Resumos
OBJETIVO: Determinar o impacto, na manutenção da amamentação além dos 2 meses, de um programa chamado "17 passos", que consiste de 17 estratégias para promoção, apoio e proteção à amamentação, implementados durante 10 meses em um centro de saúde. MÉTODOS: Ensaio clínico não-aleatorizado, com 147 crianças nascidas de 1º de janeiro de 1999 a 31 de dezembro de 2001, que tiveram seu primeiro atendimento antes de completar 2 meses de idade; 67 crianças foram submetidas ao programa tradicional e estudadas retrospectivamente, e 80 foram submetidas aos 17 passos e estudadas prospectivamente. O tempo de seguimento máximo foi de 10 meses. O impacto do programa no aleitamento foi avaliado por meio de técnicas de análise de sobrevida. As curvas de sobrevivência foram descritas pelo método de Kaplan-Meier e comparadas pelo teste log-rank. Utilizou-se o modelo de Cox para o ajuste por covariáveis. A comparação inicial dos grupos foi feita através dos testes t, Kruskal-Wallis e qui-quadrado. Considerou-se o nível de significância de 5%. RESULTADOS: Ajustando-se por covariáveis da mãe e da criança, observou-se diferença significativa entre o tempo de aleitamento dos dois grupos (p = 0,047). O risco relativo de interrupção do aleitamento materno para o grupo dos 17 passos foi de 0,54 (intervalo de confiança 95% = 0,30-0,99), indicando que o risco de as crianças submetidas à intervenção tradicional interromperem a amamentação antes de completar 1 ano é 85% superior ao das crianças submetidas aos 17 passos. CONCLUSÃO: O programa teve impacto positivo na duração da manutenção do aleitamento materno dos 2 aos 12 meses de idade.
Intervenção; promoção; avaliação; programa; amamentação
OBJECTIVES: To determine the impact on breastfeeding sustained beyond two months of the "Seventeen Steps" breastfeeding maintenance program consisting of seventeen strategies used to promote, support and protect breastfeeding and implemented for ten months at a medical center. METHODS: Non randomized clinical trial, involving 147 children born between 01/01/99 and 31/12/2001, who had attended their first medical appointment before two months; 67 children who had passed through the traditional program were studied retrospectively and 80 that had the "17 steps" applied to them were studied prospectively. Maximum follow up period was ten months. The program's impact on breastfeeding was evaluated through survival analysis techniques. The survival curves were described by the Kaplan Meier method and compared with the log-rank test. The Cox regression model was used for covariate adjustment. The initial group comparison was done through the t, Kruskal-Wallis and chi-squared tests. The significance level adopted was 5%. RESULTS: Adjusting for mother-child covariates, a significant difference was observed in breastfeeding duration between the two groups (p = 0.047). The relative risk of interrupting breastfeeding for the "17 steps" group was RR = 0.54 (95CI = 0.30-0.99), indicating that there was an 85% greater risk that children on the traditional program would be weaned before completing a year than there was that children on the "17 steps" program would be. CONCLUSION: The program had a positive impact on the duration of breastfeeding from two to twelve months of age.
Intervention; promotion; evaluation; program and breastfeeding
ARTIGO ORIGINAL
Impacto de um programa para promoção da amamentação em um centro de saúde
Adolfo P. B. LanaI; Joel A. LamounierII; Cibele C. CésarIII
IMestre em Pediatria, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG
IIProfessor adjunto, Departamento de Pediatria, Faculdade de Medicina, UFMG, Belo Horizonte, MG
IIIProfessor adjunto, Departamento de Estatística, Faculdade de Ciências Econômicas, UFMG, Belo Horizonte, MG
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Adolfo Paulo Bicalho Lana Rua Pio Porto Menezes, 120/104A CEP 30380-300 - Belo Horizonte, MG Fone: (31) 9973.2717 - Fax: (31) 3337.8836 E-mail: adolfobicalholana@bol.com.br
RESUMO
OBJETIVO: Determinar o impacto, na manutenção da amamentação além dos 2 meses, de um programa chamado "17 passos", que consiste de 17 estratégias para promoção, apoio e proteção à amamentação, implementados durante 10 meses em um centro de saúde.
MÉTODOS: Ensaio clínico não-aleatorizado, com 147 crianças nascidas de 1º de janeiro de 1999 a 31 de dezembro de 2001, que tiveram seu primeiro atendimento antes de completar 2 meses de idade; 67 crianças foram submetidas ao programa tradicional e estudadas retrospectivamente, e 80 foram submetidas aos 17 passos e estudadas prospectivamente. O tempo de seguimento máximo foi de 10 meses. O impacto do programa no aleitamento foi avaliado por meio de técnicas de análise de sobrevida. As curvas de sobrevivência foram descritas pelo método de Kaplan-Meier e comparadas pelo teste log-rank. Utilizou-se o modelo de Cox para o ajuste por covariáveis. A comparação inicial dos grupos foi feita através dos testes t, Kruskal-Wallis e qui-quadrado. Considerou-se o nível de significância de 5%.
RESULTADOS: Ajustando-se por covariáveis da mãe e da criança, observou-se diferença significativa entre o tempo de aleitamento dos dois grupos (p = 0,047). O risco relativo de interrupção do aleitamento materno para o grupo dos 17 passos foi de 0,54 (intervalo de confiança 95% = 0,30-0,99), indicando que o risco de as crianças submetidas à intervenção tradicional interromperem a amamentação antes de completar 1 ano é 85% superior ao das crianças submetidas aos 17 passos.
CONCLUSÃO: O programa teve impacto positivo na duração da manutenção do aleitamento materno dos 2 aos 12 meses de idade.
Intervenção, promoção, avaliação, programa, amamentação.
Introdução
As propriedades nutricionais, imunológicas e fisiológicas do leite humano, os aspectos psicoafetivos que resultam da interação mãe-filho durante a amamentação e o aspecto econômico podem ser traduzidos em benefícios para a criança, a mãe, a família, a sociedade e o próprio Estado1,2.
Dados nacionais mostram que 96% das mulheres iniciam a amamentação, apenas 11% amamentam exclusivamente até 4 a 6 meses, 41% mantêm o aleitamento materno até 1 ano, e 14% até os 2 anos3, índices abaixo dos aconselhados pela Organização Mundial de Saúde, que são recomenda aleitamento exclusivo até 6 meses e aleitamento materno complementado até 2 anos, no mínimo4.
Outro aspecto é o despreparo do pessoal de saúde. As falsas crenças existentes em relação à prática da amamentação também são encontradas entre eles5,6.
Programas de promoção do aleitamento materno que incluem a capacitação da equipe de saúde têm grande impacto nas práticas desses profissionais, ocasionando maior duração da amamentação nas comunidades por eles assistidas7,8.
Este estudo avalia o impacto, na manutenção do aleitamento materno a partir dos 2 meses de idade, com censura aos 12 meses, da adoção de um programa consistindo de 17 passos para a promoção da amamentação, implementado em um centro de saúde.
Métodos
Foram estudadas 147 crianças moradoras da área de abrangência e influência do Centro de Saúde São Francisco, unidade básica de saúde localizada no Distrito Sanitário Pampulha, região Norte de Belo Horizonte (caracterizada pela predominância de uma população de baixa renda), nascidas entre 1º de janeiro de 1999 e 31 de dezembro de 2001, cujas mães procuraram espontaneamente este centro de saúde antes de as crianças completarem 2 meses de idade e que ainda estavam sendo amamentadas aos 2 meses de idade.
Não houve perdas na amostra, pois não houve crianças cujas mães se recusassem a participar do estudo ou fossem portadoras de doenças e/ou condições que contra-indicassem o aleitamento materno.
Esta pesquisa constituiu-se em ensaio clínico não-aleatorizado, um estudo quase-experimento9. Todas as crianças que tiveram seu primeiro atendimento no centro de saúde antes de completar 2 meses e que ainda mamavam ao completar 2 meses foram submetidas a intervenções tradicionais (67 crianças nascidas de 1º de janeiro de 1999 a 31 de agosto de 2000); essas crianças foram estudadas retrospectivamente e constituíram o Grupo 1. Um segundo grupo, obedecendo ao mesmo critério acima, foi submetido ao programa "17 passos"; essas crianças foram estudadas prospectivamente (80 crianças nascidas de 1º de dezembro de 2000 a 31 de dezembro de 2001) e constituíram o Grupo 2. A implantação do programa ocorreu entre 1º de setembro de 2000 a 31 de novembro de 2000. As crianças do Grupo 1 que ainda estavam sendo amamentadas ao final da implantação do programa acabaram sendo beneficiadas pelo mesmo em parte de seu seguimento.
A intervenção tradicional consistia nas rotinas anteriormente realizadas no centro de saúde: aconselhamento do pediatra à mãe, individualmente, dentro do consultório, e reuniões semanais com gestantes, de duração aproximada de 1 hora, em que eram abordados temas do pré-natal e de aconselhamento familiar, sem nenhuma ênfase especial ao aleitamento materno.
Os profissionais foram capacitados por meio de palestras e observações críticas do aconselhamento em amamentação feito pelo pediatra, tanto no manejo clínico quanto nas habilidades de escuta e de reforço da autoconfiança materna. A palestra do pediatra também os colocou a par das 17 estratégias para promoção, apoio e proteção do aleitamento materno e das razões de cada uma delas (Tabela 1).
Para efeito deste estudo, os seguintes termos foram definidos:
Aleitamento materno exclusivo (AME): a criança só recebe leite materno de sua mãe ou nutriz, ou então leite materno extraído; nenhum outro líquido ou sólido, com exceção de gotas ou xaropes de vitaminas, suplementos minerais ou remédios, é dado à criança21.
Aleitamento materno predominante (AMP): a fonte predominante de alimentação da criança é o leite humano. No entanto, também se podem administrar água e bebidas à base de água (água açucarada e com sabores, infusões, chá, etc.), sucos de frutas, solução de sais de reidratação oral, vitaminas, minerais e remédios em forma de gotas e xaropes. Com exceção do suco de frutas e da água açucarada, nesta definição não se permite incluir nenhum líquido baseado em alimentos21.
Aleitamento materno complementado (AMC): o leite humano é ainda fonte de alimentação da criança, mas ela também recebe outros alimentos sólidos, semi-sólidos ou líquidos, inclusive leite não-humano21.
Aleitamento materno (AM): a criança recebe leite humano direto da mama ou ordenhado.
Interrupção do AM: é o processo pelo qual se retira totalmente o leite materno da alimentação da criança.
Para o cálculo do tamanho da amostra, consideraram-se os seguintes aspectos: prevalência do AM em 41% aos 12 meses de idade3, meta de 65% a ser alcançada aos 12 meses, probabilidade do erro tipo 1 (a) igual a 0,05, poder do teste (1-ß) igual a 0,80, direção do teste para aumento do impacto. Segundo esses critérios, o tamanho da amostra foi estimado em 71 crianças para cada um dos dois grupos.
Devido aos critérios utilizados para inclusão, a amostra final do estudo constituiu-se de 67 crianças no grupo controle e 80 crianças no grupo tratamento. Embora não tenha sido possível recrutar o número necessário de crianças para o grupo controle, o poder do estudo não ficou comprometido, porque foram recrutadas mais crianças para o grupo tratamento.
O questionário foi aplicado às mães exclusivamente pelo pesquisador responsável, imediatamente antes da consulta da criança. Abordava variáveis que permitiram demonstrar a similaridade entre os dois grupos em aspectos que poderiam influenciar a duração do AM (Tabela 2).
Medidas foram adotadas nas diferentes áreas físicas do centro de saúde visando cumprir os 17 passos e envolver as diversas categorias de funcionários, todos expostos ao programa. Na sala de reuniões, o grupo de gestantes e o de nutrizes foram coordenados por uma auxiliar de enfermagem. Seus componentes compartilhavam dúvidas, temores e ansiedades sobre maternidade e amamentação, trocavam experiências e recebiam orientações. As consultas pré-natais eram marcadas para as terças-feiras, e as de controle das crianças sendo amamentadas, para as quartas-feiras. Enquanto aguardavam a consulta com o obstetra ou com o pediatra, constituíam grupos. Na sala do obstetra, as gestantes eram sensibilizadas para a amamentação e recebiam material escrito para ser compartilhado com familiares e amigas grávidas ou amamentando. Na sala do teste do pezinho, uma auxiliar de enfermagem informava-se sobre o andamento da amamentação e reforçava positivamente a mãe, encaminhando-a, após o teste, ao pediatra. Na sala do pediatra, eram avaliadas as condições da mãe, do bebê e da amamentação. De acordo com a avaliação, retornos da dupla mãe-filho eram solicitados para o dia seguinte ou em até 1 mês. A mãe era, então, informada sobre a possibilidade de atendimento da criança mesmo sem consulta agendada e recebia material escrito, diferente a cada consulta, para ser lido com familiares e amigas. Na recepção ou no acolhimento, crianças sendo amamentadas sempre eram encaminhadas para atendimento pediátrico, mesmo com a agenda sem vagas. Na farmácia, mães amamentando com receita de pílula combinada eram encaminhadas ao pediatra para aconselhamento.
Os dados foram armazenados no programa Epi-Info22. Na comparação dos grupos, foi empregado o teste do qui-quadrado para covariáveis categóricas, o teste t de Student para a comparação de médias, e o teste de Kruskal-Wallis para a comparação de medianas; para a análise de sobrevida, em que a interrupção do aleitamento foi considerada como o evento de interesse, utilizou-se a curva de Kaplan-Meier; para a comparação entre as duas curvas de sobrevida, utilizou-se o teste de log-rank; e para ajuste pelas características da mãe e da criança, utilizou-se o modelo de regressão de Cox. Foi considerado o valor de 5% (p < 0,050) como limiar de significância estatística.
O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da UFMG (Parecer 111/02, de 30 de julho de 2002), e foram firmados os termos de consentimento das mães, o termo de compromisso do pesquisador responsável e o termo de compromisso do gerente da instituição. A pesquisa está de acordo com a Resolução 196/96 do Ministério da Saúde.
Resultados
A Tabela 2 apresenta a descrição das variáveis consideradas na análise segundo o tipo de intervenção. Os valores apresentados referem-se à média?desvio padrão para as variáveis numéricas. Para as variáveis categóricas, são apresentadas a freqüência absoluta e a freqüência percentual, entre parênteses. A análise desta tabela indica que os grupos intervenção 17 passos e tradicional são semelhantes com relação às características analisadas, à exceção da duração da gestação, que apresentou valor p = 0,021. Um estudo mais cuidadoso da variável mostrou que a significância se deveu à presença de um ponto discrepante (27 semanas de gestação) no grupo 17 passos. Sua grande influência foi em virtude da pequena variabilidade observada para a variável (coeficiente de variação = 4,68%). Em suma, podemos considerar os dois grupos como equivalentes segundo as covariáveis analisadas.
Na curva de Kaplan-Meier para os dois grupos (Figura 1), observa-se que a curva de sobrevivência relativa ao grupo 17 passos está sempre acima da curva relativa ao grupo tradicional, indicando que, para todas as idades, a proporção de crianças sendo amamentadas é maior no grupo 17 passos que no grupo tradicional. A comparação entre as curvas pelo teste log-rank indica que não há uma diferença significativa entre elas (p = 0,057). O tempo mediano de AM no grupo tradicional foi de 11,5 meses. Para o grupo 17 passos, não foi possível determinar a mediana, uma vez que mais de 50% das observações foram censuradas.
A probabilidade de significância pequena, apesar de não significativa, indica a necessidade de se considerar a avaliação do tratamento em um modelo de regressão. Isso porque, embora os grupos sejam equivalentes com relação às covariáveis medidas, havendo efeito de tratamento, as saídas ocorrem de forma diferenciada nos dois grupos, e a composição inicial não se mantém durante todo o processo; além disso, é importante o controle por elas em um modelo de regressão. A Tabela 3 apresenta o modelo ajustado.
Não foram contempladas no modelo as seguintes variáveis: duração do aleitamento do filho anterior, por haver informação apenas para 91 mulheres que tinham tido outro filho; tipo de casa, tipo de sanitário e indicador de que sabe ler, pela grande homogeneidade dos grupos em relação a tais variáveis. Como a relação entre a idade da mãe e o tempo de interrupção da amamentação não era linear, optou-se por trabalhar com a covariável categorizada. Essa decisão foi tomada considerando razões estatísticas e substantivas e levou a um melhor ajuste e maior ganho em termos de interpretação. A idade da mãe foi categorizada em < 20 anos, 20-29 anos e 30 anos ou mais. As duas últimas categorias não apresentaram diferença significativa e foram agrupadas em uma única categoria, considerada a categoria de referência.
Após o ajuste pelas características da mãe e da criança, observou-se, para o grupo 17 passos, uma redução no risco de interrupção do AM entre as idades de 2 e 12 meses em comparação ao grupo controle (risco relativo, RR = 0,54; intervalo de confiança, IC = 95%; 0,30-0,99).
Duas covariáveis apresentaram efeito significativo: orientação no pré-natal e intervenção 17 passos. A covariável indicadora de orientação pré-natal apresentou associação com um maior risco de suspensão do aleitamento entre 2 e 12 meses após controle pelas demais covariáveis (RR = 2,20) portanto, na direção contrária à esperada. Com relação à intervenção 17 passos, o efeito é na direção esperada, com as mulheres do grupo tradicional apresentando um risco aumentado de interrupção do AM.
Embora não significativo, o indicativo de mãe adolescente apresentou um valor p pequeno (p = 0,084) e um IC muito amplo (0,92-3,66), indicando que pode existir um diferencial entre mães adolescentes e as demais com relação à duração do aleitamento, com as mães adolescentes tendendo a amamentar por um período mais curto (maior risco de interrupção do aleitamento).
Discussão
Os grupos tradicional e 17 passos não apresentaram diferença quanto às características das mães, crianças, gestação, parto e pós-parto.
As crianças do Grupo 1 foram submetidas somente à intervenção tradicional, interrompendo o AM antes de 1º de dezembro de 2000, data em que teve início a intervenção 17 passos. Aqueles que mantiveram a amamentação além dessa data se beneficiaram dos 17 passos.
As estratégias para aumentar a duração da amamentação foram tomadas todas ao mesmo tempo, tornando-se impossível isolar o efeito de cada uma delas. Uma possível interação sinérgica entre as estratégias deve ter contribuído para a obtenção dos resultados.
O programa 17 passos provavelmente contribuiu para aumentar o grau de informação sobre AM dos trabalhadores de saúde, das grávidas, das nutrizes e da comunidade em geral, incentivando o trabalho em equipe dos trabalhadores de saúde e do conjunto de trabalhadores de saúde e comunidade e incrementando a participação da comunidade na promoção, apoio e proteção do AM. A intervenção atendeu aos passos 3 e 10 da Iniciativa Hospital Amigo da Criança: "informar todas as gestantes sobre as vantagens e o manejo do aleitamento" e "encorajar a formação de grupos de apoio à amamentação para onde as mães devem ser encaminhadas logo após a alta do hospital ou ambulatório", respectivamente. O atendimento mãe-filho foi humanizado e tornou o centro de saúde um pronto-socorro para problemas da amamentação; além disso, muito possivelmente, a intervenção poderá tornar o centro uma referência em AM e um centro de treinamento em amamentação para equipes multidisciplinares.
O passo 4 (consulta da gestante com pediatra às vésperas do parto) não foi praticado, mas pensamos que teria sido importante, poucos dias antes da internação, refletir juntamente com a mãe sobre a primeira mamada na sala de parto, o alojamento conjunto, a livre demanda, a apojadura, a descida do leite e a amamentação exclusiva sem chupetas. Quanto ao passo 8, não houve transgressão da norma dentro do centro de saúde.
O tratamento tradicional pode ser variável, e os resultados podem não ser tão significativos numa população que já tenha um tratamento tradicional mais eficaz que o do Centro de Saúde São Francisco. Por outro lado, populações que tenham um tratamento tradicional inferior poderão ter resultados ainda mais favoráveis. Este estudo demonstra que estratégias simples, ao alcance de qualquer centro de saúde, são eficazes para aumentar a duração do AM.
As crianças do grupo tradicional que ainda mamavam na época da implantação do programa beneficiaram-se do mesmo em termos de homenagem às mães, atendimento pediátrico mesmo sem vagas na agenda, empréstimo de material para ser lido em casa, controle mensal ou bimestral previamente agendado e treinamento e sensibilização dos profissionais. Isso pode ter aumentado a duração do AM em algumas crianças do Grupo 1, subestimando, assim, o impacto do programa avaliado.
Atenção também foi dada à possibilidade de a mãe informar que estava amamentando mesmo sem estar nessa condição, por considerar que isso agradaria mais ao entrevistador, tendo em vista a valorização evidente do AM no Centro de Saúde São Francisco e o atendimento pediátrico mesmo com agenda sem vagas às crianças sendo amamentadas. Na tentativa de evitar este viés de relato, perguntou-se que tipo de alimentação a criança estava recebendo naquele momento, e não se ela estava sendo amamentada ou não, e procuravam-se indícios de uso de leite artificial, tais como a mãe portar mamadeira, a criança estar adoecendo com freqüência e o odor de suas fezes estar modificado. Em caso de dúvida, observava-se uma mamada, evitando, assim, viés de classificação.
O pesquisador sabia quais crianças eram submetidas à intervenção tradicional e quais eram submetidas ao programa 17 passos, havendo, assim, a possibilidade de um viés do pesquisador. Toda atenção foi empenhada para que um grupo não fosse beneficiado em detrimento do outro.
Incentivar o AM é muito importante, mas não se deve esquecer do apoio emocional e técnico que deve ser oferecido nas consultas de controle no pós-parto. Muitas crianças que interromperam precocemente a amamentação têm mães que queriam e podiam amamentar. A frustração da mãe que quer amamentar e não consegue é muito grande. Assim, o incentivo ao AM sem que se dê condições para que ele se efetive pode causar sentimentos de culpa nas mães, impotentes para remover tantos obstáculos colocados no caminho da amamentação.
A Iniciativa Unidade Básica Amiga da Amamentação (IUBAAM), oficializada pelo Ministério da Saúde em 2003, baseou-se fundamentalmente em capacitação dos profissionais e em promoções do aleitamento às gestantes e às nutrizes com relação a procedimentos comprovadamente capazes de aumentar sua duração. A avaliação da infra-estrutura da unidade básica e entrevistas com profissionais do pré-natal e da pediatria, gestantes e mães gerou escores globais que variavam de 1 (todos os passos integralmente cumpridos pela unidade) a 0 (infra-estrutura inadequada e nenhum procedimento realizado pela unidade com as gestantes ou mães). Pesquisa em 24 unidades de saúde encontrou uma expectativa de duração do AME de 1,6 mês para os bebês menores de 6 meses assistidos em unidades de desempenho tido como regular (escore global acima de 0,33) e de 1,1 mês para os bebês acompanhados em unidades de desempenho tido como fraco (escore global igual ou inferior a 0,33)23. O programa 17 passos foi inicialmente denominado Iniciativa Centro de Saúde Amigo da Criança24 e teve seu nome modificado para evitar confusão com a IUBAAM. O programa baseou-se fundamentalmente em estratégias de apoio usadas para fazer as informações, orientações e procedimentos chegarem até as mães, impedindo que problemas ocorram e solucionando os problemas que ocorrerem. As chances de uma criança amamentada aos 2 meses chegar a 1 ano sendo amamentada aumentaram em 85%, fazendo antever que uma associação desses dois programas resultaria em uma duração ainda maior do AM.
Artigo submetido em 19.05.03, aceito em 11.02.04
Referências bibliográficas
- 1 OMS/UNICEF. Reunion conjunta OMS/UNICEF sobre la alimentacion del lactante y del niño pequeño. Genebra: OMS; 1979.
- 2. Araújo LDS. Querer/poder amamentar: uma questão de representação? [tese] Londrina: Universidade Estadual de Londrina; 1997.
- 3 BEMFAM. Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil. Pesquisa nacional sobre demografia e saúde. 1996. Amamentação e situação nutricional das mães e crianças. Rio de Janeiro: 1997;125-38.
- 4. Sokol EJ. Em defesa da amamentação: manual para implementar o Código Internacional de Mercadização de Substitutos do Leite Materno. São Paulo: IBFAN Brasil; 1999.
- 5. Cavalcanti MLF. Conhecimentos, atitudes e práticas do pessoal de saúde sobre aleitamento materno [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 1982.
- 6. Souza LMBM. Promoção, proteção e apoio. Apoio? Representações sociais em aleitamento materno [dissertação] Rio de Janeiro: IFF/FIOCRUZ; 1996.
- 7. Neylor A, Wester R. Providing professional lactation management consultation. Clin Perinatol. 1987;14:33-50.
- 8. Valdés V, Pérez A, Labbok M, Pugin E, Zambranco I, Catalan S. The impact of a hospital and clinic-based breastfeeding promotion programme in a middle class urban environment. J Trop Pediatr. 1993;39:142-51.
- 9. Kleinbaum DG, Kupper LL, Margenstein H. Epidemiologic Research: principles and quantitative methods. New York: Van Nostrand Reinhold; 1982.
- 10. Popkin BM. An evaluation of a national breastfeeding promotion programme in Honguras. J Biosoc Sci. 1991;23:5-21.
- 11. Rossiter JC. The effect of a culture-specific education program to promote breastfeeding among Vietnamese women in Sydney. Int J Nurs Studies. 1994;31:369-79.
- 12. Arora S. Major factors influencing breastfeeding rates: mother's perception of father's attitude and milk supply. Pediatrics. 2000;106:1-5.
- 13. Correa AMS. Evaluacion del impacto de las atividades de promocion de la lactancia materna. Hospital Guilherme Álvaro. USAID/LAC; fev/1994.
- 14. Valdés V, Sánchez AP, Labbok M. Manejo clínico da lactação. Assistência à nutriz e ao lactente. Rio de Janeiro: Revinter; 1996.
- 15. Valdés V, Schooley J. The role of education in breastfeeding success. Food and Nutr Bull. 1991;12:431-9.
- 16. Moura EFA. Duração do período do aleitamento materno de crianças atendidas em ambulatório de pediatria. J Pediatr (Rio J). 1997;73:106-10.
- 17. Grossman LK, Harter C, Hasbrouck C. Testing mother's knowledge of breastfeeding: instrument development and implementation and correlation with infant feeding decision. J Pediatr Perinatol Nutr. 1990;1:43-63.
- 18. OMS/UNICEF. Aconselhamento em amamentação: um curso de treinamento. Guia do Treinador; 1993.
- 19. Susin LRO, Giugliane ERJ, Krumer SC, Maciel M, Benjamin ACW, Baêta M, et al. Uma estratégia simples que aumenta os conhecimentos das mães em aleitamento materno e melhora as taxas de amamentação. J Pediatr (Rio J). 1998;74:368-75.
- 20. Alvarado R. Evaluation of a breastfeeding-support programme with health promoters' participation. Food and Nutr Bull. 1996;17:49-53.
- 21 WHO. Indicators for assessing breastfeeding practices. Geneva; 1991.
- 22. Dean AG, Dean JA, Coulombier D, Brendel KA, Smith DC, Burton AH, et al. Epi Info, version 6: a Word Processing, Database, and Statistics Program for Epidemiology on Microcomputers. Centers of Disease Control and Prevention. Atlanta, Georgia; 1994.
- 23. Oliveira MIC, Camacho LAB. Impacto das Unidades Básicas de Saúde na duração do aleitamento materno exclusivo. Rev Bras Epidemiol. 2002;5(1):41-51.
- 24. Lana APB. O livro de estímulo à amamentação: uma visão biológica, fisiológica e psicológica-comportamental da amamentação. Belo Horizonte: Atheneu; 2001.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Ago 2004 -
Data do Fascículo
Jun 2004
Histórico
-
Aceito
11 Fev 2004 -
Recebido
19 Maio 2003