iniciais do livro.

A imagem da destruição do palácio é metonímia da perda de um projeto político. O que ali aparece em escombros é a derrocada do próprio governo socialista chileno, metonímia, por sua vez, do sonho das esquerdas latino-americanas de então. Era, nessa linha, o sinal inescapável dado aos refugiados brasileiros naquele país: fim do sonho socialista no Chile e drástica redução da possibilidade de viver, fora do Brasil, em solo latino-americano. Mais tarde, soma-se, a todos esses traumas, o suicídio de Dora. E aquela tarde berlinense, acima aludida, aparecerá, pois, como coroamento de tudo. O trecho a seguir o explicita: “Saímos caminhando com a permanente sensação de vazio no peito […] insones, sonâmbulos naquelas alamedas” (SIMÕES, 1978, p. 71 - grifo nosso).

Nessa linha, impressiona o quanto a memória de Dora tem destaque na narrativa. Não se trata só da memória do narrador a respeito da companheira. Trata-se da própria memória da companheira, que se impõe dentro da lógica sonâmbula da narrativa. Importante exemplo são as cenas de prisão e tortura de certo Chael, apresentadas em fragmentos nas primeiras páginas. Chael Charles Schreier (1946-1969) foi companheiro de guerrilha de Dora, tendo ambos morado no mesmo “aparelho”. Juntos, foram capturados e presos, depois de dias de tocaia da repressão, que culminou com violenta troca de tiros. Chael acaba brutalmente assassinado sob tortura. Notável é que Guarany Simões e Chael, ao que consta, nunca estiveram presos juntos e não se conheceram. A lembrança que o texto explicita advém de Dora.

O texto fala da prisão e da tortura de Chael como se o narrador-personagem a tivesse presenciado:

Ele [Chael] ainda pôde indicar para os outros que tudo estava bem, com o polegar levantado. No corpo dançavam os hematomas azuis e cor-de-rosa na valsa do jorro de sangue que vertia com as águas das cascatas do interior de Minas, quando ela [Dora] ia brincar com os irmãos, construindo pequenos castelos com a lama que formava nas margens do rio cheio de mistérios para sua ilimitada infantil imaginação. Chael tinha passado pelo corredor com o corpo em frangalhos, puro trapo; tivemos a impressão que sorria […] para os velhos amigos que se debruçavam nas grades com os olhos esbugalhados de espanto. (SIMÕES, 1978, p. 26 - grifos nossos).

Não surpreende que o trecho venha mesclado pela perspectiva de Dora, com detalhes de sua memória infantil e, também, da realidade do cárcere. Assim, por exemplo, “cascatas do interior de Minas” é elemento da memória de Dora. O momento mais significativo dessa mistura entre memórias se dá quando a família de Dora é tematizada. Sabe-se que numa autobiografia não é incomum que o narrador conte seu próprio passado familiar: pais, cidade natal etc. Com efeito, está ausente ali o passado de jovem de classe média, filho de dono de farmácia que também foi militante de esquerda, morador de Niterói (SILVA, 2006, p. 86-87) - o que, por alto, é referido em seu outro livro, A fuga. Por contraste, há considerável referência à memória familiar de Dora. A narrativa entrevê, num tom que mistura o biográfico e o ficcional, a chegada dos pais da companheira à remota Antônio Dias (MG), tempos antes de seu nascimento. O pai, o Sô Barcelos, mencionado algumas vezes (SIMÕES, 1978, p. 47-48; 66-67), está lá.

MAIS MELANCOLIA

Sai o passado do narrador-personagem, entra o de Dora. O movimento é coerente com um quadro geral de melancolia. Diz Freud, oportunamente, que a melancolia se refere a “um rebaixamento do sentimento de autoestima, que se expressa em autorrecriminações e autoinsultos, chegando até a expectativa delirante de [auto]punição” (FREUD, 1992, p. 133). Há mesmo na melancolia uma “tendência ao suicídio” (FREUD, 1992, p. 137).

Assim, é lícito supor que toda a diluição do eu promovido pela narrativa é marca de dois movimentos complementares. O primeiro, o da melancolia do próprio narrador, resultado do suicídio da companheira; o segundo, a tentativa de emular em si mesmo a melancolia da própria Dora - fator que a teria levado ao suicídio. O romance seria, assim, uma tentativa de investigar escrituralmente as causas da morte de Dora. O pressuposto é que a própria Dora teria passado por um processo de melancolia - algo, aliás, ausente na narrativa. Significativa, pois, a surpresa do narrador ante a súbita doença de Dora. “Um dia, seus nervos explodiram, arrebentaram. E eu fiquei, impressionadíssimo, olhando para ela; jamais poderia supor, pois sempre a vi forte, mais forte do que os outros” (SIMÕES, 1978, p. 184).

Dora é forte - assim a representa a narrativa. Sua força se constitui em função de certa fraqueza confessa do narrador-personagem, que, aliás, se compraz em se representar assim. Uma linha que percorre todo texto é o contraste entre certa fragilidade do protagonista-narrador e a ostensiva força de Dora. Segue-se a constatação, aliás, frustrada no decurso da narrativa: se há suicídio previsível no transcurso da narrativa, não é o de Dora.

Desse modo, o livro põe, sob os olhos do leitor, um verdadeiro “delírio de inferioridade” moral (FREUD, 1992, p. 133). O protagonista-narrador não chega a se depreciar usando adjetivos pejorativos. Contudo, há cenas em que se representa com características que o situam na condição de herói “baixo” - de difícil definição12, entretanto. Alguns exemplos de uma evidente “malandragem”. Quase sempre sem trabalho, o protagonista abandona empregos (muitos de pouca qualificação) sem dar qualquer satisfação aos empregadores (SIMÕES, 1978, p. 112, p. 157); desempregado, mente para Dora, dizendo que, quando sai de casa, está á procura de emprego; mente também para explicar o fato de (apesar de desempregado) ter dinheiro (SIMÕES, 1978, p. 84); responsável que está pelas compras da casa, se esquece de fazê-las (SIMÕES, 1978, p. 134); na faculdade, os colegas se encarregam de fazer para ele (sabe-se lá como) suas provas de matemática (SIMÕES, 1978, p. 160). Outras cenas aludem a certa fraqueza inerente do protagonista, por exemplo: muito antes da morte de Dora, ele já está deprimido (SIMÕES, 1978, p. 114) e vive em devaneios, em verdadeiro alheamento (SIMÕES, 1978, p. 184); aqui e ali, se mostra incapaz de se concentrar nas aulas (SIMÕES, 1978, p. 115) ou nas leituras (SIMÕES, 1978, p. 182); está sempre doente (SIMÕES, 1978, p. 181), sofrendo de uma coceira tristemente cômica que o obsedia (SIMÕES, 1978, p. 114-115), dentre outras condições lamentáveis.

Dora é o seu oposto. Já nos primeiros dias de convívio ressalta-se sua disciplina:

De início vi que sua capacidade de trabalho era impressionante [que] acordava invariavelmente às sete da manhã, que passava noites em claro lendo [...] que de manhã ia fazer a meia hora de ginástica necessária para a manutenção da forma física e poder aguentar horas seguidas de reuniões e discussões. (SIMÕES, 1978, p. 79-80).

Disciplina e capacidade de trabalho são as características que a definem. Cedo ela começa a trabalhar em tarefas ligadas a sua futura formação (no Brasil, ela estava nos últimos anos de Medicina), por vezes cumprindo longas jornadas, chegando a 12 horas diárias (SIMÕES, 1978, p. 134). Além disso, é uma fortaleza afetiva e mental: aos poucos, torna-se, invariavelmente, a voz do consolo para as muitas horas de dor e desespero do companheiro (SIMÕES, 1978, p. 114). É dela, muitas vezes, que vem o “cutucão” que o tira do devaneio (SIMÕES, 1978, p. 115). Na fuga, ante as execuções sumárias da ditadura chilena, pelas ruas de Santiago, ela é a bússola (SIMÕES, 1978, p. 130). É dela também a fonte de certa ingênua sabedoria prática, recorrendo a pequenas máximas de conforto para tentar repor a vida de ambos nos eixos, após algum sobressalto. Diz a personagem: “todos no mundo cometemos nossos pequenos enganos” (SIMÕES, 1978, p. 136; também p. 122). É ela quem cuida da saúde do protagonista e o recolhe do torpor, no gelo das ruas berlinenses (SIMÕES, 1978, p. 184). É ela, enfim, quem espanta os agourentos corvos da desesperança, e quem está sempre anunciando para o futuro (“um dia”) a saída definitiva do inferno (SIMÕES, 1978, p. 181) - dentre as várias feições da granítica e hagiológica superioridade que a narrativa confere a Dora, a Maria Auxiliadora. Na contramão disso, um leitor desconfiado poderia procurar nela algum sinal de doença mental. Fora as que são dadas nas cinco últimas páginas, nada se vê.

Pouco, enfim, se diz sobre uma doença que a levasse ao suicídio. Mas há o que se especular numa outra direção. O texto sonâmbulo de OFQ seria, sim, esforço de representação de certo sonambulismo da própria Dora. Guarany Simões, ao se representar ele mesmo como melancólico, está tentando uma reaproximação com Dora: com a eventual melancolia dela (a porta aberta para seu suicídio) e que ele não percebeu - ou não quis perceber.

A melancolia pressupõe uma perda. Para Freud, ela aparece como índice de uma perda cujo objeto não é identificado, ou resta turvado. Se no luto o sujeito sabe o que efetivamente perdeu, na melancolia, não. O objeto perdido, que faz o melancólico sofrer, está, por assim dizer, aquém de sua consciência. Para Freud (1992, p. 132 - grifo nosso), o sujeito até “conhece qual é a perda que ocasionou a melancolia, na medida em que de fato sabe quem ele perdeu, mas não o que perdeu nele [no objeto]”. De fato, o romance é amplo inventário de perdas relativas ao exílio. Perde-se a pátria brasileira, a pátria socialista latino-americana (o Chile de Allende), a própria revolução, que faltou ao encontro. Em certo sentido, perde-se a própria língua. E, por fim, Dora.

Mas talvez se devesse pensar a melancolia de Guarany Simões como índice maior de um encontro - não só de uma perda. Com efeito, Agamben, na esteira de Freud e dos teólogos medievais, mostra o quanto a melancolia é, paradoxalmente, indício ao mesmo tempo de uma perda e de um encontro; é uma fuga de algo e uma fuga para algo. Relembra então que a melancolia não se refere a um mal - ao contrário, se refere a um bem. Posto que foi mostrado a alguém um vislumbre do bem supremo, esse alguém se sente sem forças para percorrer o caminho até esse bem. Desistindo de buscá-lo na sua concretude, uma vez que se sente sem recursos, esse alguém se contenta em encontrar aquele bem no recesso de si, na interioridade. Encontrando a imagem desse bem, encontra-se a si mesmo. Daí a paralisia típica do melancólico, encantado que está com a bem-aventurança imaginária e interior que alcançou; por sua vez, acovardado que está ante as tarefas que esperam por ele para obter a bem-aventurança concreta e exterior - que afinal continua lhe aparecendo como dever incontornável, apesar de inalcançável. No caso de Guarany Simões, cabe perguntar: que bem-aventurança é essa? A analogia não é excessiva: se para alguns religiosos medievais o supremo bem era Deus, para certos revolucionários dos anos de chumbo o supremo bem não estava longe de ser a própria revolução, com seus conteúdos abstratos de igualdade e de libertação, de justiça social e de morte das ditaduras.

Noção análoga sobre a melancolia acha-se em outro contexto, em W. Benjamin, que se baseia também na teologia medieval. Para o filósofo, a melancolia aparece como “acedia”, a “inércia do coração [...], que desespera de apropriar-se da verdadeira imagem histórica, em seu relampejar fugaz” (BENJAMIN, 1994, p. 225). Aqui, o melancólico também parece ter vislumbrado certo bem. Benjamin (1994, p. 225) fala do “verdadeiro” historiador, aquele que precisa saber identificar a “verdadeira imagem histórica”, oposto ao historiador positivista. Tal imagem se impõe como um corisco. Se esse historiador não captura essa “imagem verdadeira”, sobrevém-lhe o risco de se fixar numa mera imagem historicista, na vulgar história dos vencedores - dentre outros, fixada em heróis, em datas, em batalhas etc. Uma forma, pois, de se identificar com todos os vencedores do presente.

O protagonista-narrador de OFQ sabe quem são os vencedores de seu tempo: os generais das ditaduras latino-americanas de então. Desistir de capturar uma imagem do passado em que nela figurem os perdedores é, assim, correr o risco de se solidarizar com aqueles vencedores do presente. Se há uma solidariedade a perseguir, ela deve se dar em relação aos vencidos. Notável, nesse sentido, a presença de Solano López na cena comentada acima. Ele é o general derrotado da Guerra do Paraguai. Também notável, por extensão, é a presença de tantos outros derrotados no texto. Guarany Simões repudia se solidarizar com algo mais do que com esses perdedores. Passado e memória são mais do que um mero conteúdo da interioridade do narrador - aparecem como verdadeiras tarefas que não podem ser abandonadas sem que sobrevenha grave ferida. Enfim, são duas formas de apreender a melancolia de OFQ na figura do sobrevivente, que é o protagonista-narrador.

A primeira, uma tristeza por fugir da conquista do bem supremo - por não ter forças ou recursos para atingi-lo. As sucessivas derrotas da esquerda, primeiro a brasileira e, em seguida, a chilena (dentre outras), vão sinalizando que aquele bem parece a cada momento mais distante, demandando mais trabalho. Tristeza, enfim, que é esforço para evitar a empatia com os vencedores e certa culpa ante as tarefas abandonadas face ao bem supremo. Eis então o narrador: assombrado pelas terríveis imagens dos derrotados que insistem em não ir embora e que não o deixam em paz.

A segunda, um encontro com a bem-aventurança: trabalho escritural que está em OFQ, em que a tardia aproximação do protagonista-narrador com Dora é buscada abnegadamente. Eis mais uma vez o narrador, agora como sobrevivente: quase se anulando e, ao mesmo tempo, identificando-se com Dora para lhe dar uma sobrevida, para investigar-lhe as causas do suicídio; para “re-ter” na escritura a companheira morta que, em certo sentido, é a imagem fulgurante da própria revolução perdida.

  • 3
    Na tradução de Marilene Carone (FREUD, 1992, p. 134).
  • 4
    Doravante, usa-se o acrônimo.
  • 5
    Doravante, usa-se o acrônimo.
  • 6
    As “verdadeiras” testemunhas, as “testemunhas integrais” são as que não testemunharam, nem poderiam fazê-lo. Os sobreviventes, como pseudotestemunhas, falam em seu lugar, por delegação: testemunham sobre um testemunho que falta (AGAMBEN, 2008, p. 43)
  • 7
    É inegável que o tema do exílio, acompanhado da experiência da perda e da nostalgia, constitui um dos topoi retórico-poéticos mais tradicionais da literatura ocidental. Para situá-lo na tradição artística de língua portuguesa, recorde-se do poema “Sôbolos rios que vão”, de Camões (1843), glosa do Salmo 136, que tematiza o exílio do povo judeu. A lembrança desses textos, nos quais a ocorrência do verbo “ficar sentado” marca ontologicamente a posição do sujeito diante da passagem destruidora do tempo, ilumina o que está na base de uma metafísica cristã, que entende a contemplação, o repouso dos corpos em meditação, como espera fiel do horizonte escatológico da fé. Em contraposição, na experiência moderna, inscrita no romance, o horizonte utópico, frustrado politicamente, é experimentado como dor sem redenção, sem transcendência, apenas na imanência do sofrimento exasperador ou lutuoso.
  • 8
    Hipérboles como essa são recorrentes no livro, como, por exemplo, nas páginas 118 e 121 (SIMÕES, 1978). Indicam certa incapacidade de dimensionar a realidade de um “eu”, em todos os sentidos, diminuído e apequenado.
  • 9
    O conceito é de Robert Alter (2007) e é usado pelo crítico como instrumental para pensar o texto bíblico, mas aqui se presta à reflexão em questão. A “cena-padrão” se repete no texto bíblico para produzir coesão em um texto paratático. O procedimento faz pensar que o fenômeno da repetição, em OFQ, pode ser um expediente de ligação sintática entre coisas distantes e “quebradas”. Nesse sentido, a repetição é tanto um elemento de coesão quanto espécie de conjunção que se presta a ordenar o aparente caos - nesse caso, o caos decorrente da perda da companheira. Contudo, essa repetição está ferida por uma espécie de neurose, de patologia. A repetição seria, portanto, uma forma de organização neurótica do texto, entendida não como sintoma de uma patologia a ser curada, mas, simplesmente, como artifício literário.
  • 10
    Para outra menção ao personagem, ver: Simões (1978, p. 48).
  • 11
    Uma contextualização para ajustar o foco de análise. Não há nenhuma positividade nesse sonambulismo. Ele é metáfora da perda da identidade e da consciência - tida, afinal, como negativa. Com efeito, no contexto dos anos 1970, OFQ vai na contramão daqueles produtos culturais que, naquele momento, estão celebrando a alteração da consciência como forma de ampliação cognitiva. Viviam-se, desde o final dos anos 1950, os influxos do psicodelismo e da crítica às limitações da consciência como forma de autoconhecimento (desdobramento, dentre outros, tanto da psicanálise quanto do surrealismo, que, entre jovens, ganha força no que se chamou de “contracultura”). É a era das drogas psicodélicas, como o LSD, a mescalina, a psilocibina e outras. Embora escrito nesse contexto, a única droga referida no livro é o álcool. Trata-se, assim, de um romance dos anos 1970, que figura uma consciência profundamente alterada e que, contudo, passa ao largo daquelas experiências.
  • 12
    O livro está longe de ser cômico - tão grave é o seu tom; disso deriva que seu herói está longe das fabulações dos pícaros (muito longe, aliás), longe de ser um malandro, no sentido dado por Antonio Candido (1993); longe também de ser o herói sem nenhum caráter que é Macunaíma (ANDRADE, 1928).

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Jun 2023
  • Aceito
    23 Abr 2024
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