Resumos
Trata-se de um relato de experiência de tutoras de enfermagem do Programa de Educação pelo Trabalho na Saúde (PET-Saúde) da Universidade Federal de Alagoas, entre maio de 2009 a abril de 2010. O objetivo do PET-Saúde enfermagem foi desenvolver ações de educação em saúde voltadas para as necessidades das comunidades atendidas pelas Unidades de Saúde da Família em Maceió, Alagoas. Para isso, foi realizado o planejamento em saúde orientado pela metodologia da problematização. As atividades resultaram em mudança na aprendizagem dos estudantes e na prática das enfermeiras do PET-Saúde, indicando a importância deste programa para o ensino e prática de enfermagem.
Educação em Saúde; Serviços Preventivos de Saúde; Promoção da Saúde; Enfermagem em saúde comunitária
Se trata de un relato de experiencia de los tutores de enfermería del Programa de Educación por el Trabajo en Salud (PET-Salud), de la Universidad Federal de Alagoas, desde mayo del 2009 hasta abril del 2010. El objetivo del PET-Salud en enfermería fue desarrollar acciones de educación en salud dirigidas a las necesidades de las comunidades atendidas por las Unidades de Salud de la Familia en Maceió, Alagoas. Para ello, llevamos a cabo la planificación en salud orientada por la metodología de la problematización. Las actividades resultaron en cambios en el aprendizaje de los estudiantes y en la práctica de las enfermeras del PET-salud, lo que indica la importancia de este programa para la enseñanza y la práctica de enfermería.
Educación para la Salud; Servicios Preventivos de Salud; Promoción de la Salud; Enfermería en salud comunitaria
This is an experience report of tutors from nursing Working Education Program in Health ( PET- Saúde ) from the Federal University of Alagoas, from May 2009 to April 2010. The objective of the nursing PET-Saúde was to develop health education actions aimed at the needs of the communities attended by the Family Health Units in Maceio, Alagoas. We conducted a health planning guided by the problem-based methodology. The activities resulted in changes in student learning and in the practice of nurses PET-Saúde , indicating the importance of this program for teaching and practice of nursing.
Health Education; Preventive Health Services; Promotion Health; Community health nursing
INTRODUÇÃO
A criação do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, com a Constituição Federal de 1988 e a publicação da lei 8080/90, intensificaram as discussões sobre a formação dos profissionais de saúde, uma vez que importantes mudanças nas práticas de saúde vêm ocorrendo, com alterações significativas no processo de formação e desenvolvimento dos profissionais da área ( 1 ) .
Mudar a formação por meio do trabalho e formar para o trabalho é uma necessidade atual do SUS, pois diversos estudos ( 2 - 3 ) apontam para a reversão do modelo de atenção como um dos principais nós críticos do sistema, o que dificulta seu fortalecimento. Mudanças na formação incidem sobre com um ator importante do sistema, o futuro trabalhador, que por meio dos objetos, instrumentos e produtos de seu trabalho, tem poder de (re)desenhar o modelo de atenção (4).
Com o intuito de aproximar a teoria acadêmica desenvolvida do período de formação e as reais necessidades de vida da população, os Ministérios da Saúde e Educação lançaram em 2005 o Programa Nacional de Reorientação Profissional em Saúde (Pró-Saúde). O programa veio para estimular nos cursos de saúde estratégias de ensino-aprendizagem que valorizassem a formação interdisciplinar, crítica, humanística e comprometida com a realidade cotidiana dos serviços de saúde ( 5 ) .
Associado ao Pró-Saúde, o Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde) foi instituído em 2008 por iniciativa do Ministério da Saúde em parceria com o Ministério da Educação, possibilitando a fomentação de equipes tutoriais de aprendizagem com inserção de estudantes de graduação nos serviços e na comunidade para uma formação voltada para as necessidades de saúde da população assistida pelo sistema de saúde brasileiro. Operacionalmente, cada grupo tutorial era formado por um tutor, seis preceptores (enfermeiras de USF), 12 estudantes bolsistas e 18 estudantes voluntários ( 5 ) .
A experiência relatada neste artigo diz respeito aos três grupos tutoriais do curso de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), no primeiro edital do PET-Saúde (2008/2009). O projeto desenvolvido pelas equipes voltou-se para as prioridades da Estratégia de Saúde da Família (ESF) e comunidades de Maceió, Alagoas, Brasil, utilizando como principal estratégia de ação a Educação em Saúde, tanto nos espaços dos serviços quanto da comunidade.
No contexto da mudança na formação em saúde para uma atuação mais assertiva no SUS, busca-se o desenvolvimento de processos de educação crítica e participativa, com vistas à transformação social e à promoção da saúde. A discussão da mudança de modelo necessária para concretização do SUS implica a ênfase em um projeto de promoção da saúde, com uma visão ampla e integrada de saúde, com ações direcionadas para transformação das condições de vida das pessoas e sua capacidade de tomar decisões ( 6 - 7 ) . A concretização desse projeto exige o olhar para quatro eixos fundamentais: concepção de saúde, gestão do processo de trabalho, formação dos profissionais e controle social, os quais guardam a potencialidade de fomentar processos de mudança para construção do projeto de promoção da saúde ( 8 ) .
A educação em saúde como área de conhecimento é um campo multifacetado e constitui um espaço de formação e veiculação de conhecimento e práticas desenvolvidos e legitimados no modo como cada cultura entende o viver saudável ( 6 ) . O enfermeiro desenvolve a educação em saúde como um de seus eixos norteadores do cuidado em saúde, concretizando sua atuação em vários espaços e cenários, dos serviços e da comunidade. Nesse sentido, instrumentalizar o estudante de enfermagem para o desenvolvimento de práticas educativas para promoção da saúde é uma das prioridades na formação de enfermagem no Brasil, com vistas ao desenvolvimento práticas profissionais contextualizadas, voltadas para a realidade nacional e amparadas pelos princípios do SUS ( 9 ) .
O trabalho tem como objetivo relatar a experiência de criação e desenvolvimento do PET-Saúde Enfermagem e seu papel de mudança na formação de Enfermagem o no fortalecimento da ESF em Maceió.
MÉTODO
A elaboração e o desenvolvimento do projeto foram amparados pela metodologia da problematização ( 10 - 11 ) , de maneira que a construção do conhecimento foi mediada pela vivência prática dos estudantes participantes do PET-Saúde. O processo educativo problematizador adotado permitiu que os conteúdos trabalhados emergissem da realidade, contribuindo para a tomada de consciência com conseguinte possibilidade de transformação desta realidade ( 10 ) . O planejamento das atividades privilegiou a integração ensino-pesquisa-extensão, a articulação ensino-serviço e a interação entre os participantes para que o planejamento das ações acontecesse de maneira contínua, participativa e contextualizada às realidades das diferentes USF.
O cronograma de trabalho foi disposto em duas fases: pré-campo e campo , que aconteceram, retrocederam e se intercalaram conforme as necessidades dos grupos. A fase pré-campo concentrou-se nos primeiros três meses de atividade, quando os estudantes foram divididos em grupos de trabalho – Cenários de prática e pesquisa , Orientação teórico-metodológica e Comunicação e Informação . Essa organização permitiu que os participantes se apropriassem de estratégias de planejamento, comunicação e organização em grupo, possibilitando maior aprofundamento teórico-metodológico sobre temáticas relevantes ao projeto e que instrumentalizaram os participantes para a inserção nas USF . Encontros semanais foram feitos com as professoras tutoras, as enfermeiras preceptoras e a coordenadora do projeto de extensão AtuAção no SUS, espaço relevante para o estudo e a socialização de todo o conteúdo do projeto, estabelecimento de compromissos entre os participantes, construção de agendas, conhecimento da realidade e necessidades das USF envolvidas, definição dos temas estratégicos para alinhamento conceitual e metodológico entre os envolvidos.
A fase de campo ocorreu nos nove meses subsequentes, quando os estudantes passaram a frequentar duas vezes por semana as unidades em que seus preceptores encontravam-se. Em média, havia cerca de cinco estudantes para cada preceptor. Nessa fase, a metodologia da problematização foi utilizada com aplicação do Método do Arco ( 11 - 12 ) , que considera como premissa da educação a realidade do indivíduo, suas vivências e experiências, seus saberes e conhecimentos prévios, com objetivo de propiciar o desenvolvimento cognitivo, crítico, reflexivo e autônomo de educadores e educandos.
Orientado pelo Método do Arco, o projeto seguiu as seguintes etapas: 1. Observação da realidade: momento em que o olhar crítico de estudantes e educadores avalia a realidade e discute os problemas que serão utilizados como molas propulsoras do processo de ensino e aprendizagem; 2. Pontos-chave: momento de síntese após a observação inicial, em que aspectos importantes para a compreensão e a delimitação do problema levantado são investigados a fim de obter respostas; 3. Teorização: momento de busca pelo conhecimento científico que elucide questões levantadas na etapa anterior; 4. Hipóteses de solução : nesse momento, a elaboração de planos de intervenção decorrentes da análise do problema, com estímulo à criatividade e à renovação do conhecimento; 5. Aplicação à realidade: momento em que o conhecimento construído coletivamente e com articulação teórico-prática é aplicado na realidade concreta.
RESULTADOS
Caracterização do projeto
O projeto geral do PET-Saúde apresentado pela UFAL foi construído coletivamente pelos cinco cursos envolvidos – Enfermagem, Medicina, Farmácia, Psicologia e Odontologia – tendo como eixo central de trabalho a educação em saúde para promoção da qualidade de vida e o estímulo ao controle social para o exercício do protagonismo do sujeito no âmbito do SUS. Neste artigo apresentamos a experiência do projeto PET-Saúde do curso de Enfermagem, desenvolvido na realidade da ESF de Maceió, Alagoas, durante seu primeiro ano de atuação (2009/2010).
O curso de Enfermagem da UFAL inseriu-se no programa conquistando três grupos tutoriais, dos oito grupos aprovados pela Universidade. A conquista do maior número de grupos pelo Curso foi fruto da relevância do trabalho desempenhado pela Enfermagem na Atenção Básica (AB) alagoana, do envolvimento e do compromisso de professores, estudantes e enfermeiras na construção do projeto PET-Saúde 2009/2010, integrando-se com outros cursos da saúde e estabelecendo parcerias com órgãos da UFAL e Secretaria Municipal de Saúde. Conquistou-se também uma função importante dentro do projeto, a coordenação geral do PET-Saúde da UFAL em Maceió, que esteve sob responsabilidade de uma das professoras tutoras da Enfermagem durante o primeiro ano de existência do programa.
Seguindo a norma ministerial, cada grupo tutorial foi composto por uma tutora (professora efetiva com dedicação exclusiva), seis preceptores (enfermeiras de USF de Maceió) e 30 estudantes, dos quais 12 eram bolsistas e 18 voluntários, totalizando 111 participantes. Todos os envolvidos dedicaram no mínimo oito horas semanais ao projeto. As atividades foram desenvolvidas em oito USF dos 6º e 7º Distritos Sanitários de Maceió.
No que se refere à proposta de ação, a Enfermagem buscou orientar-se pelas diretrizes do projeto geral do PET-Saúde da UFAL, adequando-as às particularidades do curso e da profissão, propondo agir nas dimensões: Educação em Saúde e Metodologia do processo de trabalho de Enfermagem na ESF . Ambas as dimensões voltaram-se para ações de enriquecimento do processo de ensino e aprendizagem dos envolvidos, em especial, dos estudantes, e também de reflexão e ação sobre a prática de Enfermagem na AB.
Ações de ensino, pesquisa e extensão
A experiência de realização do projeto possibilitou estabelecer um novo olhar para as inúmeras possibilidades que a ESF e a formação em saúde compõem para consolidação do SUS. Em relação às atividades de ensino , além dos encontros tutoriais em grupo voltados para a problematização da realidade, foram realizados encontros temáticos para alinhamento conceitual de tutoras, preceptores e estudantes, dos quais destacam-se a educação em saúde, o ensino de Enfermagem, o trabalho em saúde e Enfermagem e a qualidade de vida.
Na reorientação da formação, o curso de Enfermagem da UFAL buscou a aproximação entre PET-Saúde e o Programa de Reorientação da Formação em Saúde (Pró-Saúde) em processos de planejamento, desde a definição das USF como cenários das atividades do PET, contemplando e priorizando aquelas que já estavam sendo trabalhadas no Pró-Saúde, em um claro esforço de integração e otimização entre as duas importantes estratégias de mudança no âmbito da formação em saúde. Além disso, foram realizadas oficinas e eventos conjuntos de capacitação para docentes, enfermeiros e estudantes, aquisição de material e equipamentos para as USF e para implantação da sala do PET-Saúde Enfermagem, participação conjunta em encontros e eventos de avaliação do processo.
Quanto às atividades de extensão e pesquisa , a inserção dos estudantes orientou-se pela realização do diagnóstico situacional da realidade das USF, para o reconhecimento das reais necessidades das comunidades, de forma a orientar o planejamento das intervenções. Para isso, além da observação e do trabalho da equipe, do território e da comunidade realizados continuamente, foi feito o levantamento de dados por meio do instrumento de cadastro utilizado pelos agentes comunitários de saúde (Ficha A) e de informações das unidades coletadas em bancos de dados municipais, construindo um diagnóstico inicial da área de atuação, cuja finalidade foi identificar necessidades e definir prioridades para as ações de educação em saúde a serem realizadas. Além disso, os estudantes tiveram a oportunidade de vivenciar o cotidiano do trabalho do profissional enfermeiro, juntamente com a equipe de Saúde da Família, no contexto das unidades.
A observação empírica e a análise dos dados coletados permitiram evidenciar que os perfis das populações atendidas pelas diferentes USF que, afora algumas variações, apresentam indicadores semelhantes e representam a situação de saúde maceioense: condições precárias de moradia e saneamento, frequência elevada de esgoto e lixo a céu aberto, taxas expressivas de violência e desemprego, taxa de analfabetismo acentuada, presença de crianças em idade escolar que não frequentam a escola, alta prevalência de doenças crônico-degenerativas, ocorrência de doenças transmissíveis, entre elas doenças sexualmente transmissíveis, hanseníase e tuberculose, alta taxa de gestantes sem acompanhamento pré-natal, alta incidência de gravidez na adolescência, desistência precoce da amamentação exclusiva, entre muitas outras informações, algumas positivas, como a taxa mínima de mortalidade infantil.
A partir dos determinantes e condicionantes de saúde identificados, foram priorizadas as necessidades exequíveis para o PET-Saúde. Definidas as prioridades, os grupos investigaram teoricamente e empiricamente, levantando as informações científicas e as experiências já desenvolvidas pelas USF sobre os problemas evidenciados, orientando-se pelo Método do Arco ( 12 ) .
Com estas informações, os grupos planejaram coletivamente um programa de educação em saúde para cada USF, delimitando os problemas, público, objetivos, metodologia e cronograma de atividades. As ações foram desenvolvidas em todas as unidades de maneira bastante diversificada, mesmo quando os públicos e os problemas coincidiam, revelando a capacidade criativa do grupo e sua potencialidade de se adequar à realidade encontrada.
Os programas incluíram muitas ações, não sendo possível apresentá-las aqui em sua totalidade. Entretanto, podem ser destacados alguns aspectos comuns. Os grupos populacionais priorizados nas ações foram idosos, crianças, mulheres, adolescentes, portadores de doenças crônicas e enfermeiros das USF. Cada ação do programa foi detalhadamente planejada pelos estudantes, com a tutora, os preceptores e as equipes de saúde, contando frequentemente com a participação de profissionais da ESF, especialmente os agentes comunitários de saúde. Os locais de realização das atividades educativas incluíram a própria USF, escolas, associação de moradores, igrejas, parques e campus universitário. A metodologia de trabalho buscou se aproximar de estratégias educativas participativas, mediadas pelo diálogo e o respeito aos diferentes saberes ( 7 ) . Para isto, diversos instrumentos e estratégias educativas foram elaborados, mediados pela criatividade e disponibilidade para o diálogo, que sensibilizaram usuários e serviram como estímulo constante para os grupos. Os instrumentos educativos mais utilizados foram: cartazes, cartilhas, filmes, encenações, músicas, dinâmicas, festas, rodas de bate-papo, brincadeiras, debates, oficinas e seminários.
Com relação à metodologia do processo de trabalho de Enfermagem, iniciou-se a discussão e a capacitação das enfermeiras e preceptoras do PET-Saúde, em parceria com o Pró-Saúde, sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) e outros temas relevantes para a implementação dessa metodologia. As capacitações foram realizadas em oficinas e cursos. Após o momento de capacitação, as enfermeiras e os estudantes iniciaram um grupo de estudo sobre Pré-Natal com vistas à aplicação da SAE na consulta de enfermagem às gestantes atendidas na ESF, utilizando a linguagem da Classificação Internacional das Práticas de Enfermagem (CIPE®).
DISCUSSÃO
No atual contexto de necessidade de reversão do ensino e do trabalho em saúde, a teoria da problematização ( 11 - 12 ) contribui para a transformação de práticas tradicionais, diretivas, coercivas e acríticas em práticas participativas e reflexivas, favorecendo a formação de sujeitos capazes de reconhecer e intervir sobre os problemas da realidade, com vistas a transformações sociais que libertem e transformem. No contexto dos cursos de ensino superior da saúde, a problematização para reorientação da formação tem fundamental importância, na medida em que permite que o aprendizado comece e termine na realidade social, em um movimento de ação-reflexão-ação ( 13 ) que torna o processo de ensino e aprendizagem mais efetivo na formação dos futuros profissionais de saúde.
As atividades do PET-Saúde têm contribuído para a formação de enfermeiros com ênfase na Atenção Básica, na ESF, para uma atuação crítica, competente e humanística no SUS. Embora haja consenso de que a formação de profissionais de saúde deveria ser orientada para formar profissionais para o SUS, ela tem se mostrado alheia à necessidade de promover uma educação baseada em seus princípios e diretrizes, perpetuando o modelo hegemônico ( 14 ) . Estratégias bem sucedidas para romper com esse modelo, como a do PET-Saúde, devem ser incentivadas e estimuladas.
Sabe-se que tal modelo influenciou inclusive a organização dos currículos. Se, numa visão mecanicista, o corpo humano é visto como uma espécie de máquina composta de partes interrelacionadas e a doença representa um desarranjo em uma delas, o conhecimento necessário para lidar com ele torna-se necessariamente fragmentado, apresentado sob a forma de disciplinas estanques. Além disso, os conteúdos curriculares dão maior prioridade aos problemas de saúde individuais, em detrimento dos coletivos, desconsiderando fatores psíquicos, afetivos, históricos e culturais do adoecer humano ( 14 ) .
Rompendo com este conceito restrito e fragmento do processo saúde-doença, as atividades do PET-Saúde Enfermagem permitiram aos estudantes o aprendizado sobre as necessidades de saúde da população, com enfoque na promoção da saúde, com base no conceito ampliado e positivo de saúde ( 6 ) . A aproximação com os indicadores de saúde de cada território foi o elemento desencadeador dos trabalhos, que utilizaram o referencial da problematização e o conceito de territorialidade ( 15 ) .
O estudo foi orientado pela compreensão de que o interesse pelo território na área da saúde é um fenômeno recente, partindo principalmente dos gestores de saúde, de estudiosos em administração dos serviços e dos próprios trabalhadores desses serviços. Vários motivos podem ter contribuído para esse fenômeno. Em primeiro lugar, a Reforma Sanitária Brasileira, em particular o projeto de implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), motivou uma reflexão sobre o funcionamento dos serviços e, com isso, de sua base territorial, levando a um maior interesse sobre os critérios de delimitação de territórios para a saúde.
Sob essa ótica gerencial, o território é concebido como área político-administrativa, com maior ênfase na repartição do espaço que nos processos que aí se desenvolvem. Mas, a operacionalização do conceito de território é o principal objetivo dessa retomada, levando à redefinição do próprio conceito de território utilizado nas políticas públicas de saúde. É nesse sentido que o resgate do conceito de território ( 15 ) reafirma sua importância para a implementação de uma reforma democrática na saúde, sendo a base territorial um dos princípios organizativo-assistenciais mais importantes do sistema de saúde. Por isso, pressupõe limites, organização e participação, para se constituir em espaço de trocas e pactos para a qualidade de vida e o sentimento de bem-estar. Assim, o território passa a ser compreendido como suporte da organização dos serviços e das práticas de saúde, no sentido da co-responsabilidade e da atuação compartilhada para a promoção da saúde.
Tendo em vista o desenvolvimento de um projeto de promoção à saúde, o desenvolvimento de práticas educativas orientadas para a realidade dos serviços e da comunidade voltou-se para os problemas encontrados no território. Tais problemas, objetos de intervenção dos grupos tutoriais do PET-Saúde de Maceió serviram como disparadores de ações que buscaram a promoção da saúde e aproximam-se de uma abordagem de qualidade de vida, envolvendo ações de empoderamento das comunidades e dos trabalhadores nas decisões sobre a saúde ( 8 - 9 ) .
Em relação à comunidade, o enfoque nas temáticas sensíveis do território, como desemprego, gravidez na adolescência e violência, conduziu as ações para os grupos prioritários da comunidade, em um movimento de estímulo ao viver saudável e sensibilização para a autonomia dos sujeitos. Em relação aos trabalhadores dos serviços, os grupos tutoriais voltaram-se para a instrumentalizações dos enfermeiros da ESF na utilização da SAE/CIPE® na Atenção Básica ( 16 - 18 ) não apenas como ferramenta de orientação da prática profissional, mas também como motivador da reflexão sobre o próprio processo de trabalho, conduzindo para um fazer empoderado.
CONCLUSÃO
O PET-Saúde Enfermagem da UFAL tem contribuído para a formação dos futuros enfermeiros, pois possibilita aos estudantes a inserção e a atuação efetiva na ESF, a criação de vínculos, o desenvolvimento de diferentes competências e o conhecimento sobre o planejamento em saúde, em consonância com metodologias problematizadoras de educação. Rompe com o modelo tradicional de formação e saúde, orientando-se por um aprender a fazer crítico e reflexivo da realidade, tendo em vista efetivação do SUS por meio da promoção da saúde.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Dez 2013
Histórico
-
Recebido
16 Dez 2012 -
Aceito
15 Ago 2013